Pedro Cordeiro, editor da Secção Internacional | Expresso (curto)
Bom dia!
Antes de mais um convite: hoje, 3
de maio, às 14h, Junte-se à Conversa com David Dinis, Paulo Baldaia e Vítor
Matos. Desta vez sobre “A crise do Governo e os limites do Chega”. Inscreva-se aqui.
A de ontem foi uma noite para political junkies, como dizem os camaradas
da secção de Política do Expresso. João Galamba esteve demissionário, mas menos
tempo do que Paulo Portas há dez anos, durante a crise do “irrevogável”. Dessa
vez foram dias, agora escassas horas. Intensas, e a equipa cá de casa esteve em
direto a explicar tudo o que se passava.
O ministro das Infraestruturas pediu a demissão ao início da noite, em prol da
“necessária tranquilidade institucional”, devido à perceção pública do caso do assessor Frederico
Pinheiro, por si exonerado e que alegadamente protagonizou cenas de violência
no Ministério. Galamba assegurava “em momento algum ter agido em
desconformidade com a lei ou contra o interesse público” ou ter sonegado dados
à comissão parlamentar de inquérito sobre a TAP, e pedia desculpa aos afetados
por esse episódio.
António Costa surpreendeu grande parte do país quando, pouco depois, recusou a demissão. Explicou o primeiro-ministro que
“seria muito mais fácil seguir a opinião unânime dos comentadores, ouvir a
generalidade dos agentes políticos e aceitar a demissão”, mas tal violaria a
sua consciência. Entregar de bandeja a cabeça de Galamba seria “dançar a dança
do populismo”. Na visão do chefe do Executivo, o ministro “não fez nada de
mal”. Também Costa pediu desculpa pelo ocorrido no Ministério,
responsabilizando o assessor afastado, a quem acusa de ocultar informações à
Assembleia da República.
“Lamento desiludir os que vou desiludir”, ironizou Costa, para afirmar o seu
poder: “Cabe-me a mim decidir”. A ele e não ao mais ilustre dos comentadores
nacionais, o que preside à República. Marcelo Rebelo de Sousa não demorou a reconhecer que “não pode exonerar um membro do Governo
sem ser por proposta do primeiro-ministro”, sublinhando que discorda de Costa “quanto à leitura política dos
factos e quanto à perceção deles resultante por parte dos portugueses, no que
respeita ao prestígio das instituições que os regem”. Ou seja, por ele Galamba saía. Ou talvez nem devesse ter entrado.
Ao afrontar em público o Presidente, Costa eleva a parada e não segue o aviso
com que o David Dinis recordava a demissão, há 23 anos, de
Armando Vara por pressão do Presidente Jorge Sampaio. Ouvi, bem entrado o serão,
análises de quem acha que o primeiro-ministro confia que Marcelo não tem
trunfos para ripostar, já que dissolver a Assembleia da República seria de alto
risco (o PS podia ganhar; a aritmética parlamentar subsequente tornar o país
ingovernável; ou, pior, abrir as portas do poder à extrema-direita, a quem o
PSD as fechou, mas não trancou, no entender até de militantes laranja. Há ainda
quem creia que Costa quer ir já a votos, antes que seja pior para o PS.
Em relação a Belém, cujo inquilino vai estar fora do país entre sexta e
quarta-feira que vem, há igual cisma: uns garantem que o Presidente retaliará,
sob pena de perder autoridade; outros asseguram que preferirá deixar queimar o
Governo em lume brando, aguardando pelo fim da comissão de inquérito (onde o PS foi criticado) ou, quiçá, que algo mexa no PSD e o
partido que Marcelo um dia liderou se torne alternativa a Costa. Estará Marcelo sequestrado, como defende no “Público” a Ana Sá
Lopes? O desafio à autoridade presidencial é inegável, explica a Rosália Amorim no “Diário de Notícias”.
A maior formação da oposição foi a única representada no Parlamento que não
reagiu de viva voz à demissão abortada. Um curto comunicado promete algo pelas
12h30, após reunião interna, e critica um Governo “sem liderança efetiva,
com inegável falta de autoridade e numa tentativa teatral de ultrapassar tantas
fragilidades”. Do líder social-democrata, ficou um tweet que depressa perdeu atualidade, a
celebrar a saída de Galamba quando esta já fora revertida. A IL e o Chega
consideram que o Executivo chegou ao fim; o PCP, o BE e o PAN preferem criticar
a política do Governo; e o Livre recusa bravatas.
* O título deste Curto é tomado de empréstimo a uma célebre canção de José Mário Branco, a quem saberá
sempre bem recordar e homenagear no mês de maio
Outras notícias
PONTA DELGADA Os Açores
podem ser a região europeia que mais cresce graças aos fundos comunitários,
anunciou a Comissão Europeia e noticia a Joana Nunes Mateus.
KIEV O Presidente da Assembleia da República esteve na capital da Ucrânia, como lhe contámos na cobertura minuto a minuto da
guerra. Augusto Santos Silva não levou na delegação o PCP (que também não
queria ir) nem o Chega (a quem pune pela má-criação na recente receção a Lula
da Silva). A segunda figura do Estado defendeu ainda que pode chamar a polícia para expulsar deputados
desrespeitadores.
FARO A capital do Algarve é a cidade portuguesa com mais alunos estrangeiros. É em Loures que mais se chumba e
em Lisboa que há mais desigualdade, escrevem as camaradas Isabel Leiria e Joana
Pereira Bastos, que estudaram dados do Ministério da Educação.
