Travar a marcha do capital rumo
ao neofascismo!
Remy Herrera
Surrealista. Os
acontecimentos que, a partir de meados de Março de 2020, sob o assalto do
coronavírus, fizeram afundar um país inteiro, e outros com ele, têm algo de
surrealista. Menos pelo ocorrência da própria pandemia e sim pelas escolhas de
política económica-sanitária que foram feitas. O risco de epidemia global era
anunciado desde há anos por muitos cientistas especializados – à semelhança da
ameaça ligada a eventuais catástrofes naturais (ou nucleares), por exemplo,
previstas por outros investigadores... Se a contagem quotidiana das mortes
causadas pelo vírus causa horror, se o afluxo aos hospitais de doentes
contaminados angustia, a "gestão da crise do covid-19" transtorna. As
escolhas efectuadas no cimo da pirâmide dos poderes foram de consequências
pesadas, extremamente graves, simplesmente monstruosas. Pois quis-se fazer
aceitar como normal o facto de que equipes médicas, despojadas ex ante dos
meios de exercer sua profissão – consistente em salvar vidas – tenham sido
constrangidas ex post a fazer a selecção entre pacientes para os
quais tudo seria tentado a fim de sobreviverem e os outros – idosos,
vulneráveis, ditos "polipatológicos", "com comorbilidade",
ou seja, aquelas e aqueles que, pelo seu próprio estado de saúde, necessitariam
de mais cuidados. Estas escolhas revelaram, quão dramática é a imoralidade
culpável dos altos responsáveis do país, políticos naturalmente, mas também e
sobretudo económicos – uma vez que a fidelidade dos primeiros aos segundos, do
interesse geral aos interesses de um punhado de grandes accionistas ávidos,
ferozes, desavergonhadamente anti-patrióticos, acaba por colocar em perigo a
humanidade: depois de ter arruinado o mundo, desesperado nossos jovens,
degradado nossas condições de vida e de trabalho, querem abandonar nossos
idosos.
Uma vez dissipado o estupor e a incredulidade, amplas parcelas do povo francês compreenderam que os seus dirigentes não lhes seriam de nenhum socorro em semelhante caso – excepcional, certamente, mas em que o indivíduo sente como nunca a necessidade vital de ser protegido. Elas perceberam rapidamente que é contra elas, e não contra um vírus, que os representantes das classes dominantes partiram "em guerra" e que, de facto, eles não fazem parte deste "nós" mencionado por E. Macron no seu discurso de 16 de Março. Nosso "nós" para nós, o dos governados, foi pressionado ao retrocesso, obrigado a reconhecer que a sociedade na qual nos prendem (embastille) é aquela do cada um por si, do todos contra todos e do salve-se quem puder. Uma sociedade em que os governos e as potências aos quais eles são dedicados estão em condições de decretar que não há lugar para todos nós – não há bastantes lugares no "mercado" de trabalho nem no do alojamento, não bastante para ganhar uma remuneração que permita viver dignamente ou para se exprimir democraticamente, nem mais lugares na fila de espera das entregas de máscaras cirúrgicas ou dos serviços de reanimação no tempo do coronavírus. Esta sociedade tem um nome. Este nome é capitalismo.
No fim de Fevereiro, restavam muito poucos dúvidas entre os microbiologistas, em primeiro lugar dos quais os virologistas, mas igualmente epidemiologistas, infectologistas e outras vozes autorizadas: a inevitabilidade da pandemia estava cientificamente estabelecida. Fazia cerca de um mês que a OMS declarara a "urgência de saúde pública mundial"; mais de um mês e meio que os investigadores chineses haviam identificado o vírus, descoberto (ultra-rapidamente) um teste de despistagem, publicado a sequência genética do novo agente infeccioso. Em 6 de Março, "aproveitando a vida com todos os dentes", o presidente francês e sua esposa iam à noite aplaudir a representação de uma peça de teatro (pondo em cena um chefe de Estado recém eleito, mas doente, a dialogar com um psiquiatra [lapso revelador?]). Ao passearem nos Campos Elíseos, sob flashs dos fotógrafos, em 9 de Março os pombinhos desafiavam novamente o perigo. A mensagem destinada aos franceses neste momento tão singular? Divirtam-se! Já há cinco dias o coordenador da primeira missão da OMS em Wuhan, o doutor Bruce Aylward, canadiano, insistia no New York Times (datado de 4 de Março) sobre a extraordinária gravidade da situação.
