segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

A China na Estratégia Nacional de Defesa de Donald Trump


Pedro Brancher*

No dia 18 de dezembro de 2017, o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a publicação da Estratégia Nacional de Segurança (ENS) de seu governo. A ENS é um documento que sintetiza as percepções e diretrizes que nortearão a política externa estadunidense pelos próximos anos. Nesse contexto, a publicação de 2017 explicita que, do ponto de vista da administração Trump, a República Popular da China se constitui como a maior fonte de ameaças aos interesses nacionais dos EUA na política internacional contemporânea.

A nação asiática é mencionada trinta e três vezes ao longo das cinquenta e seis páginas do documento. Logo na primeira referência, a ENS se refere à China e à Rússia como nações que “estão desafiando o poder e a influência dos Estados Unidos, bem como buscando erodir a segurança e a prosperidade estadunidense”. Em seguida, são realizadas graves acusações às práticas internacionais do Governo chinês. Por exemplo, Beijing é acusada de “roubar propriedade intelectual dos EUA”, “expandir práticas comerciais abusivas”, “explorar tecnologias de informação para ampliar seu sistema político autoritário”, bem como “avançar sobre a soberania de outros países”. Por fim, o documento sugere que está em curso uma divisão político-ideológica na região Indo-Pacífica. Isto é: “uma competição geopolítica entre concepções autoritárias e liberais acerca da ordem internacional”.

Percebe-se que tal abordagem representa um brusco ponto de inflexão em relação à ENS publicada em 2015 pela administração do ex-Presidente Barack Obama. Nessa ocasião, as poucas referências à República Popular da China destacavam os avanços que ambos os países haviam alcançado no âmbito das políticas de combate à mudança climática. Além disso, o documento de 2015 ressaltava que “os EUA acolheriam a ascensão de uma China estável, pacífica e prospera”, bem como a busca pelo desenvolvimento de uma relação construtiva que promovesse segurança e prosperidade para a Ásia e o restante do mundo. 

As acusações presentes na Estratégia Nacional de Segurança de Donald Trump foram prontamente respondidas pelas autoridades chinesas. Hua Chunying, Porta-Voz do Ministério de Relações Exteriores do país, declarou que “nós estimulamos que o governo dos EUA pare de distorcer deliberadamente as intenções estratégicas da China e abandone conceitos ultrapassados da Guerra Fria”. Por sua vez, o periódico do Partido Comunista Chinês, Global Times, assumiu tom mais severo em seu editorial: “a ENS é uma manifestação da postura da administração de Trump, a qual se baseia mais no poder americano no que nas regras internacionais. Demonstra a indisputável insistência de Washington na hegemonia global. Beijing e Moscou não aceitarão”.  

É cedo para se avaliar o resultado prático da inflexão no âmbito discursivo da política externa estadunidense em relação à China. Isso porque a Estratégia Nacional de Segurança não delimita um conjunto específico de ações no âmbito internacional, mas apenas apresenta percepções e diretrizes gerais.

Nesse sentido, especialistas questionam até que ponto Donald Trump não teria utilizado o documento como forma de responder ao eleitorado estadunidense que o elegeu. Além disso, na medida em que manifestações contraditórias e declarações presidenciais via Twitter se tornaram uma prática recorrente do atual Chefe de Estado dos Estados Unidos, ficou mais complexa a compreensão acerca da real estratégia de longo prazo perseguida pelo país norte-americano. 

Ainda assim, nota-se que a mudança apresentada na ENS estadunidense ocorre em uma conjuntura de acirramento da competição entre China e EUA, bem como de alteração no posicionamento externo do país asiático. Por exemplo, o presidente Xi Jinping, em seu discurso a nação realizado no dia 31 de dezembro de 2017, declarou que a China será uma ativa construtora da paz e guardiã da ordem internacional. Em outras palavras, Beijing assume definitivamente uma atitude de liderança na comunidade internacional. Logo, percebe-se que o ano de 2018 se inicia com a incorporação de rivalidade recíproca no discurso oficial da política externa das duas maiores potências do sistema interestatal contemporâneo.

*CEIRI | 5 de Fevereiro de 2018

Imagem: “Xi Jinping e Peng Liyuan, Presidente e Primeira Dama da República Popular da China, ao lado de Donald Trump e Melanie Trump, Presidente e Primeira Dama dos Estados Unidos” (Fonte):

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