Manlio Dinucci*
O plano de mobilidade militar
apresentado pela Comissão Europeia demonstra, publicamente, como a União
funciona desde a sua criação. Se dispõe de uma certa margem de manobra, ela é,
fundamentalmente, o obstrutor civil da Aliança do Atlântico Norte. Até hoje,
nenhuma das normas da União Europeia difere das normas estabelecidas,
antecipadamente, pela NATO. Consequentemente, quaisquer que sejam os poderes do
Parlamento e do Conselho Europeu, os mesmos são apenas os orgãos de registo das
decisões da Aliança, o único poder verdadeiro de Bruxelas. A decisão da NATO de
normalisar as estruturas da União Europeia, ocorreu apenas, tardiamente, em
2015, o que força a Comissão Europeia, três anos mais tarde, a exteriorizar a
sua sujeição à Aliança.
Comissão Europeia apresentou, em
28 de Março, o Plano de Acção sobre a mobilidade militar [1].
“Ao facilitar a mobilidade militar dentro da União Europeia - explica a Alta
Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e para a Política
de Segurança, Federica Mogherini - podemos reagir mais eficazmente quando os
desafios surgirem”. Mesmo que não o diga, a referência à “agressão russa” é
evidente. O Plano de Acção foi decidido, na realidade, não pela União Europeia,
mas pelo Pentágono e pela NATO.
Em 2015, o General Ben Hodges,
Comandante das Forças Terrestres dos EUA na Europa (U.S. Army Europe),
requisitou o estabelecimento de uma “Área Schengen militar” para que as forças
dos EUA, a fim de enfrentar a “agressão russa”, pudessem deslocar-se
rapidamente de um país europeu para outro, sem serem atrasadas pelas
regulamentações nacionais e pelos procedimentos alfandegários.
Este pedido foi feito pela
própria NATO: o Conselho do Atlântico Norte, reunido em 8 de Novembro de 2017,
ao nível dos Ministros da Defesa, pediu oficialmente à União Europeia que
“aplicasse leis nacionais que facilitassem a passagem das forças militares
através das fronteiras” e, ao mesmo tempo, “melhorasse as infra-estruturas
civis de modo a adaptá-las às necessidades militares” [2].
Em 15 de Fevereiro de 2018, o Conselho do Atlântico Norte, representado pelos
Ministros da Defesa dos países membros, anunciou o estabelecimento de um novo
Comando Logístico da NATO para “melhorar o movimento de tropas e equipamento
essencial para a defesa, na Europa” [3].
Cerca de um mês depois, a União Europeia apresentou o Plano de Acção sobre
mobilidade militar, que responde, exactamente, aos requisitos estabelecidos
pelo Pentágono e pela NATO.
O mesmo prevê “simplificar as
formalidades aduaneiras para as operações militares e para o transporte de
mercadorias perigosas do tipo militar”. Assim, prepara-se a “Área Schengen
militar” com uma diferença - para circular livremente, não se refere a pessoas
mas a tanques. Entretanto, deslocar tanques e outros veículos militares nas
estradas e caminhos de ferro não é o mesmo que fazer circular veículos e
comboios normais. “Portanto, as barreiras existentes à mobilidade militar devem
ser derrubadas” modificando-se as “infra-estruturas não adequadas ao peso ou
dimensão dos meios militares, em particular pontes e caminhos de ferro com
capacidade de carga insuficiente". Por exemplo, se uma ponte não for capaz
de suportar o peso de uma coluna de tanques, deverá ser fortalecida ou
reconstruída.
A Comissão Europeia irá
“identificar as partes da rede europeia de transportes adequadas ao transporte
militar, fazendo as mudanças necessárias”. Elas devem ser realizadas ao longo
de dezenas de milhares de quilómetros da rede rodoviária e ferroviária. O que
exigirá uma enorme despesa para os países membros, com uma “possível
contribuição financeira da União Europeia para tais obras”.
No entanto, seremos sempre nós,
os cidadãos europeus, a pagar estas “grandes obras”, inúteis para uso civil,
com os consequentes cortes nos gastos sociais e investimentos em projectos de
utilidade pública. Em Itália, onde os fundos para a reconstrução das zonas de
terremotos são escassos, biliões de euros terão de ser gastos para reconstruir
as infra-estruturas adequadas à mobilidade militar.
Os 27 países da União Europeia,
21 dos quais pertencem à NATO, são agora chamados a examinar o Plano. De facto,
a Itália teria possibilidade de rejeitá-lo. Mas isso significaria, que o
próximo governo, se opusesse não só à União Europeia, mas também à NATO sob
comando USA, começando por se desvincular da estratégia que, com a invenção da
ameaça russa, prepara a guerra, esta sim verdadeira, contra a Rússia. Seria uma
decisão política fundamental para o nosso país, mas, dada a sujeição aos EUA,
permanece no domínio da ficção política.
Manlio Dinucci* | Voltaire.net.org | Tradução Maria Luísa de
Vasconcellos | Fonte Il Manifesto
(Itália)
Foto: Recepção ao chefe da Comissão
Europeia. Se, em Bruxelas, a União europeia é uma burocacia mais ou menos
eficiente, o verdadeiro poder reside no exterior da cidade: na NATO.
*Geógrafo e geopolítico. Últimas
publicações : Laboratorio
di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di
viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte
della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016.
[1] Joint
Communication to the European Parlament and the Council on the Action Plan on
Military Mobility, JOIN(2018) 5 final, March 28, 2018.
[2]
“Press
conference by NATO Secretary General Jens Stoltenberg following the meeting of
the North Atlantic Council at the level of Defence Ministers”, NATO,
November 8, 2017.
[3]
« Les
ministres de la Défense des pays de l’OTAN prennent des décisions destinées à
renforcer l’Alliance », Otan, 15 février 2018.
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