Em 29 de Fevereiro, um dia após à passagem do país à "fase 2" e à recomendação da OMS de mobilizar "todo o governo" a fim de dominar a pandemia, a ordem do dia do Conselho de Ministros "excepcional" dedicado ao coronavírus foi virada do avesso pelo executivo de um outro reizinho visivelmente preocupado em respeitar a agenda de demolição das conquistas sociais ditadas pela [confederação patronal] MEDEF: destruir com um bulldozer modelo 49.3 [1] o sistema de pensões, proibir toda manifestação e, para que o barulho do tractor anti-democrático seja um pouco menos ouvido, manter em 15 de Março a realização das eleições municipais. Mesmo que isso signifique enviar para o combate – sem a menor máscara distribuída – os assessores dos gabinetes de voto e seu concidadãos.
Uma vez dissipado o estupor e a incredulidade, amplas parcelas do povo francês compreenderam que os seus dirigentes não lhes seriam de nenhum socorro em semelhante caso – excepcional, certamente, mas em que o indivíduo sente como nunca a necessidade vital de ser protegido. Elas perceberam rapidamente que é contra elas, e não contra um vírus, que os representantes das classes dominantes partiram "em guerra" e que, de facto, eles não fazem parte deste "nós" mencionado por E. Macron no seu discurso de 16 de Março. Nosso "nós" para nós, o dos governados, foi pressionado ao retrocesso, obrigado a reconhecer que a sociedade na qual nos prendem (embastille) é aquela do cada um por si, do todos contra todos e do salve-se quem puder. Uma sociedade em que os governos e as potências aos quais eles são dedicados estão em condições de decretar que não há lugar para todos nós – não há bastantes lugares no "mercado" de trabalho nem no do alojamento, não bastante para ganhar uma remuneração que permita viver dignamente ou para se exprimir democraticamente, nem mais lugares na fila de espera das entregas de máscaras cirúrgicas ou dos serviços de reanimação no tempo do coronavírus. Esta sociedade tem um nome. Este nome é capitalismo.
No fim de Fevereiro, restavam muito poucos dúvidas entre os microbiologistas, em primeiro lugar dos quais os virologistas, mas igualmente epidemiologistas, infectologistas e outras vozes autorizadas: a inevitabilidade da pandemia estava cientificamente estabelecida. Fazia cerca de um mês que a OMS declarara a "urgência de saúde pública mundial"; mais de um mês e meio que os investigadores chineses haviam identificado o vírus, descoberto (ultra-rapidamente) um teste de despistagem, publicado a sequência genética do novo agente infeccioso. Em 6 de Março, "aproveitando a vida com todos os dentes", o presidente francês e sua esposa iam à noite aplaudir a representação de uma peça de teatro (pondo em cena um chefe de Estado recém eleito, mas doente, a dialogar com um psiquiatra [lapso revelador?]). Ao passearem nos Campos Elíseos, sob flashs dos fotógrafos, em 9 de Março os pombinhos desafiavam novamente o perigo. A mensagem destinada aos franceses neste momento tão singular? Divirtam-se! Já há cinco dias o coordenador da primeira missão da OMS em Wuhan, o doutor Bruce Aylward, canadiano, insistia no New York Times (datado de 4 de Março) sobre a extraordinária gravidade da situação.
Em 29 de Fevereiro, um dia após à passagem do país à "fase 2" e à recomendação da OMS de mobilizar "todo o governo" a fim de dominar a pandemia, a ordem do dia do Conselho de Ministros "excepcional" dedicado ao coronavírus foi virada do avesso pelo executivo de um outro reizinho visivelmente preocupado em respeitar a agenda de demolição das conquistas sociais ditadas pela [confederação patronal] MEDEF: destruir com um bulldozer modelo 49.3 [1] o sistema de pensões, proibir toda manifestação e, para que o barulho do tractor anti-democrático seja um pouco menos ouvido, manter em 15 de Março a realização das eleições municipais. Mesmo que isso signifique enviar para o combate – sem a menor máscara distribuída – os assessores dos gabinetes de voto e seu concidadãos.
