Expresso
das Ilhas, editorial
Há
25 anos, 1991 foi um ano de mudança histórica em Cabo Verde. Por Cabo Verde
também passavam os ventos que desde de 1989 vinham deitando abaixo regimes
totalitários e autoritários em todos os continentes. Para caracterizar o
fenómeno, Francis Fukuyama falava na época do “Fim da História”, do abraçar
quase universal dos princípios e valores da liberdade e democracia e do
reconhecimento da importância central da iniciativa privada e dos mercados na
criação de riqueza e prosperidade. Um optimismo contagiante acabou por dominar
toda a década que então se iniciava à medida que barreiras ideológicas
desapareciam e saltos tecnológicos nos domínios dos transportes e
telecomunicações lançavam a humanidade num processo de globalização sem
precedentes. Em consequência, centenas de milhões de pessoas deixaram a
pobreza, muitas vezes abjecta, para integrarem as fileiras da nova classe média
dos países emergentes.
Cabo
Verde, que vinha de vários anos de estagnação económica e de um crescimento do
PIB em 1990 de praticamente 0%, iniciou o ano com um novo governo que se
anunciou pronto a construir as instituições próprias de uma democracia moderna
e a reestruturar profundamente a economia. A economia estatizada que tinha sido
criada nos quinze anos de partido único tinha falhado em fazer Cabo Verde
crescer com a rapidez que outros estados insulares como as Maurícias e as
Seychelles vinham crescendo. Em consequência o rendimento per capita de Cabo
Verde mantinha-se abaixo dos mil dólares (957) enquanto nas Maurícias já era de
2365 dólares e nas Seychelles já ultrapassava os 5 mil dólares. Essas ilhas
tinham feito escolha oposta em relação a Cabo Verde. Maurícias tinham apostado
na atracção do investimento externo para criar uma base de manufactura para
exportação, aproveitando o sistema preferencial de acesso a mercados da Europa,
América e Japão e as Seychelles tinham feito um comprometimento sério com o
desenvolvimento do turismo, que as deixou com um turismo de qualidade que tem
um efeito forte de arrastamento na economia nacional.
Depois
de quinze anos de rendimentos perdidos por causa de estratégias erradas de
estatizar, fugir dos mercados e rejeitar o turismo, a perspectiva nos
primórdios dos anos noventa era soltar as amarras que vinham prendendo a
criatividade, energia e iniciativa dos cabo-verdianos e pô-las ao serviço da
criação de riqueza. A década de noventa acabou por se revelar de um crescimento
sem precedentes, com impacto significativo no emprego que desceu para os níveis
mais baixos de sempre. A década e meio que se seguiu, apesar de beneficiar de
importantes fluxos de capital privado particularmente nos três anos antes da
crise financeira de 2008 e de donativos e empréstimos concessionais ao longo de
todo o tempo, tem-se revelado frustrante nos resultados de crescimento
económico (2012 – 1,2%; 2013 - 1%; 2014 - 1,8%) não obstante os avultados
investimento feitos. O ano de 2015 é já claramente um ano fraco com
resultados nos três últimos trimestres de 1%, 05%, 1,4%
respectivamente a confirmar que o impacto de toda a chamada Agenda de
Transformação ficou muito aquém do prometido.
A
Ministra das Finanças ainda procura justificar a situação actual de estagnação
económica como sinal de modelo esgotado e de necessidade de passar para um
outro estádio de desenvolvimento, numa perspectiva que justifica a orientação
seguida até agora e até aconselha para se continuar numa nova etapa. A
realidade porém é que há muito se devia ter abandonado o modelo, mas razões
outras não deixavam. Uns dizem que é por factores ideológicos, outros apontam
para razões pragmáticas de manutenção do poder. O facto é que com o andar dos
anos a competitividade externa do país não melhora, os sectores de energia,
água e transportes marítimos e aéreos continuam fracos, caros e não confiáveis
e a base da economia mantem-se pouco diversificada. A administração pública faz
o seu trabalho sempre pouco sensível e burocrática em relação ao mundo de
negócios, enquanto a atenção dos governantes para questões centrais como a
segurança, o desenvolvimento do turismo e a atracção de investimento externo
continua não devidamente focalizada, nem consequente.
Em
1991 teve que se imprimir uma reorientação radical para que a economia voltasse
a crescer a taxas que se traduzissem em ganhos efectivos, em rendimentos e qualidade
de vida para a população. Algo similar deverá acontecer neste ano de 2016. A
dúvida é se, à semelhança do que foi há 25 anos, também hoje existe a
consciência de que se impõe uma mudança de paradigma na governação actual, uma
vontade em explorar outras vias para desenvolver o país e uma confiança que é
possível produzir riqueza e prosperidade sustentável de que todos poderão
beneficiar. Para bem de toda a gente, esperemos que sim.
Votos
de um bom ano de 2016.
Texto
originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 736 de 06
de Janeiro de 2016.
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