A separação de poderes da justiça e da política são, dos cargos desempenhados por uns e outros de ambos os setores da sociedade portuguesa, bens adquiridos e explícitos na Constituição de Portugal. Até porque, sabendo nós, tendo por experiência que quando durante o salazarismo fascista ambas se acasalaram imensas injustiças deram origem às maiores barbaridades fascistas e consequentes violações da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de que Portugal era signatário.
Signatário que não cumpria aquilo a que se comprometeu perante os seus pares na ONU. Só após o 25 de Abril de 1974 os Direitos Humanos em Portugal ganharam força de letra e de lei, de compromisso e de respeito, salvo casos pontuais, alguns condenados pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Sempre se constatou que em Portugal a Justiça possui membros que a envolvem numa áurea excessivamente conservadora, muitas vezes reacionária à democracia e às constitucionalidade, interpretando os Direitos Humanos de que Portugal é signatário a seu modo, suas conveniências e ideologias descaradamente de direita, que quase sempre encontram o seu caminho e práticas na aproximação ao fascismo e em extremismos prejudiciais ao povo que dominam - em tantos exemplos desumanos. Assim, lá se vai a democracia e os direitos e liberdades democráticas dos cidadãos.
Acresce, para exemplo, a constatação da existência de juízes e outros elementos do setor da Justiça que cumpriam com zelo os deveres ditatoriais, desumanos e antidemocráticos do Tribunal Plenário, instrumento da justiça política salazarista - que o mesmo é dizer nazi-fascista. Ali se deram bem juízes e outros do mesmo jaez, em conluio com a PIDE, a polícia política que torturava e assassinava direta e indiretamente portugueses opositores democráticos. A intolerância e os extremismos perduravam e eram a prática antidemocrática manhosamente denominada de justiça. Falsa justiça aplicada por juízes igualmente nazi-fascistas.
Na atualidade existem motivos mais que suficientes para os portugueses se preocuparem e ficarem permanentemente atentos ao que na justiça está a acontecer e que aparenta estar a ser tecido numa teia especifica desde há alguns tempos: o caminho e práticas da judicialização da política, de uma quantidade provavelmente avultada de atores em setores da justiça. Que alguma da comunicação social - para não dizer demasiada - auxilia e promove no caminho antidemocrático, semelhante ao que já vivemos no salazarismo.
Não por acaso, há tempos começámos e ver e escutar a expressão super-juiz sobre a pessoa de Carlos Alexandre, termo que assim ficou. Não por acaso assistimos a esse mesmo juiz ser vedetizado nas televisões, jornais e revistas. Outros haverá dessa mesma estirpe. Nestes casos o recato dos juízes e daqueles que se destinam a de facto aplicar a Justiça sem sofismas, sem vedetismos, tem sido mandado às urtigas. Um claro indício da teia que tem vindo a progredir com rumo aparentemente certo à judicialização da política. Algo que mostra resultados prejudiciais ao Estado de Direito democrático no Brasil, já o tendo comprovado em Itália e em muitos outros países.
No exemplo do juiz Carlos Alexandre é interpretação de muitos milhares ou de milhões de portugueses que ele é um juiz da ultradireita política. Atualmente ainda mais pelo seu empenho ou teimosia a pés-juntos demonstrado no Caso de Tancos para com o primeiro-ministro António Costa.
Acresce que não por acaso consta na comunicação social que André Ventura, do partido Chega (racista e xenófobo), antes de anunciar que se vai candidatar à Presidência da República nas próximas eleições, convidou o juiz Carlos Alexandre para ser ele a candidatar-se com o apoio do Chega e, obviamente, de extremistas portugueses que não aceitam a sociedade livre e democrática como um bem adquirido e a desenvolver. André Ventura já deixou explicito o seu racismo e xenofobia e as suas ambições programáticas de um país dominado por políticas e práticas assalazaradas de índole fascista.
Em abono da verdade acrescente-se que consta que o juiz Carlos Alexandre declinou o convite. Claro que sim, este não é o seu momento propício para tal candidatura. Não haverá quem derrote Marcelo Rebelo de Sousa na sua corrida para o exercício do segundo mandato presidencial. Para Ventura a candidatura não vai além de um jogo populista que lhe renderá mais uma oportunidade de caça aos eleitores incautos e muito maior visibilidade sem que na realidade revele as suas intenções políticas a pôr em prática se algum dia chegar ao poder que almeja. Já Hitler e seu séquito fizeram o mesmo.
Porquê, aqui, o exemplo de Carlos Alexandre? Porque é considerado o mais mediático, o que aceita de bom grado as injeções de vedetismo e populismo que certa e incerta comunicação social lhe dispensa e a que o promove com sua aceitação declarada e visível - parece que devidamente calendarizada. Recato, imparcialidade, é algo que Carlos Alexandre desconhece no que toca a populismo e consequente vedetismo. Quase que uma ave rara na sua postura perante os processos que julga e/ou intervém quando envolvem políticos, principalmente mais chegados à esquerda política. Já o mesmo não se verificou no Caso dos Submarinos (Juiz recusa reabrir caso dos submarinos), em que Paulo Portas, do CDS, interviu quando ministro da Defesa...
Decerto que o juiz Carlos Alexandre é senhor e dono do seu saber profissional para a aplicação da justiça nos processos que lhe cabem, mas tal deixa de ser inquestionável quando é sistemática a inobservância do recato que é aconselhável a quem julga processos tão complicados, tão baralhados. Tanto, que até parece que assim são propositadamente para que os cidadãos fiquem realmente em estado de confusão mental e se desliguem da atenção imprescindível que devem dispensar interessadamente aos atores da aplicação da justiça, assim como da política.
As opiniões divergem. É a democracia. São expressas livremente desde que tolerantes apesar de discordantes. É isso que permite manifestar as críticas a este ou àquele. Há os que as aceitam e reformulam seus comportamentos, assim como também existem os que se sentem impregnados de razões para enveredar por incorreções e atitudes criticáveis ou pelo menos desaprovadas pelos cidadãos que acompanham com um pouco mais de atenção o que acontece quotidianamente. Não se entendem dois pesos e duas medidas.
É certo que a democracia é um processo que não é perfeito e que aqui e ali lhe encontramos lacunas que não deviam existir, porém, se nos esforçarmos por melhorá-la, melhorando a nossa cidadania, beneficiaremos nós próprios e toda a sociedade a contento das aspirações da maioria dos portugueses. Tarefa que pertence principalmente aos políticos, aos juízes e profissionais da justiça, às polícias, etc… Mas também aos trabalhadores na generalidade. A todos os cidadãos que saibam ser exigentes pelo aperfeiçoamento do processo democrático e justo que se destina a todos e não só a alguns.
Assim não acontecendo é a democracia que está em risco, como se verifica atualmente, em Portugal, na UE, por todo o mundo. Sem justiça não existe democracia de facto.
*Na imagem: Juiz Carlos Alexandre