Mário
Soares foi fundador e secretário-geral do PS, primeiro-ministro nos períodos
1976-1978 e 1983-1985, e Presidente da República de 1986 a 1996.
Foi eleito deputado à Assembleia Constituinte e à Assembleia da
República, em várias legislaturas entre 1976 e 1985, e ao Parlamento
Europeu, em 1999. Em 2005 voltou a candidatar-se à Presidência da República,
eleições que foram ganhas à primeira volta por Cavaco Silva.
Da
oposição antifascista à promoção da contra-revolução
Integrou
estruturas unitárias antifascistas a partir da segunda metade dos anos 40 e foi
preso por diversas vezes por curtos períodos, tendo cumprido um total de cerca
de três anos de prisão. Membro de vários grupos de oposição, foi candidato à
Assembleia Nacional pela Comissão Democrática Eleitoral (CDE) em 1965, tendo
rompido com as listas de unidade da oposição ao regime fascista em 1969 e sendo
um dos promotores da Comissão Eleitoral de Unidade Democrática (CEUD).
Após
o 25 de Abril, é ministro de quatro dos governos provisórios, altura em que
protagoniza movimentações que pretendiam travar o processo revolucionário. Um
dos episódios mais significativos foi o assinalar do 1.º de Maio de 1975,
quando quebrou o compromisso assumido de participação no desfile da
Intersindical. Em entrevista a Maria João Avillez, Soares descreveu o episódio
da seguinte forma: «Estragámos a festa. Entrámos no estádio de roldão, em puro
confronto físico, abrindo caminho ao empurrão».
Mário
Soares ficará para a história associado à teia de cumplicidades, alianças e
conspirações que promoveu com os inimigos internos e externos da Revolução
portuguesa e ao papel crucial que desempenhou na contra-revolução e na ofensiva
contra as conquistas de Abril.
Anos
mais tarde, viria a revelar o envolvimento nas movimentações orquestradas,
em articulação com a Embaixada norte-americana, para travar o processo
revolucionário. Já em 2011, um reencontro com o diplomata Frank Carlucci, que
chegou a Portugal no final de 1974, revelou a profunda proximidade que
ambos mantiveram durante a passagem de Carlucci por Portugal, que antes
passou pelo Congo em missão da CIA, no mesmo período em que Patrice Lumumba foi
assassinado, tendo assumido cargos de destaque após sair do nosso
País.
1976:
sem maioria, lidera o I Governo Constitucional
Enquanto
primeiro-ministro, celebrou dois empréstimos com o Fundo Monetário
Internacional (FMI), com a exigência de medidas de cortes e medidas de redução da
despesa pública. Foi na sua primeira passagem pelo executivo que foram
aprovadas leis que abriram caminho à posterior privatização de sectores
estratégicos (Lei da Delimitação dos Sectores) e ao combate à Reforma Agrária
(com a tristemente célebre Lei Barreto).
No
plano laboral, faz aprovar a lei dos contratos a prazo, lança a facilitação dos
despedimentos colectivos e cria os recibos verdes. Já em 1978, o ministro do
Trabalho, Maldonado Gonelha, lança um projecto de restrição dos direitos
sindicais e de promoção do divisionismo entre os trabalhadores.
Política
de alianças
O
I Governo Constitucional chegou ao fim com o chumbo de uma moção de confiança
apresentada por Soares na Assembleia da República, após o qual apresenta uma
«proposta vazia» de acordo ao PCP. Rapidamente, o PS vira-se para a direita
mais reaccionária e forma um governo de coligação com o CDS, partido que apenas
dois anos antes votara contra a Constituição da República.
O
lema do I Governo – «Vencer a crise, salvar a Revolução» – é vetado por Freitas
do Amaral, que impõe uma variação: «salvar a democracia». Mário Soares tenta
justificar a aliança com a direita parlamentar mais reaccionária,
dizendo: «Não se trata agora de meter o socialismo na gaveta, mas de salvar a
democracia.» Mas a verdade é que ficaria conhecido como o homem que
«meteu o socialismo na gaveta». A sua acção política veio a
confirmar quão longe as suas palavras estavam longe da verdade,
nesse ano de 1978.
1980:
preparar o caminho, de São Bento a Belém
Nas
segundas eleições presidenciais após o 25 de Abril, em 1980, Soares tenta
demover o seu partido, de que era secretário-geral, de apoiar o então
presidente e recandidato. Ramalho Eanes, que em 1976 tinha sido
apoiado pelo PS, PPD (hoje PSD) e pelo CDS , defrontou nessas
eleições Soares Carneiro, que contava com o apoio dos partidos da Aliança
Democrática (PPD, CDS e PPM) e dos sectores mais reaccionários da sociedade
portuguesa.
