terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

DEPOIS DAS “DEMOCRACIAS DE MERCADO” - Boaventura


O regime que era opção das elites desde a queda do Muro de Berlin regrediu, após 2008, para uma democracia esvaziada. Mas é apenas um interregno. Virá um novo momento, ainda incerto

Boaventura de Sousa Santos | Outras Palavras | Imagem: Paul Robeyrolle, Liquidação (1999)

Estamos num interregno. O mundo que o neoliberalismo criou em 1989 com a queda do Muro de Berlim terminou com a primeira fase da crise financeira (2008-2011) e ainda não se definiu o novo mundo que se lhe vai seguir. O mundo pós-1989 teve duas agendas com um impacto decisivo em todo o mundo. A agenda explícita foi o fim definitivo do socialismo enquanto sistema social, econômico e político liderado pelo Estado. A agenda implícita consistiu no fim de qualquer sistema social, econômico e político liderado pelo Estado.

Esta agenda implícita foi muito mais importante que a explícita, porque o socialismo de Estado estava já agonizante e, desde 1978, procurava reconstruir-se na China enquanto capitalismo de Estado na sequência das reformas promovidas por Deng Xiaoping. O efeito mais direto do fim do socialismo de tipo soviético na esquerda foi o ter desarmado momentaneamente os partidos comunistas, alguns deles há muito já distanciados da experiência soviética. A agenda implícita foi a que verdadeiramente contou; por isso, teve que ocorrer de maneira silenciosa e insidiosa, sem queda de muros. Assistiu-se, depois de 1989, à difusão sem precedentes da ideia da crise da social-democracia, que implicava uma forte intervenção do Estado na concessão de direitos sociais e econômicos. A secundá-la, a ortodoxia neoliberal doutrinava sobre o caráter predador ou, pelo menos, ineficiente do Estado e da regulação estatal.

O desarme da social-democracia foi disfarçado durante algum tempo pela nova articulação das formas de dominação que vigoram no mundo desde o século XVII: capitalismo, colonialismo e patriarcado. As reivindicações sociais passaram a orientar-se para as agendas ditas pós-materiais, os direitos culturais ou de quarta geração. Estas reivindicações eram genuínas e denunciavam modos de opressão e de discriminação repugnantes. Incidiam especificamente em dois eixos da dominação, o colonialismo (racismo, monoculturalismo) e o patriarcado (sexismo e hetero-sexismo).

O modo como as reivindicações foram orientadas fez crer aos agentes políticos que as mobilizaram (movimentos sociais, ONGs, velhos e novos partidos) que podiam levá-las a cabo com êxito sem tocar no terceiro eixo da dominação – o capitalismo. Houve mesmo uma negligência do que se foi chamando política de classe (igualdade, distribuição) em favor das políticas de raça e sexo (reconhecimento da diferença). Essa convicção provou-se fatal no momento em que o regime pós-1989 caiu. A dominação capitalista, reforçada pela legitimidade que criou nestes anos, virou-se facilmente contras as conquistas anti-racistas e anti-sexistas na busca incessante de maior acumulação e exploração. E estas, desprovidas da vontade anti-capitalista ou separadas das lutas anti-capitalistas, sentiram e sentem muitas dificuldades para resistir.

Nestes anos de interregno resulta evidente que a agenda implícita visava dar total prioridade ao princípio do mercado na regulação das sociedades modernas em detrimento do princípio do Estado e da comunidade. No início do século XX, o princípio da comunidade fora secundarizado em favor da rivalidade que então se instalou entre os princípios do Estado e do mercado. A relação entre ambos foi sempre muito tensa e contraditória. A social-democracia e os direitos econômicos e sociais significaram momentos de trégua nos conflitos mais agudos entre os dois princípios. Esses conflitos não eram resultado de meras oposições teóricas. Resultavam das lutas sociais das classes trabalhadoras que procuravam encontrar no Estado o refúgio mínimo contra as desigualdades e os despotismos gerados pelo princípio de mercado. A partir de 1989, o neoliberalismo encontrou o clima político adequado para impor o princípio do mercado, contrapondo a sua lógica à lógica do princípio do Estado, que foi  colocado na defensiva.

A globalização neoliberal, a desregulação, a privatização, os tratados de livre comércio, o papel inflacionado do Banco Mundial e do FMI foram sendo executadas paulatinamente para erodir o princípio do Estado, quer retirando-o da regulação social, quer convertendo esta numa outra forma de regulação mercantil. Para isso, foi necessária uma desvirtuação radical mas silenciosa da democracia. Esta, que no melhor dos casos fora encarregada de gerir as tensões entre o princípio do Estado e o princípio do mercado, passou a ser usada para legitimar a superioridade do princípio do mercado e, no processo, transformar-se ela própria num mercado (corrupção endêmica, lobbies, financiamento de partidos, etc.). O objetivo era que o Estado passasse de Estado capitalista-com-contradições a Estado capitalista-sem-contradições. As contradições passariam a ser exteriorizadas para a sociedade, e as crises sociais a serem resolvidas como questão de polícia e não como questão política.

Vivemos, pois, um período de interregno. Não sei se este interregno gera fenômenos mórbidos como o interregno famosamente analisado por Gramsci. Mas tem certamente assumido características profundamente dissonantes entre si. Nos últimos cinco ou dez anos, a atividade política em diferentes países e regiões do mundo adquiriu facetas e traduziu-se em manifestações surpreendentes ou desconcertantes.

Eis uma seleção possível:

o agravamento sem precedentes da desigualdade social e a passagem da riqueza envergonhada para a riqueza ostentada;

a intensificação da dominação capitalista (erosão dos direitos sociais), colonialista (intensificação do racismo, xenofobia, islamofobia, anti-semitismo) e patriarcal (sexismo, feminicídio) traduzida no que chamo fascismo social em suas diferentes formas (fascismo do apartheid social, fascismo contratual,  fascismo territorial, fascismo financeiro, fascismo da insegurança);

a reemergência do colonialismo interno na Europa com um país dominante, a Alemanha, que se aproveitar da crise financeira para transformar os países do sul numa espécie de protetorado informal, particularmente gritante no caso da Grécia;

o golpe judiciário-parlamentar contra a Presidente Dilma Rousseff, um golpe continuado com o processo de impedimento da candidatura de Lula da Silva às eleições presidenciais de 2018;

a saída unilateral do Reino Unido da União Europeia;

o fim presumível do conflito armado na Colômbia;


o colapso ou crise grave do bipartidismo centrista em vários países, da França à Espanha, da Itália à Alemanha;

a emergência de partidos de tipo novo a partir de movimentos sociais ou mobilizações anti-política, como o Podemos na Espanha, Cinco Stelle na Itália, AAP na Índia, Alternative für Deutschland na Alemanha; a constituição de um governo de esquerda muito moderado em Portugal com base num entendimento sem precedentes entre diferentes partidos de esquerda;

