segunda-feira, 10 de setembro de 2018

PSL ou as “araras do regime”


Alfredo Barroso  | Jornal i | opinião

No antro mediático das “araras do regime”, expressão utilizada por ele próprio, Pedro Santana Lopes deixou de ser o genius loci desde que Marcelo Rebelo de Sousa foi eleito Presidente da República e decidiu beijocar, lambuzar, abraçar, sufocar diariamente milhões de portugueses até mais não poder. Outra das mais conhecidas “araras do regime”, igualmente candidato a genius loci, é o frenético Luís Marques Mendes, também ex-presidente do PPD-PSD, além de ex-ministro de Cavaco, com espaço reservado há muito num canal de TV - como todas as “araras velhas” do PPD-PSD que se prezam -, mas que ainda não percebeu que não é por muito esbracejar que melhor convence os telespectadores com as suas balelas e patranhas semanais, ou que mais expande a sua inteligência como aquele velho chupa-chupa a que, quando eu era miúdo, chamávamos “estica-larica”.

Estes três exemplares do PPD-PSD, considerados velhas “araras” mediáticas do regime, não gostaria de tratá-los como aves de bicos muito curvos e fortes que os ajudam a trepar na política. Ainda menos como plantas ornamentais cultivadas em Portugal. Ou como patetas ou pessoas ingénuas. Nada disso! Prefiro tratá-los (sobretudo Pedro Santana Lopes nesta nova etapa da sua vida mediática) como demagogos “telepopulistas”, produtos do “videopoder” ou da “videopolítica”, que se comportam como actores “telegénicos” (Marques Mendes nem por isso, porque esbraceja muito, é um caso deplorável de overacting!), todos eles ocupando com regularidade os ecrãs de televisão em horas de grande audiência e optando pelo “espectáculo televisivo” em detrimento das mediações tradicionais (deliberações, debates parlamentares, confrontação pública de ideias e programas, etc.).

Os média têm-se substituído aos partidos políticos quer como mecanismos de selecção da classe política, quer como instrumentos de mobilização da opinião e de definição da agenda política. Tudo isto afecta claramente o funcionamento e a orientação da democracia, transformando-a cada vez mais numa “democracia de opinião” ou, pior ainda, numa “democracia demagógica”. Tanto nos EUA como em várias democracias europeias, temos assistido à emergência daquilo a que muitos sociólogos e politólogos chamam neopopulismo mediático e plebiscitário. Como sucedeu, por exemplo, em Itália, e salienta o politólogo Mario Caciagli, o caminho tem sido linear: “Da democracia referendária passou-se à democracia plebiscitária e, desta, à democracia demagógica.” Portugal ainda é excepção. Ainda…

Os demagogos “telegénicos” e “telepopulistas” dizem que falam directamente ao “povo” (regra geral, reduzido ao público de telespectadores); pretendem situar-se fora do sistema de partidos (onde quase sempre não foram politicamente felizes); optam por um discurso antipartidos e costumam “denunciar” as elites no poder (Santana Lopes diz, por exemplo, que “há vários que se julgam donos disto tudo” e que, com ele, “vão deixar de o ser”!); e anunciam, finalmente, programas políticos reduzidos a fórmulas vagas e a promessas impossíveis de cumprir, o que não impede, infelizmente, que alguns tenham sido eleitos presidentes ou primeiros-ministros. O populismo, com toda a sua retórica demagógica, coloca em causa a própria existência da mediação política centrada nas instituições representativas. O populismo pode ser, de facto, a corrupção ideológica da democracia.

Foi, contudo, por esta via que Santana Lopes decidiu enveredar, porventura em busca duma “arca” da “Aliança” capaz de conter - sabe-se lá - as partituras dos até agora inexistentes “concertos para violino de Chopin” e, sobretudo, do segredo do supremo poder que nunca logrou alcançar enquanto militante e dirigente do PPD-PSD. Para tanto, PSL resolveu fazer “tábua rasa” do seu passado - péssimo primeiro-ministro, mau secretário de Estado da Cultura, desastrado presidente do Sporting e autarca esbanjador quer na Figueira da Foz quer em Lisboa -, optando, evidentemente, por um discurso de “denúncia” duma classe política a que sempre pertenceu (e que tantas vezes contribuiu para desacreditar). Tudo isto para gáudio do universo mediático doméstico sedento de “espectáculo” e hoje dominado pela plutocracia e por jornalistas profissionais que já nem escondem o desejo do regresso da direita ao poder e vão mesmo ao ponto de enumerar “as razões para a esquerda voltar à oposição”. É verdade, podem crer!

É claro que Pedro Santana Lopes, nesta sua nova etapa como dirigente político populista e demagogo, precisa em absoluto de manter o palco mediático que as TV e os jornais nunca se recusaram a oferecer-lhe até agora. Todavia, quaisquer que sejam as razões que hoje nos levem a criticar José Sócrates, será bom não esquecer que este, in illo tempore, fez Santana Lopes num oito, obtendo para o PS a primeira maioria absoluta. Mas é bem provável que António Costa nem precise de fazer outro tanto se apanhar pela frente o chefe da “Aliança» - isto não ignorando as sucessivas derrotas que PSL sofreu dentro do PPD-PSD, por exemplo face ao seu “amigo” Durão Barroso e ao seu “inimigo” Rui Rio. Como diria o cego, a ver vamos se Pedro Santana Lopes terá algum êxito como demagogo populista. É, aliás, uma vocação que entronca a preceito nas suas primordiais convicções ideológicas de juventude, quando era um activista de extrema-direita…
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*ARARA - 1. ORNITOLOGIA Ave da família dos Psitacídeos, de bico muito curvo e forte que a auxilia quando trepa; 2. BOTÂNICA Planta ornamental da família das Amarantáceas, cultivada em Portugal; 
3. FIGURATIVO Pateta, pessoa ingénua, mentira, peta, patranha, galga, logro, mentirola, balela.
Escreve sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990

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