sábado, 7 de abril de 2018

BRASIL | Dilma muda domicílio eleitoral para Minas e pode se candidatar


A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) chegou nesta sexta-feira 6, ao Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) para transferir seu título do Rio Grande do Sul para o Estado e utilizou a saúde da sua mãe, que mora em Belo Horizonte, para justificar a mudança.

Dilma, porém, admitiu a possibilidade de disputar as eleições. Mais cedo, o líder do governador Fernando Pimentel (PT) na Assembleia Legislativa, Durval Ângelo (PT), disse que a ex-presidente será candidata ao Senado.

"Estou transferindo o título porque tenho parte da minha família aqui. A minha mãe tem 94 anos. Eu tenho vindo muito aqui. Achei que seria bom estar com meu título eleitoral aqui", afirmou a ex-presidente, ao chegar ao TRE, acompanhada de Pimentel.

"Mas vocês podem ter certeza, campanha, eu vou fazer. Pro Senado ou não. Porque acho que o Brasil precisa de uma transformação. Acho que o Brasil precisa se reencontrar consigo mesmo. Acho que o Brasil precisa de um processo de pacificação que só é possível se tivermos eleições diretas. Eu participarei em qualquer condição", acrescentou. A ex-presidente disse ainda esperar que Lula seja candidato em 2018.

Antes de Dilma, Pimentel afirmou que a ex-presidente estava transferindo o título por causa da mãe, mas afirmou que a colega de legenda "evidentemente está sempre à disposição dos partidos que compõem a nossa base". "A candidatura é uma conversa que será decidida mais adiante, ouvindo todos os nossos aliados", disse Pimentel.

Tudo pronto

Apesar dos discursos de Dilma e Pimentel, o líder do governador na Assembleia afirmou que a chapa já está fechada com Pimentel como candidato à reeleição, Dilma e o presidente da Assembleia Legislativa, Adalclever Lopes (MDB), nas duas vagas para disputa pelo Senado por Minas.

O vice de Pimentel, segundo o parlamentar, seria Josué Alencar, que estaria saindo do MDB e indo para o PR. A assessoria de Josué ainda não confirmou a mudança.

Tensão

Antes da chegada de Dilma ao TRE, apoiadores da ex-presidente hostilizaram repórteres que esperavam a chegada da petista. Um repórter da Rede Globo deixou o local e voltou depois com o microfone da empresa descaracterizado. Um repórter da Rádio Itatiaia bateu boca com manifestantes. Parlamentares que estavam em frente ao local pediram calma aos correligionários.

Ainda durante a espera da ex-presidente, um motorista passou pelo local, discutiu com manifestantes, levou o carro até adiante e jogou uma bomba semelhante às utilizadas por torcidas de times de futebol próximo a estádios. Ninguém se feriu.

O prazo para mudança de partido para o pleito de outubro, desincompatibilização de cargos e troca de domicílio eleitoral, como é o caso da ex-presidente, termina neste sábado, 7. Porém, por ser sábado, as saídas dos cargos e mudança de legendas e domicílio precisam ser feitas até esta sexta-feira, 6, segundo o TRE-MG.

Agência Estado| em O Povo online

Partidos e coligações distribuídos pelo país no arranque da campanha


TIMOR-LESTE

Díli, 07 abr (Lusa) - Os quatro partidos e três das quatro coligações que concorrem às eleições legislativas antecipadas em Timor-Leste iniciam na terça-feira as suas ações de campanha com eventos de maior ou menor dimensão em praticamente todo o território, segundo o calendário oficial.

Apenas duas das forças políticas, a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP) - a coligação que reúne as três forças atualmente na oposição (CNRT, PLP e KHUNTO) - e a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) - que lidera a coligação de Governo - têm previstos comícios.

No caso da AMP - coligação liderada por Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak -, a campanha arranca no campo de futebol de Ainaro, a cerca de 131 quilómetros a sul de Díli, enquanto a Fretilin -liderada pelo atual primeiro-ministro Mari Alktatiri - escolheu a vila de Manatuto, a cerca de 68 quilómetros de Díli.

Já o Partido Democrático (PD), parceiro da Fretilin no Governo, começa a sua campanha na Região Administrativa Especial de Oecusse-Ambeno, onde permanecerá os primeiros dois dias da campanha.

Na capital timorense, Díli, estarão duas das forças candidatas, o Partido Republicano (PR) que lança a sua campanha na sede do partido, e a coligação Movimento de Desenvolvimento Nacional (MDN) que se divide em ações de rua em cinco municípios.
O Movimento Social Democrata (MSD) fará campanha na vila de Liquiçá, a oeste da capital e a coligação Frente de Desenvolvimento Democrático (FDD) estará na ponta leste em Lautem.

Finalmente, o Partido Esperança da Pátria (PEP) só arranca a sua campanha oficialmente na quinta-feira, com uma ação em Bobonaro, capital do município de Maliana, a cerca de 120 quilómetros a sudoeste da capital.

As ações iniciam uma longa campanha que se prolonga um mês, até 09 de maio, antes de dois dias de reflexão e a votação. Os dias de reflexão são também em Timor-Leste uma oportunidade para os eleitores regressarem aos locais onde estão recenseados e onde têm de votar o que, dadas as condições de muitas estradas, pode implicar viagens demoradas.

Depois da maior campanha de sempre nas legislativas de 2017, com os principais partidos a gastarem milhões de dólares, esta campanha deverá ser mais reduzida, segundo fontes das principais forças políticas.

Tradicionalmente, a campanha aposta em comícios nas capitais de municípios e depois pequenas ações de rua, sendo que é a zona de Taci Tolo, na zona oeste da capital timorense, que serve sempre de 'régua' para medir a força da campanha.

O comício final da AMP decorre no dia 08 de maio, em Taci Tolo - a coligação estará na ilha de Ataúro no último dia -, enquanto o comício final da Fretilin decorre na mesma zona no último dia da campanha, a 09.

Globalmente estão previstos 37 comícios em todo o país.

Recorde-se que os timorenses vão eleger os 65 deputados da 5ª legislatura do Parlamento Nacional.

A previsão é de que o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral divulgue o número e local dos centros de votação e estações de voto até à próxima quinta-feira.

O calendário define que o apuramento municipal e regional dos votos decorre até 14 de maio, com o apuramento final dos resultados - em que se clarificam os votos disputados - a decorrer até dia 17 seguinte.

A Comissão Nacional de Eleições tem depois três dias para elaborar a ata do apuramento dos resultados nacionais provisórios, abrindo-se até 22 de maio um período para eventual recurso dos resultados.

O Tribunal de Recurso terá depois de analisar eventuais recursos validando e proclamando os resultados até 27 de maio.

ASP // SR

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Rituais tradicionais em pacto de paz e unidade pré-eleitoral


TIMOR-LESTE

Díli, 07 abr (Lusa) - Representantes dos quatro partidos e quatro coligações candidatos às eleições antecipadas de 12 de maio em Timor-Leste assinaram hoje um compromisso de paz e unidade nacional em defesa de um voto livre, justo e pacifico.

A assinatura decorreu depois de uma cerimónia tradicional, conduzida por chefes tradicionais (lia nain) de todo o país, e que começou na sexta-feira com vários ritos preparatórios, incluindo o sacrifício de vários animais.

Hoje as vozes e ritos dos lia nain marcaram a cerimónia mais formal conhecida como Hamulak ('juntos' em tétum) a representar um "gesto de aceitação de serenidade e clareza para uma eleição pacífica" de todos os líderes políticos do país.

A cerimónia foi presidida pelo chefe de Estado, Francisco Guterres Lu-Olo, e contou, entre outros, com a presença do presidente do Tribunal de Recurso, Deolindo dos Santos, e do vice-presidente do Parlamento Nacional, António Verdial.

Evidente foi a ausência de muitos dos principais líderes do país, incluindo o primeiro-ministro Mari Alkatiri, o presidente do Parlamento Nacional, Aniceto Guterres, o ministro de Estado, José Ramos-Horta, os bispos timorenses e os comandantes da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL).

Ausentes estiveram também os principais líderes partidários, incluindo além de Alkatiri (Fretilin), Xanana Gusmão e Taur Matan Ruak (AMP) e Mariano Sabino (PD), entre outros.

O "Pacto de unidade nacional para o compromisso para realização de uma eleição pacífica, consolidando a paz e unidade nacional na eleição antecipada parlamentar 2018" foi assinado no Salão Lalini-Lariguto, no segundo andar do edifício da Comissão Nacional de Eleições (CNE), em Díli.

As zonas de Lalini-Lariguto, na região de Viqueque, na ponta leste de Timor-Leste têm especial significado na história da resistência tendo sido ali que decorreram as negociações entre a resistência, lideradas por Xanana Gusmão, e os ocupantes indonésios, que levaram ao cessar-fogo de 1993.

Em nome do Partido Esperança da Pátria (PEP) assinou o 1º vice-presidente, Jerónimo dos Santos, do Partido Democrático (PD) o seu secretário-geral António da Conceição e em nome do Partido Republicano (PR) o vice-presidente Vicente Dias da Costa.

A Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) foi representada pelo vice-presidente Francisco Miranda Branco, a coligação Movimento Social Democrata (MSD) pelo secretário executivo Benjamim Barreto e a coligação Movimento Desenvolvimento Nacional (MDN) pelo presidente Francisco Gomes.

Finalmente pela coligação Frente de Desenvolvimento Nacional (FDD) assinou o presidente António de Sá Benevides e pela coligação Aliança de Mudança para o Progresso (AMP) o vice-presidente Fidelis Magalhães.

Promovida pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), a assinatura do pacto pretende responder a preocupações da sociedade expressas tanto em encontros comunitários do órgão eleitoral como em audições públicas conduzidas pelo Presidente da República, Francisco Guterres Lu-Olo, como referiu o presidente da CNE, Alcino Baris.

Um compromisso que quer evitar problemas no período eleitoral, incluindo "linguagem difamatória, rumores, agitação através das redes sociais".

Timor-Leste vive há meses um período de grande tensão política com o Governo minoritário a ver o seu programa e orçamento retificativo chumbados pela oposição, com o Parlamento Nacional praticamente parado.

A situação levou Lu-Olo a convocar eleições antecipadas que serão as com menos candidaturas no boletim de voto e as com mais coligações pré-eleitorais.

O texto assinado compromete os partidos e coligações a respeitar os princípios Gerais da Campanha Eleitoral e a lei eleitoral, garantindo a "liberdade de propaganda, igualdade e oportunidade e transparência".

Comprometem-se a promover direitos humanos, igualdade de género e participação inclusiva em defesa da democracia, combatendo a violência e promovendo uma "cultura de diálogo" em busca da "paz e da unidade nacional".

As forças políticas comprometem-se ainda a aceitar o resultado das eleições.

ASP// ATR

China preparada para a combater os EUA "a qualquer preço"


Pequim, 06 abr (Lusa) - As autoridades chinesas afirmaram hoje estarem preparadas para combater os Estados Unidos "a qualquer preço", como resposta à possibilidade de os Estados Unidos imporem novas taxas aduaneiras, no valor de 81,6 mil milhões de euros, sobre produtos chineses.

"Se os Estados Unidos persistirem neste comportamento de unilateralismo e protecionismo comercial, ignorando a oposição da China e da comunidade internacional, a China continuará a qualquer preço contra-atacar com força", ameaçou o Ministério do Comércio chinês em comunicado.

A China apresentou já uma queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) devido às taxas impostas por Washington sobre importações de um conjunto de produtos chineses.

"A China pediu a abertura de consultas com os Estados Unidos, no quadro do mecanismo de regulamento de diferendos da OMC relativamente às taxas alfandegárias dos Estados Unidos que visam um conjunto de produtos chineses", referiu, em comunicado, a organização que regula o comércio mundial.

As ameaças feitas hoje por Pequim surgem como consequência do anúncio por parte do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de estar a considerar impor novas taxas, no valor de 81,6 mil milhões de euros, sobre produtos chineses, como retaliação às tarifas anunciadas por Pequim.

A Casa Branca anunciou, depois do fecho dos mercados na quinta-feira, que Trump perguntou à representação dos EUA para o comércio internacional se a imposição de mais 100 mil milhões de dólares (81,6 mil milhões de euros) em tarifas seria apropriada e, se assim for, que se identifiquem os produtos a serem taxados.

Este anúncio, mais um episódio da guerra comercial entre os dois países, surge como um contra-ataque à China, que declarou a imposição de taxas alfandegárias a produtos norte-americanos, num valor aproximado de 50 mil milhões de dólares (41 mil milhões de euros).

Por sua vez, a medida das autoridades de Pequim foi também uma retaliação aos Estados Unidos por terem, no início da semana, imposto taxas aduaneiras, em igual valor. Assim, cerca de 250 produtos norte-americanos, como soja, milho, carne, sumo de laranja, tabaco, automóveis ou certos tipos de aeronaves, entre outros, foram taxados pela China.

A China e os Estados Unidos envolveram-se numa disputa comercial depois de a USTR (representante de comércio norte-americano) divulgar uma lista de importações chinesas às quais era proposto aplicar taxas alfandegárias, como retaliação pela "transferência forçada de tecnologia e propriedade intelectual norte-americana".

A lista inclui 1.300 produtos de vários setores, incluindo aeronáutica, tecnologias de informação e comunicação ou ainda robótica e máquinas, com um valor aproximado de 50 mil milhões de dólares.

O confronto entre as duas grandes potências reflete a tensão entre as promessas de Trump em reduzir o défice comercial norte-americano com a China (cerca de 375 mil milhões de euros) e as ambições comerciais de Pequim.

MIM (JPI) // SB

Novo Macau denuncia problemas do território ao Conselho dos Direitos Humanos da ONU


São temas que atravessam toda a sociedade de Macau, aqueles apresentados pela Associação Novo Macau num documento submetido à Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. A associação quer que a ONU pressione o Governo para considerar os direitos humanos dos cidadãos e fez chegar ao organismo um guia que oferece soluções para os problemas que considera mais graves, para ser analisado no próximo mês de Novembro.

Recomendações sobre direitos políticos, liberdade de expressão e movimento, privacidade e vigilância, reconhecimento de género e violência doméstica foram submetidas pela Associação Novo Macau (ANM) à Revisão Periódica Universal (UPR, na sigla inglesa) do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. O documento, redigido por Jason Chao e Rocky Chan,  integra “recomendações tecnicamente alcançáveis, mensuráveis e calendarizáveis” e foi entregue no dia 28 de Março para chegar à 31ª sessão de trabalhos do organismo da ONU sobre a Região Administrativa Especial de Macau. A apresentação elenca informações sobre os cinco tópicos relacionados com Direitos Humanos e aponta as falhas detectadas pela associação pró-democrata do território no contexto da realidade local.

“Não queremos que a ONU oiça apenas a opinião ou o comentário do Governo, por isso devemos mostrar a nossa voz à comunidade internacional. Os direitos políticos e os dados e informações pessoais são os tópicos mais importantes e, ao mesmo tempo, mais perigosos. O Governo tem actualmente mais poder para controlar a nossa privacidade e os nossos direitos humanos e civis, algo que poderá piorar no futuro”, disse Sulu Sou, vice-presidente da ANM, ao PONTO FINAL.

A ANM começa por afirmar que “o direito à participação política é limitado em Macau”, e pede que o Conselho dos Direitos Humanos apele a Macau à implementação de eleições directas para o Chefe do Executivo, “o mais tardar em 2019”, para “todos os membros da Assembleia Legislativa, não depois de 2021” e para membros do instituto municipal que será criado futuramente.

“A vasta maioria dos cidadãos de Macau pode eleger 14 dos 33 membros da Assembleia Legislativa. Os responsáveis do Governo de Macau negaram repetidamente a introdução de sufrágio universal para as eleições do Chefe do Executivo e de todos os membros da Assembleia Legislativa”, refere o documento.

Quanto ao novo órgão municipal sem poder político – cuja criação foi anunciada em Outubro do ano passado e a respectiva proposta de lei, que prevê a sua constituição sem recurso a eleições directas, foi sujeita a consulta pública –, a ANM considera que a sua criação “não vai trazer qualquer mudança substancial que permita uma participação mais activa do público nos assuntos municipais”. A proposta de lei intitulada Criação do Instituto para os Assuntos Municipais foi ontem apresentada no hemiciclo.

A ANM lembra que no relatório final da consulta pública “o Governo reiterou a sua posição relativamente aos membros, tanto das comissões consultivas como das administrativas do futuro instituto municipal, não estarem sujeitos a eleições directas. Apesar do facto de a Lei Básica diferir a formação do instituto municipal não-soberano e a legislação local e não conter disposições que proíbam a eleição dos seus membros, o Governo insistiu que permitir eleições seria incompatível com a Lei Básica”.

A liberdade de expressão e de movimento

Garantir “soluções efectivas” às pessoas a quem é negada a entrada em Macau e o acesso às “razões reais para a recusa da sua entrada” são as recomendações deixadas no documento no que diz respeito à liberdade de expressão e de movimento no território. A ANM recorda os jornalistas, deputados, activistas, académicos e escritores que foram impedidos de entrar em Macau. “Os casos não foram pouco frequentes”, indica a associação. “A única justificação dada no aviso de recusa é que o visitante em questão ‘representaria uma ameaça à segurança interna de Macau’”, lê-se ainda no documento.

“O Governo de Macau alegou que as proibições de entrada foram realizadas ‘de acordo com a lei’ e ‘não tiveram nada a ver com a profissão dos visitantes’. No entanto, pessoas com bom senso veriam que essas afirmações são dificilmente convincentes”, escreve a ANM, recordando a situação em que jornalistas de Hong Kong não puderam entrar no território para fazer a cobertura dos danos deixados pela passagem do tufão Hato por Macau, em Agosto do ano passado, e o caso dos escritores cujo convite para participarem no Festival Literário de Macau – Rota das Letras foi cancelado por não lhes ser garantida a entrada na RAEM.

