O Curto de hoje, por Cristina
Figueiredo, do Expresso da Impresa do tio Balsemão, abre com as desgraças do
mundo que a humanidade escolheu de alma e coração e teima em escavacar o
planeta, o clima e quase tudo em que toca. Chama-se a isso as “alterações climáticas”,
a Grande Mãe de Imensas Desgraças da Humanidade. Acontece um pouco (ou
demasiado) por todo o mundo. Em Portugal também. Vê-se nos fogos monstruosos
que ocorrem em Portugal. O ano passado com a marca negra e triste de Pedrógão e
imediações. Este ano com o de Monchique, até agora sem vítimas mortais.
Vimos este ano, também no ano passado e noutros anos,
que em Portugal chovem imensos entendidos nesta coisa de dominar e extinguir os fogos, os incêndios
gigantescos. Pena que na maior parte dos casos só saibam debitar palavras e que
nem numa mangueira para regar o pequeno jardim lá de casa saibam pegar, dar-lhe
a pressão devida ou apontá-la para onde devem. Aliás, muito provavelmente nem têm
um único metro de mangueira. Bem, mas vai daí, passeiam-se pela televisões, rádios
e jornais a debitar palavras e opiniões de sabedoria de cordel. Neste caso
contra os governantes, a Proteção Civil e os que mais se lembrarem. Na TVI
ouviu-se uma verdadeira enxurrada de palavras em velocidade supersónica de uma
jornalista-bombeira de sabedoria ímpar. Disse mal de tudo e de todos. E pronto.
Grande jornalista, grande esclarecedora e formadora dos telespectadores. Como
ela há-de haver por aí muitos mais. Pena que nem saibam pegar numa mangueira e
que falem sem ter conhecimento do que não se vê nos fogos mas que está lá: a
impotência perante os fenómenos naturais, a impotência e o fracasso dos
pequeninos que somos, nós, os humanos. Adiante.
De teoria em teoria pegam-se nas
palavras ditas por este e aquele e dá-se-lhe outro sentido. E blá-blá-blá. É
muito triste o espetáculo dado a presenciar e escutar ou ler. Gente que se mostra pequena a esticar-se, a pôr-se
em bicos dos pés. Continuem, que vão longe com tanta carga de mediocridade.
Pior é que isso pega-se, contagiam a sociedade cada vez mais decadente e
adversária dos valores que podem muito bem preservar e melhorar a vida humana
neste planeta. Não assim. Não por acaso, planetáriamente, a desumanidade é
crescente. Nacionalmente também.
Bom dia. A seguir o Curto do
Expresso e um recado para o tio Balsemão: Por favor, pague melhor aos seus
trabalhadores. No caso à vista já a seguir, aumente-os o suficiente para
comprarem vedante para as frinchas das janelas, para que assim se concentrem sem esforço, devidamente, quando estão a escrever em casa. Afinal estão a trabalhar para si,
para nós também, caro tio Balsemão. Muito obrigado.
Estão a ler e não perceberam... Já a seguir entenderão.
O Curto. Que não é só desgraças porque também contém referências boas. A melhor será o slogan do Expresso: "Liberdade para pensar". Primordial. Isso é como pão para a boca. Pois. (MM | PG)
Bom dia este é o seu Expresso
Curto
"Pintou um clima". Mas
esta "novela" não promete um final feliz
Cristina Figueiredo | Expresso
Às duas da manhã, o vento soprava
tanto entre as frinchas das portadas das minhas janelas que me dificultava a
concentração para continuar a escrever. Não fosse a casa ainda estar tão quente
das temperaturas infernais de há uma semana e julgar-se-ia que era inverno.
Pouco antes, a SIC passara imagens tão espectaculares quanto assustadoras de
um tornado de fogo em Inglaterra - um fenómeno que já
não é assim tão raro. Há notícia de
cheias em França e na India (causaram
20 mortos e milhares de desalojados). Na Califórnia
continua a lavrar um incêndio de proporções bíblicas (considerado já o mais
grave na história daquele Estado norte-americado) e na Nova Gales do Sul,
"celeiro" da Austrália, há registo de uma seca nunca vista: sem água,
o país está
à beira de ficar também sem pão. Por cá, uma semana depois,
o fogo em Monchique (que consumiu mais de 26 mil hectares e já foi classificado
como o maior fogo europeu do ano) está finalmente dominado.