a eleição presidencial de homens de negócios bilionários com fraca ou nula experiência política, apostados em destruir a proteção social que os Estados têm garantido às classes sociais mais vulneráveis, sejam eles Macri na Argentina ou Trump nos EUA;

o ressurgimento da extrema-direita na Europa com o seu tradicional nacionalismo de direita, mas surpreendentemente portadora da agenda das políticas sociais que tinham sido abandonadas pela social-democracia, com a ressalva de agora valerem apenas para “nós” e não para “eles” (imigrantes, refugiados);

a infiltração de comportamentos fascistizantes em governos democraticamente eleitos, como, por exemplo, na Índia do BJP e do presidente Modi, nas Filipinas de Duterte, nos EUA de Trump, na Polônia de Kaczynski, na Hungria de Orban, na Rússia de Putin, na Turquia de Erdogan, no México de Peña Nieto;

a intensificação do terrorismo jihadista que se proclama como islâmico;

a maior visibilidade de manifestações de identidade nacional, de povos sem Estado, nacionalismos de direita na Suíça, e na Áustria, nacionalismos com fortes componentes de esquerda na Espanha (Catalunha mas também País Basco, Galiza e Andaluzia) e na Nova Zelândia, e nacionalismos dos povos indígenas das Américas que se recusam a ser encaixados na dicotomia esquerda/direita;

a agressividade sem paralelo na gravidade e na impunidade da ocupação da Palestina pelo Estado colonial de Israel;

as profundas transformações internas combinadas com estabilidade (pelo menos aparente) em países que durante muito tempo simbolizaram as mais avançadas conquistas das políticas de esquerda, da China ao Vietnã e a Cuba;

o colapso por uma combinação de erros próprios e interferência grave do imperialismo norte-americano de governos progressistas que procuraram combinar desenvolvimento capitalista com a melhoria do nível de vida das classes populares, no Brasil, Argentina e Venezuela; o novo rosto e a nova tática do imperialismo norte-americano que, em vez de impor ditaduras por via da CIA e forças militares, promove e financia iniciativas de “democracia-amiga-do mercado” através de organizações não-governamentais ultra-liberais e evangélicas e de desenvolvimento local, protestos com slogans ofensivos para as personalidades, os princípios e as políticas de esquerda, protestos na medida do possível pacíficos, mas que, em situações mais tensas, pode envolver ações violentas que depois, com a cumplicidade das mídias nacionais e internacionais, são atribuídas aos governos hostis, isto é, governos hostis aos interesses norte-americanos.

Este elenco deixa de fora os problemas sociais, econômicos e ecológicos que talvez mais preocupem os democratas em todo o mundo, tal como não menciona a violência familiar, urbana, rural ou a proliferação das guerras não-declaradas, embargos não declarados, o terrorismo e o terrorismo de Estado que estão destruindo povos inteiros (Palestina, Líbia, Síria, Afeganistão, Iêmen) e a convivência pacífica em geral. Neste sentido, este elenco é um elenco de sintomas e não de causas.

Mesmo assim, serve-me para mostrar as características principais do interregno em que nos encontramos: a democracia liberal nunca teve capacidade para se defender dos anti-democratas e fascistas com os mais diversos disfarces; mas hoje o que mais surpreende não é essa incapacidade; são antes os processos de incapacitação movidos por uma força transnacional altamente poderosa e intrinsecamente antidemocrática – o neoliberalismo (capitalismo como civilização de mercado, de concentração e de ostentação da riqueza), cada vez mais geminado com o predomínio do capital financeiro global, a que tenho chamado o “fascismo financeiro”, e acompanhado por um cortejo impressionante de instituições transnacionais, lobistas e meios de comunicação social.

Estes novos (de fato, velhos) inimigos da democracia não querem substitui-la pela ditadura. Em vez disso, buscam descaracterizá-la ao ponto de ela se transformar na reprodutora mais dócil e na voz mais legitimadora dos seus interesses. Mas, como ilustra o elenco de sintomas acima, é um processo com muitas contradições.

O que virá depois deste interregno?

* Boaventura de Sousa Santos é doutor em sociologia do direito pela Universidade de Yale, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, diretor dos Centro de Estudos Sociais e do Centro de Documentação 25 de Abril, e Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa - todos da Universidade de Coimbra. Sua trajetória recente é marcada pela proximidade com os movimentos organizadores e participantes do Fórum Social Mundial e pela participação na coordenação de uma obra coletiva de pesquisa denominada Reinventar a Emancipação Social: Para Novos Manifestos.

Politização dá o tom no carnaval do Rio de Janeiro


Sete das 13 escolas do Grupo Especial carioca escolheram enredos de cunho político-social.

João Soares*

A folia que toma conta do Rio de Janeiro é marcada por uma forte politização, no Sambódromo e nas ruas. Na avenida, será a mais intensa observada em quase três décadas. Entre as 13 escolas de samba do Grupo Especial, a elite do Carnaval carioca, sete irão apresentar enredos de cunho político-social.

Enquanto a Beija-flor lembra os "filhos" abandonados pela pátria, a Mangueira exalta a cultura de rua como expressão não alienada. A São Clemente, por sua vez, lembra o incêndio no prédio da Escola de Belas Artes da UFRJ, ainda sem solução. O desfile do Grupo Especial começa na noite de domingo 11.

Vencedoras da edição anterior, Mocidade Independente e Portela bradam contra a intolerância e reivindicam a integração entre os povos. Já o Paraíso do Tuiuti lembra as novas formas de cativeiro, ao passo que o protagonismo das mulheres negras é tema central na escolha do Salgueiro.

O último boom de enredos politizados havia sido observado na redemocratização, período que tem como marco o tema escolhido pela Imperatriz Leopoldinense em 1989. Com "Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós", a escola exaltava os 100 anos da proclamação da República.

Pesquisador do Carnaval, o historiador Luiz Antonio Simas esclarece que a festa sempre reflete a conjuntura do país ou da cidade: "É uma festa tensionada. Na época da abolição, os Carnavais abordaram o tema com muita força. O mesmo aconteceu durante a Segunda Guerra Mundial."

A politização dos enredos neste ano ocorre justamente após um corte de 50% na verba destinada pela prefeitura do Rio às escolas. Em vez de R$ 2 milhões, cada escola passou a receber R$ 1 milhão anual.

Na época da redução, o prefeito Marcelo Crivella argumentou que o dinheiro poupado poderia ser usado para a alimentação de crianças nas creches do município em 365 dias do ano, em vez de numa festa que dura apenas três dias.

A decisão inspirou o carnavalesco da Mangueira, Leandro Vieira, a idealizar o enredo "Com dinheiro ou sem dinheiro, eu brinco" para este ano.