A privacidade e vigilância

“O mecanismo para proteger os dados pessoais dos cidadãos contra o abuso pelas autoridades é fraco. Embora Macau tenha adoptado uma lei de protecção de dados com raízes na Directiva Europeia de Proteção de Dados, as acções do Gabinete de Proteção de Dados Pessoais (GPDP) de Macau convocaram a sua sinceridade para proteger a privacidade dos cidadãos”, refere a Novo Macau no documento, frisando que o GPDP “tem histórico de repressão de iniciativas civis”.

Os pró-democratas querem que o Conselho de Direitos Humanos da ONU interceda junto do Governo, pedindo uma maior transparência, obrigando “as autoridades públicas a divulgarem informação verdadeira e completa sobre as capacidades das tecnologias de vigilância utilizadas na Lei da Cibersegurança [proposta pelo secretário para a Segurança]”.

O reconhecimento de género e a violência doméstica

Na lista de recomendações elaborada e assinada pela ANM, também a questão do reconhecimento de género mereceu atenção, já que “Macau não possui políticas que respeitem a identidade de género de pessoas transexuais”. Entre as 11 páginas que chegaram à ONU, lê-se que “as pessoas transexuais que mudaram os indicadores de género nos seus documentos de identidade de Macau foram recusadas devido à falta de base legal, no início de 2015”, e que a promessa feita pelo Executivo de permitir a mudança daqueles indicadores continua sem actualizações desde então.

A associação local defende a promulgação de uma lei que permita que pessoas transexuais, sem serem submetidas a um inquérito de esterilização, tenham as suas identidades de género reflectidas em documentos oficiais de identidade até ao ano de 2020.

No que respeita à violência doméstica, a ANM considera necessária a correcção da Lei de violência doméstica na sua próxima revisão (que acontece três anos após a sua entrada em vigor) no sentido de proteger os parceiros íntimos desde tipo de violência, independentemente da sua orientação sexual.

A maior associação pró-democrática do território salienta que “apesar da recomendação do Comité Contra a Tortura das Nações Unidas para que Macau promulgue uma lei de violência doméstica sem discriminação, o Governo de Macau recusou-se a conceder protecção igual contra a violência doméstica independentemente da orientação sexual. A actual lei protege parceiros íntimos não casados do sexo oposto. Os seus pares do mesmo sexo (parceiros íntimos não casados do mesmo sexo) são privados do mesmo nível de protecção legal”.

Ponto Final Macau | Foto: Eduardo Martins

O ENIGMA DO CRESCIMENTO CHINÊS


Rémy Herrera *  e Zhiming Long **

Por que falar de enigma? 

O êxito manifesto da economia chinesa, ilustrado especialmente por uma taxa de crescimento muito rápida do produto interno bruto (PIB) – de facto, a mais elevada do mundo em média ao longo das últimas três décadas –, mas também pelo papel de líder que hoje ela tende a ocupar no seio dos países do Sul, é muitas vezes comentado nos media e na literatura académica. Entretanto, um mistério continua a rodear este fenómeno, nomeadamente porque o conteúdo e por vezes a própria realidade dos debates entre economistas chineses – ainda que muito controversos e abrangendo o espectro político completo que vai do marxismo ao neoliberalismo – não são percebidos na sua justa medida pelos comentadores ocidentais.[1] Estes últimos estão com efeito constrangidos a apoiarem-se sobre dados estatísticos e fontes de informação geralmente elaboradas por instituições ocidentais (ou multilaterais, mas sempre dominadas pelas potência ocidentais), que traduzem visões externas à China. Este prisma centrado no ocidente, ideológico por natureza, é deformador – pelo menos tanto, há que reconhecer, quanto aquele com que são tratados os discursos oficiais das autoridades chinesas.

Além disso, também há dificuldades devido a incertezas transmitidas por certos termos utilizados acerca da China (como o de "emergência"), ou certas categorias ambíguas (como a dos "BRICS"), assim como à indeterminação – para não dizer confusão – que acompanha as tentativas de caracterização do sistema político-económico em curso neste país. Estas dificuldades, complexas como se vê, explicam que fora da China as opiniões sobre a evolução desta sociedade, por vezes muito categóricas, são frequentemente mal documentadas e pouco escoradas. À direita, o que é celebrado é o triunfo aparente de um capitalismo vigoroso em território chinês, mesmo que se considere aberrante sua combinação com a "ditadura comunista". À esquerda – ou, digamos, sobretudo entre marxistas –, talvez mais do que em qualquer outro tema, o leque de desacordos a seu respeito está amplamente aberto, indo da franca desaprovação frente às gritantes desigualdades de riqueza que induz este dinamismo económico até à esperança finalmente reencontrada de uma nova super-potência capaz de se contrapor ao hegemonismo estado-unidense. O poderio crescente da China intriga, fascina, provocando aqui admiração, ali inquietação, mas para todos o crescimento da sua economia no fundo permanece um enigma.

É neste contexto singularmente nebuloso que no ocidente parece se ter estabelecido um consenso no seio das instituições da ideologia dominante quanto a certas "evidências" sobre a China. Uma das mais enraizadas é a ideia segundo a qual a China teria "emergido", e seu crescimento económico "descolado", após as "reformas" ditas de "abertura" do fim dos anos 1970, ou seja, de facto após a morte do presidente Mao Zedong em 1976. O presente artigo pretende por em causa este consenso e fornecer elementos de reflexão para desenredar o "enigma" deste crescimento chinês – sem pretender dissipar, longe disso, toda a complexidade.

Acumulação de capital, crescimento da produção e "emergência" de longo prazo 

Uma das ideias mais difundidas sobre a China é que ela teria "emergido" recentemente. O conceito de "emergência" – tal como aquele de "BRICS", forjado pelos think tanks das finanças estado-unidense – sugere que um "descolamento" seria encarável no quadro da mundialização, apesar dos disfuncionamentos do sistema mundial capitalista, no entanto desfavoráveis aos países do Sul. Entretanto, ao aceitar esta ideia de que a economia chinesa teria "emergido", ou "descolado", exactamente após – e somente após – o desaparecimento de Mao, adere-se, implicitamente, a uma das variantes da seguinte argumentação. Em primeiro lugar, a economia chinesa não teria realmente começado a se desenvolver senão graças à sua "reorientação" e sua "abertura" ao sistema mundial capitalista adoptada sob a influência do número um chinês, Deng Xiaoping, na sequência do 11º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) em Dezembro de 1978 – e incidentalmente, algumas semanas mais tarde, do reconhecimento diplomático da República Popular pelos Estados Unidos, em Janeiro de 1979. Em segundo lugar: seria óbvio que a economia chinesa não teria feito outra coisa senão estagnar durante o período maoista do socialismo – como estagnaria de facto, pela sua natureza por assim dizer, toda economia socialista. E, terceira variante deste mesmo raciocínio, acrescenta-se o argumento segundo o qual a China se teria modernizado quase imediatamente depois (por magia?) de os seus altos dirigentes políticos terem decidido abandonar, se não a etiqueta de "comunismo", pelo menos as instituições do socialismo, para orientá-las rumo a formas do sistema capitalista.

Ora, ao assim fazer, três realidades fundamentais ficam ao mesmo tempo ocultadas. A primeira, no entanto grandiosa, é a profundidade milenar da história. Pois se é incontestável que a China de facto "emergiu" na cena mundial, isto não foi há 40 anos, como repete o leitmotiv absurdo dos media dominantes, mas, enquanto civilização importante – e Estado-nação –, há... vários milhares de ano. O peso da China pôde atingir um terço do PIB mundial no começo do século XIX. [2] E é preciso manter consciência de que não foi senão graças à vitória da revolução maoista em Outubro de 1949 que foi possível por fim ao século de guerras havia dilacerado o país, continuamente, desde a agressão britânica da Guerra do Ópio em 1842 e dos assaltos lançados pelas potências ocidentais que haviam desmembrado este país. A segunda realidade deixada de lado é que quando na China o crescimento do PIB começou a ultrapassar regularmente a marca dos 10%, na década de 1980 (contra 3% registados nos Estados Unidos), o essencial das estruturas e instituições do socialismo ainda estavam em vigor. O terceiro facto a recordar aqui, muito frequentemente esquecido na literatura, é a rapidez relativamente forte da taxa de crescimento do PIB chinês antes da morte de Mao.

