quarta-feira, 2 de março de 2016

Angola. UM ÚLTIMO “VIVA” PARA LÚCIO LARA



O corpo de Lúcio  Lara, que faleceu no sábado, por doença, aos 86 anos, é sepultado hoje no Cemitério do Alto das Cruzes, em Luanda.

Antes da derradeira marcha até à sua última morada, o homem que ajudou a escrever a história de África, em especial das antigas colónias portuguesas, desde o Clube Marítimo Africano (CMA), da Casa dos Estudantes do Império (CEI) e do Movimento Anti-Colonial (MAC), é homenageado na antiga sede do Parlamento angolano, por sinal, o seu último endereço de trabalho.

A urna foi transportada ontem da Clínica Girassol para as antigas instalações da Assembleia Nacional, onde o corpo foi velado por familiares e antigos combatentes e veteranos da Pátria.

A cerimónia oficial tem início hoje, pelas 9h30, no mesmo local, com homenagem do Presidente da República, José Eduardo dos Santos, dos titulares dos órgãos de soberania, dos membros do Bureau Político do MPLA e dos deputados à Assembleia Nacional. 

Lúcio Lara é também homenageado hoje pelos membros do Comité Central do MPLA, dos órgãos de defesa, segurança e ordem pública, entidades eclesiásticas, representantes de partidos políticos, do corpo diplomático e de organizações sociais do partido e da sociedade civil.

Logo às 15h00, no Cemitério do Alto das Cruzes, antes da descida da urna à sepultura, há um momento de exaltação da família, incluindo a leitura de mensagens da Associação Tchiweka e dos antigos combatentes.

Artífice da Independência

Num comunicado, o Bureau Político do MPLA referiu-se a Lúcio Lara como um dos artífices da luta pela independência de Angola, ao lado do Primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, e de outros eminentes nacionalistas, que “escreveu o seu nome com letras de ouro na História de Angola, pela sua inestimável participação na árdua caminhada em prol da liberdade, da autodeterminação e da independência nacional”.

Durante todo dia de ontem continuaram a chegar à redacção do Jornal de Angola várias mensagens de condolências pelo falecimento de Lúcio Lara.  O Grupo Parlamentar do MPLA destacou ontem as qualidades do grande combatente pela independência do povo angolano e de África em geral, falecido por doença sábado último, em Luanda. 

Em comunicado tornado público ontem, os parlamentares do MPLA consideram Lúcio Lara como um homem que dedicou toda a sua vida à causa do povo angolano, na luta pela independência, tendo-se tornado uma referência incontornável na história contemporânea de Angola.

Os parlamentares qualificam-no como “homem de fortes convicções, humilde, compreensivo, estudante, com participação activa na Casa dos Estudantes do Império, militante dedicado do MPLA, onde exerceu a função de secretário-geral”. Entre as qualidades de Lúcio Lara, os parlamentares destacaram ainda as de  guerrilheiro, dirigente e deputado à Assembleia do Povo, a vida dedicada ao MPLA, contribuindo para a elaboração da história da organização, que se confunde com a do povo angolano.

O Grupo Parlamentar do MPLA inclina-se perante a memória de “Tchiweka” e apresenta à família enlutada as mais sentidas condolências e que sejam fortes para suportar a imensa dor que neste momento a todos atinge.

O ministro da Assistência e Reinserção Social, João Baptista Kussumua, responsáveis e quadros do Ministério também se associaram à dor da perda do grande combatente da liberdade, tendo endereçado uma mensagem de condolências onde exprimem o seu profundo sentimento de pesar à família enlutada.

O Governo da província de Malanje também se mostra consternado com o falecimento de Lúcio Lara. Na sua mensagem de condolências, o governador Norberto dos Santos “Kwata Kanawa”, destacou a figura de Lúcio Lara como nacionalista, guerrilheiro e dirigente histórico do MPLA. “Lúcio Lara foi um artífice da luta pela independência de Angola, ao lado do primeiro Presidente, Agostinho Neto, e de outros eminentes nacionalistas, que lutaram  incansavelmente no cumprimento dos programas do MPLA, que visam a satisfação das principais necessidades do povo”, referiu. 

A OMA considera Lúcio Lara um destacado nacionalista histórico do MPLA, que durante a sua trajectória de vida contribuiu de forma decisiva para a conquista e consolidação da independência, liberdade, emancipação do povo angolano e construção do país. Na sua  mensagem, a OMA reconhece ainda no malogrado um homem com elevado sentido de missão na luta contra o colonialismo português. O Secretariado Executivo Nacional da OMA inclina-se perante a memória deste ilustre combatente da Pátria angolana e endereça sentidas condolências à família enlutada.

Diplomatas consternados

O embaixador de Angola na Itália, Florêncio de Almeida, manifestou-se consternado pelo falecimento de Lúcio Lara. 

De acordo com uma nota de condolências da Embaixada de Angola na Itália, Lúcio Lara foi um grande combatente da liberdade do povo angolano e um dos maiores impulsionadores do MPLA, juntamente com o saudoso Presidente Agostinho Neto.

