quinta-feira, 7 de abril de 2016

Moçambique. PROMISCUIDADE ENTRE ESTADO, PRIVADOS E FRELIMO NO PORTO DE NACALA



Porto de Nacala uma parceria promiscua entre o Estado, membros do partido no poder em Moçambique e investidores estrangeiros


O nosso país possui um porto natural de águas profundas que esteve adormecido durante várias décadas porém, quando surgiram no horizonte potenciais grandes clientes estrangeiros, o Estado decidiu concessionar esse porto a uma empresa privada que deveria ter investido na sua reabilitação e modernização mas não o fez. Para o porto de Nacala funcionar Moçambique teve que endividar-se, em cerca de 285 milhões de dólares norte-americanos, mas nem assim recuperou a gestão desta infra-estrutura de importância estratégica e que hoje gera lucros. Porquê foi feita, e é mantida até 2020, esta Parceria Público Privada? Porque os privados são os próprios agentes de Estado que decidiram a quem concessiona-lo, a começar pelo antigo Presidente da República, Armando Guebuza, passando pelos ex-primeiro-ministros, Mário Machungo e Aires Aly, antigos deputados e juiz do Conselho Constitucional e até gestores seniores da empresa pública de caminhos-de-ferro.

Na segunda metade da década de 1990, dispondo de informação estratégica sobre as mudanças que estavam a acontecer na economia nacional, políticos moçambicanos iniciaram a corrida para a criação de empresas em forma de sociedades de gestão e participação nos negócios públicos. Estas empresas eram orientadas para realizar negócios com o Estado, num contexto de liberalização da economia nacional.

Uma dessas empresas foi a Sociedade para o Desenvolvimento do Corredor de Nacala (SDCN), constituída a 22 de Janeiro de 1998, em Maputo, em forma de Sociedade Anónima de Responsabilidade Limitada (S.A.R.L), já com o objecto social de “Realização de estudo de viabilidade da linha férrea do porto e da baía de Nacala, negociação com o Governo de Moçambique do contrato de concessão do porto de Nacala e da rede ferroviária do corredor de Nacala e a constituição de empresas destinadas a gerir e desenvolver o porto e a linha férrea de Nacala e o Corredor de Desenvolvimento de Nacala”.

Tratando-se de uma sociedade anónima, as empresas accionistas da SDCN nunca foram reveladas mas o Centro de Integridade Pública(CIP) apurou que eram nove empresas na altura em que aconteceu a concessão: as estrangeiras Edlows Resources e Railroad Development Corporation (com 51% do capital) e os investidores nacionais Consórcio Cabo Delgado, Gestão e Transportes, Gestão e Desenvolvimento de Nampula, Moçambique Gestores, Niassa Desenvolvimento, Sociedade de Tecnologias Portuárias (com 33% do capital) a ainda a Nacala Comércio e Investimentos (16% do capital).

A investigação do CIP apurou os seguintes accionistas entre os investidores moçambicanos: a Gestra - Gestão e Transportes (criada em 1997 e que tem como accionistas/outorgantes Francisco Ilídio de Rocha Dinis, João de Passos Fonseca Vieira, Manuel Henriques Teixeira, Júlio Dias Lopes Hingá, Rui Cirne Plácido de Carvalho Fonseca, Gabriel Mabunda, Carlos Fernando Bambo Nhangou, Eunice Maria António, Carneiro Maria António Rothenberger e Rui Ferreira dos Santos); aMG - Moçambique Gestores (criada em 1996 por Armando Emílio Guebuza, Maria da Luz Dai Guebuza, Mário António Dimande, Nora Vicente Maculuve, Teodato Mondim da Silva Hunguana, António Américo Amaral Magaia (Sócio da SOMOESTIVA, a única empresa com a participação de Filipe Nyusi), Argentina da Conceição Nhantumbo Magaia, Benjamim Alfredo, Isabel Luís Chaúque Alfredo, Manuel Alexandre Panguene, Mário da Graça Fernando Machungo, Augusto Joaquim Cândido, Raimundo Manuel Bila, Cadmiel Filiane Muthemba, Maria Helena Paulo, Gabriel Mabunda, Miguel José Matabel, Armando Francisco Cossa, Bartolomeu Augusto Guiliche, Moisés Rafael Massinga, Filor Nassone, Venâncio Jaime Matusse, Fernanda Carolina Betrufe Manave Matsinha, Mariano de Araújo Matsinhe, Rosário Mualeia, Eduardo Silva Nihia, Bonifácio Gruveta Massamba, Orlando Pedro Conde, Abel Ernesto Safrão, Eugénio Numaio, Arnaldo Tembe, Flora Manuel Arnaldo Tembe, Feliciano Salomão Gundana, Aires Bonifácio Baptista Ali, António Correia Fernando Sumbana, Pires Daniel Manuel Sengo, Alfredo Fontes Selemane Namitete); o Consórcio Cabo Delgado (criada em 1998 e que representa os interesses de generais do norte, com Alberto Chipande à cabeça).

No ano 2000 foram assinados os contratos da concessão,a escolha da concessionária aconteceu sem concurso público, mas só no início de 2005 consumou-se a transferência efectiva da gestão Porto de Nacala dos CFM para o consórcio Corredor de Desenvolvimento do Norte (CDN), que foi formado em 2001 pelos Caminhos de Ferro de Moçambique com 49% e pela Sociedade para o Desenvolvimento do Corredor de Nacala com a maioria de 51%.

Os contratos de concessão do sistema ferro-portuário do Norte foram assinados por Tomaz Salomão, Ministro dos Transportes e Comunicações, em representação do Governo de Moçambique; Rui Fonseca, PCA dos CFM, em representação desta empresa; Domingos Bainha, Administrador Executivo dos CFM; Alberto Chipande, PCA da CDN; Fernando Amado Couto, Administrador da CDN.

O maior porto natural de águas profundas da costa oriental de África

O Porto de Nacala é o terceiro maior porto de Moçambique, em termos de quantidade de carga manuseada. É o maior porto natural de águas profundas da costa oriental de África. Esta particularidade do porto permite a entrada e saída de navios sem limitação de calado, 24 horas por dia, e não necessita de dragagem.

O porto foi herdado da administração colonial. Em Outubro de 1951 procedeu-se à abertura do porto ao tráfego de navios. Tal como muitas infra-estruturas construídas no período colonial, o Porto de Nacala sofreu degradação contínua ao longo dos anos. Entretanto, devido à sua localização estratégica, continuou a desempenhar um papel importante para a importação e exportação de mercadorias para os países do hinterland, sendo os principais clientes o Malawi e o norte do país.

