segunda-feira, 7 de outubro de 2024

EUA: eleições em plena ditadura


 Eduardo Vasco* | Strategic Culture Foundation  | # Traduzido em português do Brasil

A imposição de candidatos, o controle da opinião pública e a repressão generalizada de dissidentes têm sido elementos essenciais da celebração da democracia nos Estados Unidos.

Todos os principais meios de comunicação ocidentais, controlados pelo aparato de desinformação e propaganda de Washington, estão fornecendo ampla cobertura jornalística (ou melhor, “jornalística”) das eleições presidenciais nos Estados Unidos.

O país é retratado como um bastião da democracia e da livre escolha dos cidadãos. No entanto, esse paraíso está sendo ameaçado por um dos candidatos, que é considerado uma aberração e uma anomalia do sistema americano.

Portanto, as duas tentativas de assassinato contra esse candidato são justificadas pelo clima tenso e pela polarização incentivada por ele. Ao mesmo tempo, ele – Donald Trump – tem usado esses eventos como arma de propaganda contra seus rivais, apresentando-se como vítima de um regime controlado pelo Partido Democrata que destruiu o sonho americano.

Ambos os lados usaram todas as ferramentas mais recentes para obter a menor vantagem sobre seus oponentes. A mais amplamente usada é a disseminação de notícias falsas. Mas Kamala Harris e os democratas foram protegidos da maioria das acusações pela imprensa que está ligada a eles.

Na verdade, Trump, apesar de ser um demagogo absoluto, está certo quando diz que os EUA vivem sob uma espécie de regime ditatorial. No entanto, isso não se deve exatamente aos democratas e não é algo novo. Os EUA sempre foram uma ditadura, pelo menos desde que se tornaram uma potência capitalista.

Em apenas duas ocasiões a camarilha bipartidária falhou em garantir uma dobradinha no resultado final das eleições presidenciais. E isso foi há muito tempo. Há muito tempo mesmo: em 1860 e em 1912. Conforme apresentado em outro artigo, pelo menos metade dos americanos gostaria de ter um terceiro partido minimamente competitivo, porque os outros são apenas uma fachada para encobrir o sistema bipartidário claramente antidemocrático.

O sistema funciona basicamente assim: os grandes banqueiros e industriais se reúnem para decidir quem deve representar seus interesses no Salão Oval da Casa Branca. Como os interesses não são exatamente os mesmos — alguns querem mais dinheiro para seus negócios do que para outros — e como é necessário fingir para uma população de mais de 300 milhões de pessoas que esses cidadãos também têm alguns direitos, dois candidatos são escolhidos para competir.

Nos últimos anos, Donald Trump – um desses grandes empresários – conseguiu angariar apoio de um setor da burguesia para ser um desses dois candidatos. Como ele diz algumas bobagens que muitas pessoas gostam de ouvir (e que fazem sentido para muitas pessoas que estão quebradas em todos os sentidos), isso incomoda os empresários mais poderosos.

A elite capitalista dos Estados Unidos prefere Harris a Trump. O aparato que controla a política americana e o estado é basicamente composto pelos setores financeiro, de armas e de tecnologia de ponta. Uma olhada no financiamento de ambas as campanhas mostra que a balança ainda pesa a favor do candidato democrata.

O dinheiro investido, tanto oficialmente quanto nos bastidores, é o que decide quem será eleito. Os eleitores simplesmente seguem o fluxo. O monopólio dos grandes veículos de mídia só noticia os candidatos Democratas e Republicanos – como os eleitores saberão sobre os outros candidatos para votar neles? As redes sociais controlam as discussões e o conteúdo a ser visto – o Google é o maior financiador da campanha de Harris; Apple, Oracle, Amazon e Facebook também investem pesado na democrata, enquanto a Microsoft também deposita dinheiro em Trump.

Não há espaço para nada diferente.

O único espaço seriam as ruas. Mas ali a ditadura é ainda mais brutal. Milhares de ativistas foram presos nos últimos meses por realizarem protestos políticos. A principal área de atuação política dos Estados Unidos, como um verdadeiro império global, é a política internacional. E boa parte das discussões entre os dois candidatos tem sido sobre isso. Nas ruas, as pessoas também estão tentando participar das discussões – já que canais, páginas e perfis tanto de indivíduos quanto de organizações e até mesmo veículos de comunicação foram excluídos das redes sociais. Mas estudantes de dezenas de universidades estão sendo atacados e detidos pela polícia por se oporem ao genocídio que as armas e o dinheiro dos EUA estão facilitando em Gaza. Essa repressão nas ruas – realizada durante o mandato dos democratas – é aplaudida por Trump e pelos republicanos. Mas Trump deve ter cuidado, porque as duas tentativas de assassinato que sofreu foram realizadas por pessoas que não gostam das palavras supostamente pacifistas do candidato em relação à guerra na Ucrânia. Na verdade, aqueles que não apoiam a guerra dos EUA e da OTAN na Ucrânia contra a Rússia têm sido o alvo preferencial da censura nessas eleições. Vários oficiais políticos e comentaristas proeminentes foram coagidos pela polícia e pelo FBI por causa de suas posições políticas, como Scott Ritter, Dan Kovalik e Dimitri K. Simes. Ou o historiador judeu Ilan Pappé, que foi questionado ao chegar aos Estados Unidos por causa de sua opinião crítica sobre Israel.

Nessas eleições, a imposição de candidatos, o controle da opinião pública e a repressão generalizada de dissidentes têm sido elementos essenciais da celebração da democracia nos Estados Unidos.

Este é o país que quer ensinar ao resto do mundo uma lição de democracia.

* Eduardo Vasco é um jornalista brasileiro especializado em política internacional.

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