Este último ponto é suficientemente importante, e esquecido, para que nele insistamos por um instante. É verdade que o crescimento económico acelerou-se a partir dos anos 1980 – ao ponto de colocar a China, a partir desta época, e apesar do seu nível bastante fraco de rendimento per capita, longe dos outros países ditos "socialista" ou de "economia historicamente planificada" durante esta mesma década. Ainda seria preciso reconhecer que o crescimento do produto material líquido (ancestral do PIB) já havia sido muito elevado no decorrer dos dez anos que antecederam a decisão de "reformar" a economia para abri-la ao sistema mundial.[3]

Segundo os dados fornecidos pelo Banco Mundial, expressos em preços constantes (base 1980) e em médias decenais, a taxa de crescimento económico da China atingia 6,8% entre 1970 e 1979 – ou seja, mais do dobro daquela dos Estados Unidos neste período (a 3,2%, a preços constantes de 1980). [4] E se se examinam agora as séries oficiais de PIB publicadas pelo National Bureau of Statistics (NBA) da China nos seus China Statistical Yearbooks [5] , fonte de qualidade e fiável, desde a sua criação (em 1952) até os nossos dias (2015), expressos em preços constantes com base em 1952 e homogeneizados para levarem em conta rupturas estatísticas que assinalaram a transição da contabilidade do Material Product System (MPS, de tipo soviético) para o System of National Accounts (SNA, "moderno") [6] , observamos que a taxa de crescimento do PIB chinês, que em média anual era de 8,3% entre 1952 e 2015, era, por sub-períodos, de 6,3% entre 1952 e 1978 – o que é forte – e de 9,9% de 1979 a 2015 – o que é muito forte. Mas se se puser entre parênteses todos os primeiros anos da República Popular que vão de 1952 a 1962 (ou seja, entre o cumprimento da unificação do território continental e o período muito perturbado da ruptura com a União Soviética), é uma taxa de crescimento anual médio do PIB chinês de 8,2% que se regista entre 1963 e 1978 – o que reflecte um crescimento muito rápido, considerando que este período compreende a Revolução Cultural.

Mas o que é realmente a acumulação do capital na China? Esta acumulação pode ser medida. Num artigo que os autores destas linhas publicaram recentemente na revista científica de referência nos EUA especializada sobre a China (a China Economic Review ), chegámos a construir várias séries temporais originais de stocks de capital físico no período longo (1952-2015) [7] – para utilizar esta nova base em outras investigações, mas também porque, no momento actual, os institutos chineses de estatísticas ainda não puseram à disposição do público dados oficiais de stocks de capital. [8] Nossas séries, calculadas pelo método do inventário permanente, podem ser consideradas de boa qualidade em relação àquelas que existem na literatura [9] , por várias razões: nossos stocks iniciais são estimados a partir de um procedimento de cálculo mais rigoroso do rácio capital- output do que as das outras bases; os fluxos de investimento são estritamente consistentes com o perímetro estatístico dos stocks; nossos esforços são concentrados na construção de índices de preços dos investimentos adaptados ao conteúdo exacto destes stocks; e as taxas de depreciação retidas são avaliadas por tipo de bens de capital a fim de deduzir uma taxa de depreciação total da estrutura de conjunto do capital.

Ora, se examinarmos atentamente nossa nova base de dados, constatamos que as taxas de crescimento médio do stock de capital que chamamos "produtivo" (compreendendo todos os equipamentos, máquinas, ferramentas, instalações industriais, mas não os edifícios residenciais nem o valor das suas terras) foram de facto muito próximas nos dois sub-períodos 1952-1978 e 1979-2015: 9,7% para a primeira e 10,9% para a segunda. E se retivermos no presente um stock de capital produtivo ampliado, incluindo igualmente osinventories (importantes para calcular a velocidade de rotação do capital circulante em economia marxista), vemos que o ritmo médio de acumulação deste stock de capital amplo foi mesmo ligeiramente mais elevado durante o sub-período 1952-1978 (10,41%) do que no decorrer do sub-período 1979-2015 (10,39%). E se se seleccionar um capital ainda mais extenso, integrando além disso os edifícios residenciais e suas terras – portanto componentes não directamente produtivos –, a taxa de crescimento deste stock de capital muito amplo ainda era rápida no sub-período 1952-1978, em média de 9,1% contra 10,9% de 1979 a 2015.

Portanto é claro que o esforço de acumulação de capital não é um fenómeno recente, mas que foi decidido e planificado continuamente pelas autoridades chinesas durante as seis décadas decorridas. E é este esforço prolongado de acumulação – permitido nomeadamente por transferências de excedente das zonas rurais – que explica o êxito da industrialização e, em grande medida, a muito forte taxa de crescimento do PIB.

Despesas de educação e de investigação 

Entretanto, outros factores tiveram certamente de actuar neste dinamismo da economia. Trata-se, em particular, dos investimentos realizados na educação e na investigação. Como medi-los? A tarefa não é fácil, mas tentámos fazê-lo num outro artigo publicado numa revista académica de Londres. [10] Reconstruímos em séries temporais longas (1949-2015) indicadores de níveis de recursos educativos da população chinesa. Pois tais séries tão pouco existem nos anuários oficiais, e as séries relativas aos stocks de "capital humano" existente na literatura, como aquelas das Penn World Tables (2013) ou de Barro e Lee (1993), apresentam graves limites. [11]

Propusemos nossas próprias séries de stocks de formação da população esforçando-nos por trazer elementos de respostas a estas insuficiências. Assim, permanecemos fieis à definição que o NBS dá do nível de educação atingido pela população (o que conduz a integrar não só as pessoas titulares de diplomas como também aquelas que ainda se encontram na escola e mesmo aquelas que renunciaram no decorrer dos estudos). Tivemos em conta igualmente as mudanças de durações dos ciclos educativos decididos na sequência das reformas educativas sucessivas e tomámos em consideração a influência das campanhas de alfabetização e de formação dos adultos. Determinámos portanto stocks de recursos educativos, assim como seus aumentos (accrétions) respectivos – o que requer calcular os números médios de anos de estudos das pessoas por categoria de educação e os pesos destes indivíduos na população.

Ressalta das nossas estimativas que as taxas de crescimento médio do stock total de recursos educativos chineses têm sido extremamente próximas no sub-período 1949-1978 (de 4,19%) e no sub-período 1979-2015 (4,22%). E se considerarmos um stock educativo "produtivo", efectuando os cálculos a partir da população activa (e não total, como anteriormente), então as taxas de crescimento médio deste stock de recursos educativos foram de 5,07% de 1949 a 1978 e 3,55% de 1979 a 2015, ou seja, mais elevado no sub-período que antecedeu as reformas de 1978.

Em consequência, o investimento no sector da educação também deve ser analisado como um processo de longo prazo, importante nos primeiros anos da República Popular pois visava a massificação da educação – isto, paralelamente à generalização do sistema de saúde pública e à extensão das infraestruturas a todo o território nacional. Trata-se de um dos pilares centrais da estratégia conduzida pela revolução na duração longa, que contribuiu decisivamente para a solidez e o dinamismo da economia actual.

Mas e quanto a (fluxos de) despesas de investigação e desenvolvimento (I&D)? A China não integrou o sistema de contabilização internacional das actividades I&D senão em 1986. Isso não significa que o país não tenha começado a investir em I&D senão a partir de 1986, mas que antes desta data é impossível ter acesso a dados homogéneos sobre o assunto. Diante deste constrangimento, elaborámos séries temporais originais, desta vez pelos fluxos de despesas de I&D, remontando o mais longe possível no passado (1949-2015). Retivemos todas as massas orçamentais, elementos de entidades económicas públicas (centro de investigação, universidades, empresas, etc) ou privadas, ainda que a proporção da I&D que saia destes últimos nos orçamentos totais permaneça, até o presente, relativamente menor. Recordamos que só em 1984 uma empresas privada foi autorizada a funcionar na República Popular e que a primeira legislação relativa à actividade das diversas actividades do sector privado dada de 1988. No que se refere aos anuários do NBS, as "despesas de I&D das empresas industriais de médio e grande porte" ainda se elevavam a menos de 6,5% do conjunto das despesas de investigação do país em meados dos anos 2000.

E os cálculos que efectuámos na base destas séries reconstruídas dão taxas de crescimento médias das despesas de I&D da ordem dos +14,5% ao ano no período 1949-2015, mas convém observar que o ritmo médio de acréscimo destas despesas de I&D foi claramente mais forte no sub-período 1949-1978 do que no seguinte (1979-2015). Evidentemente, os níveis tecnológicos dos primeiros anos e os de hoje são diferente e, além disso, o sistema de investigação pública teve de ser construído a partir do zero – o que explica em parte o crescimento muito rápido das despesas de I&D dos primeiros anos. Entretanto, é preciso compreender que os esforços efectuados pela China em matéria de I&D estão longe de terem sido insignificantes logo desde o início da revolução e que também eles devem ser analisados como uma estratégia construída pacientemente e continuamente que deu os seus frutos a longo prazo.

Por outras palavras, a China, cujo nível de desenvolvimento científico e tecnológico já não tem nada a invejar em relação aos mais avançados países industrializados capitalistas, não começou a promover suas actividades de investigação com a sua recente integração na mundialização, mas sim muito antes – de facto, desde a vitória da revolução, ainda que a natureza destas actividades se tenha refinado consideravelmente nestes últimos anos. Em termos simples, o que dizemos é que a estratégia de desenvolvimento da revolução dispôs as condições para o êxito actual da economia e que este êxito se inscreve na continuidade do passado, ao invés de estar em contradição com ele.