"A motivação é o avanço do pensamento conservador na política nacional, que ficou evidente no Rio com a chegada do Crivella à prefeitura. Existe uma tentativa de enfraquecer as manifestações culturais da cidade, e o enredo é uma resposta a isso. É um posicionamento político as escolas desfilarem neste ano", afirma.

Simas, por sua vez, ressalta que a crise das escolas é bem anterior ao início da atual gestão municipal. "A partir dos anos 1960, elas começam a se virar para a indústria do turismo e entretenimento. Esse movimento chega a um ápice 30 anos depois, com os enredos patrocinados. Assim, foram perdendo as relações de afeto com a sociedade", diz o historiador.

O historiador acrescenta que, em um contexto de crise econômica e sem o apelo popular de outras épocas, as agremiações se viram obrigadas a buscar uma reaproximação de suas bases. "É a única forma de recuperarem o protagonismo. Paradoxalmente, a crise pode salvar as escolas."

Todavia, seria um engano pensar que a politização continuará em alta nos enredos dos próximos carnavais. "A cultura da malandragem não é do enfrentamento. As escolas sempre negociaram com as circunstâncias, desde 1930. Uma escola que traz um enredo de cunho social neste ano pode falar de uma empresa de tubulação no próximo Carnaval", diz Simas.

Humor como forma de protesto

No Carnaval de rua, a politização da festa já é sentida há mais tempo. Blocos com décadas de tradição, como Simpatia é Quase Amor e Barbas, foram criados no contexto da redemocratização, assim como a Sebastiana, associação que reúne blocos da Zona Sul e Centro do Rio.

Em 2014, na esteira da efervescência de junho do ano anterior, foi criado o Ocupa Carnaval, movimento que reúne 35 blocos do Rio e desfila em dois dias da festa com seu próprio cortejo. Todos os anos, paródias de marchinhas tradicionais são atualizadas para o contexto político do momento.

"Por meio de brincadeiras lúdicas, que aproveitam o humor, a arte e a alegria, fazemos política. Reunimos coletivos que veem no Carnaval um meio de lutar contra a mercantilização da cidade e defender a ocupação das ruas", explica Tomás Ramos, saxofonista que toca em diversos blocos da cidade.

A presidente da Sebastiana, Rita Fernandes, identifica uma politização mais forte dos blocos neste ano, fruto da situação política nacional e regional. Além das reivindicações contra todas as formas de intolerância e pelo direito de ocupar as ruas, a associação levanta a bandeira "Fora, Crivella" neste ano.

"O Carnaval de rua corre o risco de acabar no Rio. Organizamos os blocos por amor à festa e à cidade, não somos profissionais. Fomos proibidos de ter patrocinadores que não sejam os oficiais do evento, e o endividamento está no limite do impossível. Além disso, não há diálogo com a Riotur [Empresa de Turismo do Município]", critica.

Fernandes diz que só foi convidada para uma reunião com a Riotur para discutir o Carnaval deste ano. Procurada, a assessoria do órgão alega que foram realizadas mais de dez reuniões entre a Riotur e a representante da Sebastiana durante o período do pré-Carnaval, assim como encontros com outras associações de blocos.

"Não é não"

A tendência global de mobilizações femininas pela conscientização sobre o assédio contra a mulher encontra ressonância no Carnaval de rua do Rio. Desde o ano passado, o coletivo "Não é não" distribui tatuagens temporárias às foliãs com a frase que dá nome ao movimento. No ano passado, três mil foram entregues na cidade.

Neste ano, foi organizado um financiamento coletivo, e o número de tatuagens subiu para 27 mil. Além disso, a campanha foi expandida para Bahia, Distrito Federal, Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco.

"A escolha da tatuagem em vez do adesivo serve para mostrar que o assédio é sentido na nossa pele. Nosso objetivo é conscientizar, mas também formar uma rede de apoio entre mulheres", diz Luka Borges, uma das idealizadoras da iniciativa. "Tivemos a ideia quando uma amiga foi assediada em uma roda de samba e percebemos que todas tínhamos um caso, mas não falávamos sobre isso."
No ano passado, as denúncias de violência sexual aumentaram em 90% na cidade. Por isso, a Comissão de Defesa da Mulher na Câmara dos Vereadores do Rio criou a campanha #CarnavalSemAssédio. Serão distribuídos 250 mil leques de papel com a mesma mensagem inscrita nas tatuagens.

"No verso, há um passo a passo sobre como proceder em caso de assédio. O público-alvo são as mulheres, mas a ideia é alcançar os homens também. A gente não rompe com esse processo de machismo se não dialogar com eles. Pensamos no leque pela utilidade prática no verão carioca”, detalha Marielle Franco, presidente da Comissão.

Deutsche Welle | em Carta Capital

Imagem: Após ausência no ano passado, Crivella marcou presença na entrega das chaves da cidade para o Rei Momo | Foto: Mauro Pimentel/AFP

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Abre alas, elas querem passar (sem assédio)

BRASIL | A folia antidemocrática em tempos de golpe


Joaquim Ernesto Palhares* | Carta Maior

Neste ano, a Constituição de 1988 completa três décadas de existência. Trinta anos se passaram e em vez de comemorarmos, mais uma vez, estamos na trincheira em defesa dos princípios que a inspiraram. O ataque é descarado e episódios inimagináveis naquele momento se tornam realidade.

Retrocesso de direitos, ameaça à soberania nacional, perseguição política, condenações sem provas e excrescências como a liberação, pela juíza Daniela Pazzeto Meneghine Conceição da 39ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, de um bloco de carnaval intitulado “Porão do DOPS”, com explícita apologia à tortura e a seus carrascos (leia nota de repúdio), compõem o indigesto cardápio imposto a todos pelos golpistas.

Em meio ao desmonte, escancaram-se as fissuras das instituições criadas para proteger e não atacar o Estado Democrático de Direito. O comportamento da imprensa, após os resultados da pesquisa Datafolha na última semana, é exemplar. Não apenas pedem a prisão de Lula, que detém preferência de 37% do eleitorado, mas levantam falsas suspeitas, incensando uma fuga do ex-presidente e utilizam do expediente canalha de sempre, vide a reportagem “As mortes que rondam o edifício do tríplex de Lula”, da Isto É (se tiver estômago, clique aqui).

Quem irá conter tamanha violência? Certamente não será o nosso Judiciário, infestado de promotores e juízes midiáticos em busca de popularidade. Funcionários públicos que, sem constrangimentos, fazem política em vez de justiça, condenam sem provas e invertem princípios do Direito, como estamos vendo com a utilização às avessas do chamado “domínio do fato”.

Não nos esqueçamos da AP 470, quando o jurista alemão Claus Roxin, autor da teoria do domínio do fato, manifestou-se contra a utilização deste princípio pela Corte Suprema brasileira, afirmando que “a posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato” e que “quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado” (saiba mais).

