Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
A
nossa dívida pública já soma 231 mil milhões de euros, um pouco mais de 23 mil
euros por cada português. Dirão alguns que já não é notícia. Permito-me
discordar. Aliás, o silêncio à volta do boletim estatístico do Banco de
Portugal, divulgado esta semana, é a melhor prova de que é notícia. Pelo valor,
o mais alto de que há registo; e pelo embaraço político, à Direita como à
Esquerda.
À
Direita, porque fica claro como água que quatro anos e meio de austeridade e de
saque fiscal não serviram, nesta matéria, para nada. Passos e Portas prometiam
endireitar as contas, reduzindo a despesa e a dívida, mas não conseguiram nem
uma, nem outra. Limitaram-se a empobrecer os portugueses e, com eles, o país.
À
Esquerda, porque fica claro que a reestruturação da dívida, que defendia com
mais ou menos fervor, é assunto que por agora fica na gaveta. A indignação a
que se assistia há uns meses a cada atualização dos dados, deu lugar a um
silêncio cínico.
Faz
por isso sentido relembrar o célebre manifesto pela reestruturação da dívida,
divulgado em março de 2014. Diziam-nos os 70 subscritores iniciais que era
urgente baixar as taxas médias de juro, negociar prazos mais longos e
reestruturar o montante acima dos 60% do PIB, ou seja, mais de metade da dívida
pública. Sem essa reestruturação, dizia-nos gente de pensamento político e
económico tão diverso quanto Manuela Ferreira Leite, Bagão Félix, Adriano
Moreira, Francisco Louçã ou Carvalho da Silva, "o Estado continuará
enredado e tolhido na vã tentativa de resolver o problema do défice orçamental
e da dívida pública pela única via da austeridade". De então para cá, a
dívida não parou de crescer e, portanto, continuará a "não ser possível
libertar e canalizar recursos minimamente suficientes a favor do crescimento".
Pelo
menos assim pensavam, para além das personalidades já citados, mais um punhado
de dirigentes socialistas, como Eduardo Ferro Rodrigues, Adalberto Campos
Fernandes e Carlos César, por exemplo. O primeiro é agora presidente da
Assembleia da República, o segundo é ministro da Saúde e o terceiro líder da bancada
parlamentar do PS, e também por isso seria interessante perceber, agora que
ocupam cargos de poder tão relevantes, como pensam lidar com um problema que,
mais tarde ou mais cedo, voltará para nos assombrar.
Como
é sabido, Portugal vai continuar a acumular défices, ano após ano, e portanto a
somar dívida à dívida que já tem. Por muito que os socialistas - como os
bloquistas ou os comunistas - queiram por agora evitar um debate com potencial
para criar instabilidade e divisão, serve de pouco atirar o lixo para debaixo
do tapete. Até porque já há mais lixo do que tapete.
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