O diálogo, a negociação, a
persistência e a transparência constituem as balizas dentro das quais o
sindicalismo relança a validação do seu projeto dinâmico no enquadramento de
uma sociedade democrática.
Bernardo Colaço | AbrilAbril |
opinião
Numa das muitas iniciativas da
Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), tive a
oportunidade de moderar em 2008 um Seminário sob o tema «Polícia – Profissão de
Risco». De entre várias conclusões então tiradas, figurava a exigência da
função policial como profissão de risco merecer expressa consagração legal.
Como habitualmente e à semelhança de outras, esta reivindicação foi apresentada
em tempo útil ao Governo e aos grupos parlamentares. Até hoje o Executivo está
em débito para o cumprimento dessa medida, não obstante existir uma
Recomendação Parlamentar neste mesmo sentido. De igual jeito, e como
consequência da atividade sindical e associativo-profissional policial, pende
na atualidade um Projeto de Lei no sentido de ser aprovado o Estatuto da
Condição Policial, depois de um Projeto similar ter sido rejeitado na anterior
legislatura, por grupos parlamentares, entre os quais, o do partido no poder, e
que agora se apresentam solidários com a causa sindical policial.
Vem esta referência apenas para
significar que, de um modo geral, as organizações representativas de
profissionais da PSP e da GNR, enquanto unidades eleitas pela respetiva classe,
têm sabido ativar-se na busca de soluções para as suas aspirações próprias e
legítimas. Porém, este tipo de atividade num Estado de Direito Democrático tem
as suas regras. Assim, o diálogo, a negociação, a persistência e a
transparência constituem as balizas dentro das quais o sindicalismo relança a
validação do seu projeto dinâmico no enquadramento de uma sociedade
democrática. É aliás para tanto, que o artigo 55º da Constituição de República
reconhece este formato organizativo como a via superior de consciência
profissional.
Todavia, à sombra da
permissividade da sociedade democrática aparecem movimentos algo abrangentes,
que em dado momento e por mais variados motivos, podem demonstrar o “quanto” de
sua insatisfação pela situação vivencial, exigindo em simultâneo que o poder
político aja mais em conformidade com as expectativas sociais. A sua componente
difusa, por vezes radicada no anonimato, é propícia para o cometimento de
desregramentos e distúrbios podendo culminar em atos violentos. Só que esta
contextualização nada tem a ver com o sindicalismo. Em certos casos, embora possa
haver coincidência entre as exigências desses movimentos e as reivindicações
dos sindicatos, essa coincidência pode não existir na habitual forma de atuação
de uns e outros.
Neste aspeto, e ao contrário do
entendimento do sr. ministro de Administração Interna, não há sindicalismo
responsável. O sindicalismo é sempre responsável, portanto, incompatível com a
ultrapassagem da linha vermelha para a sua atuação dentro do parâmetro
democrático. De fora fica a arruaça – que pode bem ser o apanágio desses movimentos
inorgânicos, não eleitos e anónimos, mas não de sindicatos ou associações
profissionais, cujo comportamento está marcado por cânones de uma justaposição
de solução de conflito e nunca pelo afrontamento.
No recente caso da “manif”
policial do dia 21 de novembro, e pelo que se conhece das imagens televisivas,
as pretensões do denominado Movimento 0, pese embora mantendo o anonimato dos
seus dirigentes e da sua forma organizativa, aparentam coincidir com as da
ASPP/PSP e da Associação dos Profissionais da Guarda (APG/GNR), que convocaram
a manifestação. Ora, partindo da ideia de que o sindicalismo em geral pauta a
sua conduta no contexto da lei – ter caráter não clandestino, ser fruto de um
resultado eleitoral e adotar estatutos publicados, legalmente aprovados, não se
vislumbra como uma formação inorgânica, por mais zeros que tenha, possa
substituir um sindicato nos seus objetivos e, menos ainda, constituir uma mais
valia nas suas finalidades, salvo se enveredar por caminhos que a lei não prevê
nem aconselha. Mais, parece que o Movimento 0 quis viciar toda a filosofia e
sentido da manifestação sindical, ao dar o palanquim do discurso (a carrinha da
organização da manifestação) a um sr. Deputado que apareceu a fazer a afirmação
de que o sindicalismo tradicional (numa implícita alusão à ASPP/PSP e APG/GNR)
tinha os seus dias contados, daí decorrendo uma tentativa de desvirtuamento do
próprio sentido da manifestação de polícias, que por natureza, tem de ser
apartidária. Talvez aqui resida a motivação para colocar os blocos de betão a
título preventivo.
No entanto, o melhor que
aconteceu foi os organizadores, por esta altura, darem a manifestação por
terminada. Ou seja, porem fim a um gesto a todas as luzes provocatório.
*O autor escreve ao abrigo do
Acordo Ortográfico de 1990 (AE90)
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