Segundo dados dos CFM, o porto foi reabilitado, entre 1984 e 1996, por meio de um financiamento da Finlândia, orçado em 196 milhões de marcos finlandeses.

O Porto de Nacala tem três terminais, dos quais dois foram concessionados à CDN. O Terminal de Carga Geral, de 631 metros de comprimento, calado de 9,7 metros, capacitado para manusear 2 400 000 toneladas anualmente, possui ainda 8 armazéns, com uma capacidade de 50.000 toneladas. Este terminal foi concessionado à CDN.

Igualmente, foi concessionado o Terminal de Contentores, com 372 metros de cumprimento, que possui um calado de 14 metros, capacidade de manuseamento de 75 000 TEU´s anuais, possibilidade de parqueamento de 4982 contentores e 21 pontos de energia para contentores frigoríficos.

Ficou sob gestão directa dos CFM o Terminal para Granéis Líquidos, afecto ao cais 4 do Terminal de Carga Geral, com 9.7 metros. Está ligado a depósitos de combustíveis através de um “pipeline”, com 3,5 quilómetros, e ligado a depósitos para óleos vegetais com uma capacidade total de 2 400 toneladas.

Saída de norte-americanos entrada de brasileiros e japoneses

Ao longo dos 17 anos da sua existência houve entrada e saídas de accionistas na estrutura da Sociedade para o Desenvolvimento do Corredor de Nacala com base em compra e venda de participação, negócios cujos principais termos e os nomes dos compradores nunca foram divulgados.

Todos estes negócios tinham como base o Porto de Nacala e a Linha do Norte, os únicos activos que a SDCN detinha em Moçambique. Dentre entradas e saídas de accionistas da SDCN, destaque para a venda de participação das duas empresas norte-americanas Edlows Resources e Railroad Corporation à Insitec de Celso Correia, em 2009, e a posterior revenda da participação da Insitec à multinacional brasileira Vale, em 2010, que explora carvão mineral em Tete.

Devido a quase uma década sem que a CDN realizasse obras de manutenção, o Porto de Nacala ficou em avançado estado de degradação afectando as operações portuárias. Moçambique recorreu ao Japão para financiar primeiro uma “reabilitação de emergência” e depois para a modernização. Através da Agência Japonesa de Cooperação (JICA), até 2015, para foram desembolsados 310 milhões de dólares norte-americanos, 25 milhões como donativo e o restante como empréstimo.

O interesse do Japão em financiar o projecto de desenvolvimento do Porto de Nacala está relacionado com os interesses que o país asiático tem no Corredor de Nacala, particularmente no ProSavana, e cuja viabilidade está dependente da operacionalidade do Porto de Nacala e da Linha do Norte.

Talvez por isso, depois de em 2013 a Vale adquirir 18% da participação dos investidores nacionais revendeu metade dos seus 85% ao maior grupo corporativo do Japão, a Mitsui, em 20114/2015.

Enquanto a concessão gerava prejuízos para o Estado, havia quem se beneficiava dela. São alguns accionistas da SDCN que exploraram o negócio de venda das participações.

Durante muito tempo, a sociedade CDN não distribuía dividendos aos seus accionistas devido aos prejuízos, conforme foi visto acima, no número 3.2.1; em 2010 o prejuízo da sociedade atingia 25,7 milhões de dólares. Porém, a falta de auditoria às contas da sociedade, pelo menos entre 2001 e 2009, não permite apurar a veracidade desse prejuízo.

Sem partilha de rendimentos, os accionistas da SDCN encontraram forma de realização de negócios de compra e venda de acções, tendo como activos para atrair os compradores de acções o Porto de Nacala e a Linha do Norte, mas principalmente o Porto de Nacala, a infra-estrutura mais importante e lucrativa.

Entrada e saída da Insitec, de Celso Correia

O Grupo INSITEC, cujo presidente é o actual Ministro da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, Celso Correia, foi uma das beneficiárias deste tipo de negócio. A INSITEC entrou na SDCN, comprando a participação da EDR e RDC em 2008.

Com a compra das acções das duas empresas americanas, a Insitec ficou com a maioria do consórcio SDCN (51%) e, por conseguinte, com posição de peso na CDN. Há informação que indica que a INSITEC não chegou a pagar pelas acções da RDC e EDR. Serviu apenas de intermediário entre a Vale e as duas empresas americanas. Ou seja, usou o dinheiro da Vale para pagar a RDC e EDR.

A entrada da Insitec na SDCN promoveu mudanças de vulto na administração do CDN, sendo o grande destaque a saída de Alberto Chipande da presidência do CDN, substituído pelo próprio Celso Correia.

A liderança do CDN, com a entrada da Insitec, passou a ser a seguinte: Presidente do Conselho da Administração: Celso Correia (representando Insitec); Administradores: Eduardo França Magaia e Givá Remtula (Insitec); Fernando Couto (STP); Osório Lucas, Adelino Fortes Mesquita e Domingos Bainha foram nomeados Administradores em representação dos CFM, detentora de 49% da CDN.

Durante o tempo em que a INSITEC esteve na liderança da CDN, não realizou nenhum investimento de vulto na melhoria das infra-estruturas. É por isso que até 2011, nos relatórios dos CFM, reclamava-se a falta de manutenção das infra-estruturas.

A INSITEC não levou muito tempo na direcção do CDN. Vendeu a sua participação à Vale, em 2010.

Sabe-se que antes da entrada da INSITEC no CDN houve negociações muito avançadas com a Vale para que esta comprasse a parte das empresas americanas. Inexplicavelmente, o negócio não se consumou. Só que cerca de um ano depois da mesma Vale ter aparentemente desistido de comprar as acções da Railroad Development Corporation e Edlows Resources na SDCN, viria a comprá-las, mas desta vez à Insitec.

Os valores envolvidos nas duas transacções realizadas pela INSITEC – compra de acções da Railroad Development Corporation e Edlows Resources e posterior venda à Vale – nunca foram tornados públicos em Moçambique. A ocultação de valores dos negócios baseados em empreendimentos públicos é uma grande demonstração da falta de transparência na gestão desta Parceria Público Privada.

Entretanto, no relatório de desempenho da Vale, feito para investidores, consta que a mineradora brasileira desembolsou, em 2010, 21 milhões de dólares para a compra da participação na SDCN.

Não foi referido ainda se com estas transacções houve pagamento ao Estado, em forma de mais-valias, na medida em que houve rendimentos extraordinários não esperados.

Separação de gestão do Porto de Nacala da Linha do Norte e início de cumprimento

Como parte do trato da venda da participação dos investidores nacionais na SDCN para a Vale, negociou-se também a separação da gestão das duas infra- -estruturas concessionadas: o Porto de Nacala e a Linha do Norte.

