Atentados que mataram e feriram
centenas chamam a atenção para tensões sociais e religiosas no país insular do
Oceano Índico de maioria budista, onde há dez anos a violência comunal parecia
relativamente sob controle.
O governo do Sri Lanka declarou
nesta segunda-feira (22/04) que o grupo fundamentalista islâmico local National
Thowfeek Jamaath (NTJ) estaria por trás dos atentados fatais a bomba do Domingo
de Páscoa, resultando em quase 300 mortos e outras centenas de feridos.
Segundo o porta-voz Rajitha
Senaratne, que também integra o gabinete, o governo estaria examinando as
ramificações do NTJ. "Não vemos como uma pequena organização como esta,
neste país, pôde fazer tudo isso. Estamos agora investigando o apoio
internacional a eles, suas outras conexões, como conseguiram os homens-bomba e
bombas como essas."
Noticiou-se que em 11 de abril o
chefe da polícia nacional divulgara uma advertência segundo a qual uma
"agência internacional de inteligência" teria advertido que o grupo
planejava atentados contra igrejas e contra a Alta Comissão Indiana. No
domingo, as autoridades anunciaram a prisão de 13 cidadãos cingaleses suspeitos
de ligação com os ataques.
"Não sabemos muito sobre o
NTJ, mas ele parece semelhante a outros grupos terroristas ativos no Sul
Asiático, como o Ansarullah Bangla Team (ABT) em Bangladesh. Ambos
são aparentemente inspirados na Al Qaeda", explicou à DW Siegfried O.
Wolf, especialista na região pelo Fórum Democrático do Sul Asiático, sediado em
Bruxelas.
"Sua meta principal é
espalhar uma ideologia jihadista e criar medo e ódio. Ele é também contra
qualquer tipo de reconciliação nacional, e portanto trabalha para manter vivos
os conflitos étnicos e religiosos."
Nos últimos anos, têm sido tensas
as relações entre a comunidade budista majoritária do Sri Lanka e a minoria
muçulmana. Em março de 2018 o governo declarou estado de emergência em nível
nacional, a fim de coibir a violência comunitária entre muçulmanos e budistas.
Segundo analistas, porém, apesar de devastado por décadas da insurgência
separatista tâmil esmagada pelos militares em 2009, o estado insular tem pouco
histórico de violência islamista.
A maioria da população cingalesa
é budista, com apenas 10% de fé islâmica e 6% de cristãos. "Os grupos
fundamentalistas islâmicos locais não são muito fortes. Mas também é verdade
que a maioria dos suspeitos pelas detonações do domingo pertence à comunidade
muçulmana", observa o ativista cingalês dos direitos humanos S.T. Nalini.
O analista Wolf observa que,
assim como muitos grupos islamistas locais ativos no Sul da Ásia, também o NTJ
quer alastrar o movimento jihadista por aquela ilha do Oceano Índico.
"Grupos terroristas
internacionais estão cada vez mais se apoderando de conflitos locais para
estender o jihad global a diferentes partes do mundo. O conflito dos uigures na
província ocidental chinesa de Xinjiang e o dos rohingyas em Myanmar são dois
exemplos. Em ambos os casos, as organizações globais procuram instrumentalizar
problemáticas locais para ampliar sua influência."
As organizações tentam igualmente
ganhar atenção internacional e adquirir novos recursos. "O Sri Lanka se
tornou uma das mais populares destinações turísticas, nos últimos dez anos,
através dos tremendos esforços do governo. Atentados como esses prometem
atenção internacional", diz Wolf, segundo quem as igrejas da ilha são
alvos fáceis para os terroristas.
Além disso, os grupos militantes
cingaleses têm um longo histórico de se associar a organizações internacionais
de terrorismo. "A necessidade de gerar fundos levou até mesmo grupos
separatistas como os Tigres de Tâmil a procurarem ajuda externa."
Os atentados também suscitam
temores de uma ressurgência da violência comunal que tem repetidamente afligido
o país no Oceano Índico. No fim do domingo, a polícia informou que uma mesquita
do noroeste sofrera um atentado a bomba de gasolina, e duas lojas de
proprietários muçulmanos, no oeste, foram incendiadas.
As explosões representam, ainda,
um forte golpe para as autoridades cingalesas, que nos últimos dez anos vinham,
em parte, conseguindo manter sob controle a violência no país. As décadas de
insurgência no norte do país mataram milhares, até que o ex-presidente Mahinda
Rajapaksa derrotou o movimento separatista Liberation Tigers of Tamil Eelam
(LTTE) numa operação militar, em 2009.
No entanto, a ausência de
violência não significa que o Sri Lanka superara suas graves cisões sociais e
políticas, alerta Siegfried Wolf. "O conflito étnico-religioso entre a
maioria cingalesa budista e a minoria tâmil hindu terminou em 2009, mas o
conflito ainda existe no país, pois não houve qualquer solução política para esse
problema multifacetado."
Além disso as tensões econômicas
e financeiras estariam crescendo devido à implementação da infraestrutura para
a Iniciativa do Cinturão e Rota da China. "Apesar do incremento do
turismo, o desenvolvimento desigual e as intervenções estrangeiras também estão
funcionando como um catalizador para conflitos políticos no Sri Lanka",
explica o analista do Fórum do Sul Asiático.
Shamil Shams (av) | Deutsche
Welle
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