quarta-feira, 27 de março de 2024

Angola | O Piolhoso Ataca de Novo -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Hoje é um dia grande para Angola, a África Austral, todo o continente e sobretudo para a Humanidade. Porque na Batalha do Cuito Cuanavale foi derrotado o regime racista de Pretória. Acabou um governo que tinha o racismo como política central do Estado. Todos os seres humanos foram libertados dessa mancha ignominiosa nas suas honras, mesmo os que não têm e nunca terão honra.

Entre esses seres desgraçados está um piolhoso que em 2002 estava às portas da morte, nas matas do Leste de Angola. Os sobreviventes da UNITA durante a Operação Kissonde, pediram aos militares das FAA que providenciassem a evacuação de Alcides Sakala, prestes a morrer. De imediato foi chamado um helicóptero. O moribundo e piolhoso recebeu assistência médica na mata e de seguida partiu para o Hospital de Luena. Uma equipa de profissionais prestou-lhe cuidados de emergência e salvou-o.

Alcides Sakala queria morrer. A seita UNITA entrou em derrocada. O criminoso de guerra Jonas S avimbi tinha morrido. E ele ficou órfão. Desempregado da traição. O comandante militar da região, General Zumbi, foi visitá-lo aos cuidados intensivos. Pediu para tratarem do enfermo como se fosse ele. Continuaram a dispensar-lhe cuidados especiais. Salvou-se. Foi transferido para uma enfermaria. Alguns dias depois o chefe da equipa médica procurou o comandante miltar da região e disse-lhe: “O seu doente não toma a medicação. Encontrámos comprimidos debaixo da cama!”

O General Zumbi teve uma conversa séria com o piolhoso suicida. E disse-lhe que se queria morrer, então arranjava um helicóptero que o deixava na mata donde foi retirado quando estava a dar as últimas. Daquela conversa saiu um acordo. Alcides Sakala prometeu ao general Zumbi que ia seguir a medicação e fazer tudo para recuperar. Assim aconteceu. Pela primeira vez na vida foi verdadeiro.

O piolhoso publicou um livro muito mais ridículo do que ele. Ousou homenagear e agradecer a um médico zairense que integrava o grupo dos sicários da UNITA em fuga desde o Bailundo e Andulo. Mas nem uma palavra dedicou aos esforçados profissionais de saúde que lhe salvaram a vida numa primeira intervenção na mata e depois no Hospital do Luena. Não sou capaz de qualificar semelhante energúmeno. Mas besta insanável é um bom começo.

Hoje Alcides Sakala diz que a Batalha do Cuito Cuanavale foi “um impasse” na margem do rio Cuito. Os outros rios do Triângulo do Tumpo não contam. E como aconteceu um “impasse”, essa situação “conduziu à retirada das forças militares estrangeiras de Angola, cubanas e sul-africanas, negociada em Nova Iorque, em Dezembro de 1988, e às consequentes negociações políticas conducentes à independência da Namíbia, em 21 de Março de 1990; ao fim do apartheid, na África do Sul, em 17 de Março de 1991; e à democratização de Angola por via dos Acordos de Paz Para Angola, firmados em Bicesse, a 31 de Maio de 1991”

Diz o sicário que em Nova Iorque foi negociada a retirada das forças militares estrangeiras. Mistura os racistas sul-africanos, invasores de um Estado Soberano, com as tropas cubanas, chamadas pelo legítimo governo da República Popular de Angola quando sob a capa da FNLA e da UNITA, tropas estrangeiras e mercenários invadiram território angolano a Norte, a Sul e a Sudeste. O piolhoso não diz que a UNITA e seus sicários estavam ao lado das tropas da África do Sul. Do regime de apartheid. Dos ocupantes da Namíbia. Dos carcereiros de Nelson Mandela. Um sabujo insanável. Um imbua kabiri que morde quem lhe dá a ração diária.

Alcides Sakala escreve que “a batalha do Cuíto Cuanavale não representou o fim da guerra em Angola nem significou a libertação da África Austral. Angola, a Zâmbia, o Botswana, Moçambique, o Malawi, a Tanzânia, a Swazilândia, o Zimbabwe e a própria África do Sul já eram independentes antes dessa batalha”. 