Como bem destaca Guilherme Boulos, em Supremo ou pequeno?, “o Supremo, tão chamuscado pela omissão diante dos desvarios da República de Curitiba, se apequenará ainda mais caso não reveja a sentença do TRF4. Esperemos que não. Permitir a condenação de Lula do modo como ocorreu e – ainda mais grave – não agir para evitar sua prisão transformará, no entanto, o STF num Pequeno Tribunal Federal”.

Após o julgamento da AP 470, do impeachment de Dilma Rousseff, da condenação de Lula e tantas outras atrocidades, quem cobrará que a Justiça faça o seu trabalho? A imprensa, reduzida em aparato político pronto a manipular, ocultar ou turbinar notícias de acordo com seus interesses? Aliás, aos que preferem descanso à folia, está em cartaz “The Post – A Guerra Secreta”, o último filme do Steven Spielberg, sobre a divulgação dos documentos do Pentágono (Pentagon Papers) na imprensa sobre a Guerra do Vietnã (saiba mais).

Encomendados por Robert MacNamara, ex-secretário de defesa de Nixon, a divulgação desses documentos foi fundamental para destruir a narrativa de Nixon sobre a Guerra. Isso só foi possível porque Daniel Ellsberg, ex-analista militar norte-americano e funcionário do Pentágono, copiou e entregou os documentos à imprensa que os divulgou. Em 2015, Ellsberg foi laureado para o Nobel da Paz e veja só: ele acaba de assinar o manifesto “Eleição Sem Lula é Fraude!”.

Quem traz a boa nova é o diplomata Celso Amorim no artigo Perda irreparável. “Até que ponto se pode esperar que algum Daniel Ellsberg denuncie a trama diabólica para barrar o ideal de um país justo e independente, representado pelos governos petistas (apesar dos eventuais erros que possam haver sido cometidos) é uma questão em aberto”, avalia Amorim.

Além de Ellsberg, também assinaram o manifesto os filhos de Julius e Ethel Rosenberg, injustamente acusados de passar segredos militares à União Soviética. O casal foi levado à cadeira elétrica nos Estados Unidos. “O caso provocou, à época, comoção mundial, em razão da insuficiência das provas e à evidente ´armação´ das autoridades americanas para incriminar o casal”, lembra Celso Amorim.

Uma armação jurídica, como a que estamos vendo hoje. “É exasperante constatar que funcionários públicos investidos na função de administrar a justiça possam, ignorando normas e princípios legais consolidados, produzir um resultado que afeta diretamente o direito de uma sociedade escolher o seu soberano representante”, afirma Carol Proner, professora de Direito de UFRJ e organizadora do livro “Comentários a uma sentença anunciada. O processo Lula”, em seu artigo O lawfare neoliberal e o sacrifício de Lula.

Recomendamos também Fale Lula fale, há um grito de resposta engasgado no ar, editorial de Saul Leblon que avalia o comportamento da direita, destacando que “mais que prender, é preciso calar a voz rouca [de Lula] e tudo o que ela simboliza no imaginário dos deserdados”, afinal, a figura de Lula “condensa um método pacífico de luta pelo desenvolvimento, mas que empurrou os limites da negociação até o ponto em que se tornou necessário erguer linhas de passagem para um outro estirão, onde a busca da justiça social convoca a democracia participativa a entrar no jogo”.

E voltamos, novamente, à questão da democracia. Daí a importância dos ensinamentos do professor Boaventura de Sousa Santos que, em O novo interregno, mostra como a democracia vem sendo “radicalmente desvirtuada pelo neoliberalismo global” a partir de 1989. O objetivo? “Erodir o princípio do Estado, quer retirando-o da regulação social, quer convertendo esta numa outra forma de regulação mercantil”.

Não deixe de ler, também, Redes sociais: como regular sem censurar, reportagem de Anahit Miridjanian, publicada no Libération, que traduzimos para você. Uma discussão importante sobre o discurso de ódio na web e a enxurrada de fake news feita por especialistas da França, Itália, Alemanha e Estados Unidos. A preocupação é tamanha que a Alemanha adotou uma lei que obriga Twitter, Facebook e YouTube a remover um conteúdo indesejado em 24 horas, sob risco de multas de até 50 milhões de euros.

Como já dissemos, aqui, várias vezes, a única saída contra o ataque das fake news e o fechamento de espaço para a mídia alternativa nas redes sociais é nos mantermos fortemente conectados. Inscreva-se no nosso cadastro e receba nossos Boletins, por e-mail, com os destaques de cada dia.  E não se esqueça de contribuir para a continuidade deste projeto que há mais de 17 anos vem disseminando o melhor do pensamento da esquerda brasileira e internacional.: torne-se um parceiro doador da Carta Maior (saiba as opções de colaboração aqui).

Boas leituras,

*Joaquim Ernesto Palhares - Diretor da Carta Maior

Créditos da foto: Reprodução

Angolanos criticam contratação de professores cabo-verdianos


"Uma pouca vergonha e uma aberração". É assim que o Sindicato dos Professores classifica a intenção de Angola de contratar professores cabo-verdianos para ensinar no país. Um tema que está a gerar muita contestação.

As primeiras reações ao anúncio da intenção de envio de professores cabo-verdianos para o ensino secundário em Angola surgiram nas redes sociais. No Facebook, muitos internautas angolanos teceram críticas ao Governo sobre a possível assinatura de um acordo entre os dois países lusófonos. As reações estendem-se agora a outros segmentos da sociedade.

O presidente do Sindicato dos Professores Angolanos (Sinprof), Guilherme Silva, em declarações à DW África, manifestou o seu decontentamento, afirmando que o Sindicato reagiu "negativamente" à contratação de professores expatriados sejam de que país for.

 "Independentemente de Cabo Verde ter um Índice de Desenvolvimento Humano superior ao de Angola, onde a qualidade do ensino é de facto notória, ainda assim, nós não concordamos", argumenta Guilherme Silva.

O sindicalista lembra que existem no país e no estrangeiro muitos professores nacionais formados e que se encontram no desemprego. Por isso, considera a medida do Estado angolano "uma pouca vergonha e uma autêntica aberração".

Lembra ainda que há no mercado de trabalho angolano "milhares de jovens formados em escolas vocacionadas para a docência do nível médio ou superior".

Em declarações ao jornal cabo-verdiano "Expresso das Ilhas, o ministro dos negócios estrangeiros e comunidades de Cabo Verde Luís Filipe Tavares, que esteve de visita a Angola, já desvalorizou as críticas dos cidadãos.

"Dignidade para os homens do giz"

Os professores angolanos debatem-se com vários problemas, desde a falta de condições de trabalho aos baixos salários. Estão em curso com o Ministério da Educação negociações sobre as propostas do Estatuto da Carreira Docente e do Regulamento de Transição e Regime de Avaliação do Desempenho, dois importantes instrumentos, que segundo Guilherme Silva, "deverão devolver a dignidade aos homens do giz".   

