Expresso
Curto com lamentos mas também com boas notícias… Ou referência a elas. Pela
nossa parte não queremos alongar a prosa, nem opinar ou tomar considerações por
isto e aquilo. Talvez porque estamos a assistir a porcos da política que
aproveitam a tragédia dos fogos e da morte de 64 portugueses devorados pelas
chamas para fazer luta partidária. Regra geral esses são os da direita ressabiada
e bufa, como o deputado do CDS, Hélder Amaral, que até sobre Marcelo Rebelo de
Sousa, o PR, saltou como um canzarrão
esfaimado. Outros há, também esfaimados.
Gente
bacoca e da direita ataca a esquerda quando ainda nem as chamas do fogo de Pedrógão
Grande se extinguiram. Isso porque considera este governo do PS de esquerda? Sim,
às vezes de uma esquerda muita pálida, mas da esquerda não. Digamos em abono da
verdade que na atualidade uma social-democracia do estilo Olof Palme, na Suécia,
era à esquerda demais para o atual Partido Socialista. Não são os nomes dos
partidos que nos governam mas sim as pessoas. Socialistas? Onde? E então?
Deixem-nos fazer o luto. Vamos
pousar e ver no que vai dar acerca das responsabilizações daquilo e daqueles que
funcionaram mal nesta tragédia, para além da responsabilidade que justamente pertence
à natureza quando nos surpreende com fenómenos anómalos, imprevisíveis – mais que
não seja nas dimensões.
Até
amanhã. Talvez. Nada é certo e o “talvez” está muito bem aplicado. Sigam para o
Curto, hoje servido por uma senhora do Expresso, Cristina Figueiredo. O seu a
seu dono. Saiba mais se continuar a ler. (PG)
Bom
dia, este é o seu Expresso Curto
Cristina
Figueiredo | Expresso
Um
dia de inverno
Estamos
oficialmente no verão, desde as 4h24. Mas este 21 de junho é, apesar do calor, “um
dia de inverno vazio, triste como um gemido” ("A winter day",
Alexander Search). As notícias vindas de Pedrogão Grande abrandam mas ainda não
pararam, confirmando a contrario o ditado segundo o qual "no
news is good news". Nem sei por onde começar quando o inferno parece não
ter fim. As últimas dão conta das frentes de incêndio que continuam ativas (e a obrigar
a evacuações) e das dezenas de casa destruídas no concelho vizinho de
Castanheira de Pera. Com perplexidade fica a saber-se da miséria moral de quem se faz passar por técnico da segurança social junto
das populações vítimas dos incêndios (esperando lucrar com isso no futuro?).
Com perplexidade também fica a saber-se que o SIRESP, o sistema de comunicações
de emergência, já tinha falhado em agosto de 2016, durante os
incêndios em Abrantes e no Sardoal
Ontem à noite, em entrevista à TVI, o primeiro-ministro assegurou, porém, não ter provas de que tenha havido qualquer falha, nem mesmo quando a GNR conduziu os condutores para a morte ao desviá-los para a Nacional 236 - notícia em amplo destaque na homepage do El Español. Ninguém pede provas cabais do que está demonstrado do modo mais terrível e mais irreversível (47 das 64 mortes deram-se nessa estrada), mas exigem-se todas as explicações para todas as perguntas que continuamos a fazer. Como escreve o Ricardo Costa: "Como foi possível? Porque não temos mais meios de combate? Onde andam as Forças Armadas? Estamos condenados a isto? Podemos fazer qualquer coisa? A primeira vantagem da mais brutal das tragédias é a de impedir qualquer adiamento destas questões".
Costa reafirmou ainda total confiança na ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, que hoje terá oportunidade de se defender na primeira pessoa - é entrevistada na RTP3, às 23h05. E está no tempo certo para isso, agora que as tréguas políticas impostas pela tragédia dão sinais de estar a chegar ao fim: PSD e CDS, mas também PCP e BE, querem saber tudo o que se passou. Mas que ninguém atire a primeira pedra: no balanço de tudo o que podia já ter sido feito (e, nunca o saberemos, talvez prevenido a catástrofe) as culpas são repartidas por toda a classe política, ao longo de muito tempo. Basta ler o artigo que a Raquel Albuquerque escreveu na edição diária do Expresso na segunda-feira para o concluir.
Ontem à noite, em entrevista à TVI, o primeiro-ministro assegurou, porém, não ter provas de que tenha havido qualquer falha, nem mesmo quando a GNR conduziu os condutores para a morte ao desviá-los para a Nacional 236 - notícia em amplo destaque na homepage do El Español. Ninguém pede provas cabais do que está demonstrado do modo mais terrível e mais irreversível (47 das 64 mortes deram-se nessa estrada), mas exigem-se todas as explicações para todas as perguntas que continuamos a fazer. Como escreve o Ricardo Costa: "Como foi possível? Porque não temos mais meios de combate? Onde andam as Forças Armadas? Estamos condenados a isto? Podemos fazer qualquer coisa? A primeira vantagem da mais brutal das tragédias é a de impedir qualquer adiamento destas questões".