Comparações internacionais 

Para bem apreender que a dinâmica e a potência actuais da economia chinesa não são simples resultantes "naturais" da abertura à mundialização (e em particular da adesão à Organização Mundial do Comércio, em 2001), parece importante ver isto em termos de comparações internacionais. Para assim fazer, utilizaremos uma fonte padrão que ninguém suspeita de favoritismo em relação ao poder comunista: o gui das Historically Planned Economies do Banco Mundial. Este anuário, publicado em 1992 por P. Marer e seus co-autores, permite comparar a China antes de 1991 com uma trintena de países socialistas (que hoje são na maior parte antigamente socialistas). [12]

E o que revele a leitura deste documento é, novamente, que a economia chinesa já esta dinâmica, no seu conjunto, em relação aos outros países socialistas, antes (e em torno) da morte de Mao. Este foi o caso, por exemplo, para a taxa de crescimento do sector industrial, que atingiu em média +7,9% por ano na década de 1970, ou seja, o segundo lugar dos países de economia administrada, diante da URSS (6,2%) e muito adiante de todos os outros (salvo a Jugoslávia para a indústria). A velocidade de cruzeiro da economia chinesa foi portanto atingida muito tempo antes da sua adesão à OMC. No decorrer dos anos 1980, com efeito, quando o país ainda dispunha da maior parte das instituições socialistas, ela registava taxas de crescimento muito fortes em todos os sectores em comparação com os outros países ditos "socialistas". Assim, de 1980 a 1989, a China já se classificava no primeiro lugar deste grupo para o crescimento da agricultura (+6,3%), da indústria (+12,6%), da construção (+12,%) e mesmo dos serviços (+10,6%); resultados frequentemente situados claramente adiante dos outros países. [13]

Enquanto um pouco por toda a parte na academia ou nos media dominantes lê-se e ouve-se que a "descolagem" da economia chinesa seria devida à abertura à mundialização, de nossa parte pensamos ser útil acrescentar – o que raramente é o caso – que um tal crescimento não se tornou possível senão graças aos esforços e realizações cumpridas sob Mao. E só devido à condição de esta abertura ter sido firmemente e eficazmente controlada pelas autoridades chinesas é que ela pode ser considerada como tendo contribuído mais recentemente para os êxitos económicos do país. É por ter sido submetida aos imperativos internos de satisfação dos objectivos e necessidades domésticas, e plenamente integrada numa estratégia de desenvolvimento cuja coerência é sem equivalente nos países do Sul, que esta abertura pôde produzir efeitos positivos sobre a China. Sem esta estratégia, que é a obra do PCC – como esquecê-lo? – a abertura ao sistema mundial capitalista, como em tantos outros lugares no Sul e no Leste, teria inevitavelmente implicado a desestruturação, mesmo a própria destruição, da economia nacional.

Além dos progressos sociais e do êxito do processo de industrialização já evocados, um elemento essencial que também contribuiu para o desenvolvimento extraordinário da economia foi a resposta dada à questão agrária. Queremos aqui insistir no facto de que a China é um dos poucos países do mundo a ter assegurado – e continuar a assegurar –, na lei, o acesso à terra para a vasta maioria das massas camponesas. Este facto é sem igual junto aos seus vizinhos asiáticos – com excepção daqueles que efectuaram uma reforma agrária radical associada a uma revolução socialista, como no Vietname. Múltiplas violações do direito e tentativas destinadas a limitar este acesso têm sido observadas nos últimos anos (nomeadamente, pelo viés de cessões indevidas de terras públicas por autoridades locais, seguidas de expropriações de famílias), mas face a estes casos abusivos, certamente numerosos, ergueram-se resistências camponesas.

Estes factos dão uma ideia da importância da questão agrária nos debates internos na liderança política chinesa, como aqueles que atravessam a sociedade actual no seu conjunto. Percebe-se aqui a impossibilidade de compreender as evoluções profundas deste país sem colocar o campesinato no centro da análise. Pois o constrangimento maior que pesa sobre a China continua o de dever alimentar mais de 20% da população mundial com menos de 7% das terras aráveis do planeta. Isto corresponde a um quarto de hectare de terra cultivada por habitante na China, contra o dobro na Índia (e 100 vezes mais nos Estados Unidos). Este desafio alimentar, imenso, não pôde ser enfrentado senão graças à afirmação do acesso à terra para o campesinato, que continua, até o presente, a contribuição mais preciosa da herança revolucionária maoista.

Apesar de os modos actuais de organização, de produção e de distribuição do sector agrícola estarem totalmente penetrados pelos mecanismos de mercado e já não terem grande coisa a ver com os da época maoista, a propriedade fundiária na China ainda hoje permanece estatal ou colectiva – ainda que formas degradadas sejam frequentemente encontradas, por vezes mesmo com um controle privado efectivo sobre certas terras. Mas é esta persistência da propriedade pública é uma chave que permite distinguir a situação – e o êxito – da China em relação aos outros países que têm uma dimensão continental comparável e pretensamente "emergentes", tais como a Índia ou o Brasil, ou países regionalmente dominantes (África do Sul) para os quais a questão agrária está longe de ter encontrado condições, mesmo parciais, de solução.

Identificação de uma sucessão de "crises" e verificação da tese do Prof. Wen 

Mas se o crescimento da China foi muito forte durante várias décadas, será que tal fenómeno se realizou sem dificuldades, sem solavancos? Para responder, retomemos a base de dados do PIB do NBS. O que se constata? Primeiro, verificamos que desde 1952 a evolução do PIB chinês, em preços constantes, tem a aparência de uma curva exponencial. E se se raciocinar em escala logarítmica, observamos uma situação situada em torno de uma tendência linear fortemente ascendente. Mas se se encara no presente esta dinâmica em taxa de crescimento, vêem-se surgir flutuações, ainda que a amplitude tenda a reduzir-se com o tempo, e para quatro períodos precisos, de taxas de crescimento negativas. À parte estes períodos, todos os outros anos registam um crescimento positivo do PIB, mais ou menos pronunciado. Estes quatro períodos com valores negativos são identificáveis para sete anos (dos 64 incluídos a amostra estudada [1952-2015], ou seja, apenas mais de 10% do tempo: de 1960 a 1962 (com respectivamente -1,3%, -27,8% [para o ano de 1961, de longe o mais forte recuo sofrido pelo país em seis décadas] e -9,2%), associados ao choque da ruptura de relações com a URSS; depois em 1967-68 (-4,4$ e -2,9%), o que corresponde ao início da Revolução Cultural; em 1976 (-2,0%), data da morte de Maio; e finalmente em 1989 (-4,3%), no momento dos acontecimentos de Tiennamen. Podemos portanto identificar "a olho nu", e num contexto de tendência ascendente da taxa de crescimento económico, quatro períodos de "crises" no sentido tradicional do termo, ou seja, caracterizadas por uma taxa de crescimento negativa, portanto por uma diminuição do PIB em preços constantes (sem inflação): 1960-62, 1967-68, 1976 e 1989.

Entretanto, esta abordagem é insuficiente para dar conta das dificuldades atravessadas ao longo das seis décadas decorridas desde o início da revolução. Vamos aqui para além das aparências. Para aprofundar a análise, e complexificar o conceito de "crise", optamos por recorrer a indicadores da taxa de lucro para a China. O método consistente em calcular taxas de lucro é habitual entre os marxistas para estudar as dinâmicas de acumulação do capital que caracterizam países capitalistas, mas não, em geral, países "socialistas", ou cujas autoridades políticas se reclamam favoráveis ao socialismo. Ora, é inteiramente possível utilizar taxas de lucro em economia socialista, se a sua construção, ainda que a sua construção e interpretação sejam bem distintas das dos países capitalistas. [14] Construímos portanto vários indicadores da taxa e lucro do sector industrial chinês entre 1952 e 2015, a partir das nossas séries anteriores de stocks de capital físico. Estes indicadores relacionam, no numerador, um lucro ou excedente, correspondente á diferença entre o PIB e as remunerações dos trabalhadores (directas e indirectas) e, no denominador, o capital avançado, isto é, quer o capital fixo tal como o havíamos definido, quer este mesmo capital ao qual é acrescentado um capital circulante calculado a partir de uma estimativa da velocidade de rotação do capital (graças aos inventories ).

Pode-se então proceder, utilizando um método de filtragem, a uma decomposição técnica da taxa de lucro em tendência de longo prazo e ciclos de curto prazo. Duas observações podem ser feitas. A primeira é a detecção de uma tendência à baixa das taxas de lucro chinesas de 1952 a 2015, seja qual for o indicador adoptado. Se se efectuar agora uma decomposição económica das taxas de lucro, por cálculo destinado desta vez a distinguir as evoluções respectivas da composição do capital, da produtividade do trabalho e da parte dos lucros, vê-se que o fenómeno mais determinante na explicação da baixa da taxa de lucro é a alta da composição orgânica do capital (ou seja, a relação entre as partes constante e variável do capital).