A "gestion à la
française" da pandemia do covid-19 foi catastrófica. De um extremo ao
outro. Os que impõem o desordenamento da França entrarão na história pela porta
usada outrora pelos capituladores e traidores. Eles já haviam confirmado a
sentença de execução no garrote do hospital público pronunciada pelos seus
antecessores, fechando camas, pagando mal o pessoal, tornando os estrangeiros
precários, deixando envelhecer as instalações, transformando os cuidados de
saúde num supermercado. Haviam deslocalizado a produção de equipamentos e
medicamentos, entregue a investigação à sede de lucros dos laboratórios
farmacêuticos privados, passado a verdade científica na peneira de cálculo dos
lucros. Era suficiente? No momento da "crise do covid-19", decidiram
de modo consciente, cínico e criminoso não proteger a população e não tratar os
doentes – algo absolutamente incrível. "Se tens os sintomas do
coronavírus, talvez estejas doente. Nesse caso... estribilho... fica
em tua casa"! Esta foi a directiva alucinante difundida pelas autoridades
sanitárias. Não julgaram útil realizar testes em grande escala, nem constituir
a tempo os indispensáveis stocks de respiradores, entubadores, máscaras, óculos
protectores, aventais, blusas, gels hidro-alcoólicos. Sem mencionar tratamentos
que provocassem algum efeito favorável contra o coronavírus – ao mesmo tempo
que tristes polémicas de jornalistas autoproclamados peritos que se esqueceram
de informar "conflitos de interesses". Os médicos e as suas equipes,
enviados para a frente de batalha por um chefe de exército a divertir-se com
eles como se fossem soldadinhos de chumbo vestidos com sacos de lixo e chapéus
de trapo costurados no local, não tiveram sequer sedativos suficientes para
aliviar os moribundos, os infelizes destinados a "não reanimar" aos
quais não fora atribuída uma "pontuação de fragilidade" correcta...
Em vários locais, nenhum material de protecção foi atribuído aos serviços
psiquiátricos – deliberadamente? Para nada dizer dos lúgubres EHPAD [2] ,
em que muitas direcções rapidamente deixaram de transmitir as contagens de
falecidos às instâncias "competentes". E no terreno? Faltava tudo
menos a coragem. Viva os heróis!
Lá em baixo, os confinados. Que só conseguiram aguentar graças aos trabalhadores dos sectores essenciais, também eles heróicos: agricultores, operários das indústrias agro-alimentares, caixas de lojas, motoristas de entregas, pessoal de manutenção, empregados de limpeza, colectores de lixo, trabalhadores dos serviços públicos, tantos outros invisíveis e anónimos... Lá em cima? Os idiotas estão acabados! No meio dos confetis estatais que se arrastam aqui e ali, resíduos das farras e carnavais do neoliberalismo celebrando a cada dia, durante quase 40 anos, a festa dos miliardários!
Durante a pandemia, os líderes do grande patronato francês mostraram estar abaixo de tudo. Os patrões sonhavam só em nos pôr em cadeias, nas suas mini ditaduras de patrões exploradores, não pensavam, assim que o confinamento foi anunciado, senão em recolocar-nos sob a alçada da exploração. Aqueles que quase haviam conseguido convencido a maior parte dos gentis organizadores da "esquerda" de que a classe trabalhadora e a nação haviam desaparecido viram-nas ressurgir mais vigorosas do que nunca! Aqueles que nos contavam que poderiam magicamente passar sem nós para criar as riquezas foram subitamente tomados de pânico uma vez sem nós, o ciclo do capital, a sua bomba de dinheiro, bloqueou. Aqueles que, para nos fazer esquecer que a nação, nascida nas nossas fileiras, é o quadro da luta das classes e um baluarte contra a sua globalização selvagem, lançam-na novamente nos pastos da extrema direita. A Airbus reabriu rapidamente as suas fábricas e assim privou de máscaras (FFP2) os cuidadores que delas precisavam. A Sanofi, ao dar prioridade aos Estados Unidos, humilhou o Tesouro, que no entanto lhe havia assinado cheques gordos.
