De 500 organizações reconhecidas
pelo Estado angolano, 20 tinham o estatuto. Ativistas reconhecem que a medida
tenta corrigir "erros do passado".
O Governo angolano deixou de
atribuir o estatuto de utilidade pública às organizações da sociedade civil.
Nem todas as associações tinham o estatuto. A prática era o Governo conceder o
estatuto apenas para instituições ligadas ao Movimento Popular de Libertação de
Angola (MPLA, no poder), que adquiriam automaticamente o direito a obter fundos
públicos.
Uma crítica comum é que
organizações com o
estatuto não eram vistas em trabalhos de base.
O Ministério da Justiça e dos
Direitos Humanos revelou recentemente que o reconhecimento foi suspenso há dois
anos devido a dificuldades financeiras.
Segundo o ministro Artur Queiroz,
desde o início da governação do Presidente João Lourenço que havia a ideia de
deixar de atribuir o título às organizações. "Como o dinheiro escasseou
muito, o estatuto de utilidade pública também foi suspenso", explica
Queiroz.
Na prática, o fim do estatuto
atinge em cheio as organizações que eram vinculadas ao partido MPLA. O Estado
angolano reconhece oficialmente a existência de cerca de 500 associações.
Praticamente todas surgiram depois do acordo de paz assinado em 2002. Desse
universo, segundo o ministro, cerca de 20 têm o estatuto de utilidade pública.
O financiamento do Estado às
associações vai agora depender dos projetos por elas apresentados. Queiroz
explica que se trata de uma "regra que ainda se está a implantar",
mas o que se pretende é que as organizações não tenham acesso a recursos
por serem de utilidade pública, mas por serem eficientes.
As organizações devem apresentar
"um programa concreto, que tenha impacto visível na população e no
cumprimento do programa de governação".
Alguns dirigentes de organizações
da sociedade civil angolana apoiam a iniciativa. Rafael Morais, coordenador da
Friends of Angola, diz que o Governo "está a tentar corrigir um erro
cometido no passado".
Segundo o ativista, a governação
do MPLA limitava-se a financiar associações ligadas ao partido, como a
Associação dos Jovens Angolanos Provenientes da Zâmbia, a União das Associações
Locais de Angola e a Fundação Eduardo dos Santos - esta última muito próxima do
ex-Presidente José Eduardo dos Santos.
Avaliação de projetos
Por outro lado, Morais lembra que
há organizações cujo foco é resolver problemas na sociedade angolana, e não
precisam de apresentar projetos que convençam o Governo sobre sua eficiência.
"Se for assim, eles [Governo] que façam algum inquérito à população, e o
próprio povo vai dizer como é que o trabalho destas organizações tem realmente
criado impacto na sua vida", explica.
Morais cita a Mãos Livres, a Ação
para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA) e a MOSAIKO como organizações
que têm impacto relevante na vida das comunidades. A ADRA aguarda por reconhecimento
há mais de dez anos, mas o seu coordenador, Carlos Cambuta, continua a defender
o diálogo entre o Governo e as organizações.
Ele vê a iniciativa do Governo
com algum ceticismo quanto ao benefício concreto à sociedade civil. Cambuta
acredita que o estatuto de utilidade pública, na teoria, era uma contribuição
relevante, uma vez que garantia recursos para ampliar o nível de intervenção
social.
"Com a redução ou [fim do
financiamento], as organizações que tinham o estatuto de utilidade pública não
vão conseguir desempenhar o seu papel. Se conseguirem, será com muitas
limitações", explica o coordenador da ADRA.
Borralho Ndomba (Luanda) |
Deutsche Welle
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