sábado, 29 de maio de 2021

Angola | SAUDOSISMO COLONIAL, EXERCÍCIO ALCORA ...

E A CAMPANHA DE PROPAGANDA DO 27 DE MAIO

Martinho Júnior, Luanda | complementado com texto de Artur Queiroz*

(A CAMPANHA FRACCIONISTA DO 27 DE MAIO REVELA A CONTINUIDADE DUMA SUPERESTRUTURA IDEOLÓGICA E DE UMA SOMBRIA ACÇÃO DE INTELIGÊNCIA ECONÓMICA POR PARTE DO “ARCO DE GOVERNAÇÃO”, NO REAPROVEITAMENTO DO EXERCÍCIO ALCORA).

SE ANTES BENEFICIAVA O ALIADO “APARTHEID” APÓS O GOLPE DE 25 DE NOVEMBRO DE 1975 EM PORTUGAL, PASSOU A BENEFICIAR AS REDES “STAY BEHIND” AO SERVIÇO DO “HEGEMON”, DA NATO E DO AFRICOM!...

É evidente que uma parte importante da alimentação dessa campanha tem que ver com o 25 de Novembro de 1975 e o que ele representou até hoje para a oligarquia portuguesa, que era na época e é hoje, uma das principais interessadas, mesmo que não o expresse publicamente, que os do golpe de 27 de Maio de 1977, tinha a República Popular de Angola apenas ano e meio, tomassem o poder em Angola pela força das armas, ou então fosse possível “moer” com um seu sucedâneo, como a campanha que se lhe fez seguir!

Essa é uma autêntica grande operação encoberta (só publicamente visível no que é publicado por via da manobra e de sua mão-de-obra) que se identifica plenamente com um reaproveitamento do Exercício Alcora, tanto em relação à época e, como o golpe não vingou, com o que veio a seguir até aos nossos dias, agora de forma revigorada e segundo a projecção dum “estratega” em assuntos económicos e, pelos visto de inteligência: António Costa e Silva, o mesmo da “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica e Social de Portugal 2020-2030”!

O Presidente António Agostinho Neto foi confrontado, segundo notícias de fonte fidedigna, com as acusações inflaccionadas dessa campanha, em Monróvia, numa reunião de Presidentes africanos e foi um dos presidentes francofones da linha das redes Foccart e do Eliseu, que o acusou de viva voz!

Foi esse choque psicológico que foi assim “diplomaticamente” jogado olhos nos olhos, que rapidamente o afectou e o arrastou para a decadência até à morte, contribuindo para começar a minar o seu próprio poder em Angola, num momento que a luta contra o “apartheid”-nazi a todo o transe se impunha!

Das redes Foccart e do Eliseu para os serviços de inteligência portugueses não era necessário dar passo algum: os enlaces sucediam-se num ambiente de completa sintonia e para tal havia muitos dispositivos disponíveis, desde a NATO, ao “Le Cercle” e aos múltiplos canais económicos e diplomáticos bilaterais, pois a França foi até, a par da Alemanha, um dos maiores fornecedores de armamento aos componentes do Exercício Alcora e particularmente à África do Sul sob o regime “apartheid”-nazi e a Portugal sob regime colonial-fascista!

O modelo da indústria da energia e do armamento na Europa é similar à dos Estados Unidos, havendo interesses e investidores comuns em muitos sectores e mantêm em ambos os casos influência sobre as pertinências ditas “republicanas” mais conservadoras, potenciando o que há de mais versátil em termos de redes “stay behind” da própria NATO, também elas envolvidas em operações “no ultramar” (na América Latina, por exemplo, com a Operação Condor da CIA, que aproveitou os “operacionais” encobertos da Aginter Press, auxiliar da PIDE/DGS)!