A Renault anunciou os seus milhares de despedimentos, encaixando os seus milhares de milhões de dinheiros públicos. A Peugeot pós-covid preferiu utilizar trabalhadores "destacados" de uso único ao invés de trabalhadores temporários locais. B. Arnault e Vuitton reproduziram para nós o filme de Notre Dame num belo golpe publicitário. O Medef, que durante décadas pressionou pela flexibilização e precarização dos contratos, desvinculou as empresas do financiamento da Segurança Social e encorajou as deslocalizações, é certamente, e imensamente, responsável não só pela desindustrialização do país – que nem sabe mais fabricar um cotonete ou o paracetamol – como também pela dramática penúria que aqui reina. E que o governo dissimula.
Lá em baixo, os confinados. Que só conseguiram aguentar graças aos trabalhadores dos sectores essenciais, também eles heróicos: agricultores, operários das indústrias agro-alimentares, caixas de lojas, motoristas de entregas, pessoal de manutenção, empregados de limpeza, colectores de lixo, trabalhadores dos serviços públicos, tantos outros invisíveis e anónimos... Lá em cima? Os idiotas estão acabados! No meio dos confetis estatais que se arrastam aqui e ali, resíduos das farras e carnavais do neoliberalismo celebrando a cada dia, durante quase 40 anos, a festa dos miliardários!
Durante a pandemia, os líderes do grande patronato francês mostraram estar abaixo de tudo. Os patrões sonhavam só em nos pôr em cadeias, nas suas mini ditaduras de patrões exploradores, não pensavam, assim que o confinamento foi anunciado, senão em recolocar-nos sob a alçada da exploração. Aqueles que quase haviam conseguido convencido a maior parte dos gentis organizadores da "esquerda" de que a classe trabalhadora e a nação haviam desaparecido viram-nas ressurgir mais vigorosas do que nunca! Aqueles que nos contavam que poderiam magicamente passar sem nós para criar as riquezas foram subitamente tomados de pânico uma vez sem nós, o ciclo do capital, a sua bomba de dinheiro, bloqueou. Aqueles que, para nos fazer esquecer que a nação, nascida nas nossas fileiras, é o quadro da luta das classes e um baluarte contra a sua globalização selvagem, lançam-na novamente nos pastos da extrema direita. A Airbus reabriu rapidamente as suas fábricas e assim privou de máscaras (FFP2) os cuidadores que delas precisavam. A Sanofi, ao dar prioridade aos Estados Unidos, humilhou o Tesouro, que no entanto lhe havia assinado cheques gordos.
A Renault anunciou os seus milhares de despedimentos, encaixando os seus milhares de milhões de dinheiros públicos. A Peugeot pós-covid preferiu utilizar trabalhadores "destacados" de uso único ao invés de trabalhadores temporários locais. B. Arnault e Vuitton reproduziram para nós o filme de Notre Dame num belo golpe publicitário. O Medef, que durante décadas pressionou pela flexibilização e precarização dos contratos, desvinculou as empresas do financiamento da Segurança Social e encorajou as deslocalizações, é certamente, e imensamente, responsável não só pela desindustrialização do país – que nem sabe mais fabricar um cotonete ou o paracetamol – como também pela dramática penúria que aqui reina. E que o governo dissimula.
Os "heróis da linha da
frente" também foram agradecidos com o despedimento uma vez levantado o
confinamento. Já tínhamos visto patrões liquidar ou quebrar as máquinas das
últimas fábricas de máscaras em França, agora vemos afundar 300 PMEs do sector
que acreditaram ingenuamente na palavra macroniana. As empresas não sabiam que
o Kreattur [3] dos
devoradores de mortos da finança só diz a verdade aos banqueiros, que, tão
destituídos de escrúpulos quanto os seus duendes domésticos, não largam o
dinheiro? Que não haja dúvidas. Cedo ou tarde chegará a hora da justiça social
em que todos estes grandes accionistas serão julgados por alta traição,
condenados, expropriados. Ainda levará tempo para que as contas sejam prestadas
e os privilégios abolidos, mas o escândalo revolta de tal modo que em breve
chegará o momento que, unidos, encontraremos a força para lhes fazer vomitar o
que nos roubam, para ensinar boas maneiras aos riquíssimos que não têm cura,
para ensinar aos novos aristocratas avarentos e às suas más companhias dos
paraísos fiscais a comportar-se bem, a viver em sociedade. Para
educar os detentores da chamada violência dita "legítima" que, na
nossa República, as pessoas não são sufocadas, não são espancadas, não lhes é
furado o olho, não se arrancam mãos nem pés nem nada, nem tão pouco se diz
"bicot" [4] .