Assim, a Linha do Norte ficou sob a gestão do CDN. Na actual estrutura, a SDCN mantém 51% da CDN e 49% são dos CFM. As mudanças ocorreram na SDCN. A Vale é a accionista maioritária, com 85%. Os restantes 15% são detidos pelos investidores nacionais.

O Porto de Nacala passou para a gestão da Portos do Norte, uma empresa criada para o efeito, em 2012, na qual se aglutinam os interesses dos chamados investidores nacionais mais os CFM.

Os CFM detêm 30% da Portos do Norte. Os restantes 70% são distribuídos entre as empresas: Gedena, GESTRA, MG, STP Niassa Desenvolvimento e Cabo Delgado. A percentagem de acções detida por cada uma destas empresas não foi possível apurar.

A separação da gestão do Porto de Nacala e da Linha do Norte consumou-se a 15 de Março de 2013. De igual forma não foram revelados os valores envolvidos na transacção.

Entretanto, com a Vale a assumir 85% da CDN e a separação da gestão do Porto da Linha Férrea, houve algumas melhorias na gestão do Porto. A nova gestão do Porto, a cargo da Portos do Norte, começou a cumprir as suas obrigações, pagando impostos ao Estado atempadamente, bem como a gerar e pagar dividendos aos seus accionistas. Em dois anos, o Porto de Nacala gerou mais de 167 milhões de meticais de receitas fiscais para o Estado.

No mesmo período de 2013/14, os dividendos gerados para os accionistas da empresa concessionária alcançaram mais de 117 milhões de meticais, dos quais 30% foram para os CFM, empresa pública a que se atribuíram 30% na concessão do Porto de Nacala.

Renovação da concessão condicionada pelo acordo de retrocessão de crédito

A concessão do Porto de Nacala e da Linha do Norte termina em 2020. O grande interesse da concessionária é garantir a renovação da concessão dos dois empreendimentos, devendo, para tal, manifestar interesse ao Governo com antecedência de pelo menos 36 meses (três anos).

Parece certo que haverá renovação, uma vez que parte da Linha do Norte forma o Corredor Logístico do Norte (CLN), construído pela Vale e detido pela Vale, Mitsui e CFM. A Vale pretende usar a linha para escoamento do carvão de Moatize para Nacala-a-Velha, via Malawi. Isto deve garantir a continuidade da concessão da Linha do Norte à CDN.

Dúvidas poderiam persistir sobre o Porto de Nacala, uma vez que a Vale não precisa deste porto para o escoamento do carvão de Moatize. Mas o Porto de Nacala é do interesse do Japão, porque é indispensável na logística do ProSavana. É por isso que a Mitsui entrou na SDCN, comprando metade da participação da Vale.

É assim que, apesar do Estado estar a reabilitar o Porto de Nacala com fundos próprios, devido à incapacidade mostrada pela concessionária de intervir, é certo que haverá renovação da concessão.

Para recuperar os cerca de 285 milhões de dólares norte-americanos (de crédito) investido na reabilitação do Porto de Nacala, o Governo precisa de assinar acordo de retrocessão de crédito com a concessionária do Porto (a CDN). Os termos do acordo ainda não são claros mas essencialmente deve-se garantir que o dinheiro a ser desembolsado à JICA provenha das receitas do Porto de Nacala, sob gestão do CDN. Até 2020, ano em que terminam os presentes contratos de concessão, não se terá pago o valor investido na reabilitação do Porto.

Assim, a renovação da concessão do Corredor de Nacala à CDN será usada como garantia para a efectivação do acordo de retrocessão de crédito concedido pela JICA ao Estado. Nestes ternos, o Governo não terá muito espaço de manobra para negociar novos contratos de concessão que sejam favoráveis aos interesses do Estado.

Da parte dos CFM há claro interesse de recuperar o empreendimento para gestão própria, até porque o Porto de Nacala foi o último empreendimento concessionado e depois interrompeu-se o processo. Este interesse dos CFM parece certo que não tem correspondência da parte do Governo.

Outro grupo preocupado com a renovação da concessão são os políticos empresários que garantiram a gestão do Porto de Nacala de 2013 a 2020. O seu interesse é que a concessão seja renovada e a gestão do Porto de Nacala continue com a Portos do Norte, como subconcessionária.

* Investigação do Centro de Integridade Pública editada

Criminalidade em Timor-Leste aumentou 36% em fevereiro em termos homólogos



A polícia timorense registou em fevereiro um total de 351 atos criminais, mais quase 36% do que no mesmo mês de 2015 e o maior número num mês de fevereiro em pelo menos cinco anos, segundo estatísticas oficiais.

As Estatísticas de Crime Nacional, publicadas na página da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL), não detalham o tipo de crimes a que os números se referem, comparando apenas a totalidade de casos reportados durante o mês de fevereiro.

Assim, registaram-se em fevereiro deste ano 351 crimes, mais quase 36% que em fevereiro do ano passado, quando se registaram 259.

Este é o maior número desde 2012 - os dados disponibilizados pela PNTL incluem apenas os últimos cinco nos - quando se registaram 314 crimes em fevereiro daquele ano, segundo as mesmas estatísticas.

O maior número de crimes ocorreu na capital (131) seguindo-se Covalima (33) e Oecusse e Ermera (31).

Também no que toca a acidentes de viação registados em fevereiro se registou um valor recorde, com 162 em todo o país, o maior número desde 2013 e mais 26,6% do que em 2015, quando foram 128.

Díli registou o maior número de acidentes, 97, seguindo-se Baucau, com 20.

ASP // MP - Lusa


Governo timorense autoriza construção de fábrica de cimento que criará mil empregos



O Governo timorense informou hoje ter autorizado a construção de uma fábrica de produção de cimento na segunda cidade do país, Baucau, no âmbito de um acordo especial de investimento que permitirá criar mil postos de trabalho.

Trata-se de um projeto avaliado em 400 milhões de dólares e que tem como destino o mercado australiano.

O assunto foi analisado numa reunião extraordinária do Conselho de Ministros na terça-feira, segundo explicou o Governo em comunicado divulgado hoje na sua página online, referindo que foi aprovada a autorização da construção e a assinatura da minuta de Acordo Especial de Investimento com o investidor.

"Trata-se de um projeto de grande envergadura, que contribuirá para a diversificação da economia nacional e para a redução em larga escala da importação de cimento, criando postos de trabalho diretos e indiretos", referiu o Governo.

