Ministério das Finanças angolano
diz que já recebeu dinheiro que teria sido transferido ilicitamente para o
Reino Unido, alegadamente com autorização de "Zenú" dos Santos. E
lança nova luz sobre o caso.
O Ministério das Finanças de
Angola confirmou esta segunda-feira (09.04) já ter recuperado os 500 milhões de
dólares transferidos para uma conta bancária em Londres, numa operação
alegadamente ilícita que
envolveu José Filomeno dos Santos, filho do ex-Presidente angolano.
"Como resultado das várias
diligências encetadas, cumpre-nos levar ao conhecimento público que os 500
milhões de dólares americanos já foram recuperados, estando em posse do BNA
[Banco Nacional de Angola]", lê-se num comunicado enviado à agência de
notícias Lusa.
Esta transferência está em
investigação pelas autoridades angolanas e britânicas, tendo José Filomeno dos
Santos, filho do ex-chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, e o ex-governador
do BNA Valter Filipe sido constituídos arguidos em Angola.
O Ministério das Finanças
acrescenta as autoridades angolanas se mantêm "empenhadas na recuperação
da totalidade dos valores pagos" no âmbito da estruturação da operação
financeira alegadamente fraudulenta, "nomeadamente, a recuperação de 24,85
milhões de euros, indevidamente transferida para a conta da empresa Mais
Financial Services, resultante de uma prestação de serviços não
realizada".
A origem do caso
No mesmo comunicado, o Governo
angolano esclarece publicamente, pela primeira vez, os contornos desta operação
polémica, explicando que tudo começou antes da realização das eleições
gerais de agosto, quando a empresa Mais Financial Services, que refere ser
administrada pelo cidadão angolano Jorge Gaudens Pontes e auxiliado por José
Filomeno dos Santos (ambos constituídos arguidos na investigação a esta
transferência em Angola), "propôs ao Executivo a constituição de um Fundo
de Investimento Estratégico" que mobilizaria 35.000 milhões de dólares
(28.500 milhões de euros) "para o financiamento de projetos considerados
estratégicos para o país".
Envolvia ainda a constituição de
um outro fundo, em moeda externa, "que colocaria a quantia semanal de 300 milhões
de dólares", equivalente a 244 milhões de euros, "para atender as
necessidades do mercado cambial interno por um período de 12 meses".
"Note-se que toda a operação
seria intermediada pela Mais Financial Services que contava, alegadamente, com
o suporte de um sindicato de bancos internacionais de primeira linha",
afirma o Ministério das Finanças.
O negócio envolvia como
"condição precedente" a capitalização de 1.500 milhões de dólares
(1.218 milhões de euros) por Angola, acrescido de um pagamento de 33 milhões de
euros para "montagem das estruturas de financiamento".
Em consequência, entre julho e agosto
de 2017, o Ministério diz que foram pagos 24,8 milhões euros à Mais Financial
Services, para a montagem da operação de financiamento. Em agosto do mesmo ano
foram transferidos 500 milhões de dólares (406 milhões de euros) para a conta
da PerfectBit, "contratada pelos promotores da operação", para fins
de custódia dos fundos a estruturar.
Nomeação suspeita
Entre as dúvidas agora levantadas
pelas Finanças, que à data já eram lideradas por Archer Mangueira, está o facto
de Jorge Gaudens Pontes, sócio de José Filomeno dos Santos, ter sido
"nomeado administrador da PerfectBit dias antes da transferência"
destes valores.
"Da 'due dilligence' feita
pelo Ministério das Finanças e pelo escritório de advogados por si contratados,
concluiu-se que a empresa PerfectBit, detida pelo cidadão brasileiro Samuel
Barbosa, era uma empresa dormente, ou seja, um veículo sem qualquer histórico
em operações similares", lê-se.
Esta investigação levou a
concluir, em outubro, já depois da posse de João Lourenço como Presidente da
República, pela necessidade de "prudência", tendo o novo chefe de
Estado orientado que uma delegação encabeçada pelo Ministro das Finanças e
integrada pelo então governador do BNA viajasse para Londres para
"contactar os promotores e o dito sindicato de bancos que dariam suporte a
operação de financiamento".
Concluíram pela "falta de
capacidade dos promotores e da empresa contratada para estruturar e mobilizar
os fundos propostos ao Executivo", mas também "não foi confirmada a
idoneidade da empresa PerfectBit" e verificou-se a "não existência de
qualquer sindicato de bancos internacionais conforme havia sido garantido ao
Executivo", pelo que "a operação tinha fortes indícios de ser
fraudulenta".
Os promotores são ainda visados
pelo Ministério das Finanças por, após esta missão a Londres, se terem
"apressado" a "entregar pessoalmente" uma garantia
financeira alegadamente emitida pelo banco Crédit Suisse, mas
"presumindo-se" que seja "um documento falsificado".
Foi então solicitado ao banco
HSBC Londres o "congelamento dos valores que estavam na conta da
PerfectBit e o seu retorno para contas do BNA". Contudo, a operação
"teria já levantado suspeitas tanto pelos seus órgãos internos, bem como
pelos serviços britânicos de prevenção e combate ao crime financeiro", que
avançou para o congelamento dos valores, entretanto restituídos a Angola.
"Recursos que são de todos
os angolanos, que neste momento difícil muita falta fazem à economia do
país", conclui o Ministério das Finanças.
Lusa | em Deutsche Welle
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