quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Angola | A Luz da Liberdade e as Sombras -- Artur Queiroz

Agostinho Neto, Rosa Coutinho, Savimbi

Artur Queiroz*, Luanda

A Revolução dos Cravos em Portugal (25 de Abril) chegou tardiamente a Angola. E quando chegou, os Media, controlados pelos independentistas brancos, conluiados com o regime de Pretória, começaram logo a lançar sombras para ninguém ver a luz que se acendia com o fim do regime fascista e colonialista português. De fora ficou a Emissora Oficial, a Voz de Angola (órgãos públicos) e o Diário de Luanda que pertencia ao partido de Salazar, União Nacional. Esta empresa era igualmente proprietária do jornal ABC que ressurgiu como semanário.

Sem surpresas, os Media privados apoiavam a UNITA, apresentada como “movimento dos brancos” e Savimbi, o “Muata da Paz”. Menos de um mês após o 25 de Abril, também o jornal Província de Angola (Hoje Jornal de Angola) abriu as suas páginas à propaganda da FNLA. Os partidos que nasceram com a mudança de regime, todos defensores da independência branca, tinham mais espaço do que UNITA e FNLA. O jornal do partido fascista União Nacional, Diário de Luanda, era a voz troante dos esquadrões da morte. O mais extremista dos extremistas.

Este panorama mudou com a chegada a Angola do Almirante Rosa Coutinho. Os Media privados tornaram-se ainda mais extremistas na defesa da independência branca com o apoio da África do Sul. O jornal Província de Angola (Jornal de Angola) assumiu ser a voz da FNLA. Os Media públicos, Emissora Oficial, Voz de Angola e Diário de Luanda, nacionalizado com a extinção da União Nacional, foram os arautos da mudança.

A grelha da emissora Voz de Angola incluiu dois programas, Contacto Popular e Voz Livre do Povo, que defendiam os novos tempos. A Emissora Oficial de Angola sofreu uma reestruturação ao nível da Direcção. O Secretário Provincial da Comunicação Social, Correia Jesuíno, nomeou dois “militares de Abril”, Comandante Garrido Borges e Capitão Alcântara de Melo, para dirigirem a emissora. A Direcção de Informação ficou a cargo de Manuel Rodrigues Vaz (realizador e produtor do Jornal das 20 horas), António Cardoso, intercalares da noite e Artur Queiroz, jornal das 13 horas.

O MPLA passou a ter voz no processo de transição, o que parecia impossível até à chegada do presidente da Junta Governativa de Angola, Rosa Coutinho, que substituiu o último governador-geral, Silvino Silvério Marques. Ao mesmo tempo começou a debandada de jornalistas e técnicos. Decidimos que cada jornalista sénior tinha como missão formar cinco jovens, num ano. Formação em exercício. Assim nasceu a geração de José Patrício e outros grandes profissionais.

Na técnica foi aplicada a mesma receita, mas a debandada não foi tão grande. Mesmo assim, técnicos de grande valia como os manos Artur e Fernando Neves, César Barbosa, Humberto Jorge, Lucrécio, Jofre Neto, Arriscado e outros, responderam em grande! Para não dispersarmos jornalistas e técnicos, foi extinta a Voz de Angola e os quadros migraram para a Emissora Oficial de Angola (RNA). Jornalismo de alto nível. Rádio de primeira! O Povo Angolano ficou bem servido no palco mediático. Pela primeira vez na História de Angola.

Após a tomada de posse do Governo de Transição (31 de Janeiro 1975) a debandada de profissionais qualificados aumentou dramaticamente. O Sindicato dos Jornalistas criou um Centro de Formação Permanente. Luciano Rocha, Castro Lopo, Horácio da Fonseca e Artur Queiroz davam formação em técnicas redactoriais e editoriais para a Imprensa e Rádio. Maria do Carmo Medina ensinava Direito da Comunicação. Bobela Mota História do Jornalismo Angolano. 

FNLA e UNITA abandonaram o Governo de Transição e a guerra nas ruas de Luanda atingiu o máximo. A debandada de jornalistas aumentou ainda mais. O ministro Manuel Rui Monteiro, Gabriela Antunes, Francisco Simons e Sebastião Coelho decidiram criar uma escola superior de jornalismo. O Sindicato não alinhou no projecto. Fez bem porque a megalomania acabou com Gabriela Antunes, sozinha, a criar um “curso médio de jornalismo”. Ainda bem que ninguém se lembrou de criar cursos médios de Medicina, Engenharia ou Letras.

A luz foi-se extinguindo e surgiram novas sombras. A Emissora Oficial manteve o alto nível porque em devido tempo formou os seus jornalistas e técnicos. Mas a Imprensa entrou em coma. No dia primeiro da Independência Nacional a Redacção do Diário de Luanda, trincheira firme do MPLA, tinha os seguintes jornalistas: Raimundo Souto Maior, Luciano Rocha, João Serra e Artur Queiroz. Mais dois estagiários. Os fotojornalistas Bernardo e Gouveia. O jornal saía todos os dias ao início da tarde! 