Entretanto, os trabalhadores têm resistido em toda a França, pelo direito de reforma, de se desengatarem, de apresentarem queixas: nos hospitais públicos (como durante a mobilização de 16 de Junho); na indústria, na indústria automóvel e seus subcontratantes (Valeo, Faurecia, Burelle), na aeronáutica (Daher, Safran), nas infra-estruturas ferroviárias (Alstom), nos estaleiros navais (Atlantic), na indústria siderúrgica (ArcelorMittal), na embalagem (Allard); nos serviços (Carrefour, Amazone,La Redoute , Deliveroo, Uber
Eats, La Poste ,
etc.); no sector público (Carrefour, Amazone, La Redoute , Deliveroo, Uber
Eats, La Poste ,
etc.). Entre muitos outros. E será preciso resistir sempre, lutar com todas as
nossas forças contra a Blitzkrieg hoje desencadeada pelo patronato a
fim de varrer o que resta dos escombros do Código do Trabalho, sob o pretexto
de "salvar a economia". Um patronato acompanhada por líderanças
sindicais sem espinha dorsal, colaboradores de classe e adoradoras do euro (o
que ganharia a CGT se não se perdesse nela?) e apoiada por um executivo com
prerrogativas cada vez mais reforçadas, mas cujo poder os nossos concidadãos já
não aceitam, enojados por tantas submissões, traições, corrupções, repressões.
No tobogã que se precipita rumo às águas gélidas das candidaturas à municipalidade de Paris, a antiga ministra da Saúde, Agnès Buzyn, revelou que sabia o que estava a acontecer e que teria informado todos eles – ela disse ter prevenido o chefe de Estado já em 11 de Janeiro e depois advertido o primeiro-ministro no dia 30 que o pico da epidemia era esperado em França por volta de 15 de Março – todos sabiam. Invocar a desenvoltura de Emmanuel Macron, um pouco menos penosa de suportar do que a de um D. Trump ou de um B. Johnson, é importante: isso recorda que foram as potências do dinheiro a vampirizarem nossas economias que fizeram passar o elenco de actores de ópera bufa em que se tornou a democracia burguesa. Evocar a incompetência deste ou daquele funcionário ou ministro eleito tem a sua importância, mas eles são apenas pára-raios que encobrem as manobras dos seus mestres, os verdadeiros, os accionistas do Leviatã Financeiro e dos seus impérios económicos que brincam com o planeta como o globo de plástico do ditador Adenoïd Hynkel [5] , regem as nossas sociedades, maltratam os nossos serviços públicos, subjugam as nossas consciências, controlam todos os aspectos da nossa existência individual.
Estes grandes proprietários do capitalismo haviam prometido a opulência; estão a condenar-nos à escassez organizada – a que atravessámos durante a pandemia do coronavírus – e à crise sistémica – a pior depressão económica desde a Segunda Guerra Mundial está a aproximar-se. Eles glorificavam a liberdade, mas sequestram o trabalhador, mantido cativo desde a infância até à morte na sua máquina caça-niqueis do salariato. Eles sacralizavam o indivíduo, mas aniquilaram-no brutalmente para impor o seu arrepiante cálculo do "valor económico" de cada ser humano como critério decisivo para saber, uma vez que reina a falta de poupança e o fatalismo, se este poderá viverá e aquele deverá morrer. Além da insolvência made in France, o eugenismo generalizado como projecto do capital!