A coisa é de tal ordem que, confrontado o António Costa e Silva dos Comités Amílcar Cabral, com o actual “estratega” do governo do “arco” que alguns caem no engodo de considerar como “geringonça”, ele parece ter-se esquecido que o Presidente Amílcar Cabral recomendava aos pequeno-burgueses de então, “suicidarem-se como classe” quando passassem a dar o seu contributo directo à luta armada de libertação nacional, algo que ele, devoto revolucionário, não cumpriu, nem pensou em alguma vez cumprir… irra que “é de esquerda” (mas da “esquerda” CIÁtica, da praça Maidan)!

O “estratega” é perito em assuntos correlacionados com petróleo (teria aprendido bastante em Angola com a Sonangol) e está à frente da Partex, cujos interesses estão identificados com a Fundação Gulbenkian, por tabela e “tradicionalmente” com a nata da oligarquia portuguesa, que por razões de classe nunca deixou de ser saudosista do colonialismo até por que a raiz é a “ala liberal” do híbrido padrinho-afilhado Marcelo!

Como tal em termos de propaganda vale tudo: viu olhos nos olhos um pelotão de fuzilamento, ficou quase cego… mas parece que nesse aspecto está tudo bem, à boa maneira do exemplo camoniano: “em terra de cegos quem tem um olho é rei”!

Bom não se admirem que, com o andar da carruagem vamos ter em Angola, dentro em breve, com ainda mais vigor, a Partex a comprar uma parte de algum dos despojos da Sonangol, à escolha!...

Será que o António Costa e Silva é também um dos estrategas da Comissão para a Reconciliação em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos em Angola, com a intenção de “regenerar o tecido social angolano”?

Por estes dias tenho-me lembrado muito dos bascos e daquele proverbial ditado que lhes é atribuído:  “não creio em bruxas, mas que as há, sem dúvida que há” e em época neoliberal, metamorfoses que são “os costas que estão a dar à costa” perfazem o grupo das “especiais”… além do mais “pelo petróleo morre o peixe”!...

Não será assim Angola?

Martinho Júnior, 24 de Maio de 2021

Imagens que são espelhos:

01- PS pede “audição urgente” de Costa Silva no Parlamento – Socialistas querem autor do plano de recuperação económica 2020/30 na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação. – https://www.publico.pt/2020/09/02/politica/noticia/ps-pede-audicao-urgente-costa-silva-parlamento-1930137;

02- A Visão Estratégica de António Costa e Silva – 10 de Fevereiro, 2021, Bruno Cartaxeiro – Artigo incluído na edição de fevereiro 2021 – Desenhou a estratégia económica do país para a década a pedido do primeiro-ministro, de forma a relançar a economia na pós-pandemia. – https://www.forbespt.com/a-visao-estrategica-de-antonio-costa-e-silva/

03- Costa Silva diz que Angola deve criar uma comissão para vítimas do 27 de Maio de 1977 (há mais de 6 meses) – António Costa e Silva defendeu que Angola deve ter uma Comissão Verdade e Reconciliação para as vítimas de maio de 1977. “Angola é um país que precisa de atos regeneradores”, diz o gestor – https://observador.pt/2020/11/09/costa-silva-diz-que-angola-deve-criar-uma-comissao-para-vitimas-do-27-de-maio-de-1977/;

04- António Costa e Silva - Angola Partex OIL AND GAS – Professor Doutor António Costa e Silva nasceu em Catabola, Angola, em 1952. É o actual Presidente da Comissão Executiva do Grupo PARTEX OIL AND GAS. (Holdings) – https://www.youtube.com/watch?v=2rjbA8ZAHMI;

05- Costa convidou gestor da Partex para “coordenar preparação do Programa de Recuperação Económica” – O primeiro-ministro português confirmou, domingo (31), que convidou o gestor da petrolífera Partex António Costa e Silva para “coordenar a preparação do Programa de Recuperação Económica”, trabalho que deverá estar concluído até à aprovação do Orçamento Suplementar. – https://portugaldigital.com.br/portugal-costa-convidou-gestor-da-partex-para-coordenar-preparacao-do-programa-de-recuperacao-economica/.    