Mário
Soares acabou derrotado dentro do seu partido, suspendendo-se mesmo do
cargo que ocupava para que não tivesse que participar e apoiar o
candidato apoiado pelo PS, e que viria a receber também o apoio do
PCP, após a desistência do seu candidato.
Em
1982, enquanto deputado e secretário-geral do PS, aprova a primeira revisão constitucional,
que retirou do texto constitucional o objectivo da «transição para o
socialismo», extinguiu o Conselho da Revolução e retirou poderes ao Presidente
da República, reforçando o poder e as competências governamentais.
1983:
Bloco Central – de novo de braço dado à direita, com o FMI e os olhos
postos na Presidência
Um
ano depois, Mário Soares volta à chefia do governo, desta vez com o PSD e, mais
uma vez, virando as costas ao PCP e ao MDP/CDE. É como primeiro-ministro do
«Bloco Central» que Soares volta a chamar o FMI e prepara a entrada de Portugal
na Comunidade Económica Europeia (CEE, hoje União Europeia), cujo processo de
adesão teve início em 1977, durante a sua primeira passagem pela liderança do executivo.
Em Junho de 1985, menos de meio ano antes de abandonar o cargo, Mário Soares
assina o tratado de adesão à CEE, cumprindo um dos objectivos que desde 1976
definira enquanto elemento associado ao processo de restauração monopolista e
de dependência e submissão externa.
O
fim do governo do «Bloco Central» chega em vésperas das eleições presidenciais
de 1986, para as quais Mário Soares foi preparando uma candidatura, em
confronto com o seu camarada de partido, Francisco Salgado Zenha, que viria a
ser apoiado pelo PCP e pelo recém-criado PRD, do ainda presidente Ramalho Eanes.
Na
primeira volta, acaba por conseguir o segundo lugar, atrás de Freitas do Amaral
– fundador e líder do CDS apoiado pelo PSD. Na segunda volta, acaba por ser
eleito com uma curta margem, com os votos decisivos dos comunistas, perante a
ameaça da candidatura de Freitas do Amaral, que federava os sectores mais
reaccionários e revanchistas do País.
1986:
Soares & Cavaco, a dupla privatizadora
Os
dez anos presidenciais de Soares viriam a ser partilhados com outra figura marcante
das últimas quatro décadas: Cavaco Silva, que foi primeiro-ministro entre 1985
e 1995. Foi a década das privatizações e da revisão constitucional de 1989,
cujo principal alvo foi a democracia económica, com um forte papel do Estado,
instituída em 1976.
Mário
Soares viria a ser uma figura central na reconfiguração do tecido
económico português, facilitando o regresso dos principais
grupos económicos monopolistas que sustentaram o regime fascista. Foi
com o seu contributo valioso, como o próprio viria a contar, que os Espírito
Santo recuperaram a gestão do banco nacionalizado em 1975:
intercedeu, inclusive, junto do presidente francês, François Mitterrand,
para que o banco francês Crédit Agricole financiasse esse regresso.
Mas
a verdade é que Soares foi determinante para a década cavaquista:
quando o primeiro governo, minoritário, de Cavaco cai na Assembleia da
República (1987), recusa uma solução alternativa, com uma relação de
forças parlamentar onde PS, PRD (de Eanes), PCP e MDP/CDE tinham a maioria dos
lugares, com o PSD e o CDS em minoria.
O
Presidente dissolveu a Assembleia da República, avançando para
legislativas que deram a primeira maioria absoluta a um só partido, ao PSD
de Cavaco Silva, que viria a responder ao favor de Soares apoiando-o nas presidenciais
de 1991.
1996:
a irresistível sedução pelo poder
Sai
da Presidência em 1996, revelando a vontade de se dedicar à escrita e à família.
Mas o futuro ainda reservava mais dois confrontos políticos em que
viria a ser derrotado.
Em
1999, é eleito deputado ao Parlamento Europeu, tentando chegar à sua
presidência. Falha a corrida para a francesa Nicole Fontaine, de quem
disse ter «um discurso de dona de casa».
Em
2005, apresenta uma terceira candidatura a Presidente da República, com o
apoio do seu partido, mas viria a perder para Cavaco Silva.
Desde
então, a sua actividade política foi preenchida com a publicação de textos de
opinião, intervenções políticas diversas e a participação no Conselho de
Estado, de que era membro por inerência.
AbrilAbril
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