Saíram escaldados, a falar sozinhos, e a fingir nada ter ouvido do muito que lhes foi dito. No fundo, mostraram que ficam satisfeitos em dizer umas atoardas para serem depois passadas nas redes sociais.
AbrilAbril | editorial
A estridente construção de casos e casinhos onde assenta a forma de fazer política do Chega levou à realização, esta quarta-feira, de um debate na Assembleia da República sobre «Empresas públicas intervencionadas, em especial nos CTT». O mote era dado pela compra de 0,24% das acções dos CTT pelo Governo PS em 2021, e a tese, a de que o Governo PS, fruto de negociações secretas com o PCP e o BE, cometera uma ilegalidade nas costas do povo português.
O PCP reafirmou saber dessa intenção do Governo, que tinha desvalorizado a mesma e alertado publicamente os trabalhadores que a compra de uma posição minoritária na empresa não resolvia os problemas provocados pela gestão privada. Não resolvia os 13% que o PS chegou a dizer – também publicamente – que admitia comprar, muito menos resolveria os 1,95% que João Leão mandou comprar e menos ainda resolveria os ridículos 0,24% que de facto o Governo comprou. Por outro lado, defendeu a sua posição de renacionalizar os CTT.
O BE afirmou basicamente o mesmo, com a única diferença de não ter sido informado da intenção do Governo de comprar acções dos CTT.
O Chega fingiu não ouvir, e continuou, até ao final do debate, a falar em negócios secretos, em preços a pagar pelo voto no Orçamento, e na teoria da conspiração que ergueu em torno desta matéria.
Entretanto, o PCP questionou directamente o Chega por nada ter feito perante o acordo – esse, sim, secreto – que o Governo fez com o grupo Champalimaud, e por que nada denunciou, nem na altura, nem agora. Por outro lado, perguntou se a razão desse silêncio não seria o facto de esse acordo secreto ser com o grupo Champalimaud, que, como se sabe, inclui vários financiadores do Chega. É que o Governo PS, em 2021, já depois do Orçamento de Estado ter sido rejeitado, avançou para a negociação do prolongamento da concessão – por ajuste directo! – com o grupo Champalimaud (principal accionista dos CTT), negociação em que ainda se comprometeu a alterar a lei Postal (cuja alteração, favorável ao concessionário, aprovou antes das eleições e só a tornou pública depois), a diminuir as exigências de qualidade e a aumentar as contrapartidas públicas. E o Chega nem a Apreciação Parlamentar do referido decreto-lei pediu.
Numa intervenção clarificadora, o PCP recordou que o Chega tão-pouco denunciou, ou se indignou, com a delapidação do património dos CTT: «A última operação imobiliária dos CTT (e será a última porque nada mais resta) são 398 activos imobiliários, com 239 mil metros quadrados, vendidos por 137,7 milhões de euros, 32,5 milhões pagos já em 2023. Estes "activos" são a estrutura central da rede postal, e todo o património que resta e, sem eles, não há serviço público postal.»
O PCP destacou ainda que o Chega tão-pouco se indignou ou denunciou os problemas criados aos trabalhadores dos CTT: «Os trabalhadores dos CTT são mal pagos, têm vindo a ser sistematicamente prejudicados nos salários e direitos, com a perda de poder de compra, têm agora o seu patrão a tentar roubar-lhes 36 milhões de euros através das alterações à IOS, há uma falta gritante de trabalhadores no serviço postal – mas o Chega quer lá saber! Quanto menos gastar com os trabalhadores, mais tem a família Champalimaud para financiar o Chega!» Por fim, Bruno Dias ironiza e sublinha que, perante tudo isto, o Chega diz, como dizia o «outro»: «está tudo bem assim e não podia ser de outra maneira.»
Neste debate, ficaram expostas as contradições do PS, e, como lhe foi recordado pelo PCP, não só se recusou a renacionalizar os CTT, como, quando questionado sobre as tropelias da administração e, por exemplo, perante a denúncia da alienação do património imobiliário necessário à prestação do serviço público postal – CDP, sedes e estações –, o então ministro das Infraestruturas respondeu que «não cabe ao Estado interferir na sua gestão».
Coube à Iniciativa Liberal o papel de porta-voz da gestão privada, recauchutando uns números para tentar defender o indefensável. Destacou o facto de a empresa ter hoje mais 1000 trabalhadores que no momento da privatização, o que é uma pura falsificação. Como os Relatórios e Contas de 2013 e 2022 do Grupo CTT podem facilmente demonstrar, a 31 de Dezembro o número de trabalhadores do Grupo era de 12 383, em 2013, e de 12 608, em 2022, sendo que o número de trabalhadores se reduziu no serviço postal (em mais de mil trabalhadores) e cresceu pela criação do Banco CTT e pela compra de outras pequenas empresas (e incorporação desses trabalhadores). Sem esquecer que, de acordo com esses mesmos relatórios, o número de trabalhadores do grupo em Portugal reduziu-se de 11 830 para 11 788 entre 2013 e 2022. Mais desonesto foi o facto de ter colocado como um problema da gestão pública o despedimento de 800 trabalhadores em 2012, no quadro do processo de privatização. Ou seja, o Governo PSD/CDS manda fazer um despedimento em 2012 para privatizar a empresa e a culpa é da gestão pública.
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