"Além de contribuir para o crescimento do setor não petrolífero da economia, irá criar um polo de desenvolvimento industrial fora da capital, contribuindo, simultaneamente, para a redução das assimetrias entre a área urbana de Díli e o resto do país", sublinhou.

O assunto já tinha sido analisado pelo Governo a 24 de novembro tendo na altura o primeiro-ministro, Rui Maria de Araújo, explicado que o executivo estava a estudar uma participação de 20% no projeto.

Trata-se de um projeto, explicou na altura, de um investidor australiano que conduziu vários estudos preliminares comprovando a potencialidade da matéria-prima e o mercado de destino do cimento.

O Governo explicou na altura em comunicado que se trata de um projeto da TL Cement Lda para uma unidade de extração de calcário e de produção de cimento em Baucau, que criará cerca de mil postos de trabalho permanentes.

"Terá uma capacidade de produção de cerca de cinco mil toneladas de 'clinker' de cimento por dia, possibilitando a redução da dependência do país em relação ao cimento importado", referiu ainda.

O projeto inclui a construção de uma ponte-cais, pedreiras, complexo industrial, parques de energia eólica e solar, entre outros. Estudos realizados em 2014 apontam para a existência de uma grande reserva de calcário na região.

Na sua reunião de terça-feira o Governo aprovou ainda uma proposta de lei sobre promoção das exportações que pretende regular "as bases jurídicas da atividade de exportação e reexportação de bens e serviços do país, com exceção dos setores regulados por lei especial, designadamente o setor do petróleo, gás e recursos minerais".

Foi ainda aprovado um decreto para "estabelecer as regras de origem de Timor-Leste segundo as melhores práticas do comércio internacional definidas pela Organização Mundial do Comércio".

O decreto abrange todas as mercadorias, exceto o café orgânico timorense, "que já dispõe de regras de origem próprias, especiais, alinhadas com o contexto dos mercados internacionais" e que é para já o único produto exportado do país.

"Este normativo permite uma maior afirmação dos produtos timorenses no exterior, protegendo os investidores nacionais e internacionais que pretendem investir em Timor-Leste com vista à exportação", sublinhou o Governo.

ASP // VM - Lusa


Macau. Conferência cria Associação de Estudos de Língua Portuguesa da Ásia



A Universidade de Macau organiza na sexta-feira e no sábado uma conferência internacional sobre ensino e aprendizagem de português como língua estrangeira durante a qual será criada a Associação de Estudos de Língua Portuguesa da Ásia (AELPA).

A associação é criada à imagem de outras associações de professores, investigadores e académicos de estudos portugueses espalhados pelo mundo, como por exemplo a American Portuguese Studies Association (APSA) na América, indica o programa da conferência.

A AELPA terá a sua primeira sede na Universidade de Macau durante dois anos e os seus estatutos e primeiro comité executivo serão aprovados durante a conferência, que arranca na sexta-feira.

"Esta é a primeira conferência dirigida para as pessoas que ensinam português na China e na Ásia", disse hoje à agência Lusa a presidente da comissão organizadora, Inocência Mata.

"O que se pretende é direcionar para os colegas chineses que ensinam português e fazer com que a Universidade de Macau seja uma plataforma de diálogo entre colegas", acrescentou a professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e docente de literaturas e culturas em português da Universidade de Macau.

A conferência vai contar com 52 comunicações e participantes oriundos do interior da China, Japão, Coreia do Sul e Índia. Também participam professores das várias instituições de ensino em Macau e de outras de Portugal.

"Na verdade, estamos muito empenhados em que a Universidade de Macau possa ser uma referência do ensino de português na Ásia. Esta universidade tem 35 anos e o seu curso de verão [de português] vai ser o 30.º este ano, o que já demonstra a persistência (...), mas gostaríamos que ela pudesse ser o lugar de encontro das pessoas que trabalham no ensino da língua portuguesa", observou.

Na conferência vão ser abordadas, entre outros assuntos, "as literaturas de língua portuguesa, as metodologias e propostas curriculares, nomeadamente as que melhor respondem ao perfil dos falantes de língua chinesa, que não pode ser a mesma proposta curricular aplicada a um falante de francês, espanhol ou alemão".

"Há uma grande diferença no imaginário histórico-cultural dos países de europeus e de língua portuguesa em África e no Brasil" em comparação com "o acervo do estudante chinês" que estuda português, afirmou Inocência Mata, sublinhando que essa particularidade deve ser atendida no ensino da língua na Ásia.

Outro objetivo, segundo a presidente da comissão organizadora da conferência, é que o ensino da língua portuguesa seja visto "além da sua dimensão utilitária e que tenha uma dimensão humanística", porque "aprender as diferentes culturas dos outros povos também é importante para a economia".

"Não podemos perder de vista a dimensão cultural das relações económicas", concluiu.

FV // VM - Lusa

Documentos do Panamá. Hong Kong é via para contornar restrições no continente chinês



A operação "Papéis de Panamá", que revelou um alegado esquema gigantesco de evasão fiscal, evidenciou Hong Kong como um centro de criação de empresas "offshore", utilizadas por chineses do continente para transferir capital além-fronteiras.

Segundo novos dados revelados hoje pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla inglesa), os escritórios na China da Mossack Fonseca, a firma de advogados panamiana no centro do furacão, criaram 16.300 empresas de fachada.

O caso reacendeu o debate sobre os meios utilizados pelas classes abastadas da China para salvaguardar as suas fortunas e fugir às restrições cambiais impostas por Pequim.

Devido à proximidade ao continente chinês e à liberdade que caracteriza o seu sistema financeiro, a ex-colónia britânica funcionará mesmo como uma plataforma.

"Os chineses estão a transferir o seu dinheiro para fora devido ao abrandamento da economia", disse à agência France Presse Andrew Collier, diretor do centro de investigação Orient Capital Research, com sede em Hong Kong.

"O mercado imobiliário está em declínio em muitas zonas do país e existe apreensão com a campanha anticorrupção e o impacto que poderá ter na segurança do capital na China", explicou.

Através da subfaturação de bens exportados a partir de Hong Kong ou da subvalorização das importações para a cidade, é possível gerar dinheiro extra, que é depois colocado em contas "offshore", explica Collier.

"Muita gente refere que existem imensas faturas falsas de produtos transacionados entre a China e Hong Kong, e que Hong Kong está a ser utilizado como uma via para retirar capital do país", descreve.

As empresas chinesas podem então obter dinheiro em moedas estrangeiras junto dos bancos chineses, destinado a pagar produtos importados, mas sobrestimando o montante necessário, que é depois movimentando para contas na cidade.