A segunda observação refere-se aos ciclos de curto prazo que pontuam as evoluções destas taxas de lucro. Repara-se numa alternância regular de flutuações para a alta e para a baixa e constata-se que estas variações cíclicas reduzem-se claramente entre os anos 1950 e o início da década de 2000, mas que a magnitude dos ciclos tende sensivelmente a acentuar-se novamente no fim do período – ou seja, desde o fim dos anos 2000 e o período actual.

Na amostragem completa (1952-2015), uma sucessão regular de momentos de variações negativas das taxas de lucro pode assim ser assinalada. Os anos de recessão descobertos pelas taxas de lucro, marcados por crescimentos das componentes cíclicas das taxas de lucro com valores negativos, são observados uma trintena de vezes no decorrer dos 64 anos estudados. Mais precisamente, um sinal negativo é assinalado em 1952, 1957, 1960-1963, 1968, 1978-1982, 1985-1987, 1990-1991, 1998-2003, 2009 e 2012-2015. Assim, vemos que já não são apenas quatro períodos que estão identificados (como sugeria o estudo rápido anterior da taxa de crescimento do PIB), mas 10 períodos com valores negativos, registados desta vez pela taxa de crescimento das componentes cíclicas das taxas de lucro, cobrindo no total cerca da metade da amostragem temporal examinada.

Reconhece-se, através destas sequências recessivas, as desacelerações que sucessivamente afligiram a história económica da China desde a fundação da República Popular – e que o Prof. Wen Tienjun tem razão em denominar as "dez crises". [15] Depois das enormes dificuldades que o povo chinês teve de enfrentar após 1949, devidas essencialmente às destruições causadas pelas guerras e convulsões que o país havia atravessado nas décadas que antecederam a Revolução, reencontramos o traço da recessão de começa em 1952 – e cujo ponto baixo foi 1957. A grave crise do início dos anos 1960 – a pior sob a era maoista, perceptível sobretudo em 1961 – provinha dos efeitos combinados da interrupção da ajuda da URSS após a degradação do conflito sino-soviético, do fracasso relativo do Grande Salto Em Frente e de catástrofes naturais. O ano de 1968, outro ponto baixo, coincide com o endurecimento da Revolução Cultural, lançada dois anos antes. Os problemas enfrentados entre 1978 e 1982 traduzem as dificuldades da transição pós-Mao e da implantação das reformas estruturais de "abertura". O período 1985-1986 é um dos pontos de viragem rumo à economia de mercado, nomeadamente com a execução da reforma fiscal de 1984. Depois, no momento da queda do bloco soviético, foi tentada uma breve experiência que se pode qualificar de "neoliberal", cujo resultado foi o recuo brusco da economia em 1990-1991, acompanhada de uma explosão da corrupção. Finalmente, num contexto de forte dinamismo do PIB chinês, os declínios dos componentes cíclicos das taxas de lucro a partir de 1998 são cada vez mais atribuíveis ao impacto de choques exógenos importados, ligados à difusão dos efeitos de crises regionais ou globais sofridos pela China: crise "asiática" (1998-1999), depois crises da "nova economia" e "pós 11 de Setembro" (2001-2003), crise "financeira" dita "dos subprimes" em 2008 (na realidade crise sistémica do capitalismo), cujos efeitos foram ressentidos na China em dois tempos: em 20089 e, novamente, de modo mais durável e profundo, a partir de 2012 e até os nossos dias. [16]

Estes 10 momentos de "crises" são mais frequentemente identificáveis, paradoxalmente, no próprio momento em que o crescimento do PIB atingia simultaneamente taxas elevadas – e por vezes muito elevadas, como é o caso por exemplo, em contextos diferentes, nos anos 1963, 1978, 1986, 1991 e 2003. Por outras palavras, no caso chinês crescimento não quer necessariamente dizer ausência de dificuldades e, inversamente, crise não significa forçosamente recessão do PIB. Num país como a China, caracterizada por contradições poderosas, não nos pareceu necessário recorrer a um conceito mais amplo de "crise" para dar conta de períodos no decorrer dos quais surgiam dificuldades estruturais – isto, apesar das aparências de um forte crescimento do PIB podendo fazer crer que tudo vai bem.

À guisa de conclusão 

Neste artigo, quisemos sublinhar a importância da análise de período longo para compreender os motores profundos do desenvolvimento económico da China desde há mais de 60 anos: os progressos sociais, a industrialização ou a resposta à questão agrária. Para aprofundar a reflexão sobre as dificuldades encontradas pela economia chineses, para além do forte crescimento do seu PIB, propusemos fazer o exame desta última à luz das taxas de lucro industriais, que construímos a partir de séries originais de stocks de capital físico chinês e considerado como indicador chave do nosso raciocínio. Ao observar as evoluções destas taxas de lucro ao longo de mais de seis décadas, percebemos que a trajectória de crescimento económico da China, excepcional tanto pela sua forma como pela sua escala, não se operou sem dificuldades. Esta é a razão porque escolhemos qualificar de "crises" períodos paradoxais, caracterizados por variações negativas das taxas de lucro, mas também por taxas de crescimento do PIB positivas, por vezes muito elevadas.

04/Abril/2018

Notas:
[1] Ler: Lau K.C. and Ping H. (eds), 2003, China Reflected . Hong Kong: ARENA Press.
[2] Maddison A., 2001, The World Economy: A Millennial Perspective , Paris: OECD Development Centre Studies.
[3] Marer P. et al. , 1992. Historically Planned Economies: A Guide to the Data . Washington D.C.: World Bank.
[4] World Bank, various years, World Development Indicators . Washington D.C.: World Bank.
[5] National Bureau of Statistics of China, various years, China Statistical Yearbook , NBS, Beijing.
[6] Ver: unstats/un.org/unsd/nationalaccount/sna2008.asp.
[7] Long Z. and R. Herrera (2016), "Building Original Series of Physical Capital Stocks for China's Economy: Methodological Problems, Proposals of Solutions and a New Database," China Economic Review , 40(9), 33-53.
[8] Ver: Penn World Tables (www.rug.nl/research/ggdc/data/ptw) ou Chow G. (1993), "Capital Formation and Economic Growth in China,"Quarterly Journal of Economics , 108(3), 809-842.
[9] Exemplo: https://ptw-sas.upenn.edu. Para a versão 8.1, mais recente : www.rug.nl/research/ggdc/data/ptw.
[10] Long Z. et R. Herrera (2018), "Contribución a la explicación del crecimiento económico en China," Spanish Journal of Economics and Finance (Elsevier, London) , 41(115), 1-18.
[11] A título de exemplo, a base de dados Barro e Lee é de qualidade, mas ela começa apenas em 1970 e tem uma frequência de apenas cinco anos, o que está longe de ser suficiente para as exigências da análise económica. Quanto a elas, as estatísticas divulgadas pelos PTW subestimam exageradamente os níveis educativos da população chinesa. Ver: Barro R. and J.-W. Lee, 2012, Educational Attainment Dataset , disponível em: www.barrolee.com.
[12] Marer P. et al. (1992), p. 52.
[13] Idem , pp. 50-51.
[14] Herrera R. and Z. Long (2017), "Capital Accumulation, Profit Rates and Cycles in China's Economy from 1952 to 2014," Journal of Innovation Economics and Management , online, 2(23).
[15] Wen T. (2009), The 'San Nong' Problem and Institutional Transition . Beijing: China Economic Press.
[16] Herrera R. et Z. Long (2017), "Elementos de reflexión sobre el crecimiento económico de China en el largo plazo: 1952-2014," Temas de Economía Mundial (CIEM, Havana) , II(32). 


[*] Investigador do Centre national de la Recherche scientifique (CNRS), Centre d'Économie de la Sorbonne, Paris. 

[**] Professor assistente na Escola de Marxismo da Universidade Tsinghua de Pékin, Beijing, República Popular da China.


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

PORTUGAL | Cristas “anuncia” quem é - e tu?


Isabel Moreira | Expresso | opinião

Esta semana, Assunção Cristas “anunciou” que o CDS vai votar contra a autodeterminação da identidade de género e que está preocupada com o “sentido” da lei. Mais acrescenta que após debate interno ficou claro que todos os deputados do CDS discordam da proposta em causa.

Vamos ser claros.

Na primeira reunião das dezenas e dezenas que tiveram lugar na especialidade deste processo legislativo, o Deputado Nuno Magalhães afirmou perentoriamente que o CDS votaria contra fosse qual fosse o resultado das audições das entidades relevantes para a matéria e das próprias pessoas trans.
Ou seja, Cristas não “anunciou” nada.

O CDS não é contra a autodeterminação da identidade de género aos 16 anos porque está preocupado com uma eventual corrida desenfreada da população às conservatórias do registo civil para mudar de sexo “porque sim”, agora que se pretende, na senda de recomendações internacionais, dar autonomia às pessoas trans acabando com a agressão da sujeição a pareceres médicos como se fossem doentes.

O CDS é contra a autodeterminação da identidade de género aos 16 anos porque o CDS foi contra, é contra e será sempre contra o reconhecimento dos direitos das pessoas LGBT.