Que dizer a um porco escrevinhador? A África do Sul racista tinha os seus satélites na África Austral. Desestabilizava e atacava militarmente Moçambique. O Zimbabwe tinha um regime racista decalcado do apartheid da África do Sul. Angola ia ter o mesmo destino se os sul-africanos triunfassem na guerra. Savimbi ficava todo contente com o estatuto do Chief Buthelezi. O Alcides Sakala lambia as botas dos brancos, se lhe dessem confiança para isso. Não passava de criado às ordens ou escravo nas minas do Rand.

O piolhoso remata assim: “É uma mentira grosseira atribuir a libertação da África Austral à batalha do Cuito Cuanavale que apenas existiu devido ao fracasso da tentativa de tomada da Jamba. Foi este impasse militar, ocorrido nos teatros operacionais do Cuando Cubango que levou as partes em conflito, aplicar a Resolução 435 das Nações Unidas, através da política do "linkage". Esta política determinou a retirada simultânea das forças cubanas e soviéticas de Angola, à retirada das forças sul-africanas da Namíbia e o inicio de negociações directas entre a UNITA e o governo de Angola que levaram a assinatura dos Acordos de Paz para Angola, em Portugal, em Bicesse, em Maio de 1991”.

O piolhoso suicida só não diz que a UNITA não esteve no Acordo de Nova Iorque. E também náo diz que após a queda do regime de apartheid a UNITA ficava sem donos e mais ninguém se servia das suas armas. Párias. Bandidos armados. Como acabaram por ser quando morderam a mão que lhes foi estendida em Bicesse e regressaram à guerra em 1992. Felizmente os militares das FAA salvaram o piolhoso quando estava moribundo. Assim, quando abre a boca ou escrevinha, todos ficamos a saber que a UNITA e seus sicários não prestam para nada. Nem para os recados do chefe Miala. Porcaria. Ngulu iampuena!

Vou fazer um favor ao piolhoso suicida e publico a Acta da Derrota que prova, sem a menor dúvida, que não houve impasse militar nenhum. Os racistas de Pretória e a sua criadagem da UNITA foram esmagados no Triângulo do Tumpo. Ponto final.

Regime de Apartheid Reconhece a Derrota 

ARTUR QUEIROZ

O Presidente da África do Sul, PW Botha, convocou para o dia 28 de Agosto de 1988 uma reunião classificada como ultra secreta para tomar decisões de Estado sobre a derrota das forças armadas de defesa e segurança no Triângulo do Tumpo.

Estavam presentes os mais altos dirigentes sul-africanos e tomaram uma decisão dolorosa: acabar com o regime de apartheid e acatar a Resolução 435 da ONU sobre a Independência da Namíbia.

O documento secreto ao qual o Jornal de Angola teve acesso tem poucas palavras, mas são significativas.

Na reunião de alto nível estiveram presentes além do Presidente da República PW Botha, o ministro da Defesa, general Magnus Malan, o ministro das Relações Exteriores, Pik Rudolf Botha, o general Jannie Geldenhuys, o major general Neil Van Tonder e o major general Kat Liebenberg. 

A agenda da reunião tinha quatro pontos: 

1 Fracasso na tomada do Cuito Cuanavale 

2 Fracasso na tomada da aldeia do Tumpo

3 Material de guerra capturado pelo inimigo (FAPLA) 

4 As baixas em combate. 

Uma correcção. A aldeia do Tumpo é na verdade a aldeia de Samaria que fica no alto de uma colina sobranceira à grande chana do Tumpo, baptizada de “triângulo” porque naquela imensa planície correm os rios Cuito, Tumpo, Dala e Cuanavale.

O secretário da reunião escreveu na acta que o Presidente da República, PW Botha, usando os seus poderes constitucionais decidiu “desmobilizar a 82ª Brigada e o 61º Batalhão Mecanizado, que foram formados para a Batalha do Tumpo”. 

O momento mais importante da reunião estava para vir. A acta refere taxativamente:
“O ministro da Defesa, genral Magnus Malan, e o general Geldenhuys, assumem aqui a total responsabilidade da derrota”. 