"É muito difícil para um banco distinguir quais faturas são verdadeiras ou falsas", considera Collier.

Pequim limita o montante de capital que pode ser transferido por pessoa além-fronteiras a 50.000 dólares (43.896 euros) por ano, mas através de contas secretas em Hong Kong é possível superar esses valores, explica à AFP o investidor David Webb.

Webb argumenta que a cidade carece de transparência no seu mercado de capitais e nas empresas que aí se registam, em parte porque não quer afastar o negócio alimentado pela China.

"Adotaram a política do 'não perguntes, nem digas nada', sabendo que a epidémica corrupção no continente é a origem de muitos dos negócios", refere.

"Estão preocupados que [mais regulação] reduza a quantidade de negócios e a atratividade de listar empresas em Hong Kong".

A China limita a quantidade de dinheiro que cada turista pode levar para fora do país a um máximo de 20.000 yuan (2.712 euros) e o equivalente a 5.000 dólares (4,387 euros) em moedas estrangeiras.

As restrições geram, entretanto, o fenómeno designado de "mulas do dinheiro": contrabandistas que carregam cintas de notas coladas ao corpo ou em malas através das alfândegas.

Outro esquema envolve a emissão de cheques em moeda estrangeira por bancos ilegais na China em troca de yuan, a moeda chinesa.

Lojas de câmbio em Hong Kong servem também de facilitadores para transferir dinheiro para fora.

"Enquanto maiores são as restrições impostas pelo Estado, em qualquer país, à movimentação de capital, maiores são os fluxos financeiros ilegais", conclui Webb.

JOYP // PJA - Lusa

Documentos do Panamá. Quase um terço das firmas "offshore" teve origem na China



Quase um terço das firmas 'offshore' expostas pelo caso dos "Papéis do Panamá" teve origem em Hong Kong e na China continental, segundo novos dados revelados hoje pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ, na sigla inglesa).

No conjunto, os escritórios na China da Mossack Fonseca, empresa alegadamente envolvida em esquemas de evasão fiscal, criaram 16.300 empresas de fachada, ou 29% do conjunto mundial.

A investigação da ICIJ abrangeu 11,5 milhões de documentos ligados a quase quatro décadas de atividade da Mossack Fonseca, que conta com uma carteira de clientes prestigiados, entre os quais responsáveis políticos ou personalidades de primeiro plano do desporto ou da cultura.

De acordo com o ICIJ, pelo menos oito atuais ou antigos membros do Comité Permanente do Politburo do Partido Comunista Chinês, a cúpula do poder na China, terão colocado os seus bens em empresas 'offshore'.

No "Índex de Transparência" de 2015, que avalia o nível da corrupção em 168 países, a China figura em 83.º lugar.

No ano passado, o país asiático registou uma massiva fuga de capitais privados, apesar das restrições cambiais impostas por Pequim. A economia chinesa registou no mesmo período o menor crescimento dos últimos 25 anos.

Entre os familiares ou pessoas próximos de altos responsáveis chineses envolvidos figura Deng Jiagui, o marido da irmã mais velha do atual Presidente Xi Jinping.

Após ascender ao poder, em 2012, Xi lançou uma mediática campanha anticorrupção, enquanto reprimiu ativistas e dissidentes que exigiam maior escrutínio sobre os titulares de cargos públicos.

Familiares de Zhao Gaoli e Liu Yunshan, atuais membros do Politburo do PCC, criaram também empresas de fachada, revelou o ICIJ.

O jornal britânico The Guardian, que fez parte da investigação, implicou ainda familiares do ex-primeiro-ministro chinês Li Peng, que integrou a sangrenta repressão do movimento pró-democracia da Praça Tiananmen, em 1989.

Entre os nomes chineses envolvidos, consta ainda Chen Dongsheng, o marido de uma das netas de Mao Zedong, o fundador da República Popular da China.

Chen foi dono da Keen Best International Limited, uma firma com sede nas Ilhas Virgens Britânicas.

A criação de empresas 'offshore' não é ilegal, apesar de visar frequentemente o branqueamento de capitais ou a evasão fiscal.

JOYP // JPS - Lusa

Brasil. MACRI, CUNHA, JOAQUIM BARBOSA: OS PANAMALEAKS ESTÃO BOMBANDO




Provavelmente, muitos dos brasileiros envolvidos no mega-esquema frequentam as manifestações contra a corrupção.

Luiz Carlos Azenha – Viomundo, em Carta Maior

Messi, Macri, Mubarak, Eduardo Cunha, Joaquim Barbosa. Os #panamaleaks estão bombando. A empresa Mossack & Fonseca avisou seus clientes, ontem, que tinha sido vítima de uma invasão em seu banco de dados.

Na verdade, há mais de um ano o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, ICIJ, numa parceria que envolve 100 empresas jornalísticas de todo o mundo, está debruçado sobre os registros de mais de 214 mil empresas offshore criadas pela Mossack. Algumas podem ter servido a propósitos legais. Mas, na maioria das vezes, trata-se de esconder dinheiro sujo, sonegar imposto ou esconder patrimônio.

O ICIJ promete que vai divulgar a lista completa das empresas em maio.

Joaquim Barbosa, o Batman do mensalão, segundo descreveu hoje o Miami Herald, escondeu o preço do apartamento que comprou em Miami, na Flórida: U$ 335 mil dólares em dinheiro. Os brasileiros poderiam ter descoberto este valor se Barbosa tivesse pago os impostos locais, já que eles são relativos ao valor total da transação. Mas, os U$ 2 mil nunca foram pagos!

Foi a Mossack quem criou a empresa de Joaquim Barbosa, Assas JB1, registrada nas ilhas Virgens Britânicas.

Ouvido pelo Miami Herald, Barbosa culpou a intermediária que cuidou da transação por não pagar os impostos locais e disse que qualquer pessoa com acesso a um serviço privado, exclusivo de corretores de imóveis, poderia ter descoberto quanto ele pagou pelo apartamento em 2012. Isso, de um campeão da moralidade pública que, no julgamento do mensalão, cobrou transparência alheia! Cabe, neste caso, utilizar a teoria do “domínio do fato”?

Barbosa pode não ter cometido um crime, mas o certo é que foi levado no bico. Pagou mais de R$ 1 milhão, em dinheiro de hoje, por um apartamento de 73 metros quadrados! Só novo rico para cair neste conto de Miami…

O QUE O #panamaleaks NÃO VAI TE CONTAR AGORA

27 de janeiro de 2016. Vigésima segunda fase da Operação Lava Jato. Título: Triplo X. Alvo? O ex-presidente Lula. Suspeitava-se que ele era dono de um triplex no edifício Solaris, no Guarujá. Uma empresa, de nome Murray, tinha em seu nome ao menos uma unidade. A Murray foi criada pela Mossack & Fonseca, a mesma que ajudou o ex-ministro do STF Joaquim Barbosa.