Entretanto, os trabalhadores têm resistido em toda a França, pelo direito de reforma, de se desengatarem, de apresentarem queixas: nos hospitais públicos (como durante a mobilização de 16 de Junho); na indústria, na indústria automóvel e seus subcontratantes (Valeo, Faurecia, Burelle), na aeronáutica (Daher, Safran), nas infra-estruturas ferroviárias (Alstom), nos estaleiros navais (Atlantic), na indústria siderúrgica (ArcelorMittal), na embalagem (Allard); nos serviços (Carrefour, Amazone,
No tobogã que se precipita rumo às águas gélidas das candidaturas à municipalidade de Paris, a antiga ministra da Saúde, Agnès Buzyn, revelou que sabia o que estava a acontecer e que teria informado todos eles – ela disse ter prevenido o chefe de Estado já em 11 de Janeiro e depois advertido o primeiro-ministro no dia 30 que o pico da epidemia era esperado em França por volta de 15 de Março – todos sabiam. Invocar a desenvoltura de Emmanuel Macron, um pouco menos penosa de suportar do que a de um D. Trump ou de um B. Johnson, é importante: isso recorda que foram as potências do dinheiro a vampirizarem nossas economias que fizeram passar o elenco de actores de ópera bufa em que se tornou a democracia burguesa. Evocar a incompetência deste ou daquele funcionário ou ministro eleito tem a sua importância, mas eles são apenas pára-raios que encobrem as manobras dos seus mestres, os verdadeiros, os accionistas do Leviatã Financeiro e dos seus impérios económicos que brincam com o planeta como o globo de plástico do ditador Adenoïd Hynkel [5] , regem as nossas sociedades, maltratam os nossos serviços públicos, subjugam as nossas consciências, controlam todos os aspectos da nossa existência individual.
Estes grandes proprietários do capitalismo haviam prometido a opulência; estão a condenar-nos à escassez organizada – a que atravessámos durante a pandemia do coronavírus – e à crise sistémica – a pior depressão económica desde a Segunda Guerra Mundial está a aproximar-se. Eles glorificavam a liberdade, mas sequestram o trabalhador, mantido cativo desde a infância até à morte na sua máquina caça-niqueis do salariato. Eles sacralizavam o indivíduo, mas aniquilaram-no brutalmente para impor o seu arrepiante cálculo do "valor económico" de cada ser humano como critério decisivo para saber, uma vez que reina a falta de poupança e o fatalismo, se este poderá viverá e aquele deverá morrer. Além da insolvência made in France, o eugenismo generalizado como projecto do capital!
Não nos enganemos. Os assassinos
vivem no topo, acima de um Estado em que puxam os cordelinhos para nos atirar
uns contra os outros, para nos dividir, para nos domesticar ao ponto de já não
reagir à visão de sem-abrigo deitados em frente a um edifício desocupado, de
migrantes engolidos pelas ondas, de famílias bombardeadas em países longínquos
por soldados criados entre nós. O sistema que eles querem ver se eternizar – o
capitalismo – é o que em 1936 vieram reforçar os fascistas que vociferavam
"viva a morte! e "Morte à inteligência!"". Parece que os
tiranos que dominam aqueles que nos dirigem estão hoje determinados a marchar
para o neofascismo a fim de perdurarem. Terão mesmo decidido que após o vírus,
para o povo francês haveria ou a peste ou a cólera: se acontecesse que o
comediante E. Macron recebesse uma chuva de tomates, eles nos concederiam o
direito de eleger a mais nova das filhas do Le Pen. Fracções das classes
dirigentes já a designaram! Estes todo-poderosos, possuem na totalidade – e
controlando totalitariamente – o aparelho de informação e de comunicação, mais
um espectro influente de redes sociais. É claro que ainda sustentam
esforçadamente o actual ocupante da rua du Faubourg-Saint-Honoré, 55, em
Paris [6] .
Mas doravante estes parceiros silenciosos das finanças esforçam-se por encerrar
todo o espaço da luta de classes no quadro dos conflitos internos das classes
dominantes – dos quais faz parte Marine Le Pen – a fim de monopolizar o debate
político e de situar o seu centro de gravidade entre a direita e a
extrema-direita. Tal como nos Estados Unidos, onde se dilaceram
"globalistas" (Biden) e "continentalistas" (Trump).
Assim, retiraram da sua jaula um magote de editorialistas e debatedores, cada um mais reaccionário do que o outro, a mostrarem os dentes e a morderem, sedentos de sangue, transmitindo o racismo. Como caçadores a excitarem os cães de caça, censores políticos odiosos que fazem a ORTF [7] empalidecer. Os grandes financeiros deste regime haviam conseguido eleger E. Macron em 2017, no fim de uma campanha publicitária relâmpago, entre televendas e reality show. Eles agora estão a mudar de método tendo em vista as eleições presidenciais de 2022. Até ao escrutínio decisivo, perseguirão este povo rebelde, farão com que seja acossado pelas bestas imundas do neofascismo numa caçada com cães, para tomá-lo de assalto a fim de capturá-lo e levá-lo à exaustão.
