terça-feira, 4 de setembro de 2018

Brasil | O legado do jornalista Júlio Prates de Castilhos para a política gaúcha


             
O Jornal A Federação (1884-1937) - Órgão do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) - reproduziu, em grande parte, o pensamento político de Júlio Prates de Castilhos (1860-1903), que preferia o manejo da pena ao discurso na tribuna parlamentar. Considerado o “príncipe do jornalismo político”, ele defendeu o conceito de que a imprensa não precisa limitar-se apenas ao registro do acontecimento político, mas pode ser o instrumento para modificar-lhe o curso.

Nascido no Rio Grande do Sul, a experiência jornalística de Júlio de Castilhos proveio de sua atuação no jornal estudantil A Evolução (1879). Gerado dentro do Clube 20 de setembro da Faculdade de Direito de São Paulo, neste jornal, aos 19 anos, ele já combatia o regime monárquico. Com o título “O Precoce jornalista Júlio de Castilhos” (2017), o artigo do doutor Antonio Hohlfeldt e do mestre. em Comunicação Social Fábio Rausch registra que, segundo a historiadora Helga Piccolo, entre junho e agosto de 1880, Júlio de Castilhos foi redator do jornal paulistano A República (1878-1882), oriundo também do ambiente acadêmico.
  
Aos 21 anos, já formado em Direito, ele retornou ao Rio Grande do Sul e, em 1882, fundou, com outros companheiros, o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR).

Como redator d’A Federação, ele escreveu  uma série de artigos, denominados de “Sophismas Liberais”. Nestes editoriais, que somam 16 textos e foram escritos no período de fevereiro a junho de 1884, ele defendeu e justificou a forma republicana como o modelo ideal de governo. 
   
Em 2005, os jornalistas Antônio Hohlfeldt e Fábio Flores Rausch realizaram, em Porto Alegre, no Museu da Comunicação Hipólito José da Costa, uma pesquisa na qual foram analisados estes editoriais d’A Federação escritos por Júlio de Castilhos. Trata-se de artigos, visando à desconstrução de três princípios básicos defendidos pelos monarquistas: “Não temos homens para a República”, “Temos liberdade demais” e “O exemplo das Repúblicas Sul-Americanas”.

Na opinião do jornalista e pesquisador Francisco Rüdiger, A Federação influenciou os acontecimentos e não somente os reproduziu. Cada edição era uma página de um Alcorão partidário. Ser um assinante do jornal era a credencial de um republicano.  

A Federação enfrentou oposição, especialmente, do jornal “A Reforma” (1869-1912).  Com este último ocorreram acirrados embates políticos entre Gaspar Silveira Martins (1835-1901) e Júlio de Castilhos (1860-1903).

Em 1885, A Reforma  também registrou debates do jornalista monarquista e anticlerical Carlos Von Koseritz (1830-1890), respondendo às críticas do líder republicano Júlio de Castilhos.
  
Proclamada a República (1889), Silveira Martins então presidente da Província, foi para o exílio na Europa. Em 1890, Júlio de Castilhos foi eleito deputado federal pelo Rio Grande do Sul, participando, como líder da bancada gaúcha, da Constituinte de 1891. Em 14 de julho de 1891, promulgou-se a primeira Constituição do Rio Grande do Sul. Escrita por Júlio Castilhos, tinha o caráter centralizador e foi inspirada na filosofia positivista de Augusto Comte (1798-1857). No dia seguinte à sua promulgação, ele assumiu a presidência do Estado.

Pressionado pela oposição devido ao fato de ter dado apoio ao presidente do Brasil Deodoro da Fonseca (1827-1892), quando este fechou o Congresso Nacional em 03/11/1891, Castilhos renunciou em 12/11/1891.

Com o seu afastamento, nosso Estado, até junho de 1892, viveu um período de crise política, pejorativamente, chamado de “Governicho” pelo próprio Júlio de Castilhos.  Reeleito, Castilhos foi empossado, em 25/01/1893, com o apoio do presidente da República marechal Floriano Peixoto (1839-1895), que assumiu o cargo após a renúncia do marechal Deodoro da Fonseca. A oposição gaúcha considerou o pleito uma fraude, recrudescendo o ódio partidário.  


Ao retornar para o Rio Grande do Sul, após o exílio, Silveira Martins fundou, em Bagé, em 1892, o Partido Federalista (PF) que defendia o unitarismo e o parlamentarismo. Reunindo os maragatos (lenço vermelho), que haviam sido alijados do poder, ele passou a liderar uma acirrada oposição aos Pica-Paus (lenço branco) representantes do poder castilhista.  

O debate político, por meio da imprensa, configurou-se, de forma inevitável, numa guerra fratricida, eclodindo a Revolução Federalista ou da Degola (1893-1895), que nos deixou o saldo de 10.000 mortes. Vencedor, o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR) consolidou o seu poder, por cerca de 40 anos, no cenário da política gaúcha.

* Pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Museu da Comunicação HJC

Imagens:
! - Julio de Castilhos / Gravura de  Ângelo Agostini / Revista Don Quixote 
2-  Constituição do Rio Grande do Sul / 1891  Tipografia de A Federação / Acervo Musecom 
3-   A Federação de 14-07-1884 / Acervo Musecom
4- Gaspar Silveira Martins

Artigo publicado no Almanaque Gaúcho / Zero Hora em 01/09/2018.
Bibliografia ;
BAKOS, Margaret (Org.) Júlio de Castilhos / Positivismo, Abolição e República. Porto Alegre: IEL, EDIPUCRS, 2006.
FRANCO, Sérgio da Costa. Júlio de Castilhos e sua época. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 1988.
------------------------------------  Dicionário Político do Rio Grande do Sul /1821-1937. Porto Alegre: Suliani Letra & Vida, 2011.
FREITAS, Décio. O homem que inventou a ditadura no Brasil. Porto Alegre: Sulina, 2000.
LEITE, Carlos Roberto Saraiva da Costa. História da Imprensa.  In: “Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa – 30 anos”. Porto Alegre: CORAG, 2004.

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