Durante as negociações, o Sinprof espera que os estatutos sejam aprovados até março de 2018 e publicados em Diário da República. "E em maio vermos refletido nas categorias dos professores a transição para o futuro da carreira docente", afirma ainda o presidente do Sindicato.

Se isso não vier a acontecer, Guilherme Silva adianta que o Sinprof vai retomar a greve nacional de "Cabinda ao Cunene, do Luau ao Lobito".

No ano passado, os professores do ensino geral fizeram uma greve a favor do aumento de salários e da atualização da carreira docente. Propostas que já tinham sidas remetidas ao governo de Luanda em 2013.

Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche Welle

ANGOLA | É Carnaval


Manuel Albano| Jornal de Angola

Depois dos ensaios, ontem, no local do desfile, os grupos, capricharam nos detalhes para apresentarem uma core-ografia que consiga espelhar a grandeza cultural das suas localidades.

O União Jovens da Ca-cimba, como homenageado desta 40ª edição, tem a honra de abrir a festa, embora não participe na competição, se-guindo-se em ordem os gru-pos Maringas (Lunda-Norte), Tchaco-Tchaco (Cabinda), Ovinjenji (Huambo), União Muteba (Cuanza Sul) e Bravos da Victória (Benguela), aos quais está reservado  entre 10 a 15 minutos de exibição.

O grupo Tchaco-Tchaco, de Cabinda, trouxe a Luanda 80 integrantes e vão apresentar o estilo de música e dança “mayeye” da região dos Bayoyo.

Nem mesmo as altas temperaturas registadas na manhã de ontem “beliscaram” a vontade dos grupos em aprimorarem os últimos pormenores de dança.

A organização disponibilizou bastante água, para hidratar os integrantes dos grupos. Os ensaios correram bem, testemunhado pelo governador de Luanda, Adriano Mendes de Carvalho, que foi supervisionar as condições no local e dar as boas-vindas aos grupos convidados.

Na presença dos representantes dos grupos carnavalescos das províncias, membros da Comissão Preparatório do Carnaval de Luanda e da Associação Provincial do Carnaval de Luan-da (Aprocal), foi feito o ensaio da ordem do desfile com todos os grupos.

Elizabeth Tapioa, que acompanha o grupo de Ca-binda, disse que está a ser uma experiência positiva trocar experiência com outros grupos na justa me-dida em que permite ter-se uma visão diferente sobre o que se faz noutros pontos do país. “Queremos mostrar a força das nossas tradições, hábitos e costumes”, assegurou Elizabeth Tapioa.

O grupo vai apresentar o ritual “tchicumbe”, realizado na fase em que as mulheres atingem a puberdade e passam pela casa de tinta. A culinária típica de Cabinda também vai estar em evidência no decorrer do desfile.

Por sua vez, a responsável do grupo Os Bravos da Vitória, Gi-zela Santos, agradeceu ao Ministério da Cultura pelo convite e reconhecimento do trabalho que tem estado a desenvolver em Benguela, desde 1978.

 O grupo é o papão dos títulos de Carnaval, com 26 títulos de primeiro classificado, em 39 participações. Na Marginal da Praia do Bis-po, o grupo far-se-á presente com 190 elementos. Foi fundado na Catumbela, em Mar-ço de 1978, por Mário Alívio dos Santos.

O presidente do grupo “Ovinjenji”, do Huambo, Pascoal Pedro Nhanga disse que vão fazer um resumo da história do reino da Chiaca, fundado pelo rei Chilulo Vangue-Vangue. Trata-se da abordagem de aspectos atinentes ao dia-a-dia de um aglomerado do povo do Bié que se instalou no Huambo à procura de melhores condições de vida.

No que tange ao do grupo “Maringas”, da Lunda Norte, o seu presidente, Zito Joãozinho, explicou que foi  fundado em 2002 e tem um elenco de cerca de 80 foliões que pretendem abordar as-pectos importantes da cultura daquela região.

Uma mistura de música, dança e teatro conforma a novidade do grupo do Cuanza Sul que, segundo o seu presidente, José Gonzaga Neto vai homenagear a mulher rural pelo contributo prestado à sociedade.

Recinto do desfile

A Marginal da Paria do Bispo tem 300 metros de comprimentos e 20 de largura. Cada grupo terá 25 minutos para exibição, e mostrar ao público o que preparou em termos de performance, que inclui  música, dança, alegoria e bandeira.

Vão competir 12 grupos. Vai ser homenageado o grupo União Jovens da Cacimba e vão desfilar cinco grupos convidados sem competir. Desfilam, também, sem competir alguns blocos de animação.  

No local estão montadas cinco tribunas destinadas aos patrocinadores, sendo três com 290 lugares cada, duas com 400 assentos, uma tribuna VIP, com 290 lugares, e seis arquibancadas com mil e 400 lugares cada.

Protecção civil

Os Serviços Nacional de Protecção Civil e Bombeiros (SNPCB) e o Instituto Nacional de Emergências Médica (INEMA) estão prontos para atender todas as pessoas que se deslocarem à Marginal da Praia do Bispo, quer para assistir o Carnaval, quer para integrar os grupos que vão desfilar.

As equipas de socorro estão capacitadas para dar assistência aos foliões que se sentirem acossados de situações de fadiga, dores musculares e distúrbio neurovegetativo, uma doença que causa desmaios, entre outros males.

Ontem, o porta-voz do comando provincial do SNPCB, Faustino Minguêns, frisou ser normal em casos de actividades do género, surgirem  situações análogas às que ocorreram domingo, no decorrer do desfile da classe B, em que algumas pessoas foram socorridas por terem desmaiado.

“Tudo foi feito para socorrer  as vítimas, tendo alguns encontrado no local  respostas  imediatas que resultaram em recuperações eficazes.”.

O SNPCB aconselha, entretanto, o consumo de bastantes líquidos (sumos e água).

Polícia

As autoridades policiais da província de Luanda enalteceram o comportamento cívico da população, na Nova Marginal, durante os dois dias da presente edição do Carnaval.

O director do gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa da delegação de Luanda do Ministério do Interior MININT, intendente Mateus Rodrigues, informou que a população está a acatar as orientações da Polícia Nacional, no local.

 Este comportamento, prosseguiu, tem facilitado a acção dos agentes de ordem pública, Serviço de Protecção Civil e dos Bombeiros.

“Espero que, hoje, dia de maior aderência de pessoas no local, o comportamento seja o mesmo. Mas a polícia está preparada para garantir a segurança e tranquilidade dos espectadores e integrantes dos grupos”, sublinhou.

A festa mais popular do país, a nível da capital angolana, é assegurada por agentes da corporação de várias especialidades.

