quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Portugal | 45 anos de Salazar, foi demasiado sofrimento


Expresso Curto, diretamente do produtor, sem mais delongas nem considerações. Valdemar Cruz abre a cafeína de hoje com o andrajoso fulano da triste figura e grande mestre do crime Salazar. Nojo e repúdio por tal tenebroso figurão tolhe-nos o verbo. Sigam para o dito Expresso. Tenham um bom dia, apesar deste carregar de nuvens negras sobre o referido bandido, causador da desgraça de tantos portugueses e de Portugal. Por 45 anos, foi demasiado sofrimento. (CT)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

S. O Fantasma está de volta

Valdemar Cruz | Expresso

Bom dia

Está a tornar-se cada vez mais premente – e presente – o debate à volta da construção do abreviadamente chamado “Museu Salazar”. A Câmara Municipal de Santa Comba Dão, dirigida por um autarca do PS a quem a democracia deu poder local, pretende concluir até depois do verão o que apelida de Centro Interpretativo do Estado Novo.

Uma petição on line intitulada “Museu Salazar, Não!”subscrita por 204 ex-presos políticos, já com mais de 12 mil assinaturas recolhidas e enviada ao primeiro ministro António Costa, escreve Hugo Franco no Expresso Diário, condena a ideia de um museu por entenderem que “se prefigura como um instrumento ao serviço do branqueamento do regime fascista(1926-1974) e um centro de romagem para saudosistas do regime derrubado com o 25 de Abril”.

Como seria de esperar, já circula uma petição de sentido contrário, com os apoiantes do “Museu Salazar” a afirmarem que “apoiando ou não apoiando a obra de Salazar e o que se passou durante o Estado Novo, todos temos o direito de conhecer os factos de forma isenta”.

Parece passar por aqui o cerne do debate. A questão, ou os receios colocados pelos antifascistas têm sido propositadamente desvirtuados em diferentes sectores, e não apenas, ou principalmente, pelos núcleos saudosistas do salazarismo.

Várias têm sido as posições públicas de subscritores da petição a especificar que não está em causa a ideia em si mesma de um putativo museu onde se estude, questione ou equacione o salazarismo e o que possa ser o seu legado.

Na sua página no Facebook, Miguel Cardina, doutorado em Historia, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, defende ser outro o ponto. Isto porque, especifica, “os museus têm contexto e estão inseridos num território. O discurso produzido no local – e a experiência da visita – ficará determinado pelo complexo memorial onde o museu se inscreve: a antiga escola, a casa e os seus objetos domésticos, os espaços onde o ditador se fez moço, a campa rasa para atestar a imagem desse político que se representou como antipolítico e como humilde desinteressado servidor da nação”.

A propósito da ideia de potenciar o turismo, como um dos principais argumentos do autarca local para defender a ideia do museu, o historiador acentua que a circunstância de o complexo, pelas suas características, se transformar “num lugar de romaria para fascistas e saudosistas” constitui uma eventualidade que o presidente da Câmara de Santa Comba Dão não controla, nem pode controlar, pelo que, conclui, “se arrisca a vender a terra pelo preço de uma visão seletiva da ditadura e adocicada do ditador”.

Terça-feira, num artigo dedicado ao tema publicado no Expresso Diário, o colunista Daniel Oliveira, no texto intitulado “Museu Salazar: a democracia recorda a ditadura, não a normaliza”, escrevia não haver “temas e personagens tabu em democracia. O Estado Novo e Salazar fazem parte da nossa História. Devem ser estudados e revisitados”. Porém, prosseguia, “um museu dedicado a alguém que oprimiu um povo, que o obrigou a viver durante meio século na mais vil das misérias, que mandou prender, torturar e assassinar opositores e que impediu a expressão livre e democrática dos cidadãos não pode servir para celebrar, branquear e normalizar a ditadura”.

No que pode ser visto como uma resposta antecipada às acusações de censura avançadas agora pelos defensores do museu, o colunista deixa caro não ser necessário qualquer tipo de censura. Basta, conclui, “entregar os aspetos científicos desse museu a historiadores da época reconhecidos pelos seus pares. Os factos falarão por si”.