Quem sabe se a Murray não era de Lula ou de um parente dele?

Busca e apreensão na sede da Mossack na avenida Paulista, em São Paulo. Prisão de funcionários da empresa. Inclusive de um que havia sido gravado ao telefone com a filha falando em destruição de provas. A Globonews vibra! O Lula vai cair!

Nossa, um homem que admite ter picado a mala inteira de papel? Que história saborosa! O que será que havia nesta mala? Qualquer jornalista daria tudo para saber o final desta história.

5 de fevereiro de 2016. Ademir Auada é solto. O G1, da Globo, não teve a curiosidade de perguntar: que tipo de papel ele cortou? o que tinha naquela mala?

Nem a PF, nem o MPF acharam necessário mantê-lo na cadeia. Auada, que estava no Panamá quando teve a prisão decretada, entregou a lista de seus clientes — que milagrosamente não vazou!

Esta é uma das coisas que o #panamaleaks não vai te contar agora.

Auada era um intermediário entre a Mossack e clientes brasileiros.

Ele cuidava de ao menos 10 empresas que estão nos arquivos que a Polícia Federal apreendeu na sede da empresa panamenha em São Paulo.

Estes #panamaleaks, incrivelmente, não interessaram aos jornalistas brasileiros, embora os documentos tenham se tornado públicos.

Por que? São empresários, médicos, escritórios de advogados e bancos. Provavelmente, muitos dos responsáveis frequentam as manifestações contra a corrupção no Brasil. O Viomundo vai investigar a papelada através de um crowdfunding.

Papel importante neste imbróglio ocupa Ricardo Honório Neto, funcionário da Mossack no Brasil, para o qual a mídia também não deu a menor bola. Sobre a mesa dele a Polícia Federal encontrou manuscritos que equivalem ao controle de uma conta bancária. Entram as taxas de manutenção cobradas pela Mossack, saem pagamentos de despesas da firma.

Ricardo lidava com os clientes no dia-a-dia. São deles as anotações referentes a Paula Azevedo Marinho e Paula Marinho, ao lado de valores e datas de pagamento e das offshore A Plus Holdings (Panamá), Juste (ilhas Seychelles) e Vaincre LLC (Las Vegas, Nevada).

Nos documentos, elas aparecem relacionadas à Glem Participações, do genro de um dos donos do grupo Globo, João Roberto Marinho. Mas… suspense… só os arquivos da Mossack poderão revelar com absoluta certeza quem são os donos reais das três offshore.

Neste caso, a falta de curiosidade de parte da mídia brasileira chama a atenção.

O Jornal Nacional foi a Nevada, à sede da Mossack em Las Vegas, mas nem perguntou sobre a Vaincre LLC, que está registrada lá e é uma das donas da mansão de Paraty.

Esperemos, pois, até o mês de maio. Ou que o Fernando Rodrigues, desta vez, nos surpreenda positivamente.

PS do Viomundo: Vale a pena esperar. Denunciado recentemente por pagar propina de R$ 15 milhões para deixar de recolher R$ 1,5 bilhão em impostos, na Operação Zelotes, Joseph Safra é um dos controladores do banco que é vice-campeão em empresas offshore encomendadas à Mossack&Fonseca: quase mil! Essa lista de clientes do Safra queremos muito ver…

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Brasil. O GOLPE CONTRA A DEMOCRACIA E O LIMITE DA DÍVIDA PÚBLICA



A democracia corre um risco mais imediato do que o impeachment: a possibilidade de votação do projeto para definir um teto para a dívida pública da União.

Pedro Paulo Zahluth Bastos (professor livre-docente da Unicamp)

A democracia brasileira corre um risco mais imediato do que o impeachment ilegal contra Dilma Rousseff: a possibilidade de votação, essa semana, do projeto do senador José Serra para definir um teto para a dívida pública da União.

Contra o projeto de Serra, já foi publicado um manifesto assinado por economistas que rejeitam os riscos ao crescimento do emprego e da renda, e apoiado por intelectuais e ativistas que rejeitam a ameaça à soberania popular que o projeto embute.

A Carta Maior também publicou uma revista especial reunindo vários especialistas contrários ao projeto. Aqui se argumenta que esse projeto tem forte relação com os objetivos do golpe que o impeachment representa. 

O golpe e o uso da Lei de Responsabilidade Fiscal para fins políticos

Na história do Brasil republicano, todo período de mobilização popular que traga mudança de políticas públicas é interrompido por reações conservadoras que desrespeitam a legalidade. Foi assim com o ultimato militar para que Getúlio Vargas se “licenciasse” em 1954 para não prejudicar investigações criminais conduzidas, ilegalmente, pela Aeronáutica na “República do Galeão”. Foi assim também em 1964.

Em 2016, o golpe é de outro tipo: quer-se interromper o mandato de Dilma Rousseff com base em realocação de recursos entre diferentes rubricas do orçamento federal, uma prática recorrente na administração pública. Pior: as contas fiscais de 2015 fecharam dentro da meta autorizada pelo Congresso no dia 31 de dezembro, mas o pedido de impeachment é do dia 02 de dezembro! É o mesmo dia em que o PT declarou apoiar abertura de investigação sobre as contas no exterior de Eduardo Cunha.

Ademais, as contas do governo em 2015 sequer foram analisadas e julgadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), nem pelo Congresso. E a despeito da redistribuição de recursos entre itens do orçamento, o governo federal alcançou a meta fiscal em 2015 porque realizou o maior contingenciamento orçamentário da história republicana. Ou seja, a redistribuição de verbas não aumentou o volume de gastos a ponto de ameaçar a meta fiscal. Logo, a abertura do processo de impeachment – um golpe - mostra como a interpretação arbitrária de regras fiscais pode ser feita para alcançar objetivos políticos.

A reinterpretação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que ampara o pedido de impeachment retira toda flexibilidade da gestão fiscal: qualquer presidente posterior à LRF – ou seja, além de Dilma, FHC e Lula – teria sido impedido. Se o golpe atual tivesse por objetivo moralizar a gestão fiscal, outros 16 governadores que realocaram recursos entre rubricas orçamentárias em 2015 deveriam ser objeto do mesmo processo de impeachment, assim como o vice-presidente Michel Temer.

