quarta-feira, 27 de novembro de 2019

ONG pedem investigação antes de empréstimo do FMI à Guiné Equatorial


Organizações dos direitos humanos, incluindo a OXFAM e a Amnistia Internacional, pedem ao FMI o adiamento de novas linhas de crédito à Guiné Equatorial. Defendem que os recursos podem financiar absusos no país.

Oito organizações equato-guineenses e internacionais que há vários anos acompanham a governação e os direitos humanos na Guiné Equatorial, apelam ao Fundo Monetário Internacional (FMI) a não conceder para já o empréstimo solicitado pelo Executivo de Malabo em dezembro de 2018.

Na carta endereçada ao chefe de missão do FMI para a Guiné Equatorial, consideram prematuro, de momento, votar a favor do suposto acordo de cedência de fundos ao país governado pelo presidente Teodoro Obiang Nguema.

As referidas organizações, entre as quais a Amnistia Internacional, pedem que sejam feitas investigações ao regime de Obiang Nguema para se perceber, entre outras, questões relacionadas com a boa governação.




Riscos aos direitos humanos 

Face a isso, o diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal, fala de vários riscos de empréstimos àquele país, onde têm aumentado os abusos de direitos humanos: "Riscos que têm a ver com avultadas situações de corrupção, de má governação, de abusos de direitos humanos, de perseguição do Governo da Guiné Equatorial às organizações que atacam a questão da corrupção, que fazem a advocacia anti-corrupção".

De acordo com Pedro Neto, o Governo da Guiné Equatorial tem igualmente "atacado cidadãos notáveis e organizações civis", continuando os próprios oficiais do regime a exercer as suas funções com impunidade, porque "a Justiça é bastante permeável e influenciada face às indicações que o Governo dá".

Na perspetiva de Pedro Neto, "emprestar dinheiro por parte de uma agência das Nações Unidas" significa permitir que "continue a impunidade do Governo da Guiné Equatorial".

"E, por isso", defende o diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal, "pedimos que o FMI faça mais investigações e que garanta que estas tendências de governação da Guiné Equatorial acabem e que, de facto, tenha um programa de desenvolvimento e de boa governação que seja efetivo, que se comprometa a ele, que mostre já que o está a cumprir antes de que lhes seja emprestado qualquer montante financeiro".

Solicitado a reagir pela DW África, o secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), de que a Guiné Equatorial é membro, abstém-se de fazer qualquer comentário a propósito, alegando tratar-se de um assunto interno de um Estado membro.

Mais poder à elite

Para Ana Lúcia Sá, docente do Departamento de Ciência Política e Políticas Públicas do Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa – ISCTE, desde a descoberta do petróleo nos anos 90, nunca houve uma redistribuição das rendas de produção e a sua aplicação em políticas sociais ou educativas para o desenvolvimento.
A investigadora portuguesa, especialista em temáticas sobre a Guiné Equatorial, diz que as rendas da indústria extrativa do país sempre serviram para alimentar a elite governante.

Por outro lado, acrescenta, "este novo pedido ao FMI volta a colocar a Guiné Equatorial no radar das instituições internacionais" e poderá permitir "mais mecanismos de sobrevivência do regime, mais apoios internacionais, que nunca vão reverter a favor da população". Para a docente, "todos os setores sociais foram muito descurados no país".

Pedro Neto considera que serão "muitos poucos" os efeitos do referido empréstimo para a população, que já vive muito sacrificada pela má governação do Executivo liderado pelo Presidente Teodoro Obiang: "As pessoas já vivem na pobreza, vivem muito sacrificadas, quer nos seus direitos civis e políticos quer também no que toca aos seus direitos económicos. Por isso, para elas que já sofrem anos e anos das consequências da pobreza e da má governação, as consequências serão muito pequenas", avalia.

No entanto, ao não conseguir o empréstimo, o Governo não verá injetado o dinheiro de que precisa ou para desenvolver o país ou para continuar o trajeto de corrupção e de mau uso das finanças públicas, bem como de um eventual apoio financeiro a ser concedido pelo FMI.

O diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal aconselha o Presidente Obiang a garantir uma "rota de governação em que se afaste da corrupção", a dar liberdade à justiça para agir de acordo com a sua natureza e função, devendo igualmente promover os direitos civis, políticos e económicos, alicerçados num programa de investimento "que possa tirar a esmagadora maioria da população da pobreza extrema".

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle

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