OUTRAS NOTÍCIAS

A Amazónia, a floresta responsável por 20% do oxigénioque o mundo respira, está a arder a um ritmo nunca visto. Os danos à biodiversidade são já irreparáveis e as populações indígenas estão em perigo. O Brasil, escreve-se no Expresso Diário, “cheira a cinza e o governo de Bolsonaro minimiza o problema”. O presidente do Brasil avançou com mais uma das suas declarações dignas de ficarem registadas na pedra ao afirmar que não tem provas, mas está seguro de terem sido as ONG a atear os fogos, apenas para o prejudicar.

Donald Trump está disponível para permitir a detenção indefinida de menores e admite retirar o direito à nacionalidade aos filhos de imigrantes nascidos nos Estados Unidos da América. A intenção de Trump é permtir aos agentes fronteiriços deter de forma indefinida os imigrantes sem papéis e anular, assim, o acordo que obriga a que os menores retidos sejam libertados ao fim de vinte dias. A reforma deveria entrar em vigor dentro de dois meses, mas é expectável uma batalha judicial nos tribunais federais para impedir a sua implementação.

A vida parece não estar fácil para Boris Johnson. O primeiro ministro britânico pretende que a União Europeia ceda na questão da fronteira com a Irlanda do Norte, mas na reunião em Berlim com Angela Merkle ficou a saber que terá trinta dias para apresentar um plano alternativo de modo a evitar uma saída da União sem acordo.

Como não teve qualquer resultado a mediaçãogovernamental entre a Antram e o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas-SNMMP, está anunciada uma nova greve no período de 7 a 22 de setembro. Incidirá apenas sobre as horas extraordinárias e o trabalho aos fins-de-semana e feriados. O advogado Pardal Henriques abandona as funções de porta- voz do SNMMP e anunciou em comunicado ser candidato às próximas eleições legislativas nas listas do PDR.

Aí está mais uma polémica para o verão. As crianças que não se reconheçam no seu género vão passar a escolher a casa de banho que usam nas escolas. É o que determina um despacho do Governo que concretiza a lei da autodeterminação de género. À direita do espectro político soaram os alarmes e a Juventude Popular (CDS) ameaça avançar com uma ação judicial. Ao Expresso, a secretaria de Estado da Igualdade assegura que o texto não tem “qualquer orientação ideológica”.

O Governo aceitou reestruturar uma dívida antiga da República de Cuba para com o Estado português. Serão dados mais dez anos para a questão ser resolvida. O valor nem é muito expressivo: €3,3 milhões de dívida ao Estado e €1,1 milhões por pagar a algumas empresas portuguesas que venderam produtos para Cuba sobretudo nos anos de 1980. O que Cuba deve a Portugal representa 0,002% do Produto Interno Bruto nacional.

O festival de Vilar de Mouros arranca hoje com The Cult, Manic Street Preachers e Anna Calvi como cabeças de cartaz. Após uma pausa entre 2006 e 2014, o festival retomou o seu caminho com recurso a grupos com muita história acumulada no seu percurso.

Mafra, o sonho de um rei megalómano”. É este o título escolhido pelo jornal espanhol El País para um excelente trabalho sobre a basílica de Mafra, inaugurada em 1730 para assinalar o 41º aniversário do rei João V. Nos trabalhos participaram 45 mil pessoas oriundas de toda a Europa, porque o rei tinha pressa e não queria esperar seis anos pela conclusão da obra.

