quarta-feira, 24 de março de 2021

Liberdade, igualdade, fraternidade?

Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião

Liberdade, igualdade, fraternidade. Foi o que pareceu evocar esta semana o comissário europeu Thierry Breton (se excluirmos a possibilidade de ter sido mera propaganda) ao anunciar a nova meta para a imunidade de grupo dos europeus: 14 de julho, dia da tomada da Bastilha, que evoca a revolução francesa e os princípios que a história lhe atribuiu, e que estão inscritos em qualquer Constituição digna desse nome.

Mas que igualdade europeia é essa quando sabemos que há milhares de pensionistas suecos a viver em Portugal, só porque políticos de turno decidiram oferecer (ou manter) uma borla no IRS? Como explicava a ministra das Finanças sueca, ao Público, "se um paciente sueco e um paciente português estiverem lado a lado num hospital, o português pagou impostos pelos dois, porque os suecos têm todos os direitos - cuidados de saúde, transportes públicos -, mas não pagam impostos. É fascinante que isto seja aceite pelos cidadãos portugueses".

Mas que liberdade europeia é esta quando Espanha, um Estado que exibe credenciais democráticas, tem uma lei que permite punir com a cadeia quem use, na sua arte (apreciemos ou não essa arte), os insultos à monarquia, o regime anacrónico que a revolução francesa quis derrubar? Como alerta a comissária dos Direitos Humanos do Conselho da Europa, Dunja Mijatovic, a propósito da pena de prisão do raper Pablo Hásel, o Código Penal espanhol inclui uma série de artigos que põem em causa a liberdade de expressão, "um direito de importância crucial para um debate público livre e plural".

E, finalmente, que fraternidade europeia é esta que tão preocupada está com os nossos e nada com os outros? Se a fraternidade expressa a dignidade de todos, assegurando a todos os direitos sociais, políticos e individuais, porque precisa de vir o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde classificar como "grotesca" a diferença entre o número de vacinas contra a covid-19 administradas nos países ricos e nos países pobres? Se não os incomoda o "ultraje moral", podiam ao menos ter em conta as consequências económicas para os mais ricos, diz. Nota-se que Tedros Ghebreyesus não tem fé na adesão dos políticos europeus atuais (os nossos incluídos) aos lemas da revolução francesa. Compreende-se.

*Diretor-adjunto

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