A responsabilidade última de tudo isto é do clima, ou melhor, das "condições
meteorológicas excepcionais", como diria o ministro da Administração
Interna, Eduardo Cabrita, que ontem deu uma
entrevista à TVI. Tem razão. Sim, eu sei, somos tentados a
interpretar a afirmação do ministro como alijar de responsabilidades num
processo onde, apesar de tudo (e este apesar não é pouco: apesar da imensa área
ardida e da perda de muitas habitações, não houve vítimas mortais), continuou a
haver falhas na prevenção, falhas no combate e... falhas na comunicação. E
a propósito destas últimas, o gabinete do primeiro-ministro veio assegurar, em
comunicado enviado às redações ontem ao final da tarde
que, quando disse que "Monchique foi a excepção que confirmou o
sucesso da operação de combate aos incêndios", António Costa não estava a
desdramatizar o que se estava a passar na serra algarvia. As suas palavras terão
sido, lê-se, "descontextualizadas e deturpadas". Eu diria que
foram, apenas, má-escolhidas.
Mas volto propositadamente ao clima (e à "sua" culpa). Domingos
Xavier Viegas, que coordenou a equipa de investigadores que elaborou o
relatório sobre os incêndios de Pedrogão Grande, escreveu ontem
um artigo no Expresso Diário sobre as lições (algumas
melhor aprendidas que outras) que 2017 nos deu. E concorda com Cabrita: "No
processo de gestão dos incêndios florestais existem várias condicionantes que
não dependem de nós, ou que, pelo menos, não se podem alterar por uma ação
direta por parte das pessoas, como por exemplo as condições do clima e da
meteorologia. O aquecimento global da atmosfera produz uma maior variabilidade
nas condições meteorológicas. Em consequência disso temos maior probabilidade
de registar temperaturas muito altas, como já estamos a verificar". Por
sua vez, Filipe Duarte Santos, especialista em alterações climáticas, dá hoje
uma entrevista ao "i" (link não disponível) onde alerta : "Se
não se respeitar o acordo de Paris passaremos a ser parecidos com o norte de
África".
Isto leva-me ao artigo da revista científica "Proceedings of the National
Academy of Sciences of the USA", de que o Expresso já deu
notícia e que a minha homónima Cristina Peres aqui
citou na quarta-feira. Nele se dá conta de um estudo segundo o qual, se
não se trava rapidamente o aquecimento global, o planeta vai tornar-se numa
estufa, com consequências devastadoras (de que o fim da Humanidade não é de
excluir). Todos (a começar pelos responsáveis políticos) o devíamos ler, e com
aquela atenção que o ritmo acelerado do scroll nem sempre proporciona.
Acrescento
este do The Guardian, já com algumas semanas, onde
James Hansen, antigo cientista da NASA que há 30 anos alerta para o aquecimento
global, critica o facto de o poder político estar a falhar "miseravelmente" no
combate ao problema.
E pergunto ao primeiro-ministro e ao ministro da Administração Interna, e ao do
Ambiente e ao da Economia e ao secretário de Estado da Energia: estamos mesmos
a fazer tudo o que podemos? Por exemplo: numa altura em que a necessidade de
arrepiar caminho já é inquestionável e em que se sabe que é preciso alterar
comportamentos, faz sentido que Portugal continue a apostar nos
combustíveis fósseis e autorize a prospeção para uma eventual exploração de
petróleo?
OUTRAS NOTÍCIAS, CÁ DENTRO...
Nem de propósito, o Movimento Algarve Livre de Petróleo (MALP) organiza
uma caminhada contra a exploração de petróleo no Algarve e contra o furo de
petróleo de Aljezur. A partida é às 09h00, na praia de Vale de Lobo, e a
chegada está prevista para as 11h00, na Praia do Gigi (Quinta do Lago), com a
leitura de uma carta aberta ao Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa
não estará lá (só deve chegar ao seu habitual toldo de férias durante o
fim-de-semana), mas já prometeu uma audiência ao movimento para amanhã, às
17h00, na sede da junta de freguesia de Almancil.
