O aumento de infeções pelo novo
coronavírus em África eleva a preocupação com um possível desastre. Mas o
continente tem experiência exemplar no combate a doenças infeciosas e tem muito
a ensinar a países desenvolvidos.
A crise mundial do novo
coronavírus paralisou as metrópoles africanas. Em Joanesburgo, o centro
económico da África do Sul, as forças de segurança fazem o controlo do toque de
recolher imposto pelo Governo. Na animada Kampala, a capital do Uganda, mercados
e lojas estão fechados. Nas ruas, os mototaxistas não podem mais transportar os
passageiros, mas estão a fazer serviços de entrega.
Ahmed Ogwell Ouma, vice-diretor
do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (CDC África),
elogia a ação imediata dos governos africanos.
"De facto, aprendemos muito
bem a lição de que é preciso agir rapidamente, durante a crise do ébola na
África Ocidental em 2014", diz.
"Quando agimos
imediatamente, usamos os instrumentos adequados de saúde pública, além do
conhecimento científico que mostra-se efetivo. E isso contribuiu muito
para os baixos números em África", acrescenta.
Gavin Churchyard, presidente do
centro de saúde sul-africano Instituto Aurum, sublinha que o controlo de infeções
em África não é algo novo para a população, dando o exemplo da longa luta do
continente contra a tuberculose. Os materiais educacionais existentes sobre
tuberculose e HIV/SIDA também podem ser levemente modificados para colaborar na
luta contra a Covid-19.
"Ao contrário de alguns dos
países desenvolvidos, vimos países africanos adotar soluções baseadas em
evidências e vimos a liderança emergir nos países africanos, o que não vimos
noutros sítios", disse.
Apesar deste sucesso inicial, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a Covid-19 pode atingir África
com mais força do que outras regiões do mundo. Mas a África não é uma vítima
vulnerável da pandemia, na opinião de Robert Kappel, professor emérito do
Instituto de Estudos Africanos da Universidade de Leipzig, na Alemanha.
"Temos uma lição a aprender.
Apesar de termos a percepção de que o continente africano não é o continente
das pandemias, as crises de saúde e da economia persistem", disse o economista
em entrevista à DW. "É um continente que faz as coisas à sua maneira, mas
de formas muito distintas", acrescenta.
Ideias inovadoras
Kappel enfatiza o compromisso
local das pequenas e médias empresas de inovação. Estas empresas estão a ser
atores-chave na produção de máscaras farmacêuticas e de produtos de desinfeção.
"É possível aprender muito quando confiamos no conhecimento local que está
disponível nos países africanos", diz. As startups também foram
parcialmente apoiadas pelos Governos e estão a desempenhar um papel importante
no abastecimento da população.
Os economistas acreditam que a
luta bem sucedida de África contra o ébola e outras doenças mostra que o
continente não depende essencialmente da ajuda internacional e de enormes somas
de dinheiro. Isto seria necessário se o número de infeções aumentasse exponencialmente
e a crise económica se acentuasse.
Mas na primeira fase da crise do
ébola, comunidades locais, organizações da sociedade civil e autoridades locais
conseguiram limitar a propagação da doença. Outra vantagem foi o facto de que o
novo coronavírus chegou em África mais tarde do que noutros continentes,
deixando mais tempo para o continente africano se preparar.
Em duas cartas abertas
apresentadas recentemente, intelectuais africanos enfatizaram que África é tudo
menos um continente desamparado. Entre outros, o escritor e músico senegalês
Felwine Sarr, o cientista político camaronês Achille Mbembe e o Prêmio Nobel de
Literatura na Nigéria Wole Soyinka exigiriam que África "forneça uma
resposta fundamental, poderosa e sustentável a uma ameaça real e que não seja
exagerada nem subestimada, mas enfrentada racionalmente".
Estes intelectuais exigem que os
Governos usem a atual situação para emergir mais fortes desta crise. Os
sistemas de saúde teriam de ser redesenhados, as matérias-primas deveriam finalmente
ser processadas localmente e a economia tornar-se mais diversificada.
Martina Schwikowski, kg |
Deutsche Welle
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