Pedro
Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião
1.
Não vivemos uma época em que seja minimamente seguro fazer previsões. No
entanto, tudo indica que teremos um acordo parlamentar que vai levar o PS ao
governo. Os partidos de esquerda já foram longe demais para que se possa voltar
atrás. Uma eventual rutura faria que durante muito tempo ninguém levasse a
sério os partidos de esquerda, sobretudo o PS e o PCP. Estando a bola do lado
dos comunistas, seria difícil para os seus dirigentes centrais explicar à CGTP
e aos autarcas comunistas que teria sido por causa do PCP que o governo de
direita se manteria no poder. Para António Costa e o PS seria mais uma derrota
brutal e a prova provada de que a estratégia de buscar apoios à esquerda tinha
sido um erro. Em geral, ficava claro que a esquerda não se consegue entender e
não é capaz de encontrar soluções alternativas.
Das
poucas coisas que sabemos ao certo é que o governo será apenas da
responsabilidade do PS. E isso é um erro grave, um contributo significativo
para a tese da falta de legitimidade política desse governo e uma prova de que
o BE e o PCP não querem assumir as responsabilidades que os seus eleitores lhes
atribuíram. A não presença dos três partidos no governo é um mau sinal.
É
evidente que a legitimidade do governo vem do Parlamento, mas é, no mínimo,
aconselhável que aquele seja o reflexo da representação parlamentar da maioria.
Um
partido que foi o grande derrotado das eleições organizar o governo levanta
questões de legitimidade política; ser apenas esse partido a estar no governo
aprofunda-as. Um governo com os três partidos empenhados na governação seria
muito mais representativo da maioria que tudo indica governará o país e ninguém
poderia duvidar do empenho dos vários partidos que fazem parte do acordo.
Seria, aliás, a melhor forma de dar alguma coesão a uma solução composta por
organizações partidárias com diferenças ideológicas tão significativas.
As
fricções entre PS, BE e PCP, que inevitavelmente existirão, seriam muito melhor
resolvidas se todos estivessem no governo. O exercício do poder, a sua dinâmica
ajuda na busca de soluções de consenso. A coexistência cria laços, permite a
compreensão da necessidade de flexibilidade. A implementação de medidas mostra
aos vários intervenientes que há uma enorme diferença entre a teoria e a
prática, que é muitas vezes essa implementação que define o verdadeiro conteúdo
das normas.
Não
duvido de que o acordo entre os três partidos será claro, detalhado e com as
medidas a aplicar bem definidas - não poderá ser de outra maneira -, mas quem
se responsabiliza pelas medidas tem também de se responsabilizar por as
aplicar.
Por
outro lado, não estando no governo, o BE e o PCP não se afirmarão como partes
da solução, mas serão vistos como partidos que somente não querem alguma coisa.
Afinal, o BE e o PCP querem governar, exercer o poder ou continuar a ser apenas
partidos que não querem assumir as suas responsabilidades perante quem votou
neles?
A
não presença do BE e do PCP indicia uma solução instável e uma tendência para
termos uma enorme bipolaridade no comportamento desses dois partidos.
A
solução governativa é, claro está, constitucionalmente legítima e terá de ser
viabilizada pelo Presidente da República, mas não começa nada bem.
2.
Para a coligação PAF é essencial que o governo PS caia o mais depressa possível.
É fundamental, para o PSD, que o eleitorado do centro não tenha tempo para
perceber que um governo apoiado pelos comunistas não comerá criancinhas, não
nacionalizará, não deixará de cumprir no essencial os compromissos europeus. No
limite, a possibilidade de as opções do novo governo não se distinguirem muito,
em termos económicos, das do anterior governo são um cenário dantesco para a
coligação.
Marcelo
Rebelo de Sousa vai ser sujeito a todas as pressões possíveis e imagináveis
para que dê sinais de que derruba o governo logo que os prazos constitucionais
o permitam.
Coisa
que o professor não fará. Em primeiro lugar, porque basta olhar para a forma
como os eleitores votaram nas legislativas para se perceber que um candidato
que se colasse às posições do PAF não teria a mais pequena hipótese de chegar a
presidente. Em segundo, porque, pela baixíssima popularidade de Cavaco Silva,
os portugueses querem mesmo um presidente que esteja acima dos partidos e não
seja alguém colado a um partido ou a uma área ideológica. Em terceiro, porque,
apesar de estarmos num momento de bipolarização partidária, o eleitorado
maioritário continua a ser de centro e anseia por alguém que corporize essa
moderação.
Não
me surpreenderia, aliás, que o PAF apresentasse um candidato de última hora
que, pelo menos, tirasse votos a Marcelo Rebelo de Sousa, de modo a que este
perdesse as eleições. Passos e Portas sabem que se Marcelo for eleito e não
derrubar o governo dará um reforço de legitimidade política ao executivo, que
contrariará a linha de oposição do PAF - que se centrará na repetição
sistemática da mensagem da ilegitimidade política. Preferirão, assim sendo, um
presidente de esquerda que possam associar à tese da espécie de golpe de Estado.
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