ANGOLA | Com a pobreza não se brinca


Osvaldo Gonçalves | Jornal de Angola | opinião

O alto índice de pobreza em Angola devia, antes de qualquer outra coisa, merecer a atenção de todos. Mas, ao que parece, a precariedade que assola uns anima outros, que preferem a feijoada ao feijão, a mufetada à lambula crua ou grelhada.

“Jindungo no olho do outro é gelado”, dirão os que se julgam espertos e preferem que outros agarrem na enxada, enquanto perdem horas na manicure. Às 23h40 de uma sexta-feira, chama a nossa atenção uma mensagem pelo chatroom do Facebook. É um pedido de ajuda de um cidadão que se diz “muito pobre” e, por isso, precisa de apoio para realizar o sonho de se tornar num “grande fotográfico” (ipsis verbis).

O autor acena com a Bíblia no apelo choroso que nos dirige, pleno de boas maneiras, afinal é uma pessoa de origem humilde, pobre, “muito pobre”, segundo insiste, a precisar de ajuda. Sublevamos os atropelos à Gramática da Língua Portuguesa e decidimos ir adiante na conversa. Dessa forma, descobrimos que o “pedinte” estava em Benguela e tinha apenas 15 anos de idade. Nunca tinha vindo a Luanda, afinal, como poderíamos ajudá-lo, a ele, que tanto precisava.  A história tinha tanto de inusitado que chegámos a acreditar que tudo fosse terminar de forma abrupta, que algo deitasse tudo a perder, que nos bloqueasse, mas não. A Internet pregou-nos mais uma partida e a lligação caiu. De manhã, pensámos que tivesse sido apenas mais um sonho, um pesadelo, mas não.

Retomada a ligação no dia seguinte, ele lá estava. Resolvemos arriscar um pouco mais e ficámos a saber que “navegava” através de um telefone, mas um “ermão” tem conta bancária.

Um forte sentimento de revolta tomou conta de nós, aquele adolescente teria noção exacta das coisas? Uma visita ao seu mural no Facebook permitiu-nos tirar algumas ilações da pessoa. O teor das postagens e os comentários dos “amigos” em nada abonam em seu favor.

Pelo que pudemos verificar, nada indica que o rapaz viva “alguma situação de privação do bem-estar, como acesso limitado a serviços de saúde, baixo capital humano, habitação inadequada, má nutrição, falta de determinados bens e serviços, falta de capacidade para expressar pontos de vista políticos ou professar credos religiosos”, como referem os entendidos.

Por isso, ficámos a reflectir no que levaria um adolescente a colocar-se em tal situação, a expôr-se tanto, ao ponto de ser desmascarado com um simples click. Terá o rapaz noção do que é, de facto, a pobreza, sentirá algum prazer em fazer-se passar por pobre, “muito pobre”, como o próprio faz questão de mencionar?

Ou, pior que isso, estará ele interesado, por via do insucesso escolar iminente, do desemprego subsequente, da destruição da célula familiar a engrossar o exército demais de oito milhões de angolanos a viver em tais condições?

Nada nos pode convencer que um rapaz de 15 anos de idade que fica até altas horas da noite numa sexta-feira a “navegar” na Internet a partir de Benguela através de um telefone seja pobre, “muito pobre”,  como frisou. Terá ele noção do que é efectivamente ser pobre, viver com menos de 1,25 dólares por dia ou será mais um brincalhão a tentar ofuscar a imagem de quem realmente precisa de ajuda?

ANC dá 48 horas ao Presidente da África do Sul para se demitir - televisão estatal


O Congresso Nacional Africano (ANC) deu 48 horas ao Presidente da África do Sul, Jacob Zuma, para apresentar a sua demissão do cargo, segundo informações avançadas hoje pela televisão estatal sul-africana SABC.

Segundo a televisão, que cita elementos que participam na reunião do ANC, o presidente do partido, Cyril Ramaphosa, deslocou-se até à residência oficial do chefe de Estado para o informar que tem 48 horas para apresentar a sua demissão, evitando assim ser afastado do cargo.

O atual chefe de Estado, que enfrenta acusações de corrupção, pode recusar demitir-se mas, nesse caso, o ANC pode apresentar no parlamento uma moção de censura.

O partido de Jacob Zuma, o Congresso Nacional Africano (ANC), está reunido em Pretória para, como afirmou o seu líder, Cyril Ramaphosa, "finalizar" a questão da saída antecipada do Presidente da África do Sul.

Os 107 membros do Conselho Nacional Executivo do ANC estão reunidos hoje num hotel da capital da nação sul-africana para uma decisão sobre o futuro do Presidente da África do Sul.

O conselho tem o poder de "lembrar" Jacob Zuma sobre o ocorrido em 2008, quando o Presidente Thabo Mbeki, que sucedeu no cargo a Nelson Mandela, renunciou por falta de apoio do ANC no parlamento.

Depois de ter ultrapassado sete moções anteriormente, o Presidente Zuma vai enfrentar em 22 deste mês uma nova moção de censura parlamentar, pedida por um partido da oposição.

Após deixar a presidência da formação no último congresso do ANC, em dezembro, a favor de Ramaphosa - que não era o seu candidato preferido -, a pressão para que o chefe de Estado abandone o poder aumentou, especialmente nas últimas semanas.

AJO (JOP)// ANP |Lusa

China acusa livreiro de Hong Kong de divulgar segredos de Estado


Pequim, 12 fev (Lusa) -- O Ministério dos Negócios Estrangeiros da China afirmou hoje que o editor e livreiro chinês de origem sueca, radicado em Hong Kong e que vendia livros a ridicularizar líderes chineses, está detido e é suspeito de divulgar segredos de Estado.

Segundo o porta-voz do ministério chinês, Geng Shuang, o caso de Gui Minghai, detido a 20 de janeiro quando seguia a bordo de um comboio, vai ser "tratado de acordo com as leis chinesas".

O porta-voz adiantou que as autoridades de Pequim se têm queixado repetidamente da Suécia, que tem exigido a libertação de Gui, considerando tratar-se de uma "interferência injustificável na soberania judicial da China".

No domingo, a polícia de Ningbo, no leste da China, indicou que Gui está detido na prisão da cidade e que tem provas que suportam a acusação de divulgação de segredos de Estado a estrangeiros.

No sábado, o editor sueco de origem chinesa surgiu num vídeo em que confessa mal-estar e acusa Estocolmo de o ter manipulado como um "peão de xadrez".

A AFP refere que não se sabe se as declarações filmadas são sinceras porque, no vídeo, Gui aparece com dois polícias, e um amigo próximo disse que o editor está a ser manipulado.

Gui, de 53 anos, que comercializava obras que ridicularizavam o regime comunista em Hong Kong, foi preso a 20 de janeiro por polícias à paisana num comboio que seguia em direção a Pequim, onde tinha combinado um encontro com um médico especialista sueco por temer estar com a doença de Charcot.

