Mariana Mortágua* | Jornal de Notícias
| opinião
Passou despercebido mas na
passada quinta-feira o Parlamento debateu e aprovou, na generalidade, por
iniciativa do Bloco, medidas importantes para promover a transparência e
combater o crime económico. Ainda há, sobretudo na Associação Portuguesa de
Bancos e no PSD, firme oposição à ideia de que a Autoridade Tributária deve ter
acesso a informação bancária relevante. Já em 2011 PSD e CDS se tinham abstido
na emenda que permitiu acesso facilitado do Ministério Público a dados
bancários no contexto de investigações criminais. Independentemente da sua
gestão mediática, os vários processos entretanto desencadeados reforçam uma
ideia simples: não há combate eficaz à fraude fiscal e ao crime económico se as
autoridades estiverem impedidas de aceder a dados bancários.
O segredo bancário tem de ser
salvaguardado sempre que estiver em causa o direito à privacidade pessoal,
reconhecido constitucionalmente. Mas não pode servir de abrigo àqueles que o
procuram para fugir aos impostos, à justiça, ou aos princípios de boa gestão
bancária. Sempre que assim é - e em Portugal tem-no sido com frequência - a
democracia sai fragilizada, porque nenhuma democracia resiste à sensação
generalizada de impunidade e injustiça.
As três amnistias fiscais criadas
em Portugal, duas no tempo de Sócrates e uma de Passos, são um bom exemplo. O
parágrafo que interessa é comum às três leis: "Nos limites do presente
regime, a declaração de regularização tributária não pode ser, por qualquer
modo, utilizada como indício ou elemento relevante para efeitos de qualquer
procedimento tributário, criminal ou contraordenacional, devendo os bancos
intervenientes manter sigilo sobre a informação prestada".
Devido a este parágrafo, cerca de
6000 milhões de euros puderam regressar ao país, pagar uma taxa inferior a
7,5%, e os seus beneficiários ficaram ilibados de quaisquer responsabilidades
sobre os motivos que os levaram a não declarar o dinheiro em Portugal. Um
pormenor simbólico: a última amnistia aconteceu mesmo antes da entrada em vigor
de acordos de troca de informação com vários países - como a Suíça - que iriam
permitir detetar as práticas entretanto amnistiadas pela mão do Governo
PSD/CDS.
Esta é uma das muitas razões
pelas quais era difícil levar a sério o mais recente amor do PSD à
transparência e escrutínio bancário. O voto contra o novo regime de troca de
informações só ajudou a desmontar a hipocrisia.
Para além deste regime, foram
ainda aprovadas diferentes propostas para que se conheçam os grandes devedores
em incumprimento de toda a Banca. Como escreveu recentemente Manuel Esteves,
editor do "Jornal de Negócios", "Se os bancos têm sido demasiado
grandes para falirem, então é preciso um escrutínio público maior sobre as suas
decisões de crédito. Se os devedores são tão grandes que mandam mais do que os
bancos, então devem ser conhecidos". Nem mais.
*Deputada do BE
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