O golpe e os três atalhos contra direitos sociais e políticas de desenvolvimento

É evidente que o golpe não tem por objetivo corrigir a administração orçamentária: seus líderes comandam uma reação conservadora contra a mudança das políticas públicas realizadas sob amparo da Constituição Federal de 1988 a da Consolidação das Leis do Trabalho – a CLT de 1943.

A intenção de mudar a Constituição Federal e outras leis sociais não é segredo. O programa do PMDB, Uma ponte para o futuro, unifica a agenda de reformas apoiada pelo PSDB e mira reduzir impostos empresariais e direitos sociais: aumentar a idade mínima para aposentadoria, “flexibilizar” (eliminar?) os direitos trabalhistas da CLT, reverter a política de elevação do salário mínimo e, literalmente, “acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação”.

É claro que esse programa legislativo não passaria facilmente pelo Congresso. Para contornar a resistência popular indesejável, três atalhos institucionais facilitariam a execução do programa antipopular.

Primeiro, o programa do PMDB defende a celebração do “maior número possível de alianças ou parcerias regionais, que incluam, além da redução de tarifas, a convergência de normas, na forma das parcerias que estão sendo negociadas na Ásia e no Atlântico Norte”. Ora, as “normas” propostas pelos EUA são fortemente restritivas de políticas sociais e de desenvolvimento. Assinar os tratados significaria blindar o neoliberalismo contra políticas de governo forçadas a respeitar tais “normas” independentemente de resultados eleitorais.

Além disso, permitiriam, por exemplo, que corporações multinacionais que se considerassem lesadas por políticas públicas novas (que gerassem danos por “lucros cessantes”) pudessem buscar arbitragem extraterritorial contra o Estado brasileiro, como fizeram os “fundos abutres” no episódio de renegociação da dívida externa contraída durante a experiência ultraliberal argentina.

O segundo atalho institucional é “a criação de uma instituição que articule e integre o Poder Executivo e o Legislativo, uma espécie de Autoridade Orçamentária, com competência para avaliar os programas públicos”. Sua missão seria criar o “orçamento com base zero, que significa que a cada ano todos os programas estatais serão avaliados por um comitê independente, que poderá sugerir a continuação ou o fim do programa, de acordo com os seus custos e benefícios”.

O objetivo dos cortes propostos por essa “Autoridade Orçamentária” é satisfazer os credores da dívida pública acima de tudo: “iniciar o processo de sua redução (da dívida pública) como porcentagem do PIB. O instrumento normal para isso é a obtenção de um superávit primário capaz de cobrir as despesas de juros menos o crescimento do próprio PIB... Qualquer voluntarismo na questão dos juros é o caminho certo para o desastre.”

Se nenhuma das duas alternativas se viabilizar, o atalho institucional e legal mais imediato pode ser aprovado em breve pelo Senado: o projeto definindo um teto para a dívida pública bruta proposto pelo senador José Serra, através de subemenda ao projeto de resolução do Senado Federal (PRS no 84/2007) que institui limites ao endividamento da União.

O golpe e o limite da dívida pública

Em depoimento na Comissão Econômica do Senado no dia 20 de outubro de 2015, o Senador José Serra sugeriu que o projeto se limitaria a estimular a realização de estudos sobre os determinantes da elevação da dívida e exigir a prestação de contas pelo governo.

Nada mais falso: caso o governo não alcance a meta exigida no final do prazo de 15 anos, o projeto prevê nada mais nada menos que a interrupção de novas operações de crédito enquanto durar o excesso de endividamento, resguardada a rolagem da dívida. O projeto não deixa claro se a “rolagem” se restringe ao principal ou se inclui os juros. Se não incluir, o cenário de caos e paralisia de serviços públicos é imediato. Se incluir, já seria enorme a instabilidade política e financeira que a interrupção de novas operações de crédito pode gerar no Brasil.

O problema não é apenas a punição desproporcional: antes de chegar no fim do túnel, os limites propostos pelo projeto de Serra são tão draconianos que podem exigir cortes que não apenas inibem o crescimento econômico, mas requerem tesouradas sobre despesas obrigatórias, sobretudo rubricas do gasto social garantidas na Constituição Cidadã e/ou privatizações de patrimônio público.

O pior é que os cálculos que embasam tecnicamente o projeto de Serra são equivocados. Sua assessoria alegou que bastaria o crescimento econômico de 2,5% ao ano e um superávit fiscal primário de “apenas” de 2,2 % do PIB, para reduzir a dívida bruta em relação ao PIB aproximadamente de 75% do PIB para 48% do PIB entre 2020 e 2030.

A Secretaria do Tesouro Nacional refez os cálculos da Assessoria do senador Serra e encontrou equívocos constrangedores: a projeção do Senado simplesmente fazia desaparecer, magicamente, quase R$ 1 trilhão da dívida pública, referente à “redução da carteira de títulos do Tesouro no Banco Central sem nenhuma contrapartida em nenhum outro item do ativo ou do passivo do Governo.” (Notas Taquigráficas - 45ª - Comissão de Assuntos Econômicos,18/11/2015, 11:30h.)

Ademais, a projeção do Senado simplesmente elimina, magicamente, o custo de juros das operações compromissadas do Banco Central, que foram, nos últimos anos, o principal motivo de seu crescimento. Além disso, desconsidera o próprio custo do carregamento das reservas cambiais que, aliás, é um dos motivos aludidos pela própria subemenda do Senador José Serra para definir a dívida bruta como limite!

Refeitos os cálculos, o esforço fiscal necessário para atender a regra de Serra oscila entre um mínimo de R$ 2,5 trilhões e um máximo de R$ 7 trilhões. Em termos do PIB, o superávit primário requerido oscila entre um mínimo de 2,4% do PIB (no primeiro ano do melhor cenário, em que a taxa de juros real seria de 3,5% e o crescimento do PIB seria de 4% ao ano!). E um máximo de 7,04% do PIB, no primeiro ano do pior cenário, em que a taxa de juros real seria de 7% (aproximadamente o valor atual da SELIC) e o crescimento do PIB seria de 1% ao ano (o limite que adiaria o esforço fiscal por um ano).

Em qualquer caso, a regra de Serra impõe um esforço fiscal inviável sem o corte de direitos constitucionais. E, para mostrar que até no vocabulário o PMDB tucanou, sem privatizações, consideradas necessárias no programa Uma ponte para o Futuro para “executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias”.

A democracia brasileira não parece ter sido consultada sobre esse programa ultraliberal, em qualquer dos três atalhos institucionais por meio do qual ele pode ser realizado. A soberania popular não pode se sujeitar a mais ameaça de golpe. Antes de barrar o impeachment, é urgente vetar o projeto de José Serra no Senado Federal. 

