Inês Cardoso | Jornal de
Notícias | opinião
"Num contexto de pandemia, a
legislação portuguesa prevê que uma vacina possa ser obrigatória." Depois
de uma frase assim, dificilmente se evitam estilhaços e confusões na mente de
muitos portugueses, ainda que a diretora-geral da Saúde tenha acompanhado essa
declaração de mil e um alertas e ressalvas. Graça Freitas acabou por dar um
salto de gigante num tema fraturante. E a discussão pode até vir a ser
necessária, mas seguramente não faz sentido desgastarmo-nos com ela quando é
prematura.
Vamos por partes. Portugal
assegurou, no contexto da negociação global da União Europeia, a possibilidade
de aquisição futura de vacinas - por agora a quatro farmacêuticas, mas estão em
curso outras negociações. Há quem já faça contas sobre o alcance dos 6,9
milhões assegurados por Portugal, mas uma pré-reserva não passa disso mesmo.
Primeiro, é preciso que os testes comprovem a eficácia da vacina. Depois,
sabe-se e foi claramente explicado pelo primeiro-ministro, a vacinação será
progressiva e dependerá de muitos fatores, incluindo a capacidade de produção.
Iremos tendo lotes e um processo que demorará tempo. Quanto, ninguém saberá
dizer.
Em Portugal, a vacinação não é
obrigatória e esse caminho foi recusado em anteriores surtos de doenças como o
sarampo. A lei prevê a obrigatoriedade em situações excecionais, mas tal
hipótese está dependente de muitos fatores, a começar na eficácia da imunização
e na evolução da pandemia. Por mais desejada que a vacina seja, a sua chegada e
sobretudo a sua utilização em massa não passam de uma expectativa. Cada vez
mais sustentada, é certo, mas ainda assim uma expectativa.
Com tanta dúvida sem resposta,
seja sobre a vacina ou a imunidade pós-infeção, qualquer conjetura sobre a
obrigatoriedade não passa de especulação. O que temos mais certo é enfrentar o
outono e o inverno sem as esperadas ajudas da ciência. É em função disso que
temos de preparar o Serviço Nacional de Saúde e continuar a viver, adaptando
comportamentos. E seguindo em frente, porque a solução milagrosa não está,
ainda, ao virar da esquina.
*Diretora-adjunta
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