António Costa admite pensões mais favoráveis para as carreiras mais longas. As
palavras não estarão certamente deturpadas nem descontextualizadas: é
a manchete (neste momento que escrevo) do site do
Expresso, a antecipar a entrevista do primeiro-ministro que será publicada este
sábado no semanário. Prometem-se declarações do chefe do Governo sobre as
próximas legislativas, os incêndios, a situação na Saúde, o caso Robles e a
Procuradora-Geral da República.
Diz o Público que o "Estado entregou a
americanos a coleção de arte do Novo Banco". Escreve a Cristina Ferreira
que "depois de aplicar 3,9 mil milhões de euros no Novo Banco e de abrir a
porta a injectar outro tanto, o Estado deixou para o fundo de investimento
norte-americano Lone Star 50 milhões de euros em moedas raras, fotografias
contemporâneas, pintura, mapas portulanos e livros quinhentistas". Somos
um povo generoso.
Se é dos que já lhe estava a sentir a falta (não é o meu caso, confesso), pode
respirar fundo: o campeonato nacional de futebol está de volta. Às 20h30
recomeça a 1ª Liga, com um jogo entre o Benfica e o Vitória de Guimarães ou
entre um eterno candidato ao título e uma equipa promissora, na
antevisão de Tiago Teixeira que pode ler (se for
assinante) na edição de ontem do Expresso Diário. O analista conta-lhe tudo
sobre "os candidatos crónicos, as equipas a seguir com atenção e os
jogadores que vão surpreender na Liga 2018/19". E como uma boa notícia
nunca vem só, esteja atento ao sorteio para a primeira eliminatória da Taça de
Portugal: é às 15h00.
O futebol a começar, o ciclismo a acabar: é já no domingo que termina a Volta
a Portugal em Bicicleta. Hoje corre-se a 8ª etapa, 147,6 km entre Barcelos e
Braga.
...E LÁ FORA
No Iémen, um ataque liderado pela coligação militar saudita a um autocarro
escolar provocou a morte de 29 crianças e ferimentos em mais 30. O
secretário-geral da ONU, António Guterres, já anunciou querer
uma investigação ao sucedido.
Nos EUA vai saber-se se o juiz federal de Seattle Robert Lasnik, que a 31 de
julho suspendeu a autorização da Administração Trump para a divulgação de
manuais de instruções que permitem a qualquer um imprimir armas em 3D, mantém a
opinião. O juiz volta a analisar o tema na sequência de uma providência
cautelar apresentada por procuradores-gerais de vários Estados norte-americanos
e da capital.
No Brasil, realizou-se esta noite o primeiro debate televisivo para as
presidenciais de outubro. Oito dos 13 candidatos ao Planalto discutiram ideias.
Pode rever o debate
aqui.
Teve início às 4h da manhã, e prolonga-se por 24 horas, a greve dos
pilotos da Ryanair na Irlanda, na Suécia, na Bélgica e também na Alemanha.
Os portugueses que andam em viagem pela Europa por estes dias (não hão-de ser
poucos!) levam naturalmente por tabela com as consequências (atrasos, adiamentos
e cancelamentos de voos) de mais um protesto dos funcionários desta companhia
de aviação low cost, que reivindicam melhoria de salários e condições de
trabalho.
Termina hoje o prazo para a oposição zimbabueana apresentar recurso ao
Tribunal Constitucional do país a contestar os resultados das eleições
presidenciais de 30 de julho.