Na altura da detenção Gui estava com dois diplomatas suecos e Estocolmo denunciou a intervenção como "brutal" e "contrária às regras internacionais fundamentais com apoio consular".

Só a 07 deste mês é que Pequim confirmou a detenção do editor.

Gui acusa a Suécia de ser sensacionalista em relação à sua detenção num vídeo de uma "entrevista" organizada na sexta-feira pelas autoridades com os 'media' chineses, que afirmaram terem sido escolhidos criteriosamente.

O editor adianta no vídeo ter sido pressionado pelas autoridades suecas para deixar a China, apesar de estar proibido de deixar o território devido a assuntos jurídicos pendentes.

"Recusei numerosas vezes. Mas porque eles me incitavam sem parar, caí na armadilha. Olhando para trás, se calhar fui o peão da Suécia num jogo de xadrez. Violei a lei porque me instigaram. A minha vida maravilhosa está arruinada e nunca mais confiarei nos suecos", diz Gui, no vídeo.

Gui era um dos cinco editores de Hong Kong que desapareceram em 2015.

O editor desapareceu durante umas férias na Tailândia antes de aparecer num centro de detenção e de "confessar" à televisão pública chinesa o seu envolvimento num acidente vários anos antes.

JSD (MC) // VM

Favorito à sucessão do Presidente chinês Xi Jinping acusado de corrupção


Pequim, 13 fev (Lusa) - Sun Zhengcai, antigo membro do Politburo do Partido Comunista Chinês (PCC) e visto como favorito à sucessão do Presidente da China, Xi Jinping, foi hoje acusado de corrupção, informou a procuradoria-geral chinesa.

Sun ocupou o cargo de secretário do PCC no município de Chongqing até julho passado, quando foi anunciado que estava a ser investigado pela Comissão de Inspeção e Disciplina do PCC.

No seu portal oficial, a procuradoria-geral da China diz que Sun "recebeu ilegalmente grandes montantes em dinheiro e bens", em troca de beneficiar terceiros.

Sun, de 53 anos, era um dos membros mais novos do Politburo do PCC, que reúne os 25 mais poderosos da China, pelo que constava entre os favoritos a suceder Xi Jinping no cargo de secretário-geral do partido.

O comunicado da procuradoria-geral aponta que Sun será julgado por receber subornos, mas a liderança chinesa sugeriu já que as transgressões de Sun foram essencialmente politicas.

Durante o XIX Congresso do PCC, que se realizou em outubro passado, o diretor do regulador da China para os valores mobiliários afirmou que Sun e outros altos-quadros do regime atingidos pela campanha anticorrupção em curso no país estavam a "conspirar abertamente para se apoderarem da liderança do partido".

Sun foi expulso do PCC em setembro passado, suspeito de "graves violações da disciplina", termo com que o órgão máximo anticorrupção do partido descreve habitualmente os casos de corrupção.

Antigo ministro da Agricultura, entre 2006 e 2009, Sun foi então substituído por Chen Miner, ex-chefe de propaganda de Xi, como secretário-geral em Chongqing.

Mais de 440 dirigentes, alguns dos quais ministros, foram já atingidos pela campanha anticorrupção em curso na China, desde que Xi Jinping assumiu a chefia do PCC, em novembro de 2012.

Trata-se da mais persistente e ampla campanha do género na história da China comunista, mas críticos apontam que esta serve para Xi afastar rivais políticos, promovidos por outras cliques internas do PCC, argumentando que é gerida por um órgão interno do partido e não uma entidade independente.

JPI //RBF

Assembleia marca hoje debate sobre alteração à Constituição de Moçambique


A comissão permanente da Assembleia da República de Moçambique vai definir hoje as datas em que será discutida a proposta de alteração à Constituição, divulgada na última semana pelo Presidente, Filipe Nyusi, anunciou o órgão.

A proposta resulta de um acordo com Afonso Dhlakama, líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), maior partido da oposição.

O consenso alcançado prevê que os governadores provinciais e administradores distritais passem a ser propostos pelas respetivas assembleias em vez de serem nomeados pelo poder central - passando também as assembleias municipais a designar os presidentes das autarquias, deixando de ser eleitos diretamente.

Lusa

MOÇAMBIQUE | A coligação Frenamo prossegue em lume brando


@Verdade | Editorial

Inesperadamente ou não, a Frelimo e a Renamo decidiram a revisão pontual da Constituição da República de Moçambique, sem antes consultar os moçambicanos através de um referendo como manda a Constituição. Mas pouco importa a consulta, até porque os moçambicanos já estão habituados a esse tipo de teatro protagonizado por actores amadores de muito mau gosto de sempre. Sem sombras de dúvidas que a preparação da revisão da lei-mãe começou a ser feita em silêncio – e em segredo, deixando de lado as outras forças políticas, a sociedade civil e o povo.

Tudo indica que a coligação Frenamo, sobretudo as suas duas equipas cravadas na Assembleia da República vão se movimentar, qual orquestra, para acomodar os interesses dos seus partidos políticos – na sua maioria, não explicado -, ao invés de resguardarem os legítimos interesses de um povo que é forçado a viver na pobreza e na ilusão de que os seus “doutos” representantes - os mesmos que regularmente se comportam quais símios quando esbarram em um cacho de bananas - cuidarão do seu destino.

Discursando à Nação, o Chefe de Estado, Filipe Nyusi, revelou aos moçambicanos que como corolário das negociações secretas que ele e o líder do partido Renamo têm encetado ao longo dos últimos 13 meses acordaram os termos para a descentralização exigida por Afonso Dhlakama que vão implicar “a revisão pontual da Constituição da República de Moçambique”.

Ou seja, o sistema eleitoral, por sufrágio universal, será alterado, designadamente a eleição do Presidente da República, dos deputados da Assembleia da República, dos Membros das Assembleias Provinciais, autárquicas e distritais. Como resultado disso, os membros eleitos para as Assembleias Provinciais, sejam de partidos políticos maioritários é que vão propor o nome para ser nomeado pelo Presidente da República, a assumir o cargo de Governador Provincial, e o mesmo procedimento nos distritos e autarquias, mas nomeado pelo ministro de tutela, a partir das eleições a decorrer este ano de 2018.

Com isso, os moçambicanos serão obrigados a escolher o cabaz preparado pelos partidos políticos, ao invés de um indivíduo que possa dirigir os destinos das suas vidas. Além disso, essas situação vai acabar com o multipartidarismo, abrindo espaço para a bipolarização partidária. Mais uma vez a nossa jovem democracia vai receber um valente golpe.

