sábado, 10 de fevereiro de 2024

Angola | Menos por Menos Dá Aldrabice -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Cabras, cabritas, bodes e outra bicharada puseram a circular que durante o golpe de estado militar em 27 de Maio de 1977, a sua contenção e a repressão que se seguiu, morreram milhares de angolanos. A filha do Manolo e da Anália até diz que houve um genocídio. Os familiares de Cita Vales dizem que são 40.000 mortos. A “imprensa privada” começou nesse número em 1992 mas hoje já vai em 100.000. 

A manipulação, aldrabice e falsificação servem para denegrir a imagem do Presidente Agostinho Neto e seus companheiros da direcção do MPLA nessa época. Foram vítimas mas Francisco Queiroz e João Lourenço transformaram-nos em criminosos. Os criminosos golpistas são “vítimas dos conflitos políticos”. O tema até 1992 nunca foi usado pada enlamear ninguém. Nem sequer quem pertenceu à direcção política e militar do golpe. Na mudança de regime, os abutres atiraram-se como leões aos restos que sobraram de 1977. É um ajuste de contas com a Revolução Angolana!

Francisco Queiroz e João Lourenço criaram a CIVICOP para perdoar e abraçar. Promover a unidade nacional. Para eles, os angolanos andavam de costas voltadas desde 1977. Era urgente repor a confiança, a paz e a concórdia. Entre 11 de Novembro de 1975 e Fevereiro de 2002, Angola enfrentou uma guerra de agressão estrangeira. Que se saiba, ninguém recusou combater devido a desavenças nascidas durante e depois do golpe de estado de 1977. Na mudança de regime, a direcção do MPLA fez uma declaração pública inequívoca: O 27 de Maio de 1977 foi um golpe de estado militar e os golpistas foram derrotados. Ponto final.

O tema foi explorado por sobreviventes do golpe e partidos políticos que nasceram na vigência do regime de democracia representativa. Os golpistas de 27 de Maio criaram o PRD, associados aos restos da Revolta Activa. Um dos golpistas do 27 de Maio, Luís dos Passos, concorreu à Presidência da República. Conseguiu 58.121 votos (1,47 por cento dos votos). O chefe da Revolta do Leste, Daniel Chipenda, também concorreu à Presidência da República e conseguiu 20.845 votos (0,53 por cento). O PRD elegeu um deputado!

O MPLA, acusado de genocídio, de ter morto milhares de angolanos, de ter executado quem pertencia à direcção política e militar do golpe, ganhou as eleições com maioria absoluta! Os Media do “ocidente alargado” e particularmente de Portugal davam uma vitória esmagadora à UNITA e a derrota humilhante do MPLA. 

Nesse tempo fiz a cobertura das eleições e publiquei na revista “Sábado” (primeira série), uma análise na qual afirmei que o MPLA ia ganhar as eleições com maioria absoluta. Expus as razões que me levavam a essa certeza. E declarei que entregava a minha Carteira Profissional de Jornalista se estivesse errado. Não entreguei. Mas os que nos Media portugueses davam uma vitória esmagadora à UNITA, quando viram os resultados, apressaram-se a falar em “fraude eleitoral” mesmo sabendo que isso era impossível dada a forma como as eleições foram blindadas pela ONU e a Troika de Observadores (Portugal, Rússia e EUA).

Nas eleições seguintes (2008) o MPLA ganhou com maioria qualificada (81,64 por cento) e o PRD, dos golpistas de 27 de Maio de 1977, foi extinto porque teve menos de 0,50 por cento (0,22 por cento o que equivale a 14.238 votos). Francisco Queiroz e João Lourenço entenderam que estes eleitores eram um entrave à unidade nacional. O exemplo da discórdia. O motivo do atraso de vida em Angola. Sem eles no redil, sem os seus abraços e perdão, estava tudo perdido.

A CIVICOP foi um “flop”. Depois da saída de Francisco Queiroz do Executivo e a entrega dos tachos que trazia ao pescoço, o seu lugar foi ocupado por outra figura sinistra, Fernando Garcia Miala. Perdoar e abraçar à sombra tutelar de um torcionário é obra desenganada. Mas a brincadeira de mau gosto tem o seu lado positivo. O senhor ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Marcy Lopes, acaba de revelar números importantíssimos. Desde Maio de 2021 até hoje, a instituição às ordens do chefe Miala recebeu 4.618 pedidos de certidões de óbito (de vítimas dos conflitos políticos) mas só foram emitidas 2.905.

Onde estão os 30, 40, 50, 60, 100 mil mortos? Onde está o genocídio? Afinal as “vítimas” são muito menos, os golpistas ainda menos e menos por menos dá gigantesca aldrabice, fomentada por forças que sempre se opuseram à Revolução Angolana, entre as quais constam A Revolta do Leste (Daniel Chipenda), a Revolta Activa (Gentil Viana e o padre Joaquim Ponto de Andrade) ou o 27 de Maio (Monstro Imortal, Nito Alves, Bakalof, Zé Van-Dúnem e outros de menor nomeada).

Outra aldrabice que é preciso travar tem a ver com os julgamentos de quem pertencia à direcção política e militar do golpe. Continuam a dizer, despudoradamente, que foram julgamentos sumários ou nem sequer existiu qualquer julgamento. Mentira. 

Angola estava em guerra. Par a julgar quem dirigiu o golpe militar foi constituído um Tribunal Marcial nas instalações do Ministério da Defesa e do Estado Maior Geral das FAPLA. Todos os golpistas fizeram um depoimento escrito pelo seu punho. Com base nessa declaração foram responder ante os juízes militares. Os crimes que confessaram ter cometido (sedição, deserção e alta traição à Pátria) eram punidos com fuzilamento. E foi essa pena que lhes foi aplicada.

O Presidente da República insiste que a CIVICOP é uma maravilha e todas as famílias precisam de fazer os funerais dos seus mortos, quase meio século depois. Discordo. As famílias angolanas precisam de comida na mesa, trabalho com salário justo, cuidados de saúde, educação, habitação digna. Porque são estas as condições que dão suporte à Liberdade e à Dignidade. Antes de andarem atrás das ossadas dos golpistas de 27 de Maio de 1977 e das vítimas dos assassinos da UNITA, procurem os milhares de combatentes que morreram em todas as frentes de combate e ficaram insepultos. Mas desses ninguém se lembra. Porque lutaram pela Revolução Angolana. Não se ajoelharam aos pés do genocida Joe Biden.

Aqueles 4.618 que pediram certidões de óbito porque os seus parentes morreram durante os conflitos políticos armados não podem ser desprezados. Mas se o Estado até hoje nunca se preocupou com os familiares das vítimas do golpe, desde os comandantes do Estado Maior Geral das FAPLA aos guardas da Rádio Nacional de Angola, não compreendo para que serve a tal CIVICOP. Espero que não seja para desnatar dinheiro dos cofres públicos para os bolsos de uns quantos amigalhaços. 

* Jornalista

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