#Escrito
em português do Brasil
Há
algo particular no fascismo de Bolsonaro: a Falange. Por isso, são vãs as
tentativas de enquadrá-lo nos limites da legalidade. Cada recuo é, para ele,
apenas uma chance de ganhar tempo. Para detê-lo, é preciso abatê-lo, politicamente
Ricardo Cavalcanti-Schiel* |
Outras Palavras
O
governo de Jair Bolsonaro e a evolução social da epidemia de coronavírus no
Brasil parecem, finalmente, ter entrado numa curiosa sintonia lógica: a do
paradoxo. Mais do que apenas uma boutade político-sanitária, as notas
que se seguem pretendem esboçar o tamanho do impasse a que parecemos ter chegado;
não tão apenas para nos aturdirmos com ele, mas para insinuar alguns detalhes
talvez mais intrincados que a política vista pelos olhos do desejo e do
voluntarismo (ou da “torcida”), como também mais intrincados que o mito
tecnocrático da prescrição científica.
O
que nos é particular (mas não apenas a nós), nesse caso em que se cruza a
emergência com a conjuntura, é exatamente o signo do paradoxo, o que torna o
Brasil, neste momento, bastante diferente, por exemplo, dos nossos vizinhos
próximos, a Argentina, onde o que rege o mesmo quadro parece ser, casualmente,
o signo da coerência. Como vamos gerir o paradoxo e com que desenvoltura é o
que pode vir a definir as potencialidades e o lugar do país num futuro próximo,
em um mundo onde a dupla crise econômica e sanitária parece estar engatilhando
e potencializando paradoxos planeta afora.
A
partir de meados deste mês de junho, o Brasil consagrou-se mundialmente, em
definitivo, como o grande fiasco no combate à pandemia, acompanhado pelos
Estados Unidos. Neste último, a enorme disponibilidade de recursos econômicos e
a sofisticada estrutura institucional são os parâmetros para medir o tamanho do
fiasco. No nosso caso, ele é proporcional à existência de um serviço público
universal de saúde, como só existiu no welfare state e ainda existe
em alguns países socialistas ou que deles o herdaram (como a Rússia), bem como
o sucesso anterior de uma sistema que demonstrou sua eficácia no combate às
epidemias de aids e zika. Nem os Estados Unidos não têm recursos, nem o SUS, a
Fiocruz e o Instituto Butantan desapareceram (ainda, felizmente). A explicação
para o fiasco está, então, em outro lugar: na gestão política da crise
sanitária.