Afinal, se Cristas está preocupada com o “sentido” da lei, qual é o sentido que deveria ter a mesma?

Quando a lei da identidade de género foi aprovada em 2011, exigindo pareceres médicos e maioridade, o CDS votou contra, pelo que talvez o único “sentido” das declarações de Cristas seja o de reafirmar o reacionarismo de um Partido que, sabendo do seu eleitorado, dorme bem com a homofobia e a transfobia legal.

As pessoas LGBT não devem nada ao CDS, antes têm marcada na sua história pessoal de luta o combate acérrimo do “democratas-cristãos” contra a igualdade.

Revendo as votações do CDS “cristão” onde “todos têm lugar” – para usar uma expressão de Cristas – o Partido votou contra a proteção jurídica dos casais do mesmo sexo, votou contra o casamento igualitário, votou contra a coadoção em casais do mesmo sexo agredindo crianças de carne e osso com progenitores não reconhecidos, viabilizou um referendo pornográfico aos direitos das crianças filhas de casais do mesmo sexo (que o TC travou), votou contra a adoção por casais do mesmo sexo, votou contra a procriação medicamente assistida para todas as mulheres, independentemente do seu estado civil ou da sua orientação sexual, votou contra tudo e votará sempre contra estas pessoas e estas crianças.

Para o CDS, aquele artigozinho da Constituição que proíbe discriminações em função de várias categorias, como o sexo ou a religião, vincula-nos, exceto na parte “desagradável” em que também proíbe a discriminação em função da orientação sexual e, implicitamente, da identidade de género.

O “anúncio” e a “preocupação” de Cristas são, por isso, risíveis.

O “anúncio” mais não foi do que a constatação – recorrente – de quem é Assunção Cristas.

É a líder de um Partido que “acolhe” com espírito cristão as pessoas LGBT, desde que estas não se atrevam a ser, efetivamente, pessoas. Isto é, pessoas com os mesmos direitos de todas as outras.

Para o CDS, o amor ente duas pessoas do mesmo sexo não tem relevância social; para o CDS os casais do mesmo sexo, se quiserem ter filhos, através da adoção ou da PMA, são “egoístas” que não pensam no “superior interesse da criança”; para o CDS, as pessoas trans “sofrem muito”, mas paciência.

Para o CDS, os dadores de esperma, anónimos ou não (aguarda-se decisão do TC), são “pais”, como referiu no plenário desta República (sim, não foi no Estado Novo) a Deputada Vânia Dias da Silva. Na sua cabeça, se o TC reverter a sua doutrina (o que é possível), as crianças nascidas através de PMA (em casais do mesmo sexo ou de sexo diferente) poderão vir a saber quem é o “pai”. Não, senhora Deputada, poderão aceder à identidade do dador, mas o dador não figurará como “pai”, está a ver? Os bancos de esperma não são paizinhos armazenados.

Aproxima-se o momento da votação final global da lei que estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa.

Cada Deputada e cada Deputado é evidentemente livre de votar como quiser.

Que nunca se diga que o trabalho na especialidade não foi intensivo e histórico (ouvir menores trans e as suas mães não é coisa que se faça todos os dias).

Que fique para quem quiser o papel de caricaturar a lei – “vai tudo mudar de sexo porque sim, uma insegurança jurídica” - ou de, ao contrário, ler e ouvir o que resulta da ciência, de recomendações internacionais e da empatia.

Que cada uma e cada um de nós decida se quer fazer parte do historial do CDS (não, porque não) ou se quer consultar no site do Parlamento o que disseram a ILGA, os especialistas em pessoas trans, os juristas como a Professora Doutora Teresa Pizarro Beleza, os jovens trans, as mães desses jovens, a AMPLOS e então, talvez, perceber que ninguém sabe melhor quem é do que cada pessoa.

O diploma não tem nada a ver com alterações físicas das pessoas. Ninguém poderá fazer tratamentos médicos irreversíveis antes da maioridade. Só está em causa o reconhecimento legal de quem se é.

Cabe-nos a decisão de manter gente de carne e osso em sofrimento, em sofrimento diário, quando mostram o passe social ou o cartão de cidadão, em sofrimento quando, ao contrário de mim, têm de “provar” a terceiros quem são, em sofrimento quando não entendem por que razão não os entendemos.

Cristas anunciou quem é.

E tu? Quem és tu?

Portugal | NÃO HÁ NADA P'RA NINGUÉM - governo


Mário Centeno abriu mais uma guerra com os funcionários públicos. Foi declarado que só em 2020 será possível que tenham aumentos. As centrais sindicais ficaram estupefactas. Vem aí contestação social de milhares de funcionários que já há anos andam a ser vítimas dos cortes nos ordenados e na evolução e promoção nas carreiras. 

A agravar a situação estão a ser criadas situações diferenciadas entre os funcionários, uns vêem os seus ordenados serem mais gordos ao fim dos meses e outros não. Independentemente de exercerem o mesmo trabalho e categoria profissional. Para trabalho igual, salário igual – já é antigo e sabido este principio – mas não é o que está a acontecer e a diferenciação vai aumentar, em vez dos ordenados.

De Notícias ao Minuto juntamos três prosas que nos dão conta do que aconteceu ontem no Conselho Permanente de Concertação Social e respetivas declarações dos intervenientes. (PG)

Centeno diz que está "obcecado" em garantir a estabilidade orçamental

O ministro das Finanças recusou hoje informar dos dados que constam do Programa de Estabilidade, que será apresentado na próxima semana, referindo que está "obcecado" em garantir a estabilidade financeira e orçamental de Portugal.

"OPrograma de Estabilidade vai ser apresentado para a semana. Não gostaria de entrar em detalhes", afirmou Mário Centeno aos jornalistas, no final da reunião da Comissão Permanente da Concertação Social, em Lisboa, na qual apresentou as "grandes linhas" desse documento aos parceiros sociais.

As centrais sindicais CGTP e UGT disseram hoje, no fim da reunião, que o ministro das Finanças as informou de que não haverá aumentos de salários para a função pública em 2019. A CGTP acrescentou ainda que, no âmbito do Programa de Estabilidade, o Governo prevê uma redução da dívida pública de 23 pontos percentuais para 102% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2022.

O governante, nas declarações aos jornalistas, recusou confirmar quaisquer números, nem as novas perspetivas sobre o défice e o crescimento da economia.

Na quinta-feira, o Eco e o Jornal de Negócios noticiaram que o Governo já tinha iniciado as reuniões com os parceiros parlamentares sobre o Programa de Estabilidade, apresentando novas estimativas para este ano, de um défice orçamental de 0,7% do PIB e um crescimento económico de 2,3%.

No Orçamento do Estado para 2018, o executivo previa um défice orçamental de 1,1% do PIB (com o impacto de 0,1 pontos das medidas de apoio e resposta aos incêndios do ano passado) e um crescimento económico de 2,2%.

Segundo o ministro, o que o Programa de Estabilidade trará é projeções "muito positivas" para a economia e finanças públicas equilibradas, considerando que "qualquer desvio na trajetória coloca em causa a prossecução dos objetivos" a que o Governo se propôs.

"Estou obcecado em garantir a estabilidade da trajetória financeira e orçamental portuguesa. Nunca antes Portugal tinha cumprido as metas propostas", afirmou Centeno.

Lusa | em Notícias ao Minuto | Foto: Reuters

Governo disse a parceiros que não haverá aumentos nos salários em 2019

A CGTP disse hoje que o ministro das Finanças informou o Conselho Permanente de Concertação Social de que não haverá aumentos de salários em 2019, tendo a central sindical considerado "inadmissível" a posição do Governo.

"Não se percebe que este Governo esteja obcecado pelos números e a perder sensibilidade social", disse aos jornalistas o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, no fim da reunião de mais de três horas em Lisboa.

O dirigente sindical considerou que, com uma decisão como esta, o executivo põe os "trabalhadores em segundo plano enquanto trata os credores [de dívida pública] nas palminhas".

Lusa | em Notícias ao Minuto | Foto: Lusa

Funcionários públicos "continuarão a pagar fatura da crise"

A UGT disse hoje que saiu frustrada da reunião da comissão permanente da Concertação Social, em que o ministro das Finanças indicou aos parceiros sociais que não haverá aumentos salariais para a função pública em 2019.

"Ficamos não admirados, mas frustrados ao ouvirmos dizer que não haverá tão cedo aumentos salariais, estes trabalhadores continuarão a pagar fatura da crise. Isto causa grandes perturbações", afirmou Lucinda Dâmaso.

A dirigente sindical considerou que só "trabalhadores respeitados, reconhecidos e valorizados" prestarão serviços de qualidade na administração pública, como na saúde ou nas escolas, além de que o Governo devia dar "um sinal de esperança" a todos os que foram penalizados durante a crise.

Ainda para a presidente da central sindical UGT, o discurso do governante foi "dominado pela incerteza" em termos de futuro, apesar da melhoria da economia e da diminuição de desemprego que se vivem atualmente.