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A seguir: Texto do jornalista Artur Queiroz

Partido Dominador e o Patarata Pedante

Artur Queiroz*, Luanda

Nos anos da transição, o Diário de Luanda publicava todos os dias um “cartoon” do artista plástico Cabral Duarte, que assinava com o pseudónimo Bambi. Estávamos em plena fase do Poder Popular e nessa época a UNITA não tinha tropa, não tinha apoios nem sequer no Planalto Central, refugiava-se na propaganda que vendia a organização como o “movimento dos brancos” e Savimbi o “Muata da Paz”. Na época foram publicadas as cartas que ele trocou com o alto comando das tropas coloniais, inclusive uma em que pedia umas botas de cano alto e tratamento médico no Luena. Começaram então a vender a marca Galo Negro. O Bambi chamou aos “kwachas” os mentores do Poder Pipilar!

Bambi tratava as dezenas de partidos que nasceram logo a seguir ao 25 de Abril de 1974, como parasitas. E colocava-os nas partes baixas de um gigante chamado Angola. Eram piolhos púbicos ou chatos. O “cartoonista” faleceu e hoje dei comigo a pensar como ele retrataria os politólogos (mulheres e homens) que hoje inundam os Media mundiais. Não consigo encontrar uma saída. Por mim, são parasitas de cátedra, algumas e alguns até têm doutoramentos daqueles pesados, com teses de mil páginas que são grandes superfícies de lugares comuns.

Portugal tem um desses catedráticos que dá pelo nome de António Costa Pinto e acaba de publicar um opúsculo intitulado "O Regresso das Ditaduras?", pago pelo patrão do Pingo Doce, uma grande superfície de secos e molhados. O fabiano debita os habituais lugares comuns e vende fruta podre sobre Angola, como é uso e costume em Portugal. Um belo país, boa gente, excelentes vinhos e elites ignorantes, corruptas, vingativas, ressabiadas, que jamais perdoarão ao MPLA ter fado o empurrão final (em aliança com o MFA) ao império colonial português. Refiro o movimento que derrubou o fascismo, liderado por Otelo Saraiva de Carvalho, porque Agostinho Neto chamava-lhe o quarto movimento de libertação de Angola.

Costa Pinto diz que o MPLA é o partido dominante (não lhe chama da Estado, vá lá…) e está em todas, vai a tudo, domina tudo. O Presidente João Lourenço é um aspirante a ditador e tudo o que se move é manobrado pelo partido maioritário na Assembleia Nacional. Quanto à UNITA, o politólogo besugo diz que só chega ao poder se for ajudado pelas “elites do MPLA”, o partido dominador!

O tempo é escasso para um sexogenário com mais de sete décadas de muita desbunda e zero de moderação. Apesar de ter tanta coisa interessante para fazer, vou dar uma e única lição ao catedrático António Costa Pinto. Partidos dominantes estão no poder em todo o chamado “mundo ocidental”. Mas usam um truque, o mesmo produto é apresentado aos eleitores como dois partidos. Vou exemplificar. Nos EUA, há dois partidos “dominantes”, Democratas e Republicanos. No essencial são a mesma coisa, só muda a marca. É como o Sheltox e o Raid. Ambos servem para matar mosquitos, mas a cor das bisnagas e a marca são diferentes. Às vezes o preço também se altera. Partido Trabalhista e Partido Conservador (Reino Unido). PS e PSD (Portugal) PSOE e PP (Espanha). 