Costa reafirmou ainda total confiança na ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, que hoje terá oportunidade de se defender na primeira pessoa - é entrevistada na RTP3, às 23h05. E está no tempo certo para isso, agora que as tréguas políticas impostas pela tragédia dão sinais de estar a chegar ao fim: PSD e CDS, mas também PCP e BE, querem saber tudo o que se passou. Mas que ninguém atire a primeira pedra: no balanço de tudo o que podia já ter sido feito (e, nunca o saberemos, talvez prevenido a catástrofe) as culpas são repartidas por toda a classe política, ao longo de muito tempo. Basta ler o artigo que a Raquel Albuquerque escreveu na edição diária do Expresso na segunda-feira para o concluir.
Com os olhos postos no futuro (por uma vez planeie-se o país que queremos ser), o presidente da corticeira Amorim, Rios Amorim, pede um plano de ordenamento florestal. Ainda há esperança para a ameaçada cultura do sobreiro? No meio de tudo isto uma notícia que acabou por não o ser: o Canadair que se teria despenhado enquanto combatia os incêndios. Só há a lamentar, neste caso felizmente, a credibilidade da comunicação social (ainda que ajudada pela Proteção Civil, que começou por confirmar o que não estava em condições de confirmar), vítima de si própria na vertigem de dar a cacha. A fazer-nos pensar se, como o coelho da Alice, na pressa de querermos chegar não perdemos já todos a noção de para onde estamos a ir. Às 13h00, aproveitemos os sessenta segundos de silêncio nacional em homenagem às vítimas também para começar a refletir nisso.
OUTRAS NOTÍCIAS CÁ DENTRO...
Por incrível que ainda nos pareça, a vida continua para lá de Pedrogão. Ontem, o presidente da CGD, Paulo Macedo, veio dizer algo que não surpreende ninguém mas nem por isso deixa de ser menos preocupante:se a Caixa não der lucro, lá terá de ir pedir mais dinheiro aos contribuintes. "E tenho uma ideia de qual será a resposta", disse o ex-ministro da Saúde de Passos. Nós, infelizmente, também.
A operação Ajuste Direto prossegue. Ontem foi conhecida a detenção do antigo deputado do PSD e ex-presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República, João Sá. É acusado dos crimes de corrupção ativa e passiva, prevaricação, peculato e tráfico de influências, os mesmos que justificaram as detenções do atual e do antigo presidente da Câmara de Oliveira de Azeméis, Isidro Figueiredo e Hermínio Loureiro.
É dia de exames nacionais, de provas de aferição e de greve de professores, apesar de uma derradeira tentativa do ministério da Educação para conseguir desmobilizar os protestos. Tiago Brandão Rodrigues chamou os sindicatos à 5 de outubro, ontem à tarde, mas a reunião foi infrutífera: "De forma responsável não pudemos ir mais longe", justificou. Os professores exigem o descongelamento das carreiras já em 2018, uma reorganização dos horários de trabalho, a abertura de novos períodos de vinculação para os professores contratados e um regime especial de aposentação.
A seleção A de futebol joga contra a Rússia, às 16h00, na segunda jornada da Taça das Confederações. Depois do empate frente ao México, aguarda-se a vitória que leve Fernando Santos (que rebate as críticas à prestação da equipa no último domingo: "prefiro não jogar bonito e ser campeão da Europa", diz) e tutti quanti à final. Que não se deixem contagiar pelo facto de, ontem, a selecção de sub-21 ter perdido com a Espanha por 3-1, tornando mais difícil a sua passagem às meias-finais do Europeu de sub-21. Foi a primeira derrota em cinco anos e oito meses, como conta o Diogo Pombo.
Por incrível que ainda nos pareça, a vida continua para lá de Pedrogão. Ontem, o presidente da CGD, Paulo Macedo, veio dizer algo que não surpreende ninguém mas nem por isso deixa de ser menos preocupante:se a Caixa não der lucro, lá terá de ir pedir mais dinheiro aos contribuintes. "E tenho uma ideia de qual será a resposta", disse o ex-ministro da Saúde de Passos. Nós, infelizmente, também.
A operação Ajuste Direto prossegue. Ontem foi conhecida a detenção do antigo deputado do PSD e ex-presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República, João Sá. É acusado dos crimes de corrupção ativa e passiva, prevaricação, peculato e tráfico de influências, os mesmos que justificaram as detenções do atual e do antigo presidente da Câmara de Oliveira de Azeméis, Isidro Figueiredo e Hermínio Loureiro.
