terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Duas Reflexões geoeconómicas (contributos para uma Nova Cultura Politica Africana)



Rui Peralta, Luanda

1ª Reflexão: USA

Com um endividamento comercial que ronda 505 mil milhões de USD e sofrendo de um déficite fiscal de aproximadamente 55 mil milhões de USD, a economia norte-americana necessita, cada vez mais, que a sua moeda seja dominante nas transacções efectuadas na economia-mundo. O USD como moeda da reserva mundial é um principio fundamental da politica económica dos USA, conforme reconhecem os próprios, através de Jared Bernstein, economista-chefe do vice-prsidente dos USA, Joe Biden, entre 2009 e 2011 e actualmente um dos consultores do presidente Obama.

O processo de desodolorização na acumulação mundial de reservas põe em perigo a posição hegemónica geoeconómica dos USA. Dois factores são decivos para compreender este fenómeno: 1) A participação do USD nas reservas mundiais é afectada pelo Yuan chinês devido á utilização desta moeda em 40 Bancos Centrais; 2) O facto do intercâmbio comercial entre países realizar-se, cada vez mais, em moedas próprias (caso dos BRICS ou das relações Japão/China, por exemplo), sem necessidade de transitar pelo USD.

Na ultima década surgiram grandes corporações globais com origem, principalmente, nos BRICS, na U.E., Japão e Coreia do Sul. Como resultado, em 2012, os USA apenas tinham 34 companhias entre as 100 mais valiosas do mundo. Nos últimos dois anos, no entanto, os grupos empresariais norte-americanos recuperaram e em 2015 reassumiram o comando, ao colocarem 54 companhiias na lista das 100 mais valiosas. No entanto esta recuperação sabe a pouco, porque algumas economias saíram do seu posicionamento periférico e assumem protagonismo na economia-mundo. O exemplo da China é o mais destacado na actualidade. Este país conta com 11 companhias no Top mundial (á entrada do século apenas tinha 2). Outro exemplo pode ser retirado da lista Fortune 500, que reúne as 500 maiores em facturação, onde aparecem 95 empresas chinesas (contra 21 em 2001) e onde se destacam mais 27 empresas de países como o Brasil, a India, a Russia, a África do Sul, a Nigéria e o Egipto.

Os USA vêm-se, assim, forçados a compartir resultados com blocos emergentes, o que representa um abalo na hegemonia. Daí a Reserva Federal (FED) ter anunciado uma subida da taxa de juros, de forma gradual e que se fazem, neste preciso momento, fazer sentir os seus efeitos. Com esta medida os USA esperam o regresso dos capitais que se encontravam em destinos mais rentáveis, ao memso tempo que declara ao mundo que a economia norte-americana está em forma (o que é visível com a valorização do USD em curso).

A expansão monetária serviu de filtro para o saneamento dos grandes bancos e fundos de investimento norte-americanos, que recompraram grande parte da sua divida, causada pelos “produtos tóxicos” financeiros. Neste momento os USA estão preparados para crescer e reafirmar-se como epicentro da economia-mundo. Irá, pois, tentar ressuscitar o Consenso de Washington, assente em alguma novas premissas e realidades. Contam com a sua vanguarda tecnológica, que ganha terreno e marca posições na geoeconomia mundial. E conta, também, com a influência monopolística que exerce sobre as agencias de qualificação de risco (Moody`s, Standard & Poor e Fitch). As finanças da economia-mundo ainda têm raízes muito sólidas no solo norte-americano e arquitectura económico-financeira internacional tem os seus alicerces nas relações geoeconómicas estabelecidas (FMI, Banco Mundial, OMC, etc.).

África tem de levar isso em conta e reposicionar-se no cenário que 2016 anuncia. Os BRICS não são a única resposta aos problemas do continente. Poderão até tornarem-se em parte do problema ao invés de parte da solução. É necessária, mais do que nunca, uma visão realista e uma grande capacidade de análise geoeconómica para redefinir as estratégias do desenvolvimento africano. De pouco serve a geopolítica no contexto actual da economia-mundo. É um pouco como ler o destino dos Homens através dos astros…

2ª Reflexão: o preço do petróleo

O petróleo detém, ainda, um papel geoeconómico indiscutível - apesar da paulatina consolidação de novas fontes energéticas – representando 1/3 da matriz energética mundial. O século XXI, no sector petrolífero, caracterizou-se pela recuperação do papel da OPEP (Organização dos Paises Exportadores de Petróleo) face á AIE (Agência Internacional de Energia). A junho de 2014 o preço do barril alcançou 115 USD. Depois veio a queda do preço, até aos baixos índices actuais (34 a 35, na primeira semana de Janeiro de 2016).

Existem dois factores fundamentais para esta quebra. O primeiro destes factores é a queda da procura. Consome-se menos petróleo na China e na India (dois dos grandes consumidores) e menos, ainda, nas economias centrais, devido a questões como baixa do crescimento económico, concorrência das energias alternativas, etc. O segundo destes factores é o incremento da oferta. Em 2014 os USA atingiram os 9,32 milhões de barris por dia (Bpd); a Árabia Saudita ultrapassou os 9 milhões de Bpd; O Iraque ultrapassou os 4 milhões de Bpd e o Irão prevê um aumento de meio milhão de Bpd a partir deste ano.

Além destes factores fundamentais existem factores secundários de diversa ordem que em diferentes graus influenciam o movimento dos preços: alguns movimentos especulativos (nem tanto assim) nos Fundos de Investimento e nos grandes bancos (opinião conjunta do Congresso dos USA e da Goldman Sachs, ou seja, opinião suspeita, atendo ás ligações que ambas as instituições têm com o sector petrolífero); a “indiferença” da Arábia Saudita (face ao preço do barril e face ao seu déficite fisca, que representa 15% do PIB); a “despreocupação” aparente dos USA; o factor tecnológico que permitirá baixar os custos de produção; e, finalmente o papel do califado e outros grupos fascistóides islâmicos no contrabando e desvio de petróleo (Iraque, Siria, Libia, Nigéria) e respectivos centros de venda destas redes (Turquia, uma delas e o resto disseminado internacionalmente pelas monarquias do Golfo). Naturalmente que a preço baixo seria de esperar um incremento do consumo, mas para este continuar e o sector petrolífero poder concorrer com os preços também cada vez mais baixos das alternativas, é necessário que os preços baixem mais e que depois se mantenham a um nível baixo, ou seja, a guerra dos preços da energia está lançada. A equação aplicada aos preços do petróleo não é apenas matemática, mas também geoeconómica. Por exemplo, duas variáveis a ter em conta: 1) Arábia Saudita e Irão competem pela hegemonia petrolífera no Médio Oriente; 2) A Russia, apesar do embargo, elevou 7,5%  as suas exportações de petróleo em 2015.

Quanto a predições e previções deixemo-las aos videntes, cartomantes e astrólogos, que pululam pelos mercados. Ah…e aos teóricos da conspiração. E Africa? Diversificar, desenvolver-se e assumir-se. Em todas as dimensões da Humanidade. E reconstruir-se como um mercado único, sem barreiras entre as economias nacionais que a formam e entre as realidades monetárias que a compõem…

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