domingo, 13 de fevereiro de 2022

Portugal | ABUSOS SEXUAIS NA IGREJA

É momento de “curar todas as feridas” apurando a verdade, diz novo arcebispo de Braga

José Cordeiro admitiu "vergonha e humilhação" pelos abusos sexuais ocorridos no seio da Igreja. Comissão já validou 214 testemunhos, mas universo de vítimas será superior

José Cordeiro tomou posse este sábado como arcebispo de Braga. Na conferência de imprensa que sucedeu à tomada de posse, o novo arcebispo admitiu “vergonha e humilhação” pelos abusos sexuais ocorridos no seio da Igreja, sublinhando que é o momento de “curar todas as feridas” através do apuramento da verdade.

“O contexto é de cuidar de todos, cuidar de todas as feridas. É uma crise grande que vivemos mas a crise é de purificação, porque é a verdade que nos liberta e a verdade pode custar e estamos todos a sofrer com isto, mas é para que ela nos liberte e para que a Igreja seja um lugar acolhedor, um lugar seguro, um lugar de paz e de reconciliação”, disse.

José Cordeiro falava a propósito da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja Católica Portuguesa – criada no ano passado pela Conferência Episcopal Portuguesa -, que iniciou em janeiro um processo de recolha de denúncias de vítimas de abuso sexual. Em causa estão atos ocorridos no período compreendido entre 1950 e a atualidade, e que possam ainda ser suscetíveis de reporte às autoridades e consequente investigação.

214 testemunhos validados

Como o Expresso avança na edição desta sexta-feira, ao fim de um mês de trabalho da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, foram validados 214 testemunhos. Mas o universo de vítimas será muito superior. “Em pelo menos metade” destas denúncias foram referidos outros abusos de diferentes vítimas, confirma ao Expresso Daniel Sampaio, membro desta comissão.

“Os números são seguramente inferiores à realidade”, resume Daniel Sampaio ao Expresso. O psiquiatra integra a comissão juntamente com o juiz jubilado e ex-ministro da Justiça Álvaro Laborinho Lúcio, a socióloga Ana Nunes de Almeida, a realizadora Catarina Vasconcelos e a assistente social e terapeuta familiar Filipa Tavares. O grupo é coordenado pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht.

Questionado pelos jornalistas sobre teme eventuais “surpresas” resultantes da ação desta comissão, o arcebispo de Braga, José Cordeiro, preferiu pôr a tónica no “cuidar das feridas” das vítimas e das respetivas famílias, reiterando que “a Igreja está a sobrer muito” com a questão dos abusos sexuais.

“Creio que a sociedade chegou tarde e a Igreja também, mas estamos em tempo de, juntos, com seriedade, com justiça, com caridade, com misericórdia, compaixão e ternura com as vítimas e com todas as pessoas que vivem esse sofrimento (…) dar voz ao seu silêncio e falar dele”, reforçou o novo arcebispo de Braga que sucede no cargo a Jorge Ortiga, que permaneceu em funções nos últimos 22 anos. José Cordeiro lembrou, no entanto, que a comissão foi criada para estudo do fenómeno “e não para investigação”.

Cátia Mateus | Expresso

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