É dia de exames nacionais, de provas de aferição e de greve de professores, apesar de uma derradeira tentativa do ministério da Educação para conseguir desmobilizar os protestos. Tiago Brandão Rodrigues chamou os sindicatos à 5 de outubro, ontem à tarde, mas a reunião foi infrutífera: "De forma responsável não pudemos ir mais longe", justificou. Os professores exigem o descongelamento das carreiras já em 2018, uma reorganização dos horários de trabalho, a abertura de novos períodos de vinculação para os professores contratados e um regime especial de aposentação.
A seleção A de futebol joga contra a Rússia, às 16h00, na segunda jornada da Taça das Confederações. Depois do empate frente ao México, aguarda-se a vitória que leve Fernando Santos (que rebate as críticas à prestação da equipa no último domingo: "prefiro não jogar bonito e ser campeão da Europa", diz) e tutti quanti à final. Que não se deixem contagiar pelo facto de, ontem, a selecção de sub-21 ter perdido com a Espanha por 3-1, tornando mais difícil a sua passagem às meias-finais do Europeu de sub-21. Foi a primeira derrota em cinco anos e oito meses, como conta o Diogo Pombo.
...E LÁ FORA
Arriscamo-nos a já não dar importância; o terrorismo parece que caiu na rotina. Mas não deixa por isso de ser menos aviltante: Ontem à noite, dois dias depois de um automóvel ter atropelado um grupo de muçulmanos que saíam de uma mesquita em Londres, no dia seguinte a um carro com explosivos se ter atirado contra um carro-polícia nos Champs Elysées, em Paris, houve uma explosão na gare central de Bruxelas -o atacante foi abatido pela polícia.
As legislativas francesas continuam a produzir ondas de choque na cena política parisiense e o que era, ao princípio, uma mera remodelação "técnica" do Executivo presidido por Edouard Philippe ameaça tornar-se noutro Governo: depois do ministro da Coesão Territorial, Richard Ferrand, e da ministra da Defesa, Sylvie Goulard, agora foi a vez da ministra dos Assuntos Europeus, Marielle de Sarnez e do ministro da Justiça, François Bayrou, apresentarem a demissão, antecipando-se às acusações de conduta irregular. E será que fica por aqui?
A administração de Donald Trump obteve uma preciosa vitória nas eleições especiais realizadas ontem no estado da Georgia para a câmara dos representantes. Numa renhida disputa (a mais cara da história das eleições para o Congresso) com o democrata Jon Ossof, a republicana Karen Handel levou a melhor e reforçou o apoio às políticas de Trump, em vésperas de nova votação na câmara do sistema nacional de saúde (vulgo Obamacare) norte-americano. Ligado com isto (como não?), vale a pena espreitar, no The Guardian, o artigo O sonho americano está morto?.
AS MANCHETES DOS JORNAIS
"Governo recusa comando único para combater incêndios", Público
"Incêndios.
Sistema de comunicações já tinha falhado", Diário de Notícias
"16
perguntas e respostas sobre a tragédia de Pedrogão Grande", i
"Mártires, os rostos e as histórias de vítimas da tragédia de Pedrogão
Grande", Correio da Manhã
"Dia de sufoco", Jornal de Notícias
"Gestores das cotadas podem ser avaliados", Jornal de Negócios
"Doumbia chega para o ataque", A Bola
"Doumbia a caminho do Sporting", Record
"Cinco vidas novas", O Jogo
O QUE ANDO A LER, A VER, A OUVIR
O ano de 1967 despertou-me uma curiosidade acrescida nos últimos tempos e conduziu-me até um livro em particular: foi há cinquenta anos que Manuel Alegre (Prémio Camões 2017) escreveu “O Canto e as Armas”, agora reeditado pela D.Quixote, numa versão “definitiva e comemorativa”, com prefácio de Mário Cláudio, que o leu pela primeira vez enquanto cumpria o serviço militar obrigatório na Guiné e garante que não se recorda “de outro livro, talvez o de Job, eleito em momentos de infortúnio, que se [lhe] tenha amassado tão imediatamente no sangue”. Eu, que faço 50 anos para o ano e só sei da guerra colonial o que os testemunhos de terceiros me contaram, não me arrogo o direito de ficar assim tão (justamente) impressionada mas consigo perceber por que é que este conjunto de poemas cala fundo a quem lutou pela pátria e pela liberdade num tempo em que os dois substantivos pareciam inconciliáveis. Deste conjunto de poemas retenho “Que somos nós” e, nele, uma pergunta que continuamente nos interpela a todos: "Que somos nós senão o que fazemos?".