Está escrito!

A acta da reunião ultra secreta revela outro aspecto dramático para o regime de apartheid mas bom para a África Austral e o mundo civilizado: 

“Dadas as consequências da derrota no Cuito Cuanavale, o Governo da África do Sul foi obrigado a aceitar a Resolução 435 da ONU sobre a Independência da Namíbia”. 

PW Botha e os seus pares reconheceram naquele momento que a Batalha do Cuito Cuanavale os deixou de tal forma vulneráveis, que foram obrigados a abrir mão da sua colónia.

Libertação de Mandela

A acta da reunião datada de 28 de Agosto de 1988 revela um detalhe fundamental para se compreender o alcance político da vitória das FAPLA na Batalha do Cuito Cuanavale. O Presidente PW Botha, mais uma vez invocando os seus poderes constitucionais “delegou no Dr. Neil Barnard, Chefe da Inteligência Nacional, para preparar negociações com Nelson Mandela e providenciar a sua libertação”.

Os grandes chefes do regime de apartheid perceberam que a derrota no Triângulo do Tumpo era o fim do regime e tinham que agir rapidamente para não perderem tudo. Por isso, correram a abrir as portas da prisão domiciliária onde se encontrava Nelson Mandela. 

Em Angola estavam combatentes do ANC, prontos para “explorar o sucesso” da derrota das Forças de Defesa e Segurança da África do Sul na Batalha do Cuito Cuanavale.

A acta secreta entra, a seguir a este ponto, entra nas justificações para a derrota no Triângulo do Tumpo. 

Primeira justificação descrita no documento: 

“Todos os ataques para desalojar as FAPLA do seu último reduto, fracassaram”.

Mais uma justificação: 

“Todos os ataques a Este do rio Cuito (Tumpo) também falharam. A partir daí, o Alto Comando das SADF convenceu-se de que só era possível destruir o inimigo introduzindo forças massivas o que ia implicar pesadas perdas de vidas sul-africanas. Politicamente isso era inaceitável”.

PW Botha e os seus generais foram forçados a reconhecer a derrota. Abílio Camalata Numa, Paulo Lukamba (Gato), Demóstenes Chilingutila e agora Alcides Sakala dizem que a Batalha do Cuito Cuanavale “está mal contada”. Que apresentem uma versão diferente desta que está escrita na acta secreta da reunião de 28 de Agosto de 1988, no gabinete do Presidente PW Botha.

Os assuntos tratados na reunião eram de tal forma melindrosos que PW Botha obrigou todos os presentes a assinar a acta. O documento foi de facto assinado em primeiro lugar pelo Presidente PW Botha, a seguir assinaram Magnus Malan, Pik Rudolf Botha, Jannie Geldenhuys, Neil Van Tonder e Kat Liebenberg. Eu tenho o documento autêntico! Sorte do repórter.

Nada nem ninguém pode contar a Batalha do Cuito Cuanavale, melhor do que uma acta oficial, secreta, à qual tive acesso, com o respectivo anexo. Para se sentirem moralizados, os grandes chefes do apartheid dão a eles próprios um motivo de ânimo: 

“As três derrotas no Tumpo foram as únicas que a África do Sul sofreu na guerra em Angola”. Coitados. Já mentiam como o Savimbi e os sicários do Galo Negro. Esqueceram o fracasso da “Operação Protéa” que bateu contra a parede das FAPLA na Cahama.

O final da acta tem uma dimensão grotesca e mostra a situação do Presidente PW Botha: 

“Eu fui mal informado sobre a situação no Tumpo e por isso obrigo todos os presentes a assinarem a acta desta reunião”. O derrotado ainda ficou com um pingo de elegância, ao contrário dos piolhosos da UNITA. Não disse que foi aldrabado. Mas foi.

Directiva Política

Além da acta, a reunião de 28 de Agosto de 1988 produziu uma “Directiva Política” que só por si confirma a estrondosa derrota das forças do “apartheid” no Triângulo do Tumpo. Eu tive acesso ao documento que significa a liquidação do apartheid (sempre a sorte do repórter…).