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ESPANTOSA ILUSÃO



Miguel Guedes – Jornal de Notícias, opinião

Não é tanto o que o poderoso trabalho de investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas revela que me causa surpresa. O mais surpreendente é como o Mundo parece acordar para uma realidade global mais do que velha e usada, até ao desgaste, florescimento e queda, por parte significativa das maiores empresas mundiais que bem conhecemos pelo nome próprio. O que me espanta é a ilusão. O fascínio poderia entregar-se ao regaço pelo ajuste de contas, pelo grito de revolta dos oprimidos ou por um perfil de exigência que se faz tarde. Infelizmente, há algo que parece sobrepor-se: a surpresa pelos factos, uma espécie de duas letras que coabitam em interjeição num ah prolongado pela consoante. Como se não fosse assim há décadas. É nestes momentos em que a surpresa nos desilude porque não se percebe o carácter da excitação. Qual o espanto com os "Panama Papers" (PP)? Ao alcance de barco, avião ou pensamento, a Madeira aqui tão perto.

Os próximos dias tratarão de clarificar a percentagem de "lusitanismo" nos PP. Se a Mossack Fonseca tem nome português que não seja só um prolongamento do nome de família da antiga série do Gato Fedorento. Os PP são apenas uma árvore miúda que cresceu em floresta cerrada: contam-se cerca de uma centena de paraísos fiscais legais. Não será por acaso que os projectos do BE sobre o enriquecimento ilícito, a zona franca da Madeira ou sobre a obrigatoriedade de relatoriamento das transferências para offshores foram sempre olhados com indiferença ou negação. Até que se esgotem ovos e iogurtes nas grandes superfícies.

Consequências. O Parlamento islandês foi rodeado por 10 mil pessoas, vidros pintados a ovos e iogurte. O primeiro-ministro islandês pede a demissão, sendo evidente que sua "morte política" já acontecera ao vivo e a cores numa entrevista de queixo caído. Parentesco. Quase em simultâneo, perante a ausência de Rui Rio, Passos Coelho acendia uma fogueirinha no enregelado Congresso do partido em Espinho, lançando Maria Luís Albuquerque na corrida para a sua sucessão interna. Com as devidas distâncias, não há qualquer ilegalidade primordial nos offshores ou na Arrow Global: o contexto que os aproxima é a ausência de vergonha.

Vamos até ao fim, mesmo? Deseja-se a ocidentalização dos PP e o fim da sua "selectividade". Apontar à Rússia, Irão, Paquistão ou Coreia do Norte é deixar as potências da OCDE a salvo. E não podemos esquecer que a maioria das pequenas ilhas de paraísos fiscais são meras dependências de forças como os Estados Unidos, Reino Unido ou Suíça. Até agora, quase todos - União Europeia, inclusive - coabitaram com os offshores globais perante a indiferença. Bernie Sanders já se levantava contra o "Panama Free Trade Deal" em 2011. Mas quando David Cameron é agora confrontado com o envolvimento da sua família, responde com o seu não envolvimento pessoal. Erro crasso. "É tudo o que tenho", diz ele. "Para dizer", acrescento.

Portugal. “UMAS BOFETADAS? O HOMEM PASSOU-SE!"



As declarações do ministro da Cultura estão a motivar um coro de críticas.

Multiplicam-se as reações às declarações de João Soares, depois de este ter ameaçado dar "um par de bofetadas" a dois colunistas que o criticaram.

Depois de vários deputados do PSD terem publicamente e nas redes sociais (o vice-presidente da bancada parlamentar social-democrata, Sérgio Azevedo pediu mesmo a demissão do ministro) também vários elementos do Bloco de Esquerda já se pronunciaram a título pessoal.

O deputado José Soeiro, do Bloco de Esquerda, atirou no Facebook “umas bofetadas? O homem passou-se”.

“João Soares quer andar à bofetada. Podia empenhar-se no aumento das verbas para a Cultura, que continuam manifestamente abaixo do razoável”, disse por sua vez Luís Monteiro, o mais jovem deputado do Bloco.

O ministro da Cultura escreveu esta manhã no Facebook que em 1999 prometeu publicamente “um par de bofetadas” a Augusto M. Seabra.“Estou a ver que tenho de o procurar, a ele e já agora ao Vasco Pulido Valente, para as salutares bofetadas. Só lhes podem fazer bem".

Carolina Rico – Notícias ao Minuto

Portugal. Ministra alerta: Fotocópia de cartão do cidadão "é proibido por lei"



A ministra da Presidência e da Modernização Administrativa criticou hoje "a prática" de pedido de fotocópia do cartão de cidadão por diversos serviços, que é proibido por lei, e salientou que o Simplex é, "sobretudo, uma mudança de cultura".

Maria Manuel Leitão Marques falava na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa.

Relativamente ao cartão de cidadão, "chamo a atenção para essa prática de fotocópia que é frequente em alguns serviços públicos, incluindo serviços do mMinistério da Justiça, que têm acesso" a essa informação, apontou a ministra.

"Mas também, infelizmente, [essa prática acontece] em muitos serviços privados", acrescentou, dando como exemplo os operadores de telecomunicações, os bancos, entre outras entidades, que pedem fotocópia do cartão de cidadão, quando isso não é permitido por lei.

"Eu costumo dizer: eu até dou, mas dou porque quero porque é proibido por lei", acrescentou.

"Acho que é uma questão de cultura", afirmou, explicando que o cartão de cidadão tem a morada atualizada e todos os dados relevantes sobre o seu detentor.

"Para que estamos sempre a pedir a fotocópia? No banco chegam a pedir a prova da morada, o recibo de eletricidade", quando o cartão de cidadão tem essa informação e até "a prova do rendimento que é depositado todos os meses no banco", exemplificou.

"O Simplex é, sobretudo, uma mudança de cultura", salientou Maria Manuel Leitão Marques.

A ministra da Presidência e da Modernização Administrativa alertou ainda para a perda de profissionais das tecnologias de informação e comunicação no Estado.

Nesta área, "que cada vez é uma área mais importante à medida que temos serviços integrados, desmaterializados, a Administração [Pública] tem perdido competências e tem deixado envelhecer as suas competências, e temos de encontrar aqui uma resposta", afirmou a governante aos jornalistas, à margem da audição parlamentar.

"Temos de partilhar mais" e ter "centros de competências", disse a ministra, salientando que a procura de competências neste setor [TIC] "é maior que a oferta".

Maria Manuel Leitão Marques salientou ainda que o "Simplex é a única maneira viável de se fazer a reforma do Estado".

Lusa, em Notícias ao Minuto

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