PEQUIM O vice-presidente da China estará a fazer as malas para ir à
coroação de Carlos III, em Londres, de onde seguirá para Lisboa. A Salomé
Fernandes explica o sentido da visita de Han Zheng.
LISBOA Alunos de escolas de Lisboa retomaram as ocupações para exigir ação em relação às
alterações climáticas. A Carla Tomás viu tudo, ao ritmo de “Terra Ciao”, nova
iteração de uma canção que serve para tudo.
PARIS Houve feridos nos protestos do 1º de Maio
CASCAIS Um juiz exige uma avaliação médica independente de Ricardo
Salgado, para apurar se o antigo dono do BES está ou não incapacitado, como
alega a sua defesa, escrevem Liliana Valente e Rui Gustavo.
Frases
“As mesas eleitorais são
asseguradas por mulheres. Mas os coordenadores eram sempre homens. Este é um
bocadinho o retrato do Paraguai. Para o trabalho de base as mulheres”
Maria Manuel Leitão Marques, eurodeputada portuguesa que fez parte da missão de
observadores às eleições do Paraguai (onde ganharam os do costume), convidada
de um episódio extra do podcast “O Mundo a Seus
Pés”, moderado por Manuela Goucha Soares
“Com o aproximar do fim da guerra na Síria, poder-se-ia aproveitar para fazer
um balanço da Primavera Árabe. E é evidente que é uma desilusão. Há países em
guerra civil, outros no caos, outros de volta a situações ditatoriais mais ou
menos disfarçadas”
Leonídio Paulo Ferreira num artigo para o “DN” sobre um gorado sonho de liberdade
há 12 anos
O que ando a ler, ver e ouvir
Nos últimos dias dias li
sofregamente “O Retrato de Casamento” (disponível em português na Relógio
d’Água), da norte-irlandesa Maggie O’Farrell, a quem no ano passado elogiei
neste espaço “Hamnet” (que, by the way, tem agora versão teatral). A escritora mantém-se no romance histórico
e a atenção que ali deu ao filho de William Shakespeare é dada agora a Lucrezia
de Medici, duquesa de Ferrara. Num enredo recheado de intrigas palacianas na
Itália renascentista, de novo com um protagonista de vida efémera, O’Farrell
prende o leitor com descrições detalhadas da corte, diálogos de ritmo acelerado
e divagações internas mais alongadas. Presa está também a miúda a quem aos 15
anos casaram com um homem poderoso e que às tantas se convence de que este quer
matá-la. Recomendo convictamente.
Vou esta tarde à Culturgest ver o documentário “A casa de dentro de Carlos Nogueira”, realizado por Luís
Alves de Mato. O assunto é o percurso e o processo artístico de um homem
singular de quem tive a sorte de ser aluno e a quem tenho a fortuna de chamar
amigo. Feita a declaração de interesses, o filme de cerca de uma hora revela
um artista multidisciplinar, a sua obra e a estreita relação de um e de outra com o seu espaço de viver e trabalhar.
Na música, ando encantado com o sul-africano Bongeziwe Mabandla, que descobri através de alma generosa
que partilhou canção sua nas redes sociais (e a quem agradeço penhorado, embora
não me recorde de quem foi). Compõe em idioma isiXhosa, com forte inspiração
nos desafios que a vida lhe impôs e recuperando e trazendo para o presente os
sons tradicionais da província do Cabo leste. Lança esta sexta-feira um novo
álbum, o seu quarto, com o ítulo “amaXesha”, ou seja, “Tempos”. O diário inglês
“The Guardian” já ouviu e gostou.
Noutro estilo e mais perto de casa, Peu Madureira estreia-se em disco com “Espera”. Desde cedo ligado ao fado, mas não por ele
manietado, o cantor português deu-se a conhecer no Festival RTP da Canção de
2018, com a belíssima “Só por ela”. Agora brinda-nos com pouco mais de meia hora
da sua doce voz.
Despeço-me com estas sugestões, a que acrescento abaixo as da equipa de podcasts do
Expresso. A palpitante atualidade nacional e internacional continua à sua
disposição no Expresso, enquanto vamos preparando a edição impressa para
depois de amanhã. Até lá, até breve e até sempre!
Podcasts a não perder
É sobre crises, sobre lidar com o
inesperado, sobre capacidade de adaptação, sobre o papel do líder nestes
momentos e sobre estigmas que esta semana falamos. Neste episódio de O CEO é o Limite recuamos ao momento mais crítico da
pandemia e à chegada das primeiras vacinas ao mercado. Ouça o podcast que
contou com Paulo Teixeira, CEO da Pfizer em Portugal.
Com o novo romance, “Um Cão no Meio do Caminho”, a escritora Isabela Figueiredo
aponta desta vez o foco a um dos grandes males da vida moderna, a solidão que
mora nas periferias dos grandes centros. Desta vez, as personagens estão menos
coladas a si, mas continuam a dar corpo e voz a muitas das feridas a que
Isabela sempre regressa para curar. Ouça a escritora falar sobre a sua obra e a
influência das discussões woke no podcast A Beleza das Pequenas Coisas .
Esta semana, Miguel Sousa Tavares traz uma reflexão sobre a jovem democracia
portuguesa nos 49 anos do 25 de Abril, e um olhar crítico para o Chega na
cerimónia de boas-vindas a Lula da Silva. Fique a par da opinião do cronista
sobre o acontecimento com Miguel Sousa Tavares de Viva Voz .
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