domingo, 6 de março de 2022

A GUERRA DESDE A SÍRIA À UCRÂNIA

Artur Queiroz*, Luanda

Teresa Baptista, a heroína de Jorge Amado, começou aos 12 anos na vida dura e acabou cansada de guerra. Mas não viveu as guerras que eu vivi, todas desencadeadas pela mesma coligação agressiva e reacionária, capitaneada pelo estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA). Primeiro Angola. O ditador Mobutu aliou-se à linha fascista portuguesa protagonizada pelo general Spínola. Ambos foram amparados pelo regime racista de Pretória, para afastarem o MPLA do processo de descolonização, em 1974. 

Primeiro Nixon e depois Gerard Ford financiaram e dirigiram a guerra de agressão contra o Povo Angolano, iniciada logo após o glorioso dia 25 de Abril de 1974, quando Otelo Saraiva de Carvalho e seus companheiros do Movimento das Forças Armadas derrubaram o regime fascista e colonialista de Lisboa. Leiam o livro A Cia Contra Angola do antigo oficial da organização John Stockwell, que depois de 13 missões de guerra suja rompeu com os porcos e denunciou a porcaria. Como repórter cobri a II Guerra de Libertação Nacional à qual chamo a Guerra da Transição. Sobre o tema escrevi um livro/reportagem intitulado Angola a Via Agreste da Liberdade.

O almirante Rosa Coutinho, presidente da Junta Governativa de Angola até ao Acordo de Alvor, escreveu no prefácio:

“A história de toda esta época agitada está ainda por efectuar, mas a pouco a pouco vão surgindo as revelações que demonstram aos mais ingénuos, a profunda interligação das lutas que então se travaram em Portugal e nas suas antigas colónias, contra as classes dominantes nacionais e internacionais e todos os artifícios e crimes que eles utilizaram, para manterem no fundamental inalteradas as relações de dominação e exploração.

Artur Queiroz, jornalista angolano, viveu e participou no seu país os sucessos dessa época conturbada e rica. Dela nos apresenta uma reportagem pessoal, viva e colorida, se bem que às vezes a cor se confunda com o vermelho de sangue dos mártires que morreram, para assegurarem a liberdade da sua pátria.

Possa a sua leitura servir também aos portugueses e angolanos para compreenderem melhor que travaram e travam ainda uma luta comum pela emancipação dos seus povos, e que o sangue e lágrimas derramadas deverão constituir no futuro o cimento indestrutível duma amizade radicada num passado comum e no mais profundo e mútuo interesse de Angola e Portugal (...)”.

O livro é impróprio para bêbados da valeta, chantagistas e extorsionistas que fazem jornalismo na lógica das associações de malfeitores, criminosos de guerra da UNITA e outros leprosos morais. Os EUA não hesitaram em colocar-se ao lado da FNLA contra o Povo Angolano, mesmo quando a OUA (hoje União Africana) suspendeu o movimento devido aos crimes contra a cúpula militar do Exército de Libertação Nacional de Angola (ELNA) na base de Kinkuzu. Leiam a entrevista que me concedeu o general Faceira (Defunto) sobre as torturas e fuzilamentos naquele campo de concentração. Ele estava lá. 

Nicarágua. Frente Sandinista. O país era governado pelo ditador Somoza, sanguinário e cruel. Os sandinistas desencadearam a luta armada contra os assassinos no poder em Manágua. Os EUA estavam do lado da ditadura contra os libertadores. Eu estive lá como repórter. Jamais esquecerei os crimes cometidos contra famílias camponesas pelos guardas somozistas.

Guerra Irão-Iraque. Fui aos dois lados durante dez anos. EUA e as potências europeias apoiaram Saddam Hussein contra o regime dos aiatolas e a sua revolução fundamentalista. Por isso ganhou. Quando o Iraque se tornou no país mais progressista e desenvolvido do Médio Oriente, os EUA e todos os países da OTAN (ou NATO) assassinaram Saddam Hussein e destruíram o país para roubarem o petróleo e os fundos soberanos. Eu estava lá. Leiam o meu livro/reportagem Eu Vi Bombardear Bagdade, editado pela Centelha, Coimbra.

Luanda, 1992. Guerra pós eleitoral. Eu estava lá. Leiam as minhas reportagens na revista “Sábado” da época. Nada tem a ver com o caixote do lixo mediático em que se transformou hoje. Mais uma vez os EUA na origem da guerra, mas desta vez escondidos atrás dos arbustos. Por fim compreenderam que os assassinos da UNITA iam acabar mal e fingiram neutralidade. Ainda fingem. Presidente João Lourenço, cuidado com os falsos amigos. O petróleo de Angola abre muitos e vorazes apetites.

Jugoslávia, 1999. Guerra da OTAN (ou NATO) contra um estado soberano. Destruição total do país e criação do Kosovo, um estado-base militar dos EUA e coito de traficantes de toda a espécie. A coligação guerreira até bombardeou a embaixada da República Popular da China em Belgrado “por engano”. Eu estava lá, não li nas redes sociais nem vi no lixo televisivo made in USA. Líbia, 2011. A OTAN (ou NATO) destruiu a Líbia e assassinou o Presidente Kadhafi, um Chefe de Estado africano. O mundo ficou em silêncio, sobretudo África. Roubaram os fundos soberanos líbios e desde então (mais de dez anos!) roubam o petróleo. Tudo em nome da democracia deles que é assassina e altamente mortífera.

