domingo, 22 de dezembro de 2019

Jair Bolsonaro: autorretrato de um fascista


Rafael Hidalgo*

Desde que emergiu como candidato à presidência com possibilidades de triunfo, Jair Messias Bolsonaro tem sido objeto das mais diversas qualificações: xenófobo, racista, misógino e fascista, entre outras.

Não eram adjetivos novos para se referir ao polêmico ex-capitão do exército que se tornou deputado federal em 1991, mas eram mais enfáticos e cheios de medos bem fundamentados.

Nesta ocasião, o termo fascista não será usado como adjetivo, nem como recurso para identificar as características do processo político brasileiro que o levou à presidência e que na sequência o manteve nela. No plano histórico, a realidade política e social do país sul-americano não é comparável à que na Itália e na Alemanha gerou, durante os anos 20 do século passado, o fascismo e o nazismo.

O termo será usado como substantivo que retrata de “corpo e alma” o caráter daquele que se impôs, como candidato populista da extrema direita, no enredo político-eleitoral da nação sul-americana, proclamando com desenfado nada mais e nada menos do que ideias primitivas de violência, ódio, intolerância, militarismo exacerbado, autoritarismo e personalismo extremo, no melhor estilo dos líderes históricos do fascismo.

De personalidade impulsiva, cultura medíocre e talento discutível, o próprio Bolsonaro não pode ser questionado por esses dois aspectos definidores de sua personalidade: ele defende teimosamente suas ideias retrógradas e é, na verdade, obstinado quando se trata de levá-las à prática. É o que está demonstrando como presidente da nação mais populosa e extensa da América Latina.

Para Bolsonaro, assim como para a figura política que é seu modelo, Donald Trump, as regras da política são impostas por eles, e isto basta, o que os outros possam pensar não conta!


Diante dessa realidade, o mais oportuno e crível é que ele próprio se apresente, fale e explicite sua verdadeira e daninha natureza psicológica e política.

Em 1993, em meio aos esforços dos setores democráticos brasileiros para libertar o país das consequências de uma ditadura militar de mais de 20 anos, estas foram suas palavras perante a Câmara Federal: “Sim, sou a favor de uma ditadura! Nunca resolveremos os graves problemas nacionais com essa democracia irresponsável!”.

Seis anos depois, em 23 de maio de 1999, ele disse: “Através do voto, vocês não mudarão nada neste país, nada, absolutamente nada. Só vai mudar, infelizmente, quando, um dia, partirmos para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar não fez. Matando cerca de 30 mil, começando por FHC (o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso), não deixando de fora, não, matando! Se alguns inocentes vão morrer, tudo bem, em toda guerra morrem inocentes” (a sintaxe precária é um retrato do seu nível cultural).

Na mesma intervenção, ele acrescentou: “Não há a menor dúvida (de que fecharia o Congresso). Daria um golpe no mesmo dia! Não funciona! E tenho certeza de que pelo menos 90% da população iria festejar, iria aplaudir, porque não funciona. Hoje em dia, o Congresso não serve para nada… só vota o que o presidente quer. Se ele é a pessoa que decide, que tripudia sobre o Congresso, que dê o golpe agora, parta para a ditadura”.

Em 11 de fevereiro de 2016, ele expressou enfaticamente seu peculiar “senso democrático”: “Maioria é uma coisa, minoria é outra … a minoria precisa calar a boca, se curvar para a maioria, acabou …”.

Ele deixou explícita de modo lapidar sua visão de “tolerância” democrática quando ameaçou os militantes do Partido dos Trabalhadores – conhecidos como petistas – em 1º de setembro de 2017: “Vamos fuzilar toda a petralha (depreciativo de petista) daqui do Acre” … Já que eles gostam tanto da Venezuela, devem ir para lá”.

Sobre Hitler, um de seus ídolos, juntamente com Augusto Pinochet e Trump, ele disse uma vez: “O que você tem de entender é o seguinte: guerra é guerra. Ele foi um grande estrategista”.

Para o atualmente evangélico Bolsonaro, as águas do rio Jordão com as quais o pastor Everaldo Dias o batizou, em maio de 2016, de nada serviram para aplacar seus instintos primitivos: os milhões de mortos causados pelo nazismo parecem irrelevantes para ele, assim como os desaparecidos e assassinados por Pinochet e o Plano Condor, que o ditador chileno impulsionou com o beneplácito de Henry Kissinger, secretário de Estado de Richard Nixon, e os infalíveis assessores da CIA.

Sobre a tortura, ele costuma falar como se fosse um instrumento natural para obter informações. Em maio de 1999, ele disse: “Pau-de-arara (refere-se a um dos instrumentos de tortura favoritos da ditadura militar) funciona. Sou favorável à tortura, você sabe disso. E o povo também é favorável”.

As ideias racistas são recorrentes em suas expressões públicas. Em 28 de março de 2011, dirigindo-se à cantora Preta Gil, ele disse: “Não vou discutir promiscuidade com ninguém. Não corro esse risco (de meu filho se apaixonar por uma mulher negra) e meus filhos foram muito bem educados e não viveram em um ambiente, como infelizmente é o seu”.

Em 3 de abril de 2017, ele expressou com naturalidade: “Visitei uma comunidade quilombola. O afrodescendente mais magro ali pesava sete arrobas. Eles não fazem nada, nem para procriar eles servem mais”.

Ele combina o machismo com alusões depreciativas para com as mulheres. Duas expressões confirmam isto. A primeira foi uma declaração ao jornal Zero Hora do Rio Grande do Sul, em dezembro de 2014. A segunda foi ao intervir no Clube Hebraica, em abril de 2017: 1) “Eu sou um liberal, se eu quiser empregá-lo em minha empresa ganhando 2 mil reais por mês e Dona Maria ganhando 1,5 mil reais, se Dona Maria não quiser ganhar isso, ela que procure outro emprego. O patrão sou eu ”; 2) “Fui com meus três filhos, o outro também, foram os quatro. São cinco filhos, mas na quinta vez me deu uma fraqueza. Eram quatro homens, na quinta vez eu fraquejei e veio uma mulher”. Sem comentários.

As ideias retrógradas do presidente brasileiro são muitas. As expostas até aqui constituem uma amostra mínima, mas representativa. A partir delas, vocês tiram suas próprias conclusões.


*Cientista político cubano

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