PRIMEIRAS PÁGINAS

Programa para fazer regressar emigrantes só teve 71 candidatos – Público

Escolas. A guerra dos WC inclusivos – I

Nova greve dos motoristas invade pré-campanha das legislativas – DN

Canis lotados fazem disparar ataques a cães – JN

Advogada e homicida em sexo na prisão – Correio da Manhã

Governo impõe pela primeira vez serviços mínimos à Ryanair – Negócios

Porque as pessoas inteligentes cometem erros estúpidos – Visão

O milionário implacável – Sábado

FRASES

“A greve na Ryanair não é por procuração, desumana, irresponsável ou por tempo indeterminado. Não há emergência energética ou questões humanas que justifiquem os serviços mínimos impostos”. Daniel Oliveira, colunista, no Expresso Diário

“Os portugueses estão adormecidos com ansiolíticos, porque há uma intolerância à angustia”. João Marques Teixeira, presidente da Sociedade de Psiquiatria e Saúde Mental em entrevista ao Público

“Não descarto (ir ao Mundial em 2022). Eu vivo o futebol agora. Sobretudo depois de passar os 30, para mim o futebol é o presente”. Cristiano Ronaldo em entrevista à TVI

O QUE ANDO A LER

O desperdício, de pessoas e riqueza, e não tanto a escassez, constitui hoje uma das principais ameaças com que se confronta a humanidade. Esta é a tese central de um pequeno mas muito rico ensaio intitulado “El Despilfarro de las Naciones”, (O Desperdício das Naçoes) assinado por Albino Prada Blanco, doutor em Ciências Económicas pela Universidade de Santiago de Compostela.

A partir do célebre “A Riqueza das Nações”, escrito há uns 250 anos por Adam Smith, o autor parte para um conjunto de reflexões muitas vezes ancoradas em contributos de Malthus, Stuart Mill, Darwin, Bertrand Russel e outros autores mais contemporâneos para colocar a nu a verdadeira desordem económica vivida pelas sociedades contemporâneas.

A “borracheira consumista” do Ocidente gera perversidades várias e leva a constatações assustadoras, como a de que, escreve Prada Blanco, “os volumes mundiais de resíduos gerados – e a sua evolução recente – coexistem com o esgotamento dos recursos naturais (madeira, minerais, etc.) e colocam-nos perante o esbanjamento e desperdício catastrófico dos mesmos”.

Passam por aqui também os hábitos de consumo, muitas vezes induzidos, com a criação artificial de necessidades, um tema muito bem explorado neste pequeno livro com apenas 195 páginas. Carregado de exemplos perturbadores, o ensaio insiste muito na desequilibradíssima distribuição da riqueza, como quando constata que com menos dinheiro do que gastam num ano os ricos do hemisfério Norte em maquilhagem, gelados, comida para cães, “poderia proporcionar-se uma alimentação adequada, água limpa e educação básica aos mais pobres do mundo. Cem bilionários ganham o suficiente para acabar quatro vezes com a pobreza atual do mundo”.

Muito perto do final, Prado Blanco toca no sensível ponto de como ajudar toda esta massa de pobres, visíveis também nas grandes urbes do Ocidente rico. Deixa claro que a caridade não é opção, muito menos a solução. Então, como “alternativa à degradante opção da caridade deve atuar a sociedade do bem estar, pelo menos se consideramos que a compaixão como mecanismo motivador é humilhante”. Tudo porque, conclui, “uma coisa é uma distribuição piedosa de bens aos necessitados, e outra – muito distinta – uma distribuição que reconhece o direito dos beneficiários a recebê-los”.

Concluo com a referencia a outras leituras que me têm preenchido os dias nesta espécie de verão que nos acompanha. Desde logo o segundo volume do muito aliciante “O Mundo Secreto – Da Primeira Guerra Mundial à atualidade”, de Christopher Andrew. Depois, um regresso a Hang Kang, a sul-coreana que já nos dera o muito premiado “A Vegetariana” e surge agora com “O Livro Branco”, um livro com tanto de autobiográfico como de experimental.

Por fim, mas não menos importante, por ter sido uma leitura continuada, repetida, quase diária, o fascinante “Eu sou a Minha poesia”, uma antologia pessoal de Maria Teresa Horta.

É tudo por hoje. Se acaba aqui o Expresso Curto, fica aberta a porta para que entre no mundo noticioso proporcionado pelo Expresso ao longo de todo o dia. Divirta-se, se puder, e proteja-se do calor. Se acontecer.

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