Adriano Moreira e o ditador Oliveira Salazar - tempos idos a regressar |
Artur Queiroz*, Luanda
Adriano Moreira era ministro do Ultramar quando estoirou a Grande Insurreição, no Norte de Angola, a dia 15 de Março de 1961. Colaborador directo do ditador Salazar. Muitos anos depois revelou que foi convidado para o cargo para executar as reformas que defendia, por isso aceitou imediatamente.
Algum tempo depois o chefe do governo fascista e colonialista deu o dito pelo não dito e Adriano Moreira, quando soube da mudança de rumo, disse ao ditador: “Acaba de ficar sem o ministro do Ultramar”. Dou como verdadeiros estes factos.
Em 1961, eu estava a concluir o
curso geral do Liceu. Estudava na cidade do Uíje, num colégio privado. Meus
pais viviam muito perto, pouco mais do que
Até final de Abril., ninguém se atrevia a circular na estrada entre a cidade do Uíje e a base área militar do Negage. Até que alguém se lembrou de criar uma força armada que escoltasse os estudantes do meu colégio, a fim de apanharem um avião para Luanda, onde iam concluir o ano lectivo, no Liceu Salvador Correia. Lá fomos.
O ministro do Ultramar, Adriano Moreira, foi a Angola nesta época, envolveu-se naquelas fantasias dos heróis do Mucaba, os terroristas que dilaceraram a pátria, a defesa de Portugal do Minho a Timor. O normal no estado terrorista, fascista e colonialista de Lisboa. Mas sua excelência surpreendeu-nos.
Em Luanda, ante os microfones da Emissora Oficial de Angola, anunciou que os estudantes de toda a “província” de Angola tinham um bónus de dois valores! Foi a minha salvação. Na secção de Letras estava bem. Mas nas Ciências, tinha notas rastejantes. Aquela boleia de dois valores fez de mim um aluno razoável!
Muitos anos depois, fiz a cobertura de eleições legislativas em Portugal e Adriano Moreira era o candidato do CDS, partido de direita. Aquilo correu francamente mal. No distrito de Bragança (sua terra natal) os caciques da direita viraram-lhe as costas. Passaram todos, de armas e bagagens, para o lado de Cavaco Silva, um fascista ainda mais sinistro do que Salazar.
E eu publiquei no Jornal de Notícias uma crónica intitulada “Nem os Cães Ladram Quando a Caravana Passa”. No dia seguinte, os jornalistas foram com o candidato do CDS a um pomar de macieiras e ele perguntou-me:
- “Isto está assim tão mau para mim?”. E eu respondi: Está pior do que escrevi! Ele agradeceu-me polidamente.
Desde então li e ouvi Adriano Moreira. Indubitavelmente um político inteligente e com ideias. Ninguém precisa de muito tempo para perceber que Portugal tem a direita mais estúpida do mundo. No tempo da ditadura, eram todos abaixo de cão tinhoso. Depois da Revolução do 25 de Abril, foi o dilúvio.
O primeiro chefe de fila da direita foi Mário Soares. Não hesitou em andar de língua na boca com o chefe da CIA, Frank Carlucci. Apoiou e protegeu a rede bombista constituída por terroristas do regime colonialista e fascista. Mais tarde foi o promotor e mentor de Jonas Savimbi e vários sicários da UNITA que fizeram de Portugal a sua casa. Mandou prender Otelo Saraiva de Carvalho e outros revolucionários portugueses.
Depois veio a Aliança Democrática liderada por Sá Carneiro. Um pouco mais inteligente do que Mário Soares mas mesmo assim quis empurrar para a Presidência da República o general Soares Carneiro, aquele nazi que fundou o campo de concentração do Bentiaba (São Nicolau). Logo a seguir veio Cavaco Silva. Um fascista movido a dinheiro. Quanto mais fácil, melhor.
O Cavaquismo varreu tudo para baixo do tapete e o Partido Socialista teve que ultrapassar os cavaquistas pela direita, ao mando de Mário Soares e todos os sucedâneos, até hoje. O senhor Silva, chefe dos deputados portugueses e que se diz do “socialismo democrático”, é um extremista de direita, cínico e hipócrita. Portugal é o jardim da direita mais estúpida do mundo. A esquerda, representada pelo Partido Comunista, ainda não encontrou maneira de repor os valores da Revolução de Abril. Malé, malé, malé.
Neste quadro, Adriano Moreira, é um génio. De direita e inteligente!
Morreu hoje, aos 100 anos. A partir de agora a direita portuguesa, que vai do Chega ao Partido Socialista, só tem refugo. Políticos descabeçados. Vendilhões de ilusões. Espezinhadores dos valores da democracia. O quadro é tão funesto que há vítimas do sistema suspirando pelo regresso de Salazar.
Adriano Moreira deu-me dois valores salvadores em 1961 e foi o único político da direita portuguesa que admirava como pensador, como intelectual e como político. Agora os portugueses ficam com o Costa, o Silva dos deputados e o Silva da economia, ou o Montenegro dos cavaquistas. Mais de metade da população portuguesa mergulhou na pobreza. Quase dois milhões vivem mesmo abaixo do limiar da pobreza. Mas a direita portuguesa está muito abaixo desse nível. Muitíssimo abaixo da indigência. Bem podem chorar a morte de Adriano Moreira.
Eu aproveito para lhe agradecer aqueles dois valores que fizeram de mim um estudante sofrível, quando estava condenado a um chumbo.
*Jornalista
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