Não li (ainda) mas vou ver "A última viagem de Sindbad", do interventivo escritor italiano Erri de Luca (pode saber mais sobre ele nesta entrevista que deu ao Público quando esteve em Lisboa, em 2009), que a companhia de teatro Três Mais Um leva a cena (ao ar livre) na Galeria Monumental, em Lisboa, de 24 a 28 de Junho. Peça de teatro escrita em 2002 (ainda que só dada à estampa no ano passado), não podia ser, infelizmente, mais atual: de Luca, natural de Nápoles, esteve diversas vezes em Lampedusa e os primeiros naufrágios no Mediterrâneo impeliram-no a imaginar a derradeira viagem do marinheiro das Mil e Uma Noites como metáfora daqueles que, em crescendo desde então, arriscam (e quantos a perdem) a vida em embarcações frágeis para se refugiarem numa Europa ela própria à deriva. Ainda sobre o tema, interessante o desafio interativo que o El Pais nos coloca: e se nos colocássemos na pele de um refugiado?
Termino voltando ao princípio, com Alexander Search. O heterónimo de Fernando Pessoa (que escreveu os poemas, em língua inglesa, nos anos em que viveu na África do Sul) inspirou o pianista e compositor Júlio Resende, aqui “Augustus Search”, a criar uma banda de rock eletrónico com Salvador Sobral, agora “Benjamin Cymbra”, como vocalista. Ainda ouvi poucas vezes o álbum (só disponível em streaming desde sexta-feira), mas as suficientes para já ter uma canção favorita: “A day of sun”. Teria dado um belo título para esta newsletter se este fosse, que não é, não pode ser, um dia de celebração do solstício de verão, e eu pudesse “ficar estendido ao sol que me encharca e deixar-me morrer em glória de tanto beber da taça da vida”.
O ano de 1967 despertou-me uma curiosidade acrescida nos últimos tempos e conduziu-me até um livro em particular: foi há cinquenta anos que Manuel Alegre (Prémio Camões 2017) escreveu “O Canto e as Armas”, agora reeditado pela D.Quixote, numa versão “definitiva e comemorativa”, com prefácio de Mário Cláudio, que o leu pela primeira vez enquanto cumpria o serviço militar obrigatório na Guiné e garante que não se recorda “de outro livro, talvez o de Job, eleito em momentos de infortúnio, que se [lhe] tenha amassado tão imediatamente no sangue”. Eu, que faço 50 anos para o ano e só sei da guerra colonial o que os testemunhos de terceiros me contaram, não me arrogo o direito de ficar assim tão (justamente) impressionada mas consigo perceber por que é que este conjunto de poemas cala fundo a quem lutou pela pátria e pela liberdade num tempo em que os dois substantivos pareciam inconciliáveis. Deste conjunto de poemas retenho “Que somos nós” e, nele, uma pergunta que continuamente nos interpela a todos: "Que somos nós senão o que fazemos?".
Não li (ainda) mas vou ver "A última viagem de Sindbad", do interventivo escritor italiano Erri de Luca (pode saber mais sobre ele nesta entrevista que deu ao Público quando esteve em Lisboa, em 2009), que a companhia de teatro Três Mais Um leva a cena (ao ar livre) na Galeria Monumental, em Lisboa, de 24 a 28 de Junho. Peça de teatro escrita em 2002 (ainda que só dada à estampa no ano passado), não podia ser, infelizmente, mais atual: de Luca, natural de Nápoles, esteve diversas vezes em Lampedusa e os primeiros naufrágios no Mediterrâneo impeliram-no a imaginar a derradeira viagem do marinheiro das Mil e Uma Noites como metáfora daqueles que, em crescendo desde então, arriscam (e quantos a perdem) a vida em embarcações frágeis para se refugiarem numa Europa ela própria à deriva. Ainda sobre o tema, interessante o desafio interativo que o El Pais nos coloca: e se nos colocássemos na pele de um refugiado?
Termino voltando ao princípio, com Alexander Search. O heterónimo de Fernando Pessoa (que escreveu os poemas, em língua inglesa, nos anos em que viveu na África do Sul) inspirou o pianista e compositor Júlio Resende, aqui “Augustus Search”, a criar uma banda de rock eletrónico com Salvador Sobral, agora “Benjamin Cymbra”, como vocalista. Ainda ouvi poucas vezes o álbum (só disponível em streaming desde sexta-feira), mas as suficientes para já ter uma canção favorita: “A day of sun”. Teria dado um belo título para esta newsletter se este fosse, que não é, não pode ser, um dia de celebração do solstício de verão, e eu pudesse “ficar estendido ao sol que me encharca e deixar-me morrer em glória de tanto beber da taça da vida”.
Ao longo do dia, no site do Expresso, no Expresso Diário e na Tribuna, as notícias
não param. E, haja esperança, nem todas hão-de ser más.
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