AS MANCHETES DOS JORNAIS E REVISTAS
"Mulheres do Norte puxam pela subida do emprego" (Jornal de
Notícias)
"Estado entregou a americanos coleção de arte do Novo Banco" (Público)
"Guerra ao plástico" (i)
"Novas pistolas: Exército bate com a porta à NATO e pede novo
concurso" (Diário de Notícias)
"CP paga táxis para levar passageiros" (Correio da Manhã)
"Portagens descem sem acordo com concessionárias" (Jornal de
Negócios)
"Lista negra de devedores ao fisco representa 2% do PIB" (Jornal
Económico)
"Sobe o pano" (A Bola)
"Sturaro é leão" (Record)
"Maresa tem de dar provas" (O Jogo)
O QUE ANDO A LER
Chegou-me às mãos na terça-feira. Ainda só li meia dúzia de páginas mas já deu
para perceber que não descansarei antes de chegar ao fim, apesar de que "a
história" é tudo menos fácil, ligeira ou "de verão". Chama-se "Le
lambeau" (ainda não tem edição em português), palavra francesa com
pelo menos três significados (como a editora faz questão de informar na
contracapa, recorrendo ao Trésor de La Langue Française), o mais
"poético" dos quais (para efeitos de título de um livro) será...
"farrapo". O autor é Philippe Lançon, escritor e jornalista do
Libération e do Charlie Hebdo, o semanário humorístico parisiense onde, a 7 de
janeiro de 2015, os irmãos Kouachi entraram com espingardas, gritando "Alá
é grande" e matando 12 pessoas. Lançon estava lá. Foi atingido no rosto
(ficou sem mandíbula), esteve internado nove meses, sofreu 18 intervenções
cirúrgicas. Deixou Paris, mudou-se para Roma e publicou em junho estas 500
páginas, que resultam numa espécie de relato, catarse ou mesmo exorcismo de
alguém que, com legitimidade ímpar, foi verdadeiramente Charlie. Eu soube da
obra (que já é um fenómeno editorial em França) ao ler, há algumas semanas,
este
artigo na revista semanal do El Pais. Como se retoma a vida de todos
os dias depois de um acontecimento brutal assim? Não se retoma. Na entrevista
ao diário madrileno (uma das poucas que deu desde o atentado), o jornalista
francês explica(-se): "Regresso pouco a pouco, com distanciamento, a
uma vida que já não é a mesma porque eu já não sou o mesmo".
A chegada do "Le lambeau" à minha mesa de cabeceira deixou em breve stand
by as últimas páginas das memórias de Carmen Dolores, "Vozes
dentro de mim". A atriz foi condecorada por Marcelo Rebelo de Sousa a 12
de julho com as insígnias de Grande-Oficial da Ordem do Mérito, por ocasião do
seu 94º aniversário, no mesmo dia em que estreava no Teatro da Trindade, em
Lisboa, a peça "Carmen", baseada precisamente neste livro (publicado
em maio de 2017). Voltar a ver Carmen Dolores (afastou-se dos palcos em 2005)
recordou-me o belo texto de Tiago Rodrigues, "Três dedos abaixo do
joelho", uma peça engenhosamente construída a partir de excertos de relatórios
da Censura (entre 1933 e 1974) e dos pedidos em vão de diretores de companhias
(e Carmen, à época diretora do Teatro Moderno de Lisboa, foi dos mais
insistentes) para levarem a cena determinados autores mal-quistos do regime.
Daí à vontade de mergulhar nestas memórias demorou apenas o tempo de adquirir o
livro, que se lê num instante. São recordações avulsas de uma outra época (de
um outro mundo), escritas "ao correr da pena", por alguém que se
confessa apaixonada pela "sonoridade das palavras", paixão com
que qualquer jornalista se identifica.
E o Curto, que para não variar já vai longo, fica por aqui. Neste 10 de agosto,
há 73 anos, depois dos ataques nucleares dos EUA às cidades de Hiroshima (a 6
de agosto) e Nagasáqui (a 9), o Japão rendia-se incondicionalmente, pondo fim à
II Guerra Mundial. Hoje também, se fosse vivo, Jorge Amado faria 106
anos. No seu livro "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá, uma história
de amor", há uma frase que lhe sugiro para o acompanhar na navegação pelos
sítios que o mantêm bem informado: leve em linha de conta que todos "temos
olhos de ver e olhos de não ver. Depende do estado do coração de cada um".
Amanhã há Expresso nas bancas. Tenha um bom fim-de-semana.