terça-feira, 25 de junho de 2019

TUDO MENOS POLÍTICA, GUINÉ-BISSAU NO CADAFALSO


Tamilton Gomes Teixeira* | O Democrata | opinião

Quem olha hoje para Guiné-Bissau pode/deve estar seguro de que está perante a mais completa fórmula do “imprevisível”. Nem os P5 e nem outra instituição sabem que futuro espera a Guiné-Bissau. Quando o filosofo e sociólogo Noam Chomsky (1994) afirma que quem ama a política ama a incerteza, de facto tinha razão, mas quando olhamos para Guiné-Bissau, a questão não é apenas sobre as incertezas da política ou a sazonalidade das agendas políticas (normal no jogo político). No caso da Guiné-Bissau, é uma questão maior, o próprio país é incerto. Difícil de diagnosticar. Guiné-Bissau transformou-se num país onde não se sabe quem pode ser o primeiro-ministro amanhã (tudo pode acontecer). Um país à deriva há muito e bom tempo.

De crise em crise, o país (os guineenses) acabou por se acostumar com a incerteza. Esta incerteza afasta o país de tudo que é progresso. Guiné-Bissau QUO VADIS?

Quando num passado recente, insisti em defender que se evitasse em resumir os problemas da Guiné a questão normativa (jurídica), a atual realidade socio-política revela a meu favor que o problema continua a ser “as manhas” dos guineenses e seu ethos. Comportamentos erráticos dos atores políticos que os jovens vêm assimilando vertiginosamente.

Esperava-se [para os otimistas da Spínola] que, após as últimas eleições legislativas, poderia dar-se pausa no processo de sangramento do Estado, na banalização da administração pública e no adiamento fatal do país. A Guiné-Bissau apenas perde e perde muito cada vez que opta por mergulhar na barafunda ao invés de trilhar por caminhos da sociedade global: criação da riqueza para o bem e progresso de todos, na criação de rede do ensino que seja capaz de impulsionar uma nova sociedade, mais justa e igualitária, na assimilação das novas  tecnologias de modo a não perder o rumo da mundialização, na efetivação das agendas emergentes como “mulher” e sustentabilidade, etc.

O país está fora de tudo que é debate. O debate na Guiné-Bissau, como já escrevi no passado, continua a ser sobre egos e personalidades. Não existe uma agenda nacional. Um país com enorme potencialidade para provocar um desenvolvimento rápido, mas não tem sido capaz devido a crises sem fundamentos aceitáveis. Continuou-se a contribuir para industrialização e geração do emprego dos outros, nomeadamente Índia, quando envia toneladas de castanhas de caju para serem partidos, como aponta professor o Carlos Lopes.

Ainda nesta semana, ficou-se a saber que a Guiné-Bissau vai beneficiar de mais de 90 poços (fontes) financiadas pelo PNUD para suprimir as dificuldades das pessoas com dificuldade de acesso a água potável. A questão que se deve colocar é a seguinte: que país no mundo pode desenvolver-se recebendo ajuda para ter fontes, para que as pessoas possam ter acesso a água potável? Já escrevi no passado – um país que recebe financiamento para beber água, não pode pensar em desenvolvimento. Vale dizer que, como se ensina nas cadeiras de Relações Internacionais, um país nunca é pequeno, a Guiné-Bissau poderia, organizar-se, reestruturar a sua agenda política a partir duma agenda nacional com prioridades e provocar uma mudança profunda que seja capaz de aplacar o tempo perdido. Uma das coisas que poderia ser recuperada é sua DIPLOMACIA, a Guiné foi um país de um grande diplomata, Amílcar Cabral, e é dum grande diplomata – Carlos Lopes.

Como é que se explica um país que produziu no passado uma figura como a do Amílcar Cabral, expoente máximo da sua geração e, no atual contexto, ter produzido figura como a de Carlos Lopes - mente pensante das grandes agendas africanas, nomeadamente o histórico tratado do comércio africano celebrado recentemente - estar na situação em que se encontra? Tudo que a Guiné-Bissau conseguiu até 1973 foi graças à sua estratégica e competente diplomacia liderada por Amílcar Cabral. É preciso recuperar o país através duma diplomacia forte, daí a necessidade de eleger um presidente com perfil e network diplomático pujante.

Lamentavelmente, o país está no cadafalso, como havia dito numa entrevista em 2017, as posições estão bem demarcadas mais para “djunda djunda” do que propriamente para um debate sobre como fazer o plano de desenvolvimento nacional, que política de género deve ser adotada, qual é a política do país sobre o ambiente, etc. Muito pelo contrário, o debate continua a ser sobre quem é mais macho, quem manda fazer e faz acontecer, etc. Somou-se agora ao debate instrumentalização da fé.

 Enquanto reina essa distração na Guiné-Bissau, o resto dos países africanos estão a inaugurar autoestradas, caminhos de ferros, abrindo portos, cidades e financiando a educação e saúde com recursos próprios.

A Guiné-Bissau só consegue figurar como destaque, quando assume posições como a que assumiu no último relatório de Transparência Internacional (2018), onde dos 180 países avaliados, ficou melhor apenas em relação a 6 países, todos eles em algum tipo de conflito ou, situação de Guerra (Síria, Somália, Sudão, Eritreia, etc).

Sem políticos não se faz política. Na Guiné-Bissau faz-se tudo menos a política.

“és i nó mundo, mundo de bibos ku mortos, suna faci, faci diritu, ena djubiu, ena obiu, ena odjau…quilis ku bai ka tchiga de bai, esta na nó metadi” - Zé Manel.

Lisboa, junho de 2019

*Tamilton Gomes Teixeira – Sociόlogo -- Mestrando em Sociologia no ISCTE/ Portugal

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