Guerra da Síria. Começou em 2011 e já fez meia milhão de mortos, em nome da democracia deles. EUA, França e Reino Unido são os agressores e estados-assassinos credenciados em mil guerras de agressão. Eu estive lá. O grau de destruição dá para chorar. 

Já foram ver as destruições causadas durante a guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial, desencadeada pelo regime de apartheid com o apoio dos EUA e potências da União Europeia? Ainda estão visíveis. Descobri-as quando fiz a reportagem da minha vida, que foi tirar o lodo e a poeira do esquecimento que envolviam a Batalha do Cuito Cuanavale. Peço humildemente desculpa por ter feito este trabalho com o inesquecível repórter Paulino Damião, “50”, já ambos a cair da tripeça. Esta vida de repórteres pelos vistos é só para velhos. O “50” já partiu e era mais novo do que eu. Estou a treinar para a batalha final.

E a guerra da Ucrânia? Começo por uma nota de boa disposição para amenizar a tragédia. Um amigo diz que o Presidente Putin é o melhor otorrinolaringologista do mundo. EUA e União Europeia estavam completamente surdos às vozes que chegavam de Moscovo. Vejam lá, todos os países têm o direito a viver em segurança e a OTAN (ou NATO) está a cercar-nos, o que nos obriga a viver na insegurança. Vejam lá, tenham juízo, não se sirvam da Ucrânia para nos encostarem mísseis à ponta do nariz. E eles surdos. Quanto ao falar, apenas rosnavam sanções, sanções, sanções. Ai é? Não ouvem nada? Oito anos de avisos sensatos e nada?

O Presidente Putin mandou fazer umas quantas explosões na Ucrânia e, de repente, todos passaram a ouvir. Grande médico otorrinolaringologista. O pior é que agora ouvem demasiado e ficaram histéricos. É cá uma gritaria! Mas ainda faltam umas sessões para eles aprenderem a dizer mais qualquer coisa do que sanções, sanções, sanções. A coisa com jeito vai. E quem lidera a Oposição na Federação Russa? Alexei Navalny. Leiam os seus textos e discursos. É um nazi. Mas como a coligação EUA-União Europeia aposta nele, escondem essa verdade. Está tudo dito.

E na Ucrânia? O presidente eleito Víktor Fédorovych Yanukóvytch foi vítima de um golpe de estado em 22 de fevereiro de 2014. Quem o depôs? Organizações nazis apoiadas pelos EUA e a União Europeia. Hoje integram o Batalhão de Azov, cujos membros são responsáveis por um autêntico genocídio no Leste da Ucrânia, cujos habitantes são russos. Os nazis estão no poder em Kiev. O Ministério do Interior é uma casa de torturas, violações, saques, limpezas étnicas e perseguição a minorias, com especial destaque para os russos, judeus e homossexuais.

Andriy Biletsky é o “comandante” do Batalhão de Azov. Fundou o movimento Assembleia Nacional Socialista, nazi. Depois fundou o partido Corpo Nacional, também nazi. Foi deputado desde o golpe de estado de 2014 até 2019. Hoje é o chefe do país, já que o comediante Volodymyr Olexandrovytch Zelensky é apenas presidente para falar na televisão.

A Operação Militar Especial desencadeada pelas forças da Federação Russa tem razão de ser? Tem. Porque na conferência de segurança em Munique, o presidente Zelensky exigiu que os líderes mundiais presentes e o secretário-geral da OTAN (ou NATO) definissem claramente um calendário para a adesão da Ucrânia ao bloco militar. Mas fez pior. Declarou que o seu país vai regressar ao armamento nuclear! Os líderes mundiais só sabem dizer sanções, sanções, sanções. Por isso não advertiram o comediante para a gravidade das suas declarações. E pronto, aí estão as explosões.

A segurança da Federação Russa está em perigo com o avanço da NATO (ou OTAN) para os países de Leste. Mas o mundo também. Os regimes da Polónia e Hungria são assumidamente nazis, xenófobos e racistas. Tal qual a UNITA. A Roménia e os países bálticos alinham pela mesma cor política. Na chamada Europa Ocidental já existem nazis no poder em Espanha, Portugal (Região Autónoma dos Açores), Holanda e Áustria. França está quase. Reino Unido nem carne nem peixe. A rainha está a cair de podre e o primeiro-ministro é nazi mas de tendência idiota.

E o nacionalismo russo, liderado pelo presidente Putin? Depois das aldrabices da globalização, o nacionalismo hoje, sendo um erro crasso e desumano, é tão aceitável na Federação Russa como nos EUA ou qualquer outra superpotência onde ele prospera, imparável. Não gosto, não estou de acordo e se dependesse de mim, bania os nacionalismos porque já não se justificam. Quanto à guerra na Ucrânia a indústria bélica dos EUA está em grande. É a única que ainda resiste naquele país falido economicamente e a caminhar a passos largos para o nazismo. Trump ainda não acabou. 

* Jornalista

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