“Os seus feitos no longo processo da independência de Angola marcaram, de forma indelével, a memória de todos os que lutaram pela causa da libertação nacional”, lê-se no comunicado.

A mensagem realça que com a sua morte, Angola perde um dos seus melhores filhos, que, ao lado de outros nacionalistas, fez emergir uma geração de angolanos que criou as condições e consciencialização para a luta anti-colonial no seio das populações.

O chefe da missão diplomática angolana  na Namíbia também endereçou uma mensagem de condolências pela morte de Lúcio Lara. “O camarada Lúcio Lara foi um homem simples e um dos artífices da luta de libertação de Angola e de África, um combatente brilhante, patriota e dirigente partidário que sempre esteve com o povo angolano nos momentos mais difíceis da sua história”, lê-se no comunicado assinado por Manuel Rodrigues.

O embaixador angolano no Brasil, Nelson Cosme, considera Lúcio Lara como co-fundador do MPLA, destacado militante do partido e um dos “grandes vultos” do nacionalismo angolano da segunda metade do século vinte. 

Na sua mensagem de condolências, Nelson Cosme e restantes funcionários da Embaixada endereçam as mais sentidas condolências à direcção do MPLA e aos seus militantes e simpatizantes. 

A Associação “Processo dos 50” considera que Lúcio Lara, apesar de falecido, deixa os seus exemplos de verticalidade, de honestidade e de humildade aos angolanos. “Foi um humanista, um guerrilheiro, um nacionalista preocupado com o seu povo, um combatente abnegado à altura de muitos dos melhores filhos deste imenso país! Um artífice da luta pela libertação, pela autodeterminação  e independência de Angola”, refere o comunicado dos nacionalistas.

A Missão Diplomática de Angola no Reino da Suécia, Países Nórdicos e Estados Bálticos também manifestou “profunda consternação e dor” pela morte de Lúcio Lara. Na mensagem assinada pelo embaixador Isaías Jaime Vilinga, a missão diplomática sublinha que a morte de Lúcio Lara, dirigente histórico do MPLA, deixa um grande vazio no seio da classe política, parlamentar, universitária e em particular da sociedade angolana. “Angola perde um dos seus grandes filhos, um patriota e combatente da luta pela Independência e Soberania Nacional”, lê-se na mensagem, na qual destaca a figura de Lúcio Lara como um “insigne defensor dos ideais da liberdade e progresso dos povos de Africa e do mundo, cuja vida esteve intimamente ligada à História de Angola, na segunda metade do século XX”.

A embaixada de Angola na Alemanha também lamenta a morte de Lúcio Lara e curva-se perante a memória do combatente pela liberdade  dos povos oprimidos.

O Partido Comunista Português (PCP) lamentou, numa mensagem, a morte de Lúcio Lara. Na mensagem, o secretáriado do PCP afirma que  foi com profundo pesar que tomaram conhecimento do falecimento “do camarada Lúcio Lara, dirigente histórico do MPLA e da heróica luta de libertação do povo angolano e, com Agostinho Neto e outros destacados revolucionários, fundador do novo Estado independente da República Popular de Angola”.

Ao mesmo tempo em que transmite ao MPLA e ao povo angolano e à família de Lúcio Lara sentidas condolências e os sentimentos de amizade e solidariedade, o Partido Comunista Português evoca a sua destacada figura de patriota e de internacionalista. “Recordamos com respeito a sua valiosa contribuição em Portugal, ao lado do nosso Partido, para a luta contra a criminosa ditadura fascista e colonialista que, oprimindo o povo português simultaneamente oprimia o povo angolano e demais povos sujeitos ao jugo colonial, tornando os nossos povos aliados numa luta libertadora comum de que a revolução do 25 de Abril e a conquista de independência de Angola foi a mais elevada expressão”, lê-se na mensagem do PCP.  

O
Partido Comunista Português lembra ainda a contribuição de Lúcio Lara para o fortalecimento das tradicionais relações de amizade, cooperação e solidariedade entre o Partido Comunista Português e o MPLA e entre o povo português e o povo angolano, relações que é desejo dos comunistas portugueses aprofundar sempre mais.

Lúcio Lara (1929 - 2016)

Lúcio Lara, de seu nome completo Lúcio Rodrigo Leite Barreto de Lara, nasceu em 1929 no Huambo (Nova Lisboa), de pai português e de mãe angolana natural do Bailundo e neta de um soba do Libolo (hoje situado no Cuanza Sul). No dia 29 de Abril completaria 87 anos. Fez os estudos primários e parte dos secundários no Huambo e terminou o liceu no Lubango (Sá da Bandeira).

