Pedro
Ivo Carvalho* Jornal de Notícias, opinião
O
Governo que aumentou os impostos sobre os combustíveis e veio logo pedir pelas
alminhas aos portugueses para não atestarem o carro em Espanha é o mesmo que
agora quer criar um regime de exceção fiscal para as transportadoras
abastecerem, em solo luso, os camiões aos preços de nuestros hermanos. Por
isso, já sabe, caro camionista: esqueça Espanha. Pare a 500 metros da
fronteira, onde encontrará offshores do gasóleo só para si.
As
grandes transportadoras fizeram o que lhes competia: ameaçaram com boicotes. E
desembainharam um estudo interno que diz que oito em cada dez camiões enchem o
depósito do outro lado da fronteira. Logo, que há muito dinheiro que se perde.
Como o Governo não precisa de um conflito com camionistas a abrir os
telejornais, percebe-se a cedência política a um setor que tem a capacidade de
parar o país. O que não se percebe nem se aceita é a grosseira injustiça que
lhe está subjacente.
O
desconto fiscal discrimina todo o território, com exceção de Bragança, Elvas e
Almeida; discrimina as outras empresas que precisam de gasóleo para desenvolver
a sua atividade; e discrimina o numeroso exército de cidadãos que não são
empresas e gastam parte considerável do rendimento mensal em combustível.
Convém ter presente que entre nós se vende, depois de impostos, a quinta
gasolina mais cara da União Europeia e o sexto gasóleo mais alto entre 28
países.
A
bem da equidade fiscal, não se pode aumentar os impostos para todos e criar
exceções para um setor profissional porque a sua capacidade reivindicativa pesa
35 toneladas. Depois, sobra um tanque de dúvidas. A medida vai ser alargada aos
transportadores de passageiros? Quais serão os critérios para escolher os
concelhos e os postos de combustível a quem sairá o euromilhões? Que regras vão
ser criadas para impedir que se institucionalize um negócio paralelo e informal
de descontos para não camionistas? O que vai fazer o Governo se os postos em
Espanha rapidamente chegarem à conclusão de que lhes basta reduzir um pouco à
margem de lucro (uma vez que o acerto de preço terá como referência apenas o
diferencial fiscal) para poderem voltar a ser atrativos? E, finalmente, qual é
a base económica que sustenta esta decisão? A julgar pelo que diz o
ministro-adjunto Eduardo Cabrita ("o que existir de perda de receita será
compensado pelo aumento dos consumos"), não é nenhuma.
Eu
não quero ser desmancha-prazeres, mas isto tem tudo para dar asneira. Oxalá me
engane. Oxalá seja possível, como deseja o ministro da Economia, Manuel
Caldeira Cabral, "arranjar uma solução para todos". Todos os
camionistas, entenda-se.
*Editor executivo-adjunto
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