Inês Cardoso | Jornal de
Notícias | opinião
O turismo valeu, em 2018, 14,6%
da economia nacional. Portugal é, na Europa, o quinto país mais dependente
deste setor e a pandemia tem efeitos devastadores, bastando olhar para a taxa
de desemprego no Algarve para perceber a dimensão do tombo.
Por mais receios sanitários que a
movimentação de pessoas provoque, a economia precisa de turistas como de pão
para a boca. Literalmente.
Como estamos dependentes do
mercado externo, queremos que os estrangeiros venham. Incluindo de países que
viveram, ou ainda vivem, cenários epidemiológicos com elevadas taxas de
prevalência de covid-19. Os estrangeiros podem entrar, desde que tenham
dinheiro para ajudar a reanimar a atividade económica. O caso muda de figura
quando se trata dos estrangeiros residentes no país e associados a comunidades
desfavorecidas.
Os indicadores apresentados esta
semana na reunião de especialistas e responsáveis políticos, no Infarmed,
mostram que um quarto dos novos infetados em Lisboa é imigrante. Um certo
discurso alimentado nas últimas semanas em torno das medidas restritivas e das
ações de policiamento nas freguesias mais afetadas contribui, contudo, para
estigmatizar estes cidadãos. O estrangeiro pobre, quando adoece, não é vítima,
é responsabilizado pelo comportamento que o levou a adoecer.
Acicatados pelo medo, muitos dos
sentimentos de discriminação e de desconfiança em relação ao outro agravaram-se
nos últimos meses. O pior é quando as próprias autoridades e entidades que
deveriam proteger os valores essenciais em democracia contribuem para alimentar
preconceitos. Como o Ministério Público de Faro que, ao divulgar a detenção de
um jovem que tinha violado o confinamento obrigatório e foi acusado de
desobediência agravada - a primeira acusação do género conhecida publicamente
-, fez questão de escrever no comunicado que se trata de um homem de
"nacionalidade estrangeira".
Os estigmas não ajudam no combate
à doença. Nem os perigos se dominam fechando portas a cadeado. Teremos de
aprender a conviver com a doença, sem deixar que outros vírus de intolerância e
medo ganhem igualmente tamanho.
*Diretora-adjunta
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