Em 1947 seguiu para Portugal para os estudos universitários (Ciências Físico-Químicas). Foi ali que se embrenhou na luta nacionalista, com Agostinho Neto, Mário de Andrade, Amílcar Cabral, e outras figuras  nacionalistas das colónias  portuguesas, numa dinâmica que iria desembocar na formação de organizações  comuns, nomeadamente o MAC (Movimento Anti-Colonial) em 1957, a FRAIN (Frente Revolucionária  Africana  para a Independência Nacional ) em 1960 e a CONCP (Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias  Portuguesas) em 1961. Com Mário de Andrade, Viriato da Cruz, Eduardo Macedo dos Santos, Hugo de Menezes, Matias Miguéis participou na estruturação do MPLA em 1960, e na decisão da passagem à luta armada.

Durante a Luta de Libertação Nacional ocupou lugares de responsabilidade político-militar nas Frentes Norte e Leste, tendo pertencido às estruturas directivas do MPLA desde o primeiro Comité Director de 1960, as direcções seguintes, o Bureau Político e Comité Central desde 1974 (Conferência Inter-regional de Militantes), até à sua paulatina retirada, que culminou com a saída definitiva da vida política, em 2003.

Foi também Primeiro Secretário da Assembleia do Povo a partir de 1981 e deputado eleito para a Assembleia Nacional em 1982. Foi presidente da Agência Pan-Africana de Informação (PANA), em 1978. Toda a vida política de Lúcio Lara se confunde com a história do MPLA, de Movimento de Libertação a Partido no Poder. Teve uma longa relação de amizade, fidelidade política e estreita colaboração com Agostinho Neto, tendo sido considerado nos círculos políticos  nacionais e internacionais  braço  direito do Primeiro  Presidente de Angola até ao falecimento  deste, em 1979.

Como nacionalista africano, Lúcio Lara lidou com figuras emblemáticas do Pan-Africanismo, assim como da intelectualidade africana, entre eles Kwame NKrumah, Franz Fanon, George Padmore, Felix-Roland Moumié, Ruben Um Nyobe, Cheikh Anta Diop, Sembéne Ousmane e outros.

Nesse longo e muitas vezes difícil percurso, sempre contou, no espírito dos princípios que ele defendia, com a firmeza política e moral de Ruth Lara, sua esposa e companheira de todas as lutas, falecida em 2000.

Figura emblemática e bem conhecida da luta de Libertação Nacional em Angola, Lúcio Lara constituiu o símbolo de uma espécie, já rara, de militantismo e de entrega a um ideal político, numa vida inteira dedicada à luta por uma Angola e uma África livres e dignas.

Partidos políticos exaltam figura de Lúcio Lara 

O Secretariado Executivo do Comité Permanente da Comissão Política da UNITA, na sua mensagem de condolências, reconhece a contribuição de Lúcio Lara na luta pela liberdade de Angola e dos angolanos do jugo colonial português, e apresenta à família enlutada e ao Bureau Político do MPLA, as suas mais sentidas condolências.

 Na  mensagem, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA exprime sentimento de pesar pelo infausto acontecimento. “Tendo Lúcio Lara encarnado os ideais do MPLA com os quais se identificou até à sua morte, foi um destacado combatente pela independência do nosso País e deixa-nos um exemplo de nacionalismo”, lê-se na mensagem do maior partido angolano da oposição.

O Bureau Político da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) também acolheu com “profunda tristeza” a notícia do falecimento de Lúcio Lara. “É mais um ilustre filho de Angola que desaparece e que foi uma das figuras no combate contra o colonialismo português, em que durante a luta de libertação nacional se mostrou e se distinguiu como um patriota intransigente nos seus ideais em todas as frentes”, lê-se na mensagem.

A FNLA sublinha na sua mensagem que Lúcio Lara, ao lado de Agostinho Neto, Holden Roberto, Amílcar Cabral, Viriato da Cruz, Eduardo Mondlane, Mário Pinto de Andrade e outros nacionalistas consagrou-se de corpo e alma na luta contra todas as formas de dominação de que África era vítima, sobretudo nas ex-colónias portuguesas.  

Por ocasião da morte de Lúcio Lara, o Conselho Presidencial da Convergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE) também tornou pública uma nota de condolências, onde manifesta profundo sentimento de pesar pela morte do grande combatente da liberdade, ocorrida sábado último, por doença, em Luanda.

“Lúcio Lara é parte da história de Angola, como patriota, por ter participado activamente na luta contra o colonialismo português e contribuído para a sua independência”, lê-se na nota de condolências da CASA-CE.

O presidente do Partido de Renovação Social (PRS), Eduardo Kuangana, afirmou que o país acaba de perder mais um grande quadro e aproveitou a ocasião para endereçar uma mensagem de condolências à família enlutada e ao Bureau Político do MPLA. O político defendeu que os jovens devem seguir o legado de Lúcio Lara, pois a geração de Agostinho Neto, Holden Roberto e Jonas Savimbi, signatários dos Acordos de Alvor, está a desaparecer. “É uma perda, não só para o MPLA, mas para Angola e África”, defendeu Kuangana, ao lembrar que Lúcio Lara, ao lado dos líderes dos três movimentos de libertação nacional, foi um dos precursores da Independência Nacional.

Jornal de Angola – Foto JÁ / Edições Novembro

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