Em entrevista à DW África,
Mustafah Dhada afirma, no entanto, que as eleições autárquicas são prova do
reforço do pluralismo no país. Sobre futuro da Guiné-Bissau, investigador
diz-se "otimista".
O rumo das negociações para a paz
efetiva em Moçambique é sinal de reconhecimento de que existem possibilidades
de uma convivência de pluralismo ideológico entre o Governo da FRELIMO e a
RENAMO, principal força da oposição. Quem o diz é o académico moçambicano
radicado nos Estados Unidos, Mustafah Dhada, que vê no recente
acordo alcançado entre as duas partes um factor positivo para a
estabilidade no país.
Em entrevista à DW África,
Mustafah Dhada afirma que a atual situação de Moçambique deve ser vista como
"uma fase muito pequenina de uma história que se está a desenvolver há já
vários anos".
No entanto, nota este
investigador, "agarrar-se a micro-desenvolvimentos para alcançar uma visão
de futuro de Moçambique é uma parvoíce". "Esta é apenas uma fase que
dará lugar a uma outra narrativa na história" do país, acrescenta.
Eleições autárquicas
O historiador moçambicano está
convencido de que "a influência da FRELIMO estará aí para décadas".
Ainda assim, acrescenta, existirão "forças que vão [fazer] deslocar esse
pensamento e este monopólio da FRELIMO. Isto é claro. Pluralismo significa
isso".
Mustafah Dhada prevê ainda que as
próximas eleições em Moçambique, agendadas para 10 de outubro, desencadeiem
atos de violência localizados, sem o suporte de uma estratégia ideológica
partidária. "Haverá violências, isto é claro, porque o país experimentou
isso", afirma.
Outro dos assuntos abordados
nesta entrevista foram os ataques armados que têm acontecido na província de
Cabo Delgado, no norte de Moçambique. Para Mustafah Dhada, o facto de
"Moçambique ter uma população dinâmica muçulmana" deve ser
"reconhecido como uma força e não, necessariamente, como uma evolução
recente. Vem de há séculos atrás".
Aos olhos deste moçambicano, o
que é complicado é "[a junção] desta primeira realidade histórica com uma
realidade bem política e ideológica numa parte, e noutra parte económica"
e que está relacionada também com a descoberta de importantes recursos naturais.
Mustafah Dhada concorda que há,
neste sentido, interesses externos subjacentes a tais ataques, mas sublinha que
é também importante não julgar isso "como um nódulo de desenvolvimento
desagradável para Moçambique". É que, reforça, todos os países africanos
estão agora muito mais vulneráveis às influências externas.
Mustafah Dhada considera
que as autoridades moçambicanas devem encarar o problema com prudência.
"O que devemos entender é que a reação e a resposta oficial deveria ser
também muito delicada e também complexa do ponto de vista de não satanizar o
que está a acontecer", diz.
Caso da Guiné-Bissau
Mustafah Dhada
esteve, recentemente na Guiné-Bissau, no âmbito de um trabalho académico
sobre a luta de libertação e a guerra colonial.
O país, governado por José Mário
Vaz, é muito mais frágil do que Moçambique do ponto de vista da
auto-sustentação, e está confrontado, diz o investigador, com a degradação
estrutural. "Não há um ânimo ao impulso de ver o país como uma
Nação-Estado, mas sim vê-se o país como um espelho partido, com pedaços que
singularmente faz sentido mas que, em conjunto, não lhe dá uma visão para
seguir em frente", explica.
A Guiné-Bissau prepara-se para as
eleições legislativas, agendadas para 18 de novembro próximo. Mustafah Dhada
diz poder medir a pulsação da sociedade guineense pelos contactos que fez com
alguns dos dirigentes políticos, nomeadamente, [elementos] do PAIGC, e que
lhe trouxeram algum otimismo. "Há uma camada de jovens no PAIGC que tem
uma visão extremamente democrática: de aprofundar as raízes que já
perderam ideologicamente do tempo de [Amílcar] Cabral; que tem uma visão
de balançar entre desenvolvimento económico e sócio-cultural do país",
afirma.
Mustafah Dhada acredita que esta
é uma oportunidade para a Guiné-Bissau e para o PAIGC "salvaguardarem
a herança de Amílcar Lopes Cabral" sob pena da "intervenção
militar [externa] ser tão brutal" que "possa [levar ao]
desaparecimento do país".
O investigador disse ainda
depositar muita confiança nos jovens para impulsionar as mudanças necessárias
no país, com a ajuda da comunidade internacional. No entanto, diz, "seria
difícil dizer se eles têm fibra e ética para conduzir publicamente [o país] com
fundos públicos e não utilizar isso para arrumar bolsos privados em benefício
próprio".
João Carlos (Lisboa) | Deutsche
Welle
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