“Directiva Política Urgente para o Gabinete do Presidente. Directiva Política das SADF” 

É assim que se intitula o documento ao qual tive acesso e serve de base a esta reportagem. Contém várias decisões, ponto por ponto. 

Primeiro ponto:

“O Tribunal Militar deliberou em relação às responsabilidades assumidas antes, durante e depois das operações militares ‘Hooper’ e ‘Packer’ na Região do Tumpo, expulsar a partir da data efectiva de 28 de Agosto de 1988, os oficiais Mike Muller, Gerhard Louw e Cassie Schoeman”. 

Segundo ponto:

“Os seguintes oficiais foram despromovidos na Parada Militar e transferidos para o Quartel-General de Pretória: Jan Malan e Koos Lienbenberg”.

Terceiro ponto. “Origem e data. Tribunal Militar MC/302/5B. Data 28/8/88”. 

Desta directiva política foram enviadas cópias para a Autoridade Controladora do Tribunal Militar Principal, Chefe do Exército, Chefe do Estado-Maior das Operações, Chefe da Força Aérea, General Cirurgião, Chefe do Estado-Maior da Inteligência, General Capelão e Chefe do Estado Maior das Divisões. O documento é assinado por Magnus Malan. 

No dia 28/8/88, após a reunião ultra secreta onde foi reconhecida a derrota em Angola, os chefes do apartheid arranjaram logo bodes expiatórios para o fracasso no Triângulo do Tumpo.

Os Mísseis de Reagan

Um ano antes da reunião ultra secreta a cuja acta tive acesso, no dia 28 de Agosto de 1987, o poderoso general Jannie Geldenhuys chamou Savimbi à sua presença e disse-lhe que precisava dos mísseis Stinger que o Presidente Reagan lhe tinha dado.

Este episódio vem descrito com muitos pormenores no livro “Guerra em Angola” de autoria do analista militar sul-africano Helmoed Roemer Heitman. Ele revela que o general Geldenhuys chamou Savimbi “para actualizá-lo” e de seguida disse-lhe que precisava dos seus mísseis Stinger para proteger os canhões G5 na guerra de Angola.

O Presidente Reagan sabia que ao dar os mísseis a Savimbi estava a colocá-los nas mãos dos sul-africanos, mas assim não podia ser acusado de violar as sanções impostas pela comunidade internacional ao regime de apartheid. Claro que Savimbi obedeceu de imediato às ordens do seu general. Na página 43 do livro, está descrito o encontro entre ambos. Quem tiver dúvidas que leia o livro de Helmoed Roemer Heitman intitulado “Guerra em Angola”. Leiam estas partes:

 “Não alcançámos os nossos objectivos porque as tropas da UNITA já tinham entrado em desespero, face ao avanço das FAPLA, provocando o nosso retrocesso de forma ordeira, até ao Triângulo do Tumpo, onde montámos um sistema de defesa muito bem organizado”.  E prossegue: “Nas primeiras horas do dia 23 de Março de 1988, quando as nossas tropas, auxiliadas por dezenas de batalhões da UNITA, pensavam que a tomada da vila do Cuito Cuanavale era apenas uma questão de minutos, foram surpreendidas pelo poder de fogo das FAPLA que descarregaram centenas de obuses dos canhões D-30, 130 milímetros e do lança-foguetes múltiplos BM-21, além dos tanques e de outro material bélico”.

A Força Aérea Nacional, com os caças-bombardeiros S-22, MIG-23, 21 e os helicópteros MI-17, 8 e 35, foi determinante, ao infligir golpes demolidores aos invasores, que deixaram no terreno baixas humanas consideráveis e material bélico.

O Tenente-General António Valeriano, que participou nos combates, defende que “o segredo da vitória esteve na qualidade ofensiva e no patriotismo das nossas tropas, pois estavam em número bastante reduzido”. Este Herói Nacional faleceu recentemente. 

* Jornalista

Na imagem: 1 - Savimbi com Sakala; 2 - Triângulo do Tumbo, Cuito Cuanavale - a batalha vencida pelas FAPLA à UNITA e África do Sul.

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