quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Portugal | Água mole em pedra dura tanto bate que não fura


Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

A Galp Energia e a ENI desistiram do projeto de exploração de petróleo ao largo de Aljezur. Apesar da conivência do atual Governo - que tentou reverter a providência cautelar ganha pelos movimentos sociais - a persistência destes, em conjunto com as autarquias, foi mais forte.

Recordemos o que estava em causa. A exploração e prospeção de petróleo em Aljezur implicava fazer furos até 3km de profundidade na orla costeira, com graves riscos ambientais. Do ponto de vista financeiro, a concessão garantia à Galp e à ENI todos os lucros do petróleo encontrado em solo português. Do ponto de vista ambiental, o desejável mesmo é que ele não seja encontrado. Para combater as alterações climáticas, será preciso garantir que o planeta não consuma 80% das reservas de combustíveis fósseis identificadas. Acrescentar novas reservas sem levar estes limites em conta seria, para além de irresponsável, absolutamente incoerente com o discurso do Governo, que diz querer ter um país "carbono zero" até 2050.

A aposta no petróleo é errada no presente e está condenada no futuro. Para atingir os seus objetivos ambientais, o país precisa de valorizar os recursos naturais e investir em alternativas energéticas. Isso mesmo tem sido defendido pelas associações ambientalistas, pelos movimentos sociais e municípios que, numa genuína preocupação com o território, sempre rejeitaram este projeto.

A oposição popular ao furo de Aljezur ficou bem expressa no âmbito duas consultas públicas. Em 2016, o projeto foi rejeitado por 42 mil pessoas e, um ano depois, todos os municípios atingidos reiteram essa mesma oposição.

Em janeiro de 2017, em Washington, a ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, dava as boas-vindas ao investimento americano em exploração de petróleo em Portugal. Aqui, segundo a ministra, não havia movimentos "contra este tipo de exploração porque estamos a fazer a coisa silenciosamente".

A ministra enganou-se. Os movimentos existiam e, em conjunto, conseguiram travar a exploração de petróleo ao largo de Aljezur que, para além de um crime ambiental, era também um mau negócio. Agora falta aprovar uma lei pelo clima, que impeça novas concessões e cumpra a exigência de sobrevivência para o planeta: deixar o combustível fóssil no solo.

*Deputada do BE

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