Moçambique assinala o dia mundial
da Liberdade de Imprensa, com jornalistas cada vez mais preocupados com a
deterioração do ambiente criado ao livre exercício da sua profissão e aumento
de autocensura.
O Presidente do Conselho Superior
da Comunicação Social, Tomás Vieira Mário, disse à DW África que nos últimos
três anos, devido ao conflito violento no norte de Moçambique, registam-se
restrições no exercício dos profissionais da comunicação social. "Os
principais casos de violação têm a ver com o "blackout” à média na
província de Cabo
Delgado", disse.
"Esta situação concretiza-se
até através da detenção que já ocorreu, de jornalistas", acrescentou Tomás
Vieira Mário. Observou que para além do cerceamento à liberdade de imprensa
regista-se a detenção ilegal de jornalistas com "desfechos muito mal
encaminhados mesmo ao nível judicial".
Detenções de jornalistas
O presidente do Instituto de
Comunicação Social da África Austral - MISA Moçambique, Fernando Gonçalves,
exemplificou que "muito recentemente houve um caso em Cabo Delgado em que
um jornalista que estava a reportar uma ação foi levado para uma esquadra da
polícia e as imagens foram apagadas da sua camara de filmagem".
"Estas ações não são dignas
de um Estado em que a liberdade de imprensa é respeitada", afirmou
Fernando Gonçalves, sublinhando que o ambiente ao exercício da profissão
jornalística em Moçambique "é negativo".
Quase vinte organizações
expressaram, preocupações ao Presidente da República de Moçambique, Filipe
Nyusi, em relação aos relatos de violência contra civis e jornalistas
por parte de elementos das forças de segurança, questionando
especificamente o desaparecimento de um jornalista. A missiva
denuncia o "assédio e intimidação" contra jornalistas por parte
destes elementos das forças de segurança, "simplesmente por fazerem o seu
trabalho" em Cabo Delgado.
A classe jornalística no país
está, igualmente, preocupada com o aumento da autocensura na comunicação social
nacional.
Autocensura
Fernando Gonçalves considera que
o atual ambiente propicia a autocensura e afirma que alguns jornalistas recorrem
a este método como forma de se protegerem. "Esta situação deve ser
corrigida no mais breve espaço de tempo possível".
Na mesma linha, Tomás Vieira
Mário, presidente do Conselho Superior da Comunicação Social, avança que
"há um contexto político, social e económico, que instiga a autocensura em
Moçambique".
Tomás Vieira Mário denunciou
também o que descreveu como uma espécie de um consenso negativo das autoridades
públicas que consiste em ficar em silêncio na divulgação de ações críticas de
governação, tendo sublinhado que "isso é uma forma de censura ao
público".
Vieira Mário disse que apesar das
leis de comunicação social moçambicanas serem bastante progressistas, os
servidores públicos ainda não conseguiram mudar aquilo que são práticas nocivas
arreigadas da administração pública.
Violações das leis
O Presidente do Instituto de
Comunicação Social da África Austral - MISA Moçambique, Fernando Gonçalves
considera que a legislação moçambicana é muito propícia ao exercício da
liberdade de expressão, mas aponta para violações
e abusos praticados por alguns servidores públicos atuando em representação
do estado.
"Compete ao estado, ao
governo, tomar as medidas apropriadas para que estas situações não ocorram com
a frequência que se tem verificado", sublinhou.
Gonçalves defende que um dos
principais desafios da classe jornalística no país é continuar a lutar para
levar as autoridades e todas as forças vivas da sociedade a perceber que não
pode haver democracia sem liberdade de expressão e de imprensa.
Para além da queda do ambiente de
livre exercício da profissão jornalística, a qualidade da própria média,
sobretudo de televisões, também baixou nos últimos três anos.
Moçambique caiu no índice da
Liberdade de Imprensa
A Constituição da República de
Moçambique define o Conselho Superior da Comunicação Social como órgão de
disciplina e de consulta, que assegura a independência dos média moçambicanos,
no exercício dos direitos à informação, à liberdade de imprensa, bem como dos
direitos de antena e de resposta.
"Só que a instituição tem
poderes muito limitados e não vinculativos que não vão para além de deliberar
sobre aspetos morais e éticos", conforme referiu o presidente do órgão,
Tomás Vieira Mário. "O nosso foco, neste momento, é transformar o Conselho
em órgão regulador, com poderes de inspecionar, sancionar e fiscalizar".
Moçambique desceu um degrau no
índice sobre Liberdade de Imprensa divulgado na semana passada (21.04) pela
organização Repórteres sem Fronteiras, passando a ocupar a posição 104 de um
total de 180 países avaliados.
A organização considera que o
país está a palmilhar um "caminho preocupante” marcado por "fortes
pressões" e "agressões frequentes" a jornalistas
independentes, para além da "quase impossibilidade" de os
jornalistas acederem às zonas onde se registam ataques armados no norte do país.
Leonel Matias (Maputo) | Deutsche
Welle
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