Artur Queiroz*, Luanda
O meu tio Jaime adorava ser o que não era e abusava da casmurrice. A primeira máquina que conduziu foi um tractor daqueles que até as rodas eram de ferro. Como o meu pai achava que ele não tinha “queda para a condução, andou anos a tractorar.
Um dia o meu pai foi vender o café a Luanda e comprou um Jeep Willys daqueles que os norte-americanos usaram na II Guerra Mundial. Nunca soube como apareceram centenas de viaturas dessas em Angola, no final dos anos 40 e durante a década de 50. O tio Jaime aproveitou e começou a conduzi-lo. Engrenava a primeira e ia desde a Kapopa ao Negage sempre na mesma velocidade. Quando lhe pedia para acelerar um bocadinho ele dizia que já ia muito depressa e podíamos ter um desastre. Encostava o nariz ao para-brisas que também podia repousar em cima do capô. O meu irmão chamava-lhe o coca-bichinhos agarrado ao volante. E ele convencido de que era um grande condutor.
Um dia pôs de parte o tractor pesadão e lento, tipo Ronaldo a jogar na selecção de Portugal e decidiu tirar a carta para conduzir uma carrinha ou mesmo um turismo. Foi ao Uíje de carteira recheada e voltou com uma carta de condução daquelas que tinham um “P” e o habilitava a conduzir ligeiros e pesados. Nunca nos disse quanto lhe custou.
Na colheita seguinte fui com o meu pai a Luanda e ele comprou uma carrinha Chevrolet novinha
Casmurro como era, meteu na cabeça que não precisava de prise (quarta velocidade) e da marcha à ré. Porque a nossa xitaca tinha dois portões, entrava por um e saía pelo outro sem precisar de manobras e muito menos da marcha atrás. Quando o tio Jaime bebia uns copinhos a mais ia à oficina do senhor Gorila e propunha vender-lhe a marcha à ré e a prise: Ó Gorila, estão novas, nunca as usei. E o mecânico: Ó Jaime, eu não posso tirar da caixa os carretos da quarta e da marcha atrás. A carrinha nunca mais anda. Mas ele insistia, insistia. Queria mesmo vender a prise e a marcha à ré!
O campeão Fangio ganhou nos anos 50 o seu primeiro mundial de Fórmula 1, aio volante de um Afa Romeo. O meu tio Jaime dizia com ar negligente: Fui eu que o ensinei a conduzir! Não dizia estas coisas por mal. Era apenas um mitómano e adorava fazer-se passar pelo que não era.
A quadrilha que em 1992 criou o Sindicato dos Jornalistas Angolanos tem quadrilheiros que me fazem lembrar o meu tio Jaime na mania das grandezas e na mistificação da realidade. Nunca conduziram outra coisa que não seja um tractor pesadão com rodas de ferro. Não são capazes de conduzir um carro veloz nas pistas da Fórmula 1 mas fingem que ensinaram os grandes campeões.
Em Angola temos poucas e poucos jornalistas. Alguns são bons em qualquer parte do mundo. Outros vão andando a baixa velocidade, poucas vezes metem a prise e têm algumas dificuldades quando precisam de fazer manobras às arrecuas. Mas são profissionais valiosos e indispensáveis num sector onde faltam profissionais competentes. Uma boa parte da classe é constituída por simpatizantes de jornalismo. E a grande maioria não pratica. Tal como existem católicos “não praticantes” também temos muitas e muitos jornalistas não praticantes.
O lote fecha com os quadrilheiros, quase todos vivendo à sombra do Sindicato dos Jornalistas Angolanos. O “capo” da mafia de turno chama-se Teixeira Cândido. Este tem ido muito mais longe do que os outros quadrilheiros. Antes ninguém se lembrou de simular assaltos à sede da quadrilha. Nenhum ousou dividir a classe entre jornalistas que trabalham nos Media públicos e os que estão nos privados. Até agora ninguém se lembrou de colocar a mafia mediática ao serviço dos sicários da UNITA, às claras e assumidamente com a bandeira da frente patriótica unida.
A aldrabice dos “assaltos” ao sindicato soa tanto a ridículo como a bravata do meu tio Jaime quando afogado em vinho fabricado nos armazéns de Luanda dizia que ensinou o Fangio a conduzir. Mas ele nunca pertenceu a quadrilhas, nunca vendeu a honra e a dignidade a ninguém, como faz Teixeira Cândido e a sua quadrilha do sindicato. Ao entrar na aldrabice dos assaltos, deixou de ter condições para representar a classe. Até porque a maioria das e dos profissionais não se vende. Não faz política partidária no exercício da profissão.
A quadrilha que domina o Sindicato dos Jornalistas Angolanos diz que com os “assaltos” está em perigo e Liberdade de Imprensa. O meu tio Jaime, quando chegava aos 20 â hora encostava o nariz ao vidro e a barriga ao volante. Dizia que a tão alta velocidade se dão terríveis acidentes. O secretário-geral do sindicato confunde uma quadrilha de oportunistas, que suga os cofres públicos desde 1992, com jornalismo. E pensa que Liberdade de Imprensa é traficar notícias e vender o sindicato a interesses políticos golpistas.
Reginaldo Silva, o quadrilheiro do sindicato na Entidade Reguladora da Comunicação Social de Angola (ERCA), do fundo da valeta disse que "efetivamente, pode estar a haver algum agravamento dos condicionamentos à própria liberdade de imprensa". Este, no seu blogue Morro da Maianga, andou anos e anos mentindo para facturar. Desonrou por encomenda. Insultou quando a bebedeira o desinibia. Nunca exerceu a profissão num meio de comunicação social. Não sabe do que fala. Pensa que jornalismo é receber por baixo da mesa e entregar os recados que lhe encomendam.
Teixeira Cândido anunciou uma manifestação nas ruas de Luanda no dia 17 de Dezembro. Leiam o que ele disse à Lusa, agência noticiosa portuguesa (oficial) e órgão oficial da UNITA: “Não nos queremos antecipar ao Serviço de Investigação Criminal, com quem temos estado a interagir, esta manhã, esteve na sede do SJA para fazer o seu trabalho. Mas a direcção do sindicato entendeu que vai fazer uma marcha de repúdio, porque entendemos que a nossa atividade é legal.” Paleio da UNITA.
Este um dia destes vai vender a prise e a marcha à ré ao senhor Gorila. Quer dizer, diz ao dono do saco do dinheiro do Estado que se lhe puserem uns milhares na conta, desiste da quadrilha e fecha o sindicato. Esperem para ver.
*Jornalista
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