A relação entre o Sudão e o Sudão
do Sul, marcada por guerra e violência, parece estar a mudar, após a queda do
ex-Presidente sudanês Omar Al-Bashir - com vantagens para os dois países.
Quando o novo primeiro-ministro
do Sudão, Abdalla Hamdok, chegou à capital do vizinho Sudão do Sul, em
setembro, mostrou-se "muito satisfeito" por estar na sua
"segunda casa, Juba". No passado, declarações como esta de políticos
sudaneses em relação ao Sudão do Sul seriam improváveis. A relação entre os
dois países tem sido conturbada: após uma violenta guerra civil, que durou 22
anos, o Sudão do Sul, de população maioritariamente cristã, separou-se do norte
predominantemente muçulmano e de língua árabe e declarou a independência, em
2011.
Com a destituição,
em abril deste ano, do ex-Presidente sudanês, Omar al-Bashir, o
relacionamento entre o Sudão e o Sudão do Sul tem melhorado a olhos vistos.
Hamdok, que lidera um Governo de transição de 18 membros formado após a queda
de Omar al-Bashir, que esteve no poder de 1989 a abril deste ano, diz que os
dois países procuram um novo relacionamento mais estratégico.
E a saída de al-Bashir abre
caminho não só à melhoria das relações, mas também ao trabalho conjunto para
resolver os problemas internos dos dois países - que, por vezes, se agravaram
com o apoio do Governo vizinho. "Os dois países dependem, de facto, da boa
relação com o outro", afirma Marina Peter, especialista no Sudão na
organização alemã Brot für die Welt (Pão para o Mundo).
Em 2013, apenas dois anos depois
da independência, o Sudão do Sul entrou numa guerra civil, provocado pela
rivalidade entre o Presidente, Salva Kiir, e o seu então vice-Presidente, Riek
Machar. Estima-se que 400 mil pessoas tenham sido mortas no conflito e mais de
4 milhões de pessoas tenham sido deslocadas. Sob a liderança de al-Bashir, o
Sudão apoiou o grupo rebelde de Riek Machar, bem como outros elementos que se
opunham ao Governo do Sudão do Sul. "Para Kiir, é importante que Machar já
não receba apoio do Sudão, especialmente no que diz respeito a armamento",
sublinha Marina Peter.
Ao mesmo tempo, o Sudão do Sul
também apoiou grupos rebeldes no Sudão, particularmente na área das montanhas
de Nuba, no sul do Sudão, que tem laços históricos e culturais fortes com o que
é agora o Sudão do Sul.
Histórias como estas poderão ser
águas passadas. A ex-representante especial da União Europeia no Sudão,
Rosalind Marsden, considera que as melhorias são evidentes e que esta "é
uma oportunidade de ouro para ver o fim do conflito" na região.
Ainda no regime de Omar
al-Bashir, o Sudão, ao lado do Uganda, tinha já começado a mediar as
conversações entre Kiir e Machar, que assinaram um acordo de paz em 2018,
decidindo formar um Governo de transição de unidade nacional. O Governo deveria
ter sido formado até 12 deste mês, mas foi adiado por 100 dias.
Recentemente, o chefe do Conselho
Soberano do Sudão participou nas negociações entre Kiir e Machar que decorreram
no Uganda, com o intuito de facilitar o acordo para a formação de um Governo de
transição e de unidade nacional no Sudão do Sul.
"Os dois países estão
a atuar como mediadores para se ajudarem mutuamente a resolverem os seus
conflitos internos, até porque cada um tem influência sobre as forças da
oposição no outro país", considera Rosalind Marsden, que esteve no Sudão
na qualidade de diplomata europeia. "É claro que o Governo de Cartum está
a assumir essa responsabilidade e a contribuir de forma positiva para ajudar o
Sudão do Sul a resolver os seus problemas pendentes".
Fronteiras abertas e novas
oportunidades
O Sudão do Sul e o Sudão também estão
ligados a uma dependência da exploração do petróleo. Uma grande parte dos
campos de petróleo está localizada no Sudão do Sul, mas a única maneira de
fazer a extração é através do oleoduto e do porto do Sudão. O Sudão recebe
entre 9 a 10 milhões de euros por cada barril de petróleo do Sudão de Sul, de
acordo com a agência de notícias Reuters. Se o Sudão do Sul puder voltar a
exportar petróleo, será benéfico para os dois países.
Os dois países esperam também
melhorar as relações económicas, isto numa altura em que o Sudão enfrenta
uma grave crise económica, com inflação alta e aumento dos preços dos
alimentos, que estiveram na origem dos protestos que afastaram al-Bashir do
poder.
Já o Sudão do Sul, um dos países
mais pobres do mundo, viu a sua precária economia devastada por seis anos de
guerra civil.
"Espera-se que as fronteiras
abram novamente e as trocas comerciais possam ter lugar", diz Marina
Peter, da Brot für die Welt. Algumas vozes nos dois países sugerem
mesmo a formação de uma espécie de confederação no futuro, segundo a
especialista.
Daniel Pelz, bd, mjp | Deutsche
Welle
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