Angola vive momentos de tensão
face a uma estranha e maliciosa revolução de conceitos, liderada, na maioria
das vezes, pela tribo política no poder, pelo capital económico e pelas altas
patentes militares, para sufocar e domar a mente da sociedade, perpetuar e
branquear a roubalheira.
William Tonet* | opinião
E qual o maior objectivo?
Confundir, propositadamente, corrupção com peculato, para através da lei,
maquinada pelo Titular do Poder Executivo, designada de Repatriamento de
Capitais, branquear com a máxima e total impunidade, ilícitos monstruosos
praticados, exclusivamente, por uma mesmo tribo ideológica, que deveria ser
responsabilizada civil e criminalmente, pela morte de milhares de crianças e
cidadãos inocentes e não acarinhada.
Os roubos de milhões e milhões de
dólares, no exercício de funções, por parte de alguns governantes, em Angola,
não foram feitos em NOME DO POVO, mas em NOME DO BOLSO, numa institucional
cultura dantesca, que nega(va), voluntária ou involuntariamente, assistência
médica e medicamentosa, a milhares de crianças carentes de um antibiótico, que
morreram em função desta prática que deve(ria) ser enquadrada como crime
hediondo, logo, imprescritível e insusceptível de amnistia.
Daí que um movimento
internacional capitaneado por juristas, advogados, intelectuais e políticos de
todo mundo, se esteja a bater para enquadrar e tipificar, no Direito
Internacional, o peculato e a corrupção como crimes contra a humanidade, pelos
danos colaterais causados a milhões de inocentes.
Obviamente, os governantes,
eleitos ou nomeados, que a um dado momento têm a missão de gerir património e
finanças públicas, desviarem para proveito próprio, devem ter a honra de um
tapete vermelho, para o Tribunal Internacional e, sujeitos, nacionalmente, ao
crivo de acusação do Ministério Público ou de cidadãos lesados, directa ou
indirectamente, por tais práticas.
A tolerância deve ser ZERO, para
com a prática do peculato, por ser mais danosa que todas as outras, por
permitir, com alegada imunidade ou impunidade, a roubalheira e o desvio do bem
comum, até por ela, no caso angolano, ter cobertura constitucional, al.ª b),
n.º 1 do art.º 129.º:
“ O Presidente da República pode
ser destituído do cargo nas seguintes condições:
b) Por crimes de suborno, peculato e corrupção”.
A colação deste artigo, resulta
do atipismo da Constituição angolana, onde os ministros e o Conselho de
Ministros, são órgãos auxiliares do Presidente da República (logo sem
responsabilidade directa) não tendo, por via disso, responsabilidade criminal
directa, já que o poder repousa, exclusiva e totalmente, na figura do Titular
do Poder Executivo, que açambarca e esvazia o poder de todos os órgãos da
Administração do Estado.
Em termos lineares, significa que
todos os ministros que praticam ou praticarem o peculato, no exercício de
funções, caí- dos nas malhas da justiça, podem evocar terem-no feito a mando do
verdadeiro ministro: o Titular do Poder Executivo.
Como se pode ver o modismo
verbal, que assenta arraiais na corrupção, tenta apenas diminuir o maior crime,
responsável pela delapidação das finanças públicas e da economia, que é o
peculato, o verdadeiro cancro, alojado, desde 1975, nos corredores do poder.
No Código Penal, art.º 313.º,
define-se o Peculato da seguinte forma: “Todo o empregado público que em razão
das suas funções tiver em seu poder dinheiro, títulos de crédito, ou efeitos
móveis pertencentes ao Estado, ou a particulares, para guardar, despender ou
administrar, ou lhes dar o destino legal, e alguma coisa destas furtar,
maliciosamente levar, ou deixar levar ou furtar a outrem, ou aplicar a uso
próprio ou alheio, faltando à aplicação ou entrega legal, será condenado na
pena correspondente ao crime de roubo, nos termos do artigo 437.º”.
Por aqui vemos a insensatez da
Lei do Repatriamento de Capitais, por ser uma esponja para limpar a sujeira de
quem, conscientemente, delapidou durante vários mandatos, os cofres públicos
para proveito próprio e, agora, através de elucubrações jurídicas, ainda obriga
o Estado a ajoelhar-se, aos seus desígnios maliciosos, quando deveria levá-los
a provar o sabor amargo da ambição desmedida, nas suites fedorentas das
masmorras do regime, onde aprenderiam lições de ética governativa, honestidade
de gestão pública e justiça imparcial.
Definitivamente, repugna-me
assistir à dose de anestesia, para que todos, ou uma boa maioria, bata palmas a
mais esta tentativa de nos fazerem todos de parvos, através da actual Lei de
Repatriamento de Capitais, que se quisesses ser séria e credível, nos deveria
dizer:
a) Qual o montante ilícito que
saiu do país e em que períodos;
b) Quais os circuitos utilizados: BNA, bancos comerciais ou dinheiro em cash, nas malas, através das fronteiras, terrestres, aéreas e marítimas;
c) Quem são os potenciais prevaricadores;
d) Quais os montantes individuais, bem como a actual aplicação no exterior, em termos de acções bancárias, participações empresariais e ou patrimoniais;
e) Que órgão independente vai, em Angola, fiscalizar a entrada do dinheiro e acompanhar a sua aplicação nos projectos;
f) O que o Estado arrecada como indemnização do roubo praticado, pelos seus agentes;
g) Como a actual Lei de Repatriamento de Capital pode ofuscar ou escamotear a Lei de Amnistia, em vigor, que apagou todos os crimes económicos praticados até o ano de 2015, pelos governantes e dirigentes de órgãos públicos, através da prática do peculato?
Os povos de Angola que conhecem,
mais do que ninguém, ao longo destes 42 anos, as agruras do sofrimento causado
pela desgovernação de uns poucos mafiosos e malandros, dirigentes, devem
iniciar uma verdadeira “Revolução da Vassoura”, desalojando do poder a gangue
mafiosa, que degola a maioria dos autóctones angolanos.
*Folha 8 | William Tonet é
diretor do Folha 8
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