O que fazer então nestas condições? Teremos de ser resistentes, muito mais combativos, passar da defensiva à ofensiva, para poder esperar sair desta armadilha dilemática, para que o nosso "mundo de depois" não seja a sua " ordem nova" – da qual nasceu a FN em 1972 –, para que o slogan da "união nacional" da LaReM [8] não prefigure o advento do RN [9] , como "revolução nacional", ressuscitando o pior da história do país. E, para vencer, será preciso convencer. Convencer de que se quisermos travar a máquina infernal da crise sistémica e das guerras imperialistas, da destruição dos indivíduos, das sociedades e do ambiente, do agravamento das desigualdades, do racismo e do patriarcado, do embrutecimento cultural, da regressão dos direitos cívicos e democráticos, será preciso ultrapassar definitivamente o capitalismo e arrancar de vez e a sério para uma transição socialista.
Assim, retiraram da sua jaula um magote de editorialistas e debatedores, cada um mais reaccionário do que o outro, a mostrarem os dentes e a morderem, sedentos de sangue, transmitindo o racismo. Como caçadores a excitarem os cães de caça, censores políticos odiosos que fazem a ORTF [7] empalidecer. Os grandes financeiros deste regime haviam conseguido eleger E. Macron em 2017, no fim de uma campanha publicitária relâmpago, entre televendas e reality show. Eles agora estão a mudar de método tendo em vista as eleições presidenciais de 2022. Até ao escrutínio decisivo, perseguirão este povo rebelde, farão com que seja acossado pelas bestas imundas do neofascismo numa caçada com cães, para tomá-lo de assalto a fim de capturá-lo e levá-lo à exaustão.
O que fazer então nestas condições? Teremos de ser resistentes, muito mais combativos, passar da defensiva à ofensiva, para poder esperar sair desta armadilha dilemática, para que o nosso "mundo de depois" não seja a sua " ordem nova" – da qual nasceu a FN em 1972 –, para que o slogan da "união nacional" da LaReM [8] não prefigure o advento do RN [9] , como "revolução nacional", ressuscitando o pior da história do país. E, para vencer, será preciso convencer. Convencer de que se quisermos travar a máquina infernal da crise sistémica e das guerras imperialistas, da destruição dos indivíduos, das sociedades e do ambiente, do agravamento das desigualdades, do racismo e do patriarcado, do embrutecimento cultural, da regressão dos direitos cívicos e democráticos, será preciso ultrapassar definitivamente o capitalismo e arrancar de vez e a sério para uma transição socialista.
29/Junho/2020
Notas:
[1] Refere-se
ao artigo 49, alínea 3 da Constituição francesa que permite ao governo por uma
lei em vigor sem votação no parlamento.
[2] EHPAD: Établissement d'hébergement pour personnes âgées dépendantes
[3] Kreattur: personagem da série de ficção Harry Porter, da escritora J.K. Rowling.
[4] Bicot: palavra depreciativa para designar os norte-africanos.
[5] Adenoïd Hynkel: personagem de ficção criada por Charlie Chaplin no seu filme "O ditador", em 1940.
[6] Endereço do Palácio do Eliseu.
[7] ORTF: Office de radio-diffusion télévision française.
[8] LaReM:La République
En Marche, o movimento fundado por Macron
[9] RN: Rassemblement National, o movimento de Le Pen.
Este artigo encontra-se em https://resistir.info/
[2] EHPAD: Établissement d'hébergement pour personnes âgées dépendantes
[3] Kreattur: personagem da série de ficção Harry Porter, da escritora J.K. Rowling.
[4] Bicot: palavra depreciativa para designar os norte-africanos.
[5] Adenoïd Hynkel: personagem de ficção criada por Charlie Chaplin no seu filme "O ditador", em 1940.
[6] Endereço do Palácio do Eliseu.
[7] ORTF: Office de radio-diffusion télévision française.
[8] LaReM:
[9] RN: Rassemblement National, o movimento de Le Pen.
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