Ernesto Lara Filho reforçou a equipa três meses antes do 11 de Novembro mas foi nomeado director da Missão Apícola de Angola no Huambo e partiu. Ele era quadro técnico do Ministério da Agricultura desde os anos 50. No final de 1975 regressou a Luanda Adelino Tavares da Silva e ficou a trabalhar connosco. Fugiu de Portugal por estar a ser perseguido pelos vendedores do 25 de Novembro de 1975, a golpada da CIA e Mário Soares.

O Jornal de Angola era um deserto igual. Na época tinha apenas dois jornalistas seniores: Moutinho Pereira e Antero Gonçalves, o Poderoso. Dois jovens davam os primeiros passos na profissão: Paulo Pinha e Quim Pereira de Almeida. O director, Fernando Costa Andrade (Ndunduma) foi emprestado ao jornalismo. E um fiscal da Inspecção dos Espectáculos, Júlio Guerra, virou chefe de Redacção! Para colmatar tão gritantes faltas, Ndunduma admitiu uma dezena de estagiários, Alguns são hoje profissionais de bom nível.

O Presidente João Lourenço fez no Huambo esta afirmação: “No tempo do partido único o jornalismo praticado era bem diferente daquele que é praticado agora. Hoje existe liberdade de imprensa, não é só o Estado detentor de empresas de comunicação social, o sector privado também está neste nicho de mercado”.

Informo sua excelência que fiz jornalismo no regime de democracia popular e socialismo. Fazia exactamente o mesmo jornalismo que faço hoje. Ouso infirmar o Presidente da República que as Redacções do Diário de Luanda e Jornal de Angola eram espaços de liberdade. Enquanto fui chefe de Redacção da Emissora Oficial de Angola (RNA) a liberdade andava à solta. Nenhum poder ilegítimo conseguiu fazer lá ninho. Nunca! Nem sequer o senhor ministro Manuel Rui e seus secretários de Estado, Hendrick Vaal Neto e Jaka Jamba conseguiram impor a censura prévia aos noticiários! 

As Redacções deixaram de ser espaços de liberdade quando os golpistas de 27 de Maio de 1977 tomaram de assalto a RNA. Demitiram do Diário de Luanda Luciano Rocha e Artur Queiroz. Sabotaram a direcção de Fernando Costa Andrade (Ndunduma). Mas no Jornal de Angola não passaram! Director e jornalistas defenderam a Liberdade de Imprensa com risco das suas vidas! Derrotados os golpistas, o Jornalismo continuou, em liberdade.

Sua excelência o Presidente da República provavelmente não sabe. Tem mais que fazer. Não pode perder tempo com ninharas. Mas os Media privados em Angola, hoje, representam poderes ilegítimos, Nunca foram a votos ou se foram, perderam estrondosamente. Existem para derrubá-lo e derrubar o seu partido que ganhou as eleições com maioria absoluta. Os Media públicos hoje são antros de poderes ilegítimos representados pelo chefe Miala. Há uma séria ameaça à Liberdade de Imprensa e ao do Jornalismo Livre. É o sistema no seu pior.

Liberdade de Imprensa na democracia representativa e “economia de mercado” é coisa que não existe. Sem querer tirar o sono a sua excelência o Presidente da República informo que até ao ano de 1977, mais de 400 jornalistas norte-americanos eram agentes da CIA. 

Nesse ano, o jornal New York Times “investigou” e concluiu que a CIA controlava 800 órgãos de informação e seus responsáveis. A CBS (Columbia Broadcasting System) tinha uma linha directa com a sede da CIA. A Empresa Time Inc. (Life, Fortune e outros títulos) aceitou contratar agentes da CIA disfarçados de jornalistas. 

A CIA assumiu o controlo total da American Newspaper Guild e os seus agentes passaram a ter o disfarce de jornalistas nas publicações do grupo. A CIA tem os seus agentes na Reuters, Associated Press (AP) e United Press Internacional (UPI). O especialista na matéria William Schaap garante que a CIA é proprietária ou controla 2.500 meios de comunicação social em todo o mundo. O repórter John Cewdson descobriu que a CIA tem pelo menos um jornal em cada capital do “mundo ocidental”. Na folha de pagamentos da CIA constam correspondentes, repórteres, editores em praticamente todos os grandes Media do mundo.

E em Angola, excelência? O editor de Opinião do Jornal de Angola é empregado da embaixada dos EUA em Luanda. O chefe Miala faz à bruta aquilo que os seus mentores da CIA fazem discretamente. Dispenso a liberdade de imprensa que hoje temos em Angola. Porque as Redacções foram infiltradas por poderes ilegítimos. Os jornalistas foram afastados ou estão arrumados em prateleiras de lata. Muitos que estão no activo sofrem todo o tipo de agressões, até quando lhes atiram à cara com salários rastejantes. Isto para não falar do conflito no Novo Jornal!´, briga de Sobrinhos e Madalenos, sem sombras de corrupção. Nasceram milionários como vossa excelência e sua equipa.

* Jornalista

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