As centrais sindicais CGTP e UGT disseram hoje que o ministro das Finanças, Mário Centeno, informou hoje de que não haverá aumentos de salários em 2019, na reunião da concertação social em que deu a conhecer as linhas gerais do Programa de Estabilidade para 2018-2022.

Lusa | em Notícias ao Minuto | Foto: Global Imagens

PORTUGAL | Manifestantes exigem: «Cultura acima de zero!»


Os trabalhadores das profissões artísticas trocaram os palcos pelas ruas para afirmar a necessidade de uma nova política para a cultura. «Isto não acaba aqui, é apenas o início» – disse-se. Ainda bem.

Foram milhares os profissionais das Artes e da Cultura que se manifestaram em seis cidades do país (Lisboa, Porto, Coimbra, Beja, Ponta Delgada e Funchal), em protesto contra décadas de sub-financiamento do sector artístico e as políticas de sucessivos governos em matéria de apoio às artes – nomeadamente quanto ao desenho e resultados dos concursos no âmbito do Programa de Apoio Sustentado às Artes – e em defesa de uma política que dignifique a cultura e permita a esta desempenhar o papel, que constitucionalmente lhe incumbe, de motor do desenvolvimento cultural da sociedade portuguesa.

Lisboa

Em Lisboa – como nas outras cidades – nem a chuva, nem as tentativas de apaziguamento dos últimos dias desmobilizaram os manifestantes, que se concentraram no Rossio, frente ao Teatro Nacional D. Maria II, respondendo ao apelo do CENA-STE, da Rede-Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea, da Plateia-Profissionais Artes Cénicas, do Manifesto em Defesa da Cultura.

A concentração reuniu «cerca de mil e quinhentos profissionais da cultura», das artes performativas mas também «das artes plásticas e de outras áreas da cultura», – segundo André Albuquerque (CENA-STE) declarou ao AbrilAbril.

Os manifestantes encheram «mais de metade da praça do Rossio» – segundo a LUSA – com panos, faixas e cartazes (muitos deles artesanais), entoando repetidamente palavras de ordem como «quero, quero, quero, cultura acima de zero», «queremos um, por cento para a cultura», «governo sem cultura, cava a sua sepultura», ou «um por cento, já neste orçamento».

As emotivas intervenções foram muito aplaudidas e frequentemente interrompidas pelos presentes para gritarem palavras de ordem que expressavam as suas principais reivindicações.

Registámos intervenções de Victor Pinto Ângelo (Teatro Extremo), Cíntia Gil (directora do DOC Lisboa), Leonor Teles (realizadora), José Russo (Centro Dramático de Évora-CENDREV), Luís Castro (Karnarte), Martim Pedroso (Nova Companhia ), Miguel Partidário (Intervalo Grupo de Teatro)

André Albuquerque e Joana Manuel falaram em nome dos organizadores, com esta última a encerrar a acção com a leitura do comunicado da plataforma Apelo pela Cultura.

Além da reafirmação das exigências já formuladas:

- Definição de uma Política Cultural, criação de um novo modelo de Apoio às Artes e respectivos instrumentos de financiamento;

- Aumento imediato do orçamento dos Apoios às Artes para 25 milhões de euros (valores de 2009 + ponderação da inflação);

- Combate à precariedade na actividade artística e estabilidade do sector;

- Compromisso com o patamar mínimo de 1% do OE para a Cultura, já em 2019;

Joana Manuel terminou dizendo: «isto não acaba aqui», isto «é o princípio.

Uma larga participação

Os profissionais das artes marcaram encontro na concentração

Entre as muitas personalidades da cultura que estiveram presentes na concentração, segundo a LUSA, contam-se Carlos Avillez, Jorge Silva Melo, Rodrigo Francisco, Maria João Luís, Filomena Cautela, José Mata, Mariana Monteiro, Maria Rueff, Miguel Guilherme, Isabel Medina, Ricardo Neves-Neves, Martim Pedro, Marina Albuquerque, Fernando Sena, Diogo Infante, Mónica Calle, Mónica Garnel, Joaquim Horta, Carla Chambel, João Botelho, Pedro Penilo, António Pires, Miguel Seabra, Rita Blanco, Jorge Silva, Leonor Teles, Cíntia Gil, Tiago Torres da Silva e João Lourenço.

Carlos Avillez, Jorge Silva Melo, Rodrigo Francisco prestaram declarações aos jornalistas.

 As forças políticas que têm apoiado as lutas dos profissionais da cultura fizeram-se representar. Com os manifestantes estiveram Heloísa Apolónia (PEV), Catarina Martins e Mariana Mortágua  (BE) Jerónimo de Sousa, Jorge Pires e Ana Mesquita (PCP).

Em declarações aos jornalistas, Jerónimo de Sousa considerou uma prioridade o «reforço da dotação orçamental», lamentando a «via restritiva» que o governo aplicou à proposta do PCP de «uma verba de 25 milhões de euros», que repunha o valor apresentado em 2009, proposta que foi recusada pelo PS com a abstenção do PSD e do CDS.

«Um novo modelo de apoio às artes», continuou, «poderia responder a muitos dos problemas a que hoje se assiste» e preocupam «os homens e mulheres da cultura». Referiu ainda ser necessário, «contando com a opinião e a participação dos homens e das mulheres da cultura e das artes, recriar e reinventar um novo modelo de apoio às artes».

Por fim saudou a «mobilização inédita» dos profissionais das Artes e da Cultura.

A contestação do actual modelo de financiamento não é de hoje e vai prosseguir

De há muito que os trabalhadores das Artes e da Cultura lutavam contra a crónica desorçamentação do sector, que atingiu um dos seus pontos mais críticos em 2012, quando o governo PSD/CDS reduziu em 30 milhões de euros o orçamento da cultura, prestando-se o secretário de Estado à altura, Francisco José Viegas, a defender arrogantemente essa decisão junto das estruturas artísticas e dos profissionais da cultura: «Que parte é que não percebeu? Não há dinheiro».

O Programa de Apoio Sustentado às Artes 2018-2021 envolve seis áreas artísticas: circo contemporâneo e artes de rua, dança, artes visuais, cruzamentos disciplinares, música e teatro.

As estruturas artísticas e os profissionais do sector contestaram as verbas e o modelo de atribuição de apoios ainda o mesmo estava em discussão pública. À estranheza manifestada pelo governo PS por só agora serem levantados problemas relativamente ao modelo e critérios do concurso, Pedro Rodrigues, da Escola da Noite (Coimbra) respondeu, em artigo recente no AbrilAbril, que «foram ignorados (e em alguns casos ostensivamente contrariados) os principais contributos da sociedade civil». Referia-se à crítica ao baixo volume do financiamento mas também à insistência em «continuar a colocar no mesmo concurso estruturas de criação e de programação» e à constituição de júris recrutados sem «acautelar a qualificação e o reconhecimento público dos seus membros» – a partir de uma «bolsa de voluntários».

A gota de água

A gota de água foi a apresentação dos resultados provisórios do concurso, que provocaram a indignação geral do sector e tiveram o raro condão de concitar as críticas, também generalizadas, do meio artístico, das autarquias e da generalidade das bancadas parlamentares.

Das 241 candidaturas admitidas apenas 140 teriam financiamento – ainda assim, por vezes, em valor inferior ao anteriormente recebido.

Fora dos subsídios ficariam 100 companhias, na maioria com provas dadas, seja na produção de espectáculos seja na organização de Festivais, entre as quais – e apenas a título de exemplo – o Teatro Experimental de Cascais, o Teatro Experimental do Porto, as únicas estruturas profissionais de Évora (Centro Dramático de Évora) e de Coimbra (Escola da Noite e O Teatrão), o TAS de Setúbal, além de projectos como a Orquestra de Câmara Portuguesa, a Bienal de Cerveira e o Chapitô.

Tratar-se-ia da redução brutal da oferta cultural em diversas zonas do país, deixando desamparados inúmeros profissionais do sector e as comunidades que servem.

Não menos grave foram os termos em que muitas destas decisões foram fundamentadas, considerados ofensivos para várias das companhias afectadas – ainda por cima por parte de júris pouco competentes para se pronunciarem sobre a matéria artística.

Nem a intervenção pessoal de António Costa, aumentando na mesma semana as verbas a distribuir, comprometendo-se a não deixar de fora nenhuma companhia com um histórico relevante e a dialogar com os profissionais do sector para modificar o modelo de atribuição de apoios, desmobilizou os trabalhadores das artes.

Os concursos do Programa de Apoio Sustentado da DGArtes, para os anos de 2018-2021, partiram com um montante global de 64,5 milhões de euros, em outubro, subiram aos 72,5 milhões, no início desta semana, perante a contestação no setor e, na quinta-feira, o Governo anunciou o reforço para um total de 81,5 milhões de euros.


Foto: Milhares de trabalhadores das Artes e da Cultura manifestaram-se no país por uma nova política para a cultura. Em Lisboa foram mais de um milhar que se concentraram no Rossio, em frente ao Teatro Nacional D. Maria II (6 de Abril de 2018). CréditosJoão Barreiros / CENA-STE

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