Portanto, a Frelimo e a Renamo, na sua habitual chatice congénita, continuam a demonstrar desprezo absoluto por alguns princípios básicos da democracia, valendo-se da maioria parlamentar, e prosseguem indiferentes ao eleitor, ao povo e à opinião pública.

MOÇAMBIQUE | Três anos de Filipe Nyusi entre críticas e elogios


Filipe Nyusi completa esta segunda-feira três anos do seu mandato. Cidadãos ouvidos pela DW África no Niassa dão nota positiva ao Presidente moçambicano. Mas também há críticas à falta de políticas para a juventude.

Os avanços com vista a um acordo de paz com a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o principal partido da oposição, e a estabilidade no país são dois dos pontos positivos destacados na governação de Filipe Nyusi. Na última sexta-feira (12.01), numa cerimónia no Comando da Unidade de Intervenção Rápida, o Presidente moçambicano disse que o pacote sobre a descentralização e os assuntos militares nas negociações de paz está em fase de conclusão, mas não avançou detalhes.

"Sinto que o Presidente fez muita coisa, sobretudo a aproximação com o líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, e isso é muito importante para nós", afirma Alberto Weston, residente no Niassa, que avalia positivamente as negociações para um acordo de paz definitivo do Governo com o maior partido da oposição. "Quando temos paz, andamos como um pássaro a voar", lembra.

Suizane Rafael, jornalista do jornal Faísca, semanário independente no Niassa, destaca que os três anos de governação de Filipe Nyusi foram caracterizados pela concretização de vários projetos.

Se tivesse de dar uma nota ao Presidente, numa escala de 0 a 10, o jornalista daria 6, "porque no primeiro ano foi quase nada", teve de gerir muitas questões do Governo anterior. "Mas a partir do segundo ano, começou a mostrar o seu plano de governação, as promessas que foram feitas durante a campanha eleitoral".

Suizane Rafael lembra ainda que Nyusi concluiu a reabilitação da linha férrea Cuamba-Lichinga - depois de sete anos de paralisação, os comboios voltaram a circular em setembro de 2016. E também lançou o projeto de asfaltagem da EN13, a estrada nacional que liga as cidades de Cuamba e Lichinga, uma velha promessa do Executivo, "que já está a acontecer", salienta o jornalista.

Faltam políticas para a juventude

Fernando Lopes, outro residente no Niassa, recorda que a promessa de valorização da juventude, entre outras feitas por Filipe Nyusi, ainda não está a ser cumprida. "E a partidarização das instituições públicas ainda se nota, porque ainda não existe liberdade partidária", destaca também.

Para o académico Luís Ausse, os três anos de governação de Filipe Nyusi foram de "muito empenho". Mas desafia o Presidente da República a melhorar as condições dos funcionários públicos do Estado nos dois anos de mandato que lhe restam.

"Há uma ligeira letargia, há estagnação nas mudanças de carreira e promoções", observa.

Desde 2016, o Presidente da República viu-se obrigado a gerir a polémica das chamadas dívidas ocultas, no valor de dois mil milhões de dólares, que dificultaram ainda mais a situação económica do país. Moçambique continua sem a ajuda dos doadores internacionais, mas, sublinha Suizane Rafael, o país não parou graças ao desempenho e vontade do chefe de Estado.

"Já não são dívidas ocultas, já são visíveis, o que afetou muito a imagem do país a nível internacional. Alguns credores internacionais pararam de dar dinheiro a Moçambique, mas o país está a andar, não caímos completamente", afirma.

Os residentes do Niassa também apelam ao Presidente Filipe Nyusi para que prossiga a luta contra a corrupção, para desencorajar a prática no país.

Manuel David (Lichinga) | Deutsche Welle – 15.01.2018

África do Sul à espera de decisão do ANC sobre saída de Zuma


O Presidente Jacob Zuma sairá pelo seu próprio pé? É a pergunta que todos fazem. A reunião do ANC promete continuar pela noite dentro, fazendo a ansiedade crescer nas ruas por não se saber qual o futuro da África do Sul.

Durante a tarde, muito se especulou em relação ao resultado da reunião de urgência convocada para esta segunda-feira (12.02) pelo Congresso Nacional Africano (ANC), o partido no poder na África do Sul. Chegaram a ser difundidas notícias da demissão de Zuma. No entanto, o porta-voz da presidência não demorou a desmenti-las.

William Gumede, professor da Universidade Witwatersrand, explica o que pode vir a acontecer a Zuma. "O Comité Executivo Nacional do ANC é a única estrutura do partido que pode tomar a decisão de demitir Jacob Zuma. Mas depois, quando tiverem tomado essa decisão, ainda terão de ir ao Parlamento e instruir os deputados do ANC a votar a favor da saída de Zuma", diz.

E já há um prazo estipulado para que o futuro do chefe de Estado seja finalmente ditado. "É o dia 22 de fevereiro, para o qual está agendada uma moção de censura contra o Presidente Jacob Zuma", lembra o especialista.

O problema para o partido no poder e para o vice-presidente Cyril Ramaphosa, diz William Gumede, é que a votação foi pedida pela oposição "e o ANC não quer que Zuma saia na sequência de uma votação patrocinada pelo partido da oposição". Por isso, acrescenta, o que tentarão fazer é pedir uma sessão especial no Parlamento antes da que está agendada para o dia 22.

Imunidade ou perdão presidencial?

Nos últimos dias, sucederam-se vários encontros entre Jacob Zuma e Cyril Ramaphosa. Segundo William Gumede, a imunidade para Zuma pode ter sido um das condições em cima da mesa de negociações.

"Embora isso seja difícil", frisa o professor, porque a lei sul-africana não prevê imunidade caso existam acusações. "O outro caminho é o perdão presidencial", diz.

Zuma está no poder desde 2009 e é acusado de vários atos de corrupção. Em dezembro de 2017 foi substituído por Ramaphosana liderança do ANC. Desde essa altura, a pressão para abandonar o comando da África do Sul tem-se intensificado.

Eleições antecipadas

Do lado da oposição, a decisão é unânime: os partidos querem eleições antecipadas. Mmusi Maimane, líder do partido da Aliança Democrática, afirmou esta segunda-feira (12.02) que o Parlamento deve ser dissolvido para se avançar depois para eleições antecipadas. "É preciso garantir a eleição imediata de um novo Presidente. E exortamos todos os sul-africanos para que saiam às ruas. Queremos garantir que Jacob Zuma sai do poder", disse.

O líder da Aliança Democrática criticou ainda o facto de Ramaphosa estar disposto a "negociar uma saída fácil" para Zuma. Para Mmusi Maimane, este é um indicador de que no seio do ANC ainda se tolera a corrupção.

No próximo dia 22, o Parlamento da África do Sul volta a votar para mais uma moção de censura contra Jacob Zuma, a oitava que o chefe de Estado enfrenta desde que está no poder.

Raquel Loureiro, AFP, AP | Deutsche Welle

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