O politólogo besugo diz que o Presidente João Lourenço está no lugar do ditador e faz o seu caminho ditatorial. Reparem que os Media falam imenso dele. O fabiano ensandeceu! Marcelo Rebelo de Sousa aparece de manhã à noite em todos os canais de televisão portugueses. Comenta jogos de futebol, mortes de actores e actrizes, festas de adeptos dos clubes de futebol, cordões sanitários, incêndios, anda pelo país com mil câmaras na peugada, para ver se os sapadores limpam as matas. Este, como lhe paga os recados, não é candidato a ditador, mesmo sabendo que tem um fascista na cabeça e aprendeu os truques da ditadura salazarista na escola e em casa. Seu papá era ministro (fascista) de Salazar. Sendo médico, até foi governador de Moçambique. Não tinha necessidade nenhuma de servir o ditador de uma forma tão acéfala. O Presidente João Lourenço é também titular do Poder Executivo. Se aparecesse todos os dias e a todas as horas nos canais de televisão e estações de rádio, era normal. Mas isso não acontece. Pelo contrário, ele não aparece mesmo em situações que devia aparecer. É da sua natureza. Há que respeitar.

António Costa, Macron, Ângela Merckel, Joe Biden e tantos outros devem o poder aos partidos dominantes, com ou sem truque de se apresentarem aos eleitores com nomes diferentes. Em Portugal a coisa é minimalista. Existe o PS simples e o PS com D. O resto, é paisagem.

Agora o mais importante. António Costa Pinto dá voltas e reviravoltas para culpar o MPLA da rejeição dos eleitores à UNITA. Ele devia pagar a lição que lhe vou dar, mas hoje estou de mãos largas e vai mesmo de borla. Os angolanos não dão a maioria eleitoral à UNITA porque sabem que Savimbi transformou a organização numa unidade especial das tropas portuguesas durante a ocupação colonial. Sabem também que logo após o 25 de Abril de 1974, o criminoso de guerra vendeu o instrumento político aos líderes das actividades económicas (associações comerciais, agrícolas e industriais) na tentativa de conseguirem a “independência branca”. Durante a cimeira de Alvor os mais importantes golpistas, que tinham sido expulsos de Angola pelo almirante Rosa Coutinho, faziam parte da delegação oficial da UNITA.

A parte mais grave é esta: A UNITA alugou as suas armas ao regime racista de Pretória. Numa altura em que a comunidade internacional impôs sanções à África do Sul, tornando aquele país um Estado pária. Os párias atraem uns aos outros, de uma forma irrefragável. O criminoso de guerra foi gente do apartheid na invasão das suas tropas a Angola. Matador do povo angolano. Destruidor de um país soberano. Só o heroísmo dos patriotas de Angola impediu que hoje estivéssemos acantonados num bantustão. Savimbi assassinou milhares de quadros do MPLA. Assassinou os seus próprios companheiros da UNITA. Submeteu centenas de mulheres à escravidão sexual. Enviou as elites femininas do partido para as fogueiras da Jamba. O patarata Costa Pinto sabe agora por que razão a UNITA nunca ganhará eleições em Angola.

A lógica dos eleitores é esta: Mal por mal, antes com o partido que nos libertou, nos restituiu a dignidade, se bateu de armas na mão pela Independência Nacional. Percebido?

Maurício Gimbi, líder do Movimento Independentista de Cabinda, sobre o santíssimo Raúl Danda disse isto: “Partiu um filho que esteve firme na luta pelos direitos do povo e que soube representar o enclave, no Parlamento angolano”. O padre Raúl Tati é mais ambíguo: “Raúl Danda soube servir a pátria na defesa dos direitos humanos e no interesse dos povos.” Para este dirigente da FLEC (também é deputado na Assembleia Nacional) pátria é Cabinda. Nunca esqueçam.

Hoje a urna do malogrado deputado do Galo Negro chegou à capital da província e teve as mesmas honras que teria um Chefe de Estado em qualquer parte do mundo. Os traidores estão em alta. Roma não pagava aos que traíam os seus generais. Mas Luanda paga e de que maneira! Já vivemos longos anos num tempo de guerra e sem sol. Hoje temos o primado da traição. Ou a organização é forte e aguenta ou é fraca e arrebenta!

*Jornalista

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