Mariana
Mortágua* - Jornal de Notícias, opinião
Imagine
que tem um telemóvel sem saldo e neste momento não quer gastar dinheiro a
carregá-lo. Imagine que aparece alguém e lhe propõe o seguinte: "Olhe, eu
faço um carregamento de 100euro, mas fico com o aparelho para mim. Você terá
ainda de carregar com mais 300euro quando estes 100euro se gastarem. Em troca,
fica com o direito de controlar algumas das minhas chamadas, para saber que eu
não gastei tudo muito depressa". Parece-lhe um bom negócio? Pois foi,
grosso modo, o negócio que o Lone Star fechou com o Governo para a compra do
Novo Banco.
O
banco desaparece para sempre em mãos privadas, neste caso de um fundo abutre,
conhecido por lucrar com as economias desvalorizadas pela crise. O fundo injeta
mil milhões de euros no banco que acabou de comprar (desses, 250 milhões só
daqui a três anos). E depois há o resto. O Novo Banco tem uma carteira de
ativos duvidosos que ronda os 8000 milhões, e a Lone Star não quer assumir
essas eventuais perdas. Assim, negociou com o Governo que, após consumido o seu
investimento, é o Estado português que arca com as perdas, que podem chegar aos
3890 milhões. O Estado fica com 25% do Banco mas com 80% das perdas potenciais,
e não tem sequer plenos direitos de acionista. Sem falar nos despedimentos e
encerramento de balcões.
O
Governo tem-se escudado dizendo que todas as perdas com o Novo Banco recairão
sobre o Fundo de Resolução, e que este é financiado pela banca. Mas na prática,
todo o dinheiro que alimenta o Fundo de Resolução é dívida pública, paga pelos
contribuintes.
Senão
vejamos, até agora o Fundo de Resolução já injetou 4900 milhões no Novo Banco.
Desses, 3900 milhões foram emprestados pelo Estado. Era suposto a banca pagar
de volta esse valor em poucos anos, mas isso não vai acontecer. A dívida da
banca ao Fundo de Resolução foi de tal forma reestruturada que se resume,
afinal, à contribuição que já pagavam antes sequer da dívida existir (cerca de
200 milhões de euros anuais). Se o Fundo de Resolução tiver que arcar com
perdas futuras de mais 4000 milhões, este valor será financiado com mais dívida
pública, enquanto a prestação dos bancos se mantém.
Sem
mais argumentos, resta a chantagem: o Novo Banco tem que ser vendido porque a
alternativa é a liquidação. Mas porquê? Quem diz que o país está condenado a
pagar para perder o controlo de um dos seus mais importantes bancos? No Banif
as imposições europeias custaram ao país 3000 milhões de euros, ganhou o
Santander.
A
nacionalização do Novo Banco continua a ser uma alternativa. No curto prazo
terá o custo da capitalização necessária, cerca de 750 milhões, se
considerarmos o que a Lone Star vai pagar. Mas se, a partir daí, as perdas são
de qualquer forma assumidas pelo Estado, não deve o Estado controlar a
instituição? Parece uma boa alternativa ao atual modelo, que empurra com a
barriga os problemas de hoje, atirando os prejuízos para quem vier a seguir.
*Deputada
do BE
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