O furto de material de guerra em
Tancos, em 2017, teve impactos que ultrapassaram a área militar, marcando uma
legislatura que termina com um ex-ministro arguido e, na Defesa, com o problema
da falta de efetivos por resolver.
A falta de efetivos militares
nas fileiras e a saúde militar continuam, ao fim de quatro anos, a preocupar as
Forças Armadas, numa área que foi atravessada por algumas tragédias e
várias polémicas, com o furto de Tancos a ditar a saída do primeiro titular da
pasta na legislatura, José Azeredo Lopes.
O mandato de Azeredo Lopes
no cargo de ministro da Defesa cessou a 12 de outubro de 2018, quando
se demitiu sob pressão dos desenvolvimentos da investigação judicial à operação
da Polícia Judiciária Militar que levou à descoberta do material furtado, três
meses e meio depois do furto.
A 4 de julho, o
ex-ministro foi constituído arguido no processo e confessou que considera a
decisão do Ministério Público "absolutamente inexplicável" tendo
em conta o seu envolvimento "que foi apenas de tutela política".
As Forças Armadas tiveram,
nos últimos quatro anos, de enfrentar restrições financeiras ao seu
funcionamento, mas é a escassez de pessoal para as fileiras que mais preocupa as
chefias, que falam em "sobrecarga de esforço", segundo foi assumido
num seminário promovido pelo Ministério da Defesa.
Apesar de terem sido tomadas
algumas medidas para reforçar o recrutamento militar e para a
profissionalização, o máximo que o Governo pode dizer é que estancou a
"sangria de efetivos", na expressão do ministro que sucedeu a Azeredo Lopes,
João Gomes Cravinho.
Com 26.154 militares em 2016, as
Forças Armadas terminaram 2018 com 26.500, ainda longe do objetivo, 31
mil, e os ramos têm "grandes deficiências de praças", segundo o chefe
do Estado-Maior-General das Forças Armadas, almirante Silva Ribeiro.
Quanto a resultados, a estimativa
o ministro da Defesa estimou que nos próximos dois ou três anos "haverá
uma melhoria nos números", em resultado de várias medidas tomadas, como o
"plano para a profissionalização", o aumento do salário à entrada nas
Forças Armadas de 580 para 630 euros e ainda o "plano para a
igualdade" visando atrair mais mulheres para as fileiras.
Com um perfil mais conciliador e
diplomático no debate parlamentar, João Gomes Cravinho viu passar na
Assembleia da República, com o voto favorável do PS, PSD, CDS-PP e
com a inédita abstenção do PCP, a Lei de Programação Militar, que define
os investimentos em equipamentos até 2030.
O montante mais elevado, 827 milhões
de euros, serão aplicados no programa de aquisição à empresa brasileira Embraer de
cinco aviões de transporte tático e estratégico e de um simulador,
para substituir os C-130 da Força Aérea, e o primeiro avião estará ao serviço
da FAP em 2023.
O reforço da capacidade de ciberdefesa,
a compra de um novo sistema de proteção do soldado e verbas que
garantem a modernização das três fragatas da classe Vasco da Gama para a
Marinha, estão entre as principais medidas.
No plano parlamentar, a
legislatura fica ainda marcada na área da Defesa pela decisão do
Governo de retirar a proposta de lei que consagrava o estatuto do antigo
combatente, face a propostas de alteração que, a serem aprovadas, aumentariam a
despesa e, de acordo com o Executivo, poderiam causar problemas de sustentabilidade financeira
no futuro.
Na saúde militar, deverá ser
assinado "em breve" um despacho do ministro da Defesa com medidas
para o fortalecimento do setor, incidindo no modelo de organização,
capacidades do Hospital das Forças Armadas e sustentabilidade, na
sequência de um estudo pedido à ex-ministra da Saúde Ana Gomes.
O ano de 2019 marcou também
uma mudança significativa para a Força Aérea, que passou a gerir os meios
aéreos de combate a incêndios, no âmbito do sistema de proteção civil.
Para além do caso de Tancos, que
ditou a saída não só de Azeredo Lopes, mas também do ex-Chefe do
Estado-Maior do Exército Rovisco Duarte, (substituído pelo general
Nunes da Fonseca) outros casos polémicos e duas tragédias, ainda sob a tutela
do anterior ministro, geraram controvérsia e deixaram marcas na instituição
militar.
Em julho de 2016, três
militares morreram num acidente durante um treino da Força Aérea na base
aérea n.º 6, no Montijo, na sequência de um incêndio que deflagrou num C-130 e que
deixou ferimentos noutros dois militares.
Em 4 de setembro do
mesmo ano, Dylan da Silva e Hugo Abreu, ambos com 20 anos, morreram e outros instruendos sofreram
lesões graves e tiveram de ser internados durante a denominada 'Prova
Zero' (primeira prova do curso de Comandos) do 127.º curso de Comandos, que
decorreu na região de Alcochete, distrito de Setúbal.
Na Justiça ainda decorre o
julgamento de oito oficiais, oito sargentos e três praças, todos militares do
Exército do Regimento de Comandos, a maioria instrutores, acusados de abuso de
autoridade por ofensa à integridade física.
A primeira grande polémica na
Defesa surgiu alguns meses antes, em abril desse ano, quando foram
levantadas suspeitas de práticas discriminatórias em função da orientação
sexual no Colégio Militar, que teve como primeira "baixa" o chefe do
ramo, Carlos Jerónimo, substituído por Rovisco Duarte.
O ex-ministro Azeredo Lopes
assumiu então que não compactuaria com estas práticas e foi aberto um processo
interno de averiguações que culminou na substituição do subdiretor da
instituição e numa alteração dos regulamentos do Colégio Militar.
Em termos de missões externas,
destaca-se o empenhamento português na missão militar da ONU na
República Centro-Africana e na missão de formação e treino da União Europeia no
mesmo país, que Portugal liderou durante ano e meio.
No Mali, em 2017, um
sargento-ajudante do Exército, Paiva Benido, foi morto vítima de um ataque
terrorista ocorrido nos arredores de Bamako e, em 2019, o soldado comando Aliu Camará integrado
na missão da ONU na República Centro Africana, sofreu um acidente de
viação, tendo que amputar as duas pernas.